• Nenhum resultado encontrado

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.2 Saúde psíquica e trabalho

2.2.3 Promoção da saúde psíquica no trabalho

No que se refere à promoção da saúde psíquica, Borges, Guimarães e Silva (2013) esclarecem que ela pode ser desenvolvida em três níveis: Primário, que contempla a proteção e promoção da saúde; Secundário, que se refere à assistência; e Terciário, que diz respeito a reabilitação e readaptação. Destacam que a atuação nessa área exige um compromisso das instituições na implementação de mudanças necessárias nas situações de trabalho que geram impacto no processo saúde-doença.

O quadro 10 destaca a descrição apresentada por Glina e Rocha (2010) em relação a níveis de atuação dentro das organizações:

Quadro 10 – Níveis de atuação nas organizações

Prevenção Controle de riscos e exposições decorrentes de desenho inadequado do cargo e treinamento insuficiente ou inapropriado.

Reação oportuna Gerenciamento e solução de problemas em grupo, a fim de melhorar a habilidade da organização reconhecer e lidar com os problemas que surgem.

Reabilitação Envolve oferecer apoio (incluindo aconselhamento) para ajudar os trabalhadores a enfrentar e recuperar-se dos problemas existentes.

Fonte: Glina e Rocha (2010, p.115).

Para a realização de atividades eficazes na área de promoção Borges, Guimarães e Silva (2013) enfatizam ser necessário: esforço interdisciplinar; participação e cooperação entre os atores; enfoque amplo que contemple atividades orientadas para o trabalhador e o desenho das condições de trabalho.

No âmbito da Saúde do Trabalhador há ações de vigilância. Essas envolvem a identificação, o controle e a eliminação dos riscos nos locais de trabalho. “O objetivo é identificar os riscos à saúde nos contextos de trabalho e indicar modificações, visando à prevenção primária” (CFP, 2019).

Segundo Araujo e Oliveira (2019), os primeiros passos nas práticas preventivas são as pesquisas e os diagnósticos organizacionais. Seus resultados funcionam orientadores na elaboração de práticas mais adequadas ao contexto organizacional. Entretanto, destacam que as ações organizacionais, na maioria das vezes, possuem uma lógica curativa e assistencialista, ou seja, a intervenção só ocorre após o adoecimento do trabalhador. E as ações preventivas, quando existem, não consideram o contexto de trabalho como causa ou potencializador do adoecimento. As autoras completam que deve sempre ser feito o seguinte questionamento: “o que é que está causando esse adoecimento?” (ARAUJO; OLIVEIRA, 2019, p.4).

As técnicas de coleta a serem utilizadas dependerão dos objetivos da pesquisa, entre as técnicas estão: Questionário; Escala; Inventários; Pesquisa Documental; Entrevista; Técnicas projetivas; Análise Ergonômica; Grupo focal. Glina e Rocha (2010) apresentam as orientações da Organização Internacional do Trabalho para verificar as características do trabalho através dois métodos: 1) Análise do trabalho com observação direta, medidas, enfoques estatísticos teóricos; 2) Obtenção da percepção dos trabalhadores sobre o trabalho

e as condições de trabalho por meio de questionários e entrevistas (INTERNACIONAL LABOUR OFFICE, 1986 apud GLINA; ROCHA, 2010).

A prevenção de riscos psicossociais e promoção da saúde melhoram o clima organizacional, influenciam a motivação e o comprometimento, e diminuem o absenteísmo (ZANELLI, 2015). De acordo com Zanelli (2015), o primeiro passo é o diagnóstico, tanto a nível qualitativo quanto quantitativo, que deverá avaliar os agentes que podem prejudicar a saúde e o desempenho dos trabalhadores. Entre as técnicas, pode se utilizar entrevistas, questionários, escalas, documentos e observação direta. A partir dos dados coletados, são estabelecidos o programa de intervenção, acompanhamento e intervenção.

A atuação no campo da promoção da saúde psíquica é realizada de forma diferente pelas abordagens individualista, psicodinâmica e psicossosiológica devido a base epistemológica que adotam. Nessa última abordagem, Borges, Guimarães e Silva (2013) explicam que as atividades diagnósticas já são consideradas como um tipo de intervenção, que através do feedback promovem mudanças na instituição, nas condições de trabalho e podem contribuir para a construção de políticas organizacionais. No processo diagnóstico em saúde mental no trabalho, é possível incluir: questionamentos sobre o trabalho; anamnese ocupacional; análise de aspectos da organização do trabalho; identificar as exigências físicas e mentais; considerar a percepção do trabalhador a respeito da sua atividade; e observar o posto de trabalho, as condições ambientais e o processo de trabalho (CFP, 2019).

Para orientar as mudanças no contexto de trabalho é preciso que se analise as demandas apresentadas aos trabalhadores e os recursos institucionais oferecidos para realizar essas demandas. Nesse sentido, Cardoso (2015, p. 84) orienta:

é necessário comparar situação/meio ambiente/determinantes/exigências/ prescrições do trabalho, que podem ser chamadas de “demandas” estabelecidas e definidas pelas empresas. Por outro lado, é fundamental compreendermos quais são os recursos/capacidades/poderes, os respectivos “meios”, que as empresas dispõem para que os trabalhadores possam responder às demandas e realizar o trabalho.

O quadro 11 apresenta as demandas as quais o trabalhador se depara e os possíveis recursos institucionais que podem ser ofertados como suporte organizacional a essas demandas.

Quadro 11 – Demandas e recursos institucionais

Demandas

-Físicas – quantidade de trabalho; intensidade; o ritmo (determinado por máquinas, clientes, colegas); metas e objetivos; polivalência; interrupções; pressão temporal.

-Emocionais – tensão com o público; contato com o sofrimento; necessidade de esconder a emoção e de acalmar pessoas; medo durante a realização do trabalho.

-Cognitivas – a complexidade do trabalho; pensar várias coisas ao mesmo tempo; monotonia; aprendizado de coisas novas; grau de concentração; necessidade de seguir normas; grau de responsabilidade; resolução de problemas; concentração; atenção; mudanças constantes (seja em relação aos colegas de trabalho, à hierarquia, à função, aos produtos, às normas, entre outras).

Recursos da Institucionais para responder as demandas

-Autonomia e margem de manobra – para definir a ordem das tarefas, os métodos, a cadência e/ou velocidade, as pausas, os horários, a participação nas mudanças da organização e na definição dos objetivos, os espaços de discussão, a possibilidade de tomar decisões.

-Formação – no que se refere tanto à sua duração quanto ao seu conteúdo. -Processo e organização do trabalho – previsibilidade no trabalho, eliminação de prescrições contraditórias, informação suficiente para realizar trabalho e/ou saber onde encontrá-las, informações sobre mudanças futuras.

-Relação social e apoio à coordenação e aos colegas de trabalho – apoio social e/ou ajuda para resolver problemas, colaboração entre trabalhadores, formas de avaliação, equidade, respeito, sentir-se parte do grupo ou isolado.

-Violência – agressão verbal e/ou física, assédio moral/organizacional e sexual. -Relação esforço/reconhecimento – que se manifesta nas formas de promoção, de avaliação, no salário etc.

-Tempo de trabalho – no que se refere à duração normal e extra e à sua distribuição.

-Ambiente físico adequado – luz, temperatura, cheiro, limpeza, ausência de barulho, equipamentos adequados, não exposição a agentes químicos/ biológicos, poluição e radiação etc.

-Segurança no emprego – atual e futuro. Fonte: Cardoso (2015, p. 84).

De acordo com Glina e Rocha (2010), para a manutenção da saúde psíquica é preciso construir crenças saudáveis, adequar as expectativas sobre o que se pode fazer (ritmo e tempo), aceitar os limites, saber que nem sempre há recompensa, não existe um modo único e adequado de atingir as metas. É preciso que as chefias realizem seu autocuidado, bem como colaborem com o cuidado dos seus subordinados. As autoras destacam que é uma tarefa difícil, pois as pessoas tendem a ocultar os problemas que

vivenciam por receio de serem percebidos como fracos. Nesse sentido, é preciso estar atento às mudanças de comportamento e oferecer ajuda.

Para Ferreira e Mendes (2001) as vivências de sofrimento surgem quando se verifica aspectos como: divisão e padronização de tarefas com subutilização do potencial técnico e da criatividade; rigidez hierárquica; excesso de procedimentos burocráticos; ingerências políticas; centralização de informações; falta de participação nas decisões e não-reconhecimento; pouca perspectiva de crescimento profissional. Esses autores consideram o prazer-sofrimento como uma vivência subjetiva que é compartilhada coletivamente e recebe influência da atividade de trabalho. “O sofrimento é definido a partir do fator desgaste, que é a sensação de cansaço, desânimo e descontentamento com relação ao trabalho” (FERREIRA; MENDES, 2001, p. 96). Em relação ao sofrimento, Cardoso (2015) descreve aspectos como o cansaço, a ansiedade, o estresse, o desânimo, a dificuldade para dormir, o desespero, a perda de referência.

Nesse sentido, o sofrimento psíquico desencadeado pelo trabalho precisa ser entendido, pois se verifica aumento de casos de depressão, suicídio e transtornos mentais entre trabalhadores advindos da relação entre o trabalho e adoecimento psíquico (JACQUES, 2007). Desse modo, antes que se estabeleça um quadro de adoecimento psíquico, é preciso estar atento aos relatos de sintomas que também têm sido apontados como resultantes do processo de intensificação de mal-estar/sofrimento, as dores, as doenças físicas e os acidentes de trabalho (CARDOSO, 2015). Lancman, Toldrá, Santos (2010) explicam que, embora as situações de elevado sofrimento psíquico possam ser comum em algumas categorias profissionais, as respostas e reações são individuais e depende da forma como o indivíduo lida com a situação.

Entre as formas de intervenção em saúde mental no trabalho, há destaque para as atividades em grupo com trabalhadores. Lancman, Toldrá, Santos (2010) esclarecem a escuta grupal permite que os sujeitos consigam se reapropriar do seu trabalho e da relação com sua saúde, isso ocorre a partir da reflexão dos coletivos de trabalho. Portanto, é preciso conhecer em detalhe o contexto de trabalho da categoria que se pretende estudar. Nesse sentido, a seção seguinte busca detalhar o cenário no qual os docentes estão inseridos na atuação da gestão universitária.