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3.2 O Planejamento como procedimento administrativo

3.2.3 Planejamento na fase de programação da ação

Concluídas as fases de definição dos fins e do diagnóstico do planejamento, segue a etapa da programação como proposta de ação para aproximar a realidade existente da realidade desejada.192 O diagnóstico, em conjunto com os fins traçados, forma a base de toda proposta de ação. A programação é uma dedução do diagnóstico, e não pode se transformar numa tarefa mecânica: entre o conhecimento da realidade e a intervenção há um longo caminho. Deve estar sempre com os olhos voltados para os objetivos do plano, propondo ações para satisfazer as necessidades apontadas no diagnóstico. Nesta fase são apresentadas estratégias como sugestões de ações e modos de ações propostas, para níveis diversos, como meios de se concretizar o plano, atuando como marco operacional. Os objetivos

190 Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que são elementos do ato administrativo o “conteúdo” e a “forma”

(BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 388-389). Ver: ZANOBINI, Guido. Curso de diritto amministrativo. Milão: Giuffrè, 1950. p. 202. v. I.; ZANCANER, Weida. Da convalidação e da invalidação dos atos administrativos. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 33-41.; OLIVEIRA, Régis Fernandes de. Ato administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 80-81.

191 ZANCANER, Weida. Da convalidação e da invalidação dos atos administrativos. São Paulo: Malheiros,

2008. p. 36.

192 Adotamos aqui também, os ensinamentos de Danilo Gandin, que, ao tratar do planejamento escolar, divide-

o em três etapas: marco referencial, diagnóstico e programação. (GANDIN, Danilo. Planejamento como prática educativa. São Paulo: Loyola, 2007. p. 39 et seq.; GANDIN, Danilo. A prática do planejamento participativo: na educação e em outras instituições, grupos e movimentos dos campos cultural, social, político, religioso e governamental. 15ª ed. Petrópolis-RJ: Vozes, 2008. p. 103 et seq).

operacionais são apenas objetivos-meio, em que são praticados múltiplos atos preparatórios ou instrumentais nas fases do procedimento do planejamento. Os objetivos gerais são alcançados por meio da realização de objetivos específicos.

Na fase de programação do planejamento, é preciso apontar as necessidades que podem ser atendidas no tempo de duração do plano: dizendo o que será feito dentro do necessário, considerando o recurso financeiro disponível ou que pode ser disponibilizado, levando em conta o que é exequível. Medidas inviáveis, mesmo que necessárias, não devem ser propostas. Não sendo possível sanar todas as necessidades, devem-se eleger as mais urgentes. O planejamento deve ter sempre em mente que se desenvolve em três dimensões essenciais: 1) tempo, porque cobre um período de tempo limitado, tendo em vista uma realização futura – nos casos de prestações contínuas, o planejamento é permanente e se renova constantemente; 2) espaço: a ação planejada se realiza em áreas estabelecidas, seja nacional, regional ou local; e 3) volume: o planejamento visa a resultados concretos, mensuráveis e deve contar com recursos financeiros, físicos e materiais.

Nesta etapa, são realizados os “atos de administração consultiva”. Na classificação de Celso Antônio Bandeira de Mello, quanto à natureza da atividade, tais atos “visam a informar, elucidar, sugerir providências administrativas a serem estabelecidas nos atos de administração ativa”. São exemplos destes atos os “pareceres” e “informes”.193 São atos que preparam e instrumentalizam a formação do plano, como ato final ou produto da atividade de planejamento.

O planejamento, no exercício da função administrativa, deve obedecer ao regime jurídico-administrativo, com observância dos princípios: da supremacia do interesse público sobre o privado, da indisponibilidade do interesse público, da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade, eficiência, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, igualdade, do controle jurisdicional dos atos administrativos, da responsabilidade do Estado por atos administrativos, da segurança jurídica,194 da proteção à confiança legítima e da boa-fé.

193 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 29. ed. São Paulo: Malheiros,

2009. p. 417.

194 Adotamos aqui a sistematização criada por BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito

É nesta etapa de programação que se dá o enlace entre as fases do diagnóstico e dos fins traçados, na busca e eleição dos meios, para efetivação do plano. Aqui reside o núcleo da atividade de planejamento. Política e técnica, possíveis escolhas e a discricionariedade situam-se nesta fase do planejamento. As perguntas a serem feitas são: (i) O quê fazer para sanar as necessidades indicadas pelo diagnóstico? (ii) Para quê fazer? Visando a dar a linha e coerência de todo o processo. (iii) Como fazer? Para expressar os modos de atuar, sugerindo ações possíveis e cabíveis. (iv) Quais são as opções? Para levantar hipóteses de intervenção, sempre voltados para a finalidade do plano, projetando-as para o futuro. A política, na atividade de planejamento, atua como princípio de ação. Celso Lafer sustenta que a “decisão de planejar é essencialmente política”; embora influenciada por “considerações técnicas, consiste na tentativa de alocar explicitamente recursos e implicitamente valores através de um determinado plano”.195 As políticas devem se expressar como meio para os fins, são propostas de

programação, mas que devem ser adequadas para responder às necessidades apresentadas pelo diagnóstico. Basta para tanto aferir que as políticas públicas têm como núcleo um plano ou programa ou projeto.196 A função administrativa executa as decisões políticas, mas estas não esgotam todas as escolhas, que podem remanescer no caso concreto.

Quando se trata de planejamento e política não se pode olvidar que a decisão política fundamental consta da Constituição e foi tomada pelo constituinte. Tem inteira aplicação aqui a advertência de Eros Grau de que “os programas de governo deste e daquele Presidente da República é que devem ser adaptados à Constituição, e não o inverso”; a incompatibilidade “consubstancia situação de inconstitucionalidade, institucional e/ou normativa”.197 No dizer de Gilberto Bercovici, “o plano deve estar de acordo com a ideologia constitucional”, com a qual está

195 LAFER, Celso. JK e o programa de metas (1956-1961): processo de planejamento e sistema político no

Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2002. p. 26.

196 Maria Paula Dallari Bucci define políticas públicas como “programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados. Políticas públicas são ‘metas coletivas conscientes’ e, como tais, um problema de direito público, em sentido lato.” (BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 241). Para Celso Antônio Bandeira de Mello: “Política pública é um conjunto de atos unificados por um fio condutor que os une ao objetivo comum de empreender ou prosseguir um dado projeto governamental para o país.” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 808).

“sempre comprometido axiologicamente”.198 Planos criados à imagem e semelhança do administrador, para divulgação e promoção pessoal, ferem de morte o princípio da impessoalidade (art. 37, caput e § 4º, CF).

O aspecto técnico exige sustentação técnica para tanto. Não é possível o desenvolvimento da programação do planejamento sem modelos, processos, técnicas e instrumentos claros e fundamentados no método científico. Vigora a regra de que marcar “X” não é planejar. O planejamento se perde e se burocratiza quando se reduz a preencher quadros sem justificativas teóricas e sem procedimentos técnicos, os quais só podem ser realizados com capacitação técnica estrutural do Poder Público.

Pareceres técnicos e jurídicos, estudos, pesquisas, elaboração de anteprojetos, esboços, rascunhos, desenhos, traçados gráficos, orçamentos financeiros (quantitativos e qualitativos), custo-benefício, métodos de execução, prazos, canalização de informações e conhecimentos dos diversos setores, diretrizes, adequação das medidas, conservação, operacionalização, apontando, opinando, enunciando soluções, são praticados nesta etapa para formação das orientações e das ações a serem adotadas. Todos os órgãos administrativos interessados no plano devem ser ouvidos, num trabalho organizado e coordenado.

O procedimento de planejamento é mais importante que o plano em si. Após a tomada de um conjunto de decisões, elas devem ser sistematizadas, interpretadas e operacionalizadas documentalmente. As ações devem ser: 1) politicamente aceitáveis e sensíveis às aspirações da população; 2) exequíveis, apresentando viabilidade técnica e econômica, passíveis de serem executadas – o impossível e o inexequível devem ser afastados; 3) economicamente eficazes, com alcance do máximo de benefício ao menor custo econômico e social, mormente com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal – LC n. 101/2000; 4) tecnicamente racionais, coerentes e adequadas aos fins propostos – a Lei n. 8.987/95 fala em atualidade do serviço público, que compreende a “modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação”, a “melhoria e expansão do serviço”;199 5)

198 BERCOVICI, Gilberto. Desigualdades regionais: Estado e Constituição. São Paulo: Max Limonad, 2003.

p. 192.

199 Dinorá Grotti sustenta que o princípio da atualidade, adaptabilidade ou mutabilidade “significa que os serviços públicos podem e devem ser adaptados, alterados, de acordo com as necessidades cambiantes do

flexíveis e intercambiáveis, para oferecer condições, no momento da sua execução, de serem adaptadas em razão de variáveis não previstas e imprevisíveis, sem comprometer a segurança jurídica e a estabilidade das relações; e 6) no caso de plano de obras públicas, estas devem levar em conta a estética, isto é, as construções públicas devem ter beleza.