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4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.4 Percepção dos impactos da atuação na saúde psíquica

4.4.3 Potenciais geradores da organização do trabalho

Cinco categorias contemplam aspectos que envolvem a organização do trabalho. São elas: “Cobrança por produtividade e a sobrecarga”; “Papéis diversos: ensino, pesquisa, extensão e gestão”; “Normas e legislações – Burocracia”; “Ritmos de trabalho (prazo e pressões)”; e, “Organização do tempo (vida pessoal e trabalho)”.

Em relação à categoria “Cobrança por produtividade e a sobrecarga” foram apresentadas as seguintes descrições: Prejudica; Pressão; Penoso à saúde; Adoecimento; Medo; Ansiedade; Ansiedade e insônia; Estado de alerta e estresse constante; Estresse; Estresse e cansaço; e, Estresse e adoecimento.

Por conta de estressores, então essa carga-horaria excessiva que a gente tem, ela prejudica. (CHEFIA 4, 2020).

Então isso tem sido muito penoso na minha saúde mental e física. A questão da sobrecarga. [...] A sobrecarga, o excesso de coisas a fazer, tem me trazido uma ansiedade e insônia constante [agitação], um estado de alerta e de estresse constante. (CHEFIA 5, 2020).

Então foram 6 anos que eu trabalhei uma maneira tão enlouquecida que eu cheguei no nível de estresse e de cansaço, que eu fui obrigado a parar.” [Falta o ar]. (CHEFIA 7, 2020).

E Universidade se deixou envolver [alteração da voz], e levar, por esses três elementos: eficácia, eficiência e produtividade. Então tudo que nós fazemos para produzir mais. Para dar mais resultado, né? Quantos artigos? Número! [...] É inevitável o adoecimento. Então não tem o que fazer. É inevitável. [Ênfase]. Porque nós estamos numa sociedade do cansaço [...]. A sociedade do cansaço é regida pela eficiência, eficácia e produtividade. (CHEFIA 12, 2020).

No estudo de Kanan e Zanelli (2011), sobrecarga de trabalho é descrita como uma das ameaças ao bem-estar dos docentes-gestores. Os autores descrevem como consequências: cansaço, intranquilidade, sofrimento psíquico, desgaste físico e psicológico. Algumas delas são descritas pelos participantes desse estudo.

Em consonância com a fala da Chefia 12 (2020), é preciso estar atento aos reflexos da Sociedade do Cansaço, pois “o excesso da elevação do desempenho leva a um infarto da alma” (HAN, 2015, p.71). Dentro dessa sociedade, há uma violência sistêmica que gera a pressão do desempenho, isso leva a depressão e esgotamento. A vida é vivenciada de forma extremamente ativa e agitada, o que gera cansaço e esgotamento excessivos. É um contexto onde se pode tudo, não há impedimentos e freios (HAN, 2015). Isso gera um cansaço que é vivenciado de forma solitária, o que corrobora com as ideias de Bauman (2001). Cada um imerso em seu sofrimento que muitas vezes não é visto nem falado. Diante da

superprodução, superdesempenho e superinformação o corpo reage com esgotamento, exaustão e sufocamento.

Vivenciamos um contexto onde há uma falsa ideia de liberdade, onde cada um é senhor de si, que termina por gerar uma coerção inerente ao sujeito que o impele a ter o desempenho máximo. Trata-se de uma exploração eficiente, que não depende de outro, é realizada pelo próprio sujeito. Nesse sentido, a sociedade do desempenho produz depressivos e fracassados (HAN, 2015.).

A categoria supracitada tem íntima ligação com a segunda categoria “Papéis diversos: ensino, pesquisa, extensão e gestão”. Ela apresenta as seguintes descrições de impacto: Pressão; Sensação de fazer tudo mal feito; Limitação de fazer como gostaria; Adoecimento; Enxaqueca; Estresse; Bem estressante; Muito estressante; e, Violentado.

Então é motivo de loucura [risos]. [...] é uma coisa assim bem estressante. (CHEFIA 1, 2020).

Porque a gente não deixa de fazer, não deixa sala de aula, não deixa extensão, não deixa de fazer pesquisa. E acaba fazendo tudo mal feito, eu acho. (CHEFIA 4, 2020).

[...] conciliar o meu papel de gestora com meu papel de docente. Mas isso tem me adoecido. (CHEFIA 5, 2020).

[...] eu tenho tomado bastante conta de toda essa situação para que não externe o estresse. [Expressão enfática]. (CHEFIA 8, 2020).

Eu sou chefe de departamento [...], mas eu não posso deixar de publicar. Lá na pós-graduação eles expõem gráficos. [Expressões corporais]. (CHEFIA 12, 2020).

Magalhães, Barbosa e Lima (2017) destaca o dilema vivenciado pelos docentes na escolha entre o trabalho acadêmico e o trabalho administrativo, gestão implica em abdicar de atividades acadêmicas, do convívio familiar e diminuir o tempo de descanso. Ésther, Silva e Melo (2010) verificaram que a concorrência entre diversas atividades é uma fonte de angústia e impacta em menor produção científica, dificuldade na vida pessoal e pouco tempo para a família.

A própria sobrecarga de trabalho e a multitarefa colabora para a atenção se tornar rasa e superficial (HAN, 2015). Não há durabilidade nas coisas, conforme descrito por Bauman (2001), isso gera nervosismo e inquietação.

A categoria “Normas e legislações – Burocracia”, que descreveu o impacto das normativas e da burocracia, apresentou as seguintes descrições: Frustração; Desgasta muito; e, Maltrata.

Então esses tempos operacionais impacta muito. Eu planejo, acho que vai dar certo naquele tempo e aquilo demora muito mais. Então isso é uma coisa que me desgasta muito. (CHEFIA 8, 2020).

[...] uma certa frustração que dá de você não conseguir fazer tudo que poderia por causa da burocracia e falta de dinheiro. (CHEFIA 11, 2020). Entre as situações estressoras apontadas pelos gestores universitários, Wilhelm (2012) descreve: processos licitatórios; atividades que dependem de outros setores; recursos financeiros e prestação de contas; demora nos encaminhamentos. Isso corrobora com os aspectos descritos pelos participantes.

A categoria “Ritmos de trabalho (prazo e pressões)” apresentou como descrição os seguintes índices: Pressão; Sinto-me pressionado; Desgaste; Sensação de ameaça; Medo; e, Tensão.

Que às vezes eu recebo dois processos na sexta-feira, para relatar [...] na terça. Quando é que eu vou analisar esses processos? Processo de 500 folhas, de mil folhas, né? [risos]. (CHEFIA 9, 2020).

[...] querem as coisas para ontem, e se não, eu não providenciar para ontem, já ameaça [...] Aí aluno ameaçando também, entendeu? E assim vai, então isso é uma coisa que me desgastou muito esse ano [pausa de reflexão]. (CHEFIA 11, 2020).

[Alteração da voz]. O medo de todo um o sistema jurídico que nos acossa todo dia. (CHEFIA 12, 2020).

A grande responsabilidade assumida decorrente do cargo é percebida como um dos fatores de risco a saúde (KANAN; ZANELLI, 2011). Entretanto, há criticas à lógica empresarial aplicada as universidades (FINGER, 1986, apud ÉSTHER, 2011).

A última categoria “Organização do tempo (Vida pessoal e trabalho)” agrupou as seguintes descrições de impacto: Possibilidade de adoecer; Desgaste; Adoece; Ansiedade; Comprometimento da vida pessoal; Estresse familiar; e, Adoecimento familiar.

[...] mas não é só a nossa vida que é afetada, é a vida de todo mundo em casa. A minha família ficou em um estresse gigantesco. (CHEFIA 1, 2020).

[...] [coça a cabeça]. Eu trabalho de domingo a domingo, de segunda a sexta manhã tarde noite, e sábado e domingo pelo menos um turno. É um vício, né? (CHEFIA 9, 2020).

Outra coisa que me gera ansiedade bastante é administração do tempo como os colegas já falaram. (CHEFIA 10, 2020).

Eu ainda fico nas férias respondendo e-mail, o tempo todo atende o telefone, quando eu tô visitando Museu, resolvendo problema distância. Eu acho que eu teria que consertar isso. (CHEFIA 11, 2020).

Marra e Melo (2005) em seu estudo verificaram que a sobrecarga atinge a vida pessoal, como consequência os entrevistados sacrificam os finais de semana e o tempo com a família. Na pesquisa de Gomes et al. (2013) isso também foi observado com as funções de Reitor, Vice-reitor e Pró-reitores. Segundo os participantes, a gestão traz uns impactos negativos à vida pessoal: menos tempo para família, lazer, férias, e menos atividades físicas.

Sobre a organização do tempo, verifica-se o que impera é a hiperatividade que impede de desacelerar (HAN, 2015). O homem na atualidade se apresenta hiperativo e presenciamos uma enorme agitação. Essa vida exageradamente ativa dificulta a vida contemplativa. Sem a possibilidade de reflexão e contemplação, o pensamento que medita, o homem não consegue ser o que deve ser. “Também o aceleramento de hoje tem muito a ver com a carência de ser” (HAN, 2015, p. 46).

O detalhamento sobre as cinco categorias que envolvem os potenciais geradores de impactos negativos na organização do trabalho está descrito na tabela a seguir.

Tabela 16 - Aspectos da organização do trabalho. Que impactos geram?

Categoria Índice (Assunto) Frequência

do índice N° Chefes Frequência da categoria Cobrança por produtividade e a sobrecarga Prejudica 1 5 18 Pressão 4 Penoso à saúde 1 Adoecimento 3 Medo 1 Ansiedade 1 Ansiedade e insônia 1

Estado de alerta e estresse constante 1

Estresse 2 Estresse e cansaço 2 Estresse e adoecimento 1 Papéis diversos: ensino, pesquisa, extensão e gestão Pressão 5 7 15

Sensação de fazer tudo mal-feito 2 Limitação de fazer como gostaria 1

Adoecimento 2

Enxaqueca 1

Estresse 2

Bem estressante 1

Violentado 1 Normas e legislações – Burocracia Frustração 1 3 4 Desgasta muito 1 Maltrata 2 Ritmos de trabalho (prazo e pressões) Pressão 3 5 14 Sinto-me pressionado 4 Desgaste 1 Sensação de ameaça 1 Medo 4 Tensão 1 Organização do tempo (Vida pessoal e trabalho) Possibilidade de adoecer 1 7 14 Desgaste 1 Adoece 1 Ansiedade 1

Comprometimento da vida pessoal 8

Estresse familiar 1

Adoecimento familiar 1

Fonte: Elaborada pela autora (2020).

Diante desse contexto, os participantes pontuaram alguns aspectos que eles percebem como necessários e possíveis de serem melhorados. Esses pontos serão descritos no tópico seguinte que finaliza a apresentação e discussão dos resultados.