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CAPÍTULO III O LABORATÓRIO DE ENSINO DE PATOLOGIA

HORÁRIA

3.3.3 A professora-formadora

A professora Maria é uma mulher de meia idade, possui formação acadêmica, em nível de doutorado, na área de Patologia. Sua experiência profissional no ensino superior conta com cerca de vinte anos, lecionando em disciplinas universitárias dessa área, e em outras áreas correlatas da saúde, para cursos de Bacharelado, como em Ciências Biológicas, Veterinária, Medicina, etc. Ela também leciona em cursos de pós-graduação (mestrado e doutorado) na área de Patologia, tendo orientandos de mestrado e uma de doutorado em andamento, na época. Além disso, a professora possui várias publicações acadêmicas nessa área.

A partir do ano de 2009, essa professora passou a lecionar a disciplina Laboratório de Ensino de Patologia para a Licenciatura em Ciências Biológicas. Em entrevistas, Maria relatou que “herdou” essa disciplina, que já havia sendo ministrada por outros professores do departamento, em outros momentos. Ela disse-nos que teve que assumir o LEP, pois a professora que era responsável pela disciplina, saiu do departamento de Patologia.

Maria relatou que encontrou certas dificuldades para lidar com o LEP naquele momento, uma vez que não tinha expertise na área, como ela própria diz: “essa disciplina é totalmente diferente das outras que eu já ministrei. Era difícil para mim,

porque eu não sou formada na área. [...]”115 A seguir, mais um depoimento em que a professora discute os desafio que encontrou:

No início que eu comecei a trabalhar com isso e até hoje eu tenho dificuldades. Porque, primeiro, pela minha própria, posso dizer assim, ignorância com questões ligadas à educação. [...] Além disso, eu não sou uma pessoa que tem filhos e nem sobrinhos e sei que muitas pessoas têm contato com a educação por meio do acompanhamento da criação dos filhos e sobrinhos.116

Como vimos, Maria não possui experiências com o ensino na educação básica nem contato mais próximo com questões escolares. Reconhecendo essa característica em sua trajetória profissional como uma “lacuna” na sua formação enquanto formadora de professores, ela expressou uma necessidade de ir em busca de conhecimentos da área de educação. Assim, a professora começou a se interessar por assuntos educacionais.

Pela minha inquietude eu comecei a perguntar aos outros colegas que trabalhavam com os laboratórios o que eles faziam. Eu fui me interessando, e tive contato com uma professora aqui do Instituto que lecionava em um laboratório. Ela me disse para ir observando os Parâmetros Curriculares Nacionais. A partir daí eu fui lendo o documento, conversando com ela e me interessando pela área da educação.117

Em razão dessa lacuna, a professora, explicitamente, declarava que em seu planejamento para a disciplina, nos momentos para se falar de ensino e de escola, ela optava por trazer convidados que tinham experiências nessa área: “Esses assuntos, mais especificamente, eu acho muito complexo. Aí eu chamo outras pessoas para falar sobre.”118

Segundo a professora, assumir o LEP foi uma nova empreitada em sua carreira profissional e, em sua perspectiva, havia a necessidade de um maior reconhecimento do papel da disciplina.119 115Entrevista Maria. 23/09/2011. 116Entrevista Maria. 15/03/2011. 117 Entrevista Maria. 15/03/2011. 118Entrevista Maria. 23/09/2011. 119 Entrevista Maria. 23/09/2011.

Durante todo o tempo em que estivemos com a professora, observamos que ela era bastante atenciosa com os seus estudantes. Ela se interessava por cada um, procurando entender suas caraterísticas, seus limites e suas potencialidades. Em diversos momentos durante as aulas, Maria solicitava as opiniões dos alunos sobre assuntos debatidos nas aulas, os incitava a participar dos debates e refletir sobre suas opiniões. Observamos que, ao conhecer os perfis, interesses e trajetórias acadêmicas de cada um, Maria, inclusive, projetava isto no seu planejamento e seleção dos conteúdos para a próxima disciplina. Por exemplo, no depoimento abaixo, Maria explica-nos os motivos de ter mantido alguns conteúdos da área de Patologia no LEP, e se pode, facilmente, perceber como ela se orientava para alunado que podia vir a ter:

Tinha que dar uma base para eles de Patologia Geral, para aqueles que não cursaram essa disciplina, mas eu penso também sobre qual tipo de base precisa ser dada. Uma vez que eu já cortei um monte de coisas e ainda acho que há muito para ser retirado. Eu já estou começando a perceber que algumas coisas realmente não precisa. [...] Se eu tiver todos os alunos que já tiveram Patologia Geral então eu não vou mais precisar disso. Mas se eu tiver dois alunos que não fizeram a Patologia [Geral ou Comparada], eu vejo que vou ter que trabalhar esses conceitos da patologia, mas talvez pode ser menos. Eu vou ter que mudar.120

Maria demonstrou ser bastante comprometida com suas aulas. Sempre presente e pontual, por vezes, estendia-se em horários após o término das aulas para o atendimento aos alunos tanto sobre assuntos da disciplina quanto para conversas cotidianas. Ela também aparentava ser querida pelos licenciandos que, algumas vezes, conversavam com a professora sobre questões, dúvidas e angústias relativas a suas vidas acadêmicas. Também pude observar, em certos momentos, os estudantes tecerem comentários positivos sobre a professora e a disciplina.

Outra característica da professora, que pudemos observar, é que ela sempre se mostrou muito disponível e aberta aos nossos comentários, críticas e sugestões sobre sua atividade docente. Na verdade, na maior parte das vezes, era ela mesma quem solicitava algum tipo de opinião sobre suas aulas, com perguntas do tipo “O que você achou? Será que agi correto?”. Contudo, ao invés de apenas fornecermos respostas, sempre nos propusemos a entender, em conjunto com ela, o que tinha ocorrido na

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aula, as razões para suas escolhas e das reações e intervenções dos alunos. Essa atividade marcou o tempo de acompanhamento e coleta de dados, Maria demostrou ter uma boa capacidade reflexiva, em termos de lembrar de suas ações e decisões em sala de aula e projetar outras possibilidades. Ela própria relatava que muito ainda tinha que ser melhorado nessa disciplina e apresentava disposição para isso, como no depoimento a seguir: “Eu sei que desde 2009 até hoje eu evoluí muito, mas sei que muito ainda tenho que melhorar. Tenho consciência que não estou dando uma aula fantástica, por assim dizer, mas estou disposta a ir atrás.”121

No mesmo período em que começamos a pesquisa, Maria também estava iniciando o desenvolvimento de estudos e pesquisas na área de educação por meio de um pós- doutoramento, na faculdade de educação. Por várias vezes, Maria nos relatava estar muito entusiasmada por lecionar no LEP, por manter contato conosco e desenvolver atividades na área de Educação. Em um bom número de vezes, ela nos disse que a disciplina, nossa parceria e o grupo de pesquisa do qual ela fazia parte na faculdade de educação, haviam surgido em momento muito especial em sua vida, em que ela precisava de estímulo para continuar engajada com o ensino e algumas atividades desenvolvidas no IB. Ao longo do desenvolvimento de nossa pesquisa, Maria concluiu o seu estudo de pós-doutorado e desenvolveu outro, dessa vez na Europa, também na área de educação. Além disso, desde o momento em que a conhecemos até os dias atuais, observamos que ela vem participando de alguns eventos na área de Educação e Ensino de Ciências e produzindo publicações na área.

Em todo esse tempo que convivemos com Maria nunca a vimos desinteressada ou desmotivada. Ela nos recebeu muito bem, sempre muito atenciosa e interessada, por vezes era ela quem tomava a iniciativa para nos encontrarmos e discutir questões relativas à disciplina.

Portanto, o Laboratório de Ensino de Patologia é uma disciplina ofertada pelo departamento de Patologia, do Instituto de Biologia, para o curso de licenciatura em Ciências Biológicas, diurno. Sua posição curricular tem relações muito próximas com questões históricas as quais remontam a constituição do instituto e do curso. De

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acordo com alguns estudos históricos (DINIZ-PEREIRA, 1996, 1998) o departamento ao qual o LEP está vinculado, fez parte da vertente médica que deu origem ao IB, que contou com, entre outras instituições, departamentos da Faculdade de Medicina e da Escola de Veterinária da Universidade. Se, por um lado, esta vertente contava com maior status acadêmico quando comparada à outra, que também deu origem ao curso,

vertente biológica, por outro lado, o departamento ao qual ela está vinculada é o de

menor prestígio dentro daquela vertente. Tal condição, provavelmente, tem relações com o fato de este departamento só ter o LEP como única disciplina de carácter obrigatório no curso em questão. Além disso, tais estudos também evidenciam que o Instituto, historicamente, carrega uma predileção pelas atividades de pesquisa à docência. Por via de consequência, há também uma atenção maior para com a formação do acadêmico-pesquisador no campo das Ciências Biológicas à do professor de Ciências e Biologia. Tal histórico torna-se mais visível, porque é possível encontrarmos uma veterinária envolvida com a formação de professores de Ciências, em uma disciplina que tem um conteúdo específico, o campo Médico/Veterinário, e, além disso, ainda carrega uma atenção para com o contexto escolar. Afinal, esta disciplina também faz parte da carga horária da prática como componente curricular instituída pelas DCN (BRASIL, 2002a, 2002b), condição que representa institucionalmente este espaço curricular, entre outras propostas, é um espaço-tempo para serem estabelecidas relações entre um conteúdo específico e seu ensino nas escolas. Contudo, tal condição não é tratada em maiores detalhes pelos documentos institucionais do curso nem da disciplina. Assim, nem o Projeto Político Pedagógico do curso nem o Programa da disciplina não apresentam grandes explicações sobre como essa relação seria realizada. Além do mais, a professora-responsável pela disciplina não tem perfil de estudos e pesquisas na área de educação nem experiência na educação básica. Assim, pela forma como a disciplina encontra-se atualmente organizada, considerando o conjunto das temáticas selecionadas, das atividades desenvolvidas e das pessoas convidadas, é possível percebermos que ela se propõe a promover o ensino de conceitos do campo da Patologia e da Saúde e, em dados momentos, estabelecer relações com a escola. O primeiro objetivo ficaria a cargo da professora e o segundo é divido entre os planejamentos dos licenciandos sobre aulas a serem lecionadas em escolas e os depoimentos dos entrevistados.

CAPÍTULO IV – INVESTIGANDO AS RELAÇÕES TEORIA-PRÁTICA NAS

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