• Nenhum resultado encontrado

Projeto Expressões Artísticas: abordagens educativas na Escola Ruy de Lima Maltez (turma do 2º ano)

Nossa abordagem consiste em promover a interação da alfabetização e do letramento dos educandos através da arte-educação, de modo a utilizar a oralidade, já que é a partir dela que a criança, no processo de alfabetização, adquire consciência fonológica, além de outros aspectos, como a conscientização dos sons constituintes das palavras durante o aprendizado da leitura e da soletração. A atuação do educador visa incentivar o aperfeiçoamento dessa oralidade existente para que assim a criança a utilize como apoio para a sua ampliação, que servirá de alicerce no processo da escrita.

Intercalando a confecção do cenário com os ensaios da peça, o produto final do nosso projeto foi a encenação da adaptaçao da fábula de La Fontaine A cigarra e a formiga, na qual os alunos tiveram a oportunidade de se caracterizar e interpretar os animais com o auxílio de máscaras e adereços, confeccionados por eles, a partir de materias de sucata. A participação dos pais na plateia, tanto quanto a comunidade escolar, provocou certa timidez nos alunos, mas não o bastante para ofuscar o seu interesse e animação.

Embora seja comum ao teatro na educação infantil se utilizar de textos já prontos, no processo de alfabetização e letramento, fica rica e mais interessante a utilização desses textos como base para uma nova releitura, esta, sendo realizada pelos educandos. Essa metodologia propicia a interação do cotidiano vivido por eles com novas informações, possibilitando à criança a recriação e a criação dos personagens que farão parte da história, a partir da sua compreensão do mundo.

O objetivo do nosso projeto foi trazer o lúdico para o processo de alfabetização e letra- mento, bem como uma forma de traduzir, através do diálogo inicial construído pelos alunos conosco, o desejo de se trabalhar com um tema que não lhes pareça estranho, contemplando aspectos que sejam concretos para a criança, tais como a grande familiaridade por parte dos educandos com o universo animal e como esse conhecimento se diferenciava de um aluno para outro, citando casos especiais, como o aluno G, que trouxe o exemplo do escorpião, como sendo um animal que ele achava interessante, distinguindo-se dos demais alunos, que, em sua maioria, só falavam de animais domésticos e de grande porte. Outro ponto curioso foi

quando a aluna E (uma das alunas que menos falava na classe), disse que gostaria de ser uma coelhinha, associando esse animal ao gênero feminino. Já com o aluno L, que habitualmente não conseguia se concentrar nas atividades, percebemos bastante interesse de sua parte ao mostrar-se atento a tudo o que se passava na aula, fato que nos trouxe muito contentamento. Com foco na alfabetização, solicitamos aos educandos a produção de um texto, contendo palavras orientadoras, visando materializar o conhecimento sobre o tema dos animais, tra- balhado na roda dialógica. As palavras que direcionaram essa produção de texto foram: “Eu” (nome do aluno), “gostaria de ser” (nome de um animal) “por que” (características que eles associavam e admiravam naquele animal citado). Além disso, solicitamos que ilustrassem o texto escrito (metodologia aplicada para envolver todos na atividade, já que alguns ainda não dominavam a escrita), eliminando assim qualquer possibilidade de exclusão.

Estimulando a compreensão e a construção da escrita e da leitura, que são os focos cen- trais do processo de alfabetização, em se tratando da realidade da escola pública, supõe-se que este primeiro contato com a arte sensorial aconteça somente dentro do espaço escolar, depois da passagem pela pré-escola, pois é bem provável que, sem ser dessa forma, essas crianças passem uma vida inteira sem ter contatos sensoriais desse tipo. Sabemos o quanto a criança de baixa renda carece de tipos variados de lazer e, incluir no currículo essa disciplina diversificada, seria uma oportunidade de crescimento criativo de seu intelecto.

Pincelando também a conscientização ambiental, empregamos materiais reutilizáveis na prática pedagógica da aprendizagem cidadã, com a técnica das rodas dialógicas, cujo tema foi o respeito e os cuidados com os animais. Neste artigo, queremos, de alguma forma, contribuir em especial com aqueles educadores que esperam estimular a valorização do meio ambiente, partindo do próprio processo ambiental que seus educandos vivenciam, cooperando assim para o aperfeiçoamento de novas atitudes.

O meio ambiente foi o tema norteador em um dos projetos realizados na Escola Ruy de Lima Maltez, e por já estar fazendo parte das atividades realizadas pelos alunos, entendemos que infelizmente as questões acerca da ecologia e do meio ambiente se tornaram assunto urgente no mundo contemporâneo, necessitando ser debatidas profundamente e ensinados novos modos de relação com o ambiente, sobretudo junto às crianças, para que elas decidam

por si mesmas, como viver e atuar em nosso planeta, espera-se que de forma mais sensível e crítica. Por isso, o trabalho lúdico envolvendo a natureza baseou o nosso objeto de pesquisa, pois se entendeu que a linguagem expressiva se instrumentaliza a partir do uso da língua para transmitir sentimentos e posturas e, enfim, criar nas próprias crianças uma mensagem de respeito ao meio ambiente.

Por se tratar de um tema abrangente e na tentativa de melhor utilizá-lo, fez-se um recorte focando as atividades no subtema animais e suas respectivas onomatopeias. Por perceber, na grafia desses sons, que se diferenciam por não obedecerem aos padrões formais da linguagem oral utilizada por eles, servindo como fonte rica de novos conhecimentos fonológicos e novas formas de explorar e conhecer novos sons graficamente e assim contribuir para a assimilação da relação fônica (conceito: s. f. uma forma de ensinar leitura e soletração que enfatiza as relações símbolo-som usadas especialmente na instrução inicial). As crianças e/ou sujeitos envolvidos no processo da aquisição da linguagem escrita, ao perceberem que a linguagem dos animais pode ser grafada, têm a percepção que lhes possibilita ousar a produzir não só essa grafia, mas também outras do seu cotidiano.

Inicialmente, nas rodas dialógicas, buscamos conhecer, sondar e socializar os conheci- mentos prévios das crianças sobre o tema. Em vários aspectos, o objetivo dessa atividade foi ter os primeiros contatos com as crianças, seguindo um diagnóstico informal, onde as orien- tamos para a organização de ideias, respeitando a vez do outro. Nessa atividade, detectamos a familiarização das crianças com os animais, quando começaram a discernir atributos, tais como cor, alimentação, modo de locomoção, classificação e suas preferências, assim como ampliamos os conhecimentos já adquiridos, com novas informações acerca dos cuidados que se deve ter ao entrar em contato com determinados animais, e quais animais podem ser de estimação e domesticados. Nessa perspectiva, acreditamos ter contribuído para a ampliação dos conhecimentos sobre a diversidade do reino animal, salientado que é necessário aprender a observar, a respeitar e amar os animais. Através de debates propiciados nas rodas dialógicas, pudemos também observar os aspectos da oralidade dos alunos.

Para nossa satisfação, o assunto foi muito bem recebido, propiciando um diálogo animado em que até os mais tímidos participaram de forma entusiasmada, direcionando a construção

dos próximos objetivos do projeto. Nessa atividade diagnóstica, pudemos perceber a capa- cidade de se favorecer o processo de aprendizagem através da utilização da mensagem de autoria infantil, em que a criança, na fase da alfabetização, executa por ela mesma, se propõe a transmitir informação oral a terceiros, segundo o Dicionário de alfabetização, organizado por Theodore L. Harris e Ricard E. Hodges (1999).

Foram observados aspectos como relações interpessoais, sendo possível realizar ativida- des incluindo alunos que a princípio se recusavam a trabalhar juntos, eram inibidos ou sem interesse nas atividades.

Figura 2 - Atividades no 2º ano

Fonte: Elaboração própria. Projeto PIBID - Pedagogia.

Foi gratificante perceber o sucesso dessa atividade que mostrou como a roda dialógica é uma excelente ferramenta de apresentação de conteúdos, por que foi através dela que boa parte do trabalho foi construído e executado pela própria criança naquele momento. Outra grande surpresa foi a participação entusiasmada de todos, com o processo formado por um conjunto de atividades, que ressaltamos especificamente a oral, a escrita e a pictórica. O ca- pricho que os alunos demonstraram em seus desenhos – colocando desde árvores até o Sol,

como também carros e aviões, e as cores utilizadas por eles – demonstrou como estavam confiantes e autônomos em realizar a atividade, o que ressalta o envolvimento de todos.

No encontro seguinte, socializamos os textos produzidos, como forma de estimular e valorizar o trabalho deles. Em seguida, levamos para a sala de aula um conjunto de cartões confeccionados com papel duplex, de cores variadas, contendo várias imagens, nomes e a grafia do som produzido pelo animal, para que os alunos fizessem a associação, provocando a compreensão da relação grafema-fonema, de acordo com os sons produzidos pelos animais, dentro de uma perspectiva lúdica. A proposta da nossa atividade seria que as crianças fizessem a correspondência entre a figura do animal – em um cartão, com o nome da respectiva figura desse animal – escrito em outro cartão e o som característico produzido por este animal – escrito num terceiro cartão. Todos os cartões deveriam ser organizados de forma horizontal, em um pedaço de papel metro, seguindo os seguintes critérios: imagem, nome e som.

Percebemos, nesta atividade, diversas situações nas quais os alunos usaram diferentes estratégias para realizar a correspondência. As que mais nos chamaram a atenção foram as seguintes: separavam imagem, som e nome, para só depois contar, verificando assim, se a quantidade de cartões que formavam os conjuntos estava correta (três ao todo), em seguida, relacionavam ao que haviam colocado no papel metro. Outra estratégia cognitiva empregada foi associar o nome do animal com a primeira letra dele (ou seja, para o nome pato, procu- ravam a letra “P”). Como a atividade foi realizada em grupo, percebemos que o aluno do grupo que dominava mais a leitura ficava responsável pelo nome do animal, ficando para os outros as atividade de selecionar a imagem correspondente e colar no papel metro.

Ressaltamos que tínhamos preferência em trabalhar as atividades com pequenos grupos de alunos, pois proporcionam trocas de experiências entre eles, levando-os a compartilhar saberes e a levantar questões e respostas. Além do mais, essa metodologia permite trabalhar com as diferenças, pois, através do sorteio para a formação das equipes, conseguimos fazer com que aqueles alunos que se negavam a realizar as atividades participassem ativamente da mesma, em grupo. E os alunos mais introspectivos, tiveram participação significativa através do diálogo com os colegas, conseguindo resolver alguns impasses como, por exemplo, trocar o nome do animal sorteado, ampliando dessa forma as relações interpessoais no ambiente

escolar. Outra possibilidade encontrada foi a promoção da aceitação do próprio nome por parte de alguns alunos envolvidos, já que estes preferiam ser chamados por seus apelidos. A valorização do nome chegou como ferramenta para diferenciar um ser entre seus comuns, utilizando argumentos, tais como o cachorro tem muitos nomes, mas o cachorro de fulano se chama Pitoco, demonstrando dessa forma como o nome é importante para os indivíduos, quer sejam animais ou não e todas as coisas em geral, para que estas tenham diferenciações e sejam valorizadas em suas diferenças.

Elogiar sempre as atitudes positivas dos alunos e suas assertivas foi uma estratégia que usamos para contribuir de forma positiva na elevação da autoestima, propiciando mais avan- ço na construção do seu conhecimento. A socialização dessa atividade foi realizada após o término da mesma.

Dando continuidade ao processo, e nos concentrando no trabalho de alfabetização e letramento, fizemos, nesse terceiro momento, a inserção de uma fábula, como ferramenta de comunicação escrita e oral. Sendo um gênero textual diferenciado e rico em ludicidade, ao mesmo tempo em que aperfeiçoa a capacidade de reflexão sistemática sobre a língua e a linguagem, possui ainda uma característica muito interessante, já que as personagens são geralmente animais, forças da natureza ou objetos que apresentam características humanas, tais como a fala, os costumes etc., permitindo, dessa forma, uma maior assimilação do enredo. Lemos para os alunos a fábula A cigarra e a formiga, de La Fontaine, aplicando em se- guida uma atividade de estudo dirigido, permitindo que eles intepretassem e construíssem um texto adaptado com as informações já compreendidas que seriam, então, a base para o enredo de uma peça encenada por eles, sob nossa orientação. Após a construção do texto, foi realizado um sorteio para determinar quem interpretaria cada personagem na peça. Foi combinado com os alunos que todos usariam máscaras e que no texto haveria o uso das onomatopeias, como forma de comunicação, com exceção dos personagens principais da fábula (a formiga e a cigarra). A preferência por algumas personagens foi unânime, como, por exemplo, o leão. Ao serem indagados sobre o por quê desse interesse, a resposta dada era: – Porque o leão é o rei da floresta e é o mais forte! – característica muito valorizada pelos alunos. Como fizemos um acordo anterior, foi acertada a troca de personagens entre

eles, permitindo assim que todos apresentassem as personagens que mais lhes agradavam. Foi fácil sentir a empolgação entre todos, por se tratar de uma atividade que se diferenciava do cotidiano vivenciado pelos alunos no ambiente escolar. Percebemos um maior interesse na atividade referente à construção coletiva do texto, realizado em grupo, em relação à in- dividual, que foi o estudo dirigido da fábula e a valorização dos alunos sobre a orientação que demos a respeito da importância de permitir e escutar a voz do outro. A lição moral foi entedida pelos envolvidos no processo.

Figura 3 - Construção do cenário

Fonte: Elaboração própria. Projeto PIBID - Pedagogia.

Nos encontros seguintes, a atividade central foi a confecção das máscaras e do cenário. Para as máscaras, utilizamos bolas de soprar, jornal e cola, além de gravuras de animais que seriam personagens da peça. Cada aluno ficou responsável em enfeitar sua máscara. A utilização do jornal foi a forma encontrada para trabalhar com as crianças a abordagem da preservação do meio ambiente. Para nós, o trabalho com a reutilização de materiais tem um grande significado, pois se constitui fonte de matéria-prima riquíssima e inesgotável, mas que, infelizmente, nem sempre é aproveitada. Nessa perspectiva, procuramos passar para os alunos que a reutilização de materiais vistos como lixo pode e deve ser fonte de renda, e para isso é preciso que nos reeduquemos no destino que damos ao nosso lixo, procurando acondicioná-lo de forma seletiva. Dentro desse contexto, da reutilização de materiais, ensinamos os alunos a construírem todo o cenário e adereços utilizados na peça (o violão, uma folha de árvore

e a casinha da formiga foram feitos de papelão; a coroa da formiga e as flores foram feitas de tampa e de garrafa pet; as frutas, matinho e outros adereços foram confeccionados com revistas, jornal e outros tipos de papel, além de tintas, cola etc.), demonstrando assim que há a possibilidade de se reaproveitar todo tipo de material, ajudando assim a preservar o meio ambiente. Como afirma Costa e outros (2006 apud VyGOTSKy, 2003, p. 88), “o melhor são as obras compostas pelas crianças [...] pois assim elas compreendem melhor as obras e não ficam só decorando frases e palavras difíceis”.

Proposta de conclusão

Foi com muita alegria que visualizamos o modo como se desenvolveu todo o processo, com a participação ativa das crianças, em todas as etapas. Percebemos o quanto é engrande- cedor trabalhar em parceria com educandos e os demais agentes da educação, pois o nosso desempenho sempre objetivou mudar a visão, que ainda persiste, da criança como agente passivo da construção de conhecimento.

O entusiasmo foi parceiro constante de toda a comunidade escolar. Desse modo, a compreensão das crianças foi satisfatória, pois conseguiu mobilizá-las acerca da criação da adaptação de histórias já conhecidas no cenário dos adultos. O resultado desse produto foi além da peça, alcançando aspectos intrapessoais, interpessoais, sociais, políticos e o aperfei- çoamento da capacidade de se sentir autônomo na sua oralidade em sala de aula.

Percebemos, ao longo do período de validação do projeto PIBID – Pedagogia, resultados significativos do trabalho desenvolvido pelas bolsistas pesquisadoras, quando analisamos todo o processo de desenvolvimento do acesso ao conhecimento das crianças com vistas ao alcance do êxito na sua prática escolar. A impressão referente à prática pedagógica também foi positiva, já que, por se tratar de bolsistas pesquisadoras e futuras professoras alfabetiza- doras, pôde-se desenvolver uma melhor visão sobre o processo de alfabetização e aprimorar nossa prática alfabetizadora ao longo desses dois anos.

Referências

ANDRÉ, Marli E. D. A. A pesquisa no cotidiano escolar. In: FAZENDA, Ivani (Org.). Metodologia da

pesquisa educacional. 11. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: artes. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, 1997a.

______. Parâmetros Curriculares Nacionais: 1ª à 4ª série. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, 1997b.

______. Parâmetros Curriculares Nacionais: meio ambiente. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, 1997c.

HARRIS, Theodore L.; HODGES, Richard E. Dicionário de alfabetização. Tradução de Beatriz Viégas- Faria. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

LEMLE, Miriam. Guia teórico do alfabetizador. 17. ed. São Paulo: Ática, 2007. LOPES, Vanessa Gomes. Linguagem do corpo e movimento. Curitiba: Fael, 2006.

MOREIRA, Paulo Roberto. Psicologia da educação: interação e identidade. 2. ed. São Paulo: FTD, 1996.

OLIVEIRA, Denise Soares. Oficinas de recreio. São Paulo: Paulinas, 2003.

PALANGANA, Isilda Campaner. Desenvolvimento e aprendizagem em Piaget e Vygotsky: a relevância social. 3. ed. São Paulo: Summus, 2001.

RIZZO, Gilda. Jogos inteligentes. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.

SANTOS, R. S. A aquisição da linguagem. In: FIORIN, José Luiz (Org.). Introdução à linguística. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2010.

VIGOTSKy, L. S. La imaginación y el arte en la infância. Madri: Akal. 2003.

ZANIN, Vilma Pereira Martins. “Arte e Educação: um encontro possível”. Revista Científica da Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente n.1, v.2, p. 57 – 66, jan./jun. 2004. Disponível em: <http://www.arteducacao.pro.br/downloads/arte-e-educacao.pdf > Acesso em 28 de Jul. 2011.

CAPÍTULO 3

Práticas alfabetizadoras na Escola