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Rendimentos normais Renda fundiária – valor atribuível à utilização produtiva da terra

Manuel I. S Pinheiro define o cadastro predial geométrico do seguinte modo:

O PATRIMÓNIO E OS IMPOSTOS

B. Prédios rústicos:

3. Rendimentos normais Renda fundiária – valor atribuível à utilização produtiva da terra

3.1.1.2.6. A Constituição de 1976

À data da entrada em vigor da CRP, em 25 de Abril de 1976, o sistema fiscal português, no que respeita à tributação direta, mantinha a estrutura da reforma da década anterior, com a vigência de um conjunto de impostos parcelares e de um imposto complementar sobre o rendimento global, de taxas progressivas.

Contudo, na prática, a manutenção daquele sistema perdera a lógica da tributação parcelar dos rendimentos e o imposto complementar sobrecarregava de forma excessiva as categorias de rendimentos mais elevados, o que, aliado a outras ineficiências e à própria conjuntura económica, dera origem, segundo Menezes Leitão, a “… uma profunda erosão da

base tributável insuficiente para assegurar as crescentes necessidades financeiras do Estado.”247

.

Todavia, o texto constitucional de 1976248 impôs a implementação de outras soluções para o sistema. Conforme se verá seguidamente, a CRP veio estabelecer em normas programáticas o enquadramento de um novo sistema fiscal, estabelecendo as suas finalidades, definindo a sua própria estrutura, a par do estabelecimento de diretrizes específicas para os impostos.

Assim, no n.º 1 do art.º 106.º, epigrafado “Sistema Fiscal”, a CRP de 1976 determinava as finalidades, fiscal e extrafiscal, a que o sistema deveria responder, prescrevendo do seguinte modo:

“ 1. O sistema fiscal será estruturado por lei, com vista a repartição igualitária da riqueza e dos rendimentos e à satisfação das necessidades financeiras do Estado.”

246 Valor presumido da renda da terra, rendimento médio presumido que correspondia ao saldo de uma

conta de cultura, e determinado quer por avaliação cadastral quer por avaliação indireta, ou seja, não se tributava o rendimento efetivo (art.os 2.º, 36.º e 37, 128 e 145.º CCPIIA).

247 MENEZES LEITÃO, Luís M. T. - cit. 221, p. 23.

248 TEXTO ORIGINÁRIO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA aprovado em 2 de

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Por conseguinte, o sistema fiscal deveria não só satisfazer as necessidades financeiras do Estado, cobrindo as despesas públicas (objetivo fiscal), mas também repartir os rendimentos e a riqueza entre os cidadãos de forma igualitária (objetivo extrafiscal – função redistributiva)249.

O art.º 107.º, intitulado “Impostos”, estipulou a estrutura do sistema fiscal, prescrevendo o seguinte:

“1. O imposto sobre o rendimento pessoal visará a diminuição das desigualdades, será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar, e tenderá a limitar rendimentos a um máximo nacional, definido anualmente pela lei.

(Sublinhado nosso, corresponde ao texto eliminado com a Lei Constitucional n.º 1/1982)

2. A tributação das empresas incidirá fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

3. O imposto sobre sucessões e doações será progressivo, de forma a contribuir para a igualdade entre os cidadãos, e tomará em conta a transmissão por herança dos frutos do trabalho.”

(Sublinhado nosso, corresponde ao texto eliminado com a Lei Constitucional n.º 1/1982)

4. A tributação do consumo visará adaptar a estrutura do consumo às necessidades da socialização da economia, isentando-se dela os bens necessários à subsistência dos mais desfavorecidos e suas famílias e onerando-se os consumos de luxo.”

(Alterado pela Lei Constitucional n.º 1/1982250)

Desta forma, a CRP designava não só os impostos que deveriam integrar o sistema, mas também os princípios estruturantes a que os mesmos deveriam obedecer, a par das finalidades extrafiscais de cada um deles, num quadro de normas que colidiam com o sistema misto então vigente.

249 MENEZES LEITÃO, Luís M. T. - cit. 221, pp. 21-24; Para mais desenvolvimentos sobre as

finalidades do sistema fiscal consagradas na CRP de 1976, cfr. TEIXEIRA RIBEIRO; J. J. – cit. 226, pp. 97-141. Voltar-se-á a este tema, no decurso do presente trabalho.

250 Em 1982, com a primeira revisão constitucional, em 1982, o artigo 107.º da CRP sofreu alterações

nos seus n.os 1, 3 e 4 (cfr. art.º 86.º da LEI CONSTITUCIONAL n.º 1/1982, de 30 de setembro. DR, I Série. N.º 227 (1982.09.30), pp. 3135-3206). Essas alterações traduziram-se na supressão das expressões sublinhadas no texto, quanto aos n.os 1 e 3, e o n.º 4 passou a ter a seguinte redação: “4. A tri utação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo”. Refira-se que, à data da aprovação da reforma fiscal de 1988/1989, era este o texto constitucional vigente.

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Pela CRP eram assim referenciados quatro impostos: - dois impostos sobre o rendimento: rendimento pessoal, de tributação única e progressiva, e rendimento das empresas, com incidência sobre o rendimento real; - um imposto sobre sucessões e doações251, de cariz progressivo; - um imposto sobre o consumo.

3.1.1.2.7. A Reforma Fiscal de 1988-1989 – A Contribuição Autárquica

A quarta reforma do sistema fiscal nacional do século XX, implementada em 1988/1989, cerca de 12 anos após a entrada em vigor da CRP252, foi balizada pelas normas constitucionais, tendo procedido a uma transformação no sistema fiscal português, que passou de uma histórica tributação cedular do rendimento pessoal para a tributação única e progressiva do rendimento global, igualando-o aos sistemas fiscais dos países membros da então CEE e da OCDE253.

Neste sentido, foram criados os atuais impostos sobre o rendimento pessoal, quer sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS)254, quer sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC)255.

251 MENEZES LEITÃO, Luís M. T. – cit. 221, pp. 22 e 46, refere-se ao imposto sobre sucessões e

doações, referido pela CRP de 1976, como sendo um imposto sobre o património e, implicitamente, assim o consideram GOMES CANOTILHO, J. J. e VITAL MOREIRA – Constituição da República Portuguesa Anotada – Art.os 1.º a 107.º, 4ª Edição revista, 2007, vol. 1, p. 1101. Para TEIXEIRA RIBEIRO, J. J. – cit. 226, p. 115, tratava-se de um imposto sobre o rendimento do herdeiro, legatário ou donatário, uma vez que as aquisições de bens a título gratuito (herança, legado ou doação) representam acréscimos patrimoniais para tais sujeitos. A pp. 138 da op. cit. de TEIXEIRA RIBEIRO, o autor afirma mesmo que a CRP de 1976 não instituiu um imposto sobre o património, tendo deixado a questão ao arbítrio do legislador ordinário.

252 À implementação da reforma precedeu a instituição da Comissão da Reforma Fiscal, pelo DL n.º

232/84, de 17 de julho, remodelado pelo DL n.º 345/87, de 29 de outubro, presidida pelo Prof. Doutor Paulo Pitta e Cunha, a qual foi incumbida de estudar a reestruturação do sistema tributário e de apresentar propostas de medidas para esse fim. Após a conclusão dos respetivos trabalhos, foi publicada a LEI n.º 106/88, de 17 de setembro, da Assembleia da República, que concedeu ao Governo a autorização legislativa para aprovação da Reforma Fiscal, publicada no DR, I Série, N.º 216 (17.09.1988), pp. 3820-3826.

É entendimento doutrinário que, em rigor, a reforma fiscal foi iniciada em 1984, com a publicação do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) e introdução do respetivo imposto (IVA), pelo DL n.º 394/B/84 de 26 de dezembro e que entrou em vigor em 1986. Esta alteração da tributação indireta em Portugal, não foi efetuada por impositivo constitucional, mas por exigência da então CEE, na sequência do pedido de adesão do país àquela Comunidade (GOMES CANOTILHO, J.J. e VITAL MOREIRA – cit. 251, p. 1099; MENEZES LEITÃO, Luís M. T. - cit. 221, p. 24).

253 Para uma visão crítica da aprovação da reforma fiscal de 1988/1989, cfr. MEDINA CARREIRA,

Henrique – Uma Reforma Fiscal Falhada?, 1990.

254 CIRS – cit. 136. O CIRS entrou em vigor em 01 de janeiro de 1989 e com ele foram abolidos o

imposto profissional, o imposto de capitais, a contribuição industrial, a contribuição predial, o imposto sobre a indústria agrícola, o imposto complementar, o imposto de mais-valias e o imposto de selo constante da verba 134 da TG do IS, até então em vigor (cfr. art.os 1.º, 2.º e 3.º do citado DL 442-A/88, de 30 de novembro). O CIRS foi

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No entanto, a introdução do novo sistema de tributação unitária, através do englobamento do conjunto dos rendimentos, suscitou questões quanto aos rendimentos prediais.

Relembra-se que, na vigência da CP, tal como concebida pela reforma de 1963, esse imposto incidia sobre o rendimento real e imputado dos prédios urbanos e sobre a renda fundiária dos prédios rústicos, cuja receita se destinava na totalidade às autarquias, desde 1979256.

Se o IRS e o IRC se restringiriam aos rendimentos reais (aos “realmente auferidos”), excluindo-se os rendimentos imputados, tais como os resultantes da utilização de bens que pertencem ao próprio titular, ao nível dos rendimentos prediais apenas poderiam ser considerados os resultantes de situações de arrendamento ou similares (casos de cessões de estabelecimentos comerciais ou industriais).

Desta forma, resultariam realidades (prédios não arrendados) que ficariam por tributar e, sobretudo, os municípios ver-se-iam privados de uma importante fonte de receita.

Na verdade, com a reforma fiscal, as autarquias deixariam de receber não só as receitas cobradas em sede de CP, que seria eliminada, mas também do imposto de mais- valias, que seria igualmente abolido, cujos rendimentos passavam a ser tributados em sede de IRS e IRC (impostos estaduais).

Perante este cenário, foi criada a contribuição autárquica (CA), pelo Decreto-Lei n.º 442C/88, de 30 de novembro, diploma que aprovou o Código da Contribuição Autárquica (CCA)257, de cujo preâmbulo se retira que, aquela contribuição se tratava de um imposto

republicado em anexo à LEI n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, publicada no DR, 2.º Suplemento, I Série. N.º 252 (31.12.2014), pp. 6546-(339) - 6546-(418).

255

O Código do IRC (CIRC) foi aprovado pelo DL n.º 442-B/88, de 30 de novembro, do Governo, publicado no DR, 1.º Suplemento, I Série. N.º 277 (30.11.1988), pp. 4754-(38) – 4754-(71). O CIRC entrou em vigor a 01 de janeiro de 1989 e com ele foram abolidos a contribuição industrial, o imposto sobre a indústria agrícola, o imposto de mais-valias, a contribuição predial, o imposto de capitais, o imposto complementar e o imposto do selo constante da verba 134 da TG do IS. O IRC substituiu o imposto sobre o rendimento do petróleo (cfr. art.os 3.º e 4.º do citado DL n.º 442-B/88, de 30 de novembro).

256 A LEI n.º 1/79, de 2 de janeiro, LEI DAS FINANÇAS LOCAIS, publicada na DR, I Série. N.º 1

(02.01.1979), pp. 1-7, revogou a parte do Código Administrativo que regulava as finanças locais e, no seu art.º 5, epigrafado “Participação dos municípios nas receitas fiscais”, constituiu como receita fiscal a arrecadar pelos municípios a totalidade do produto da cobrança da CP rústica e urbana, entre outros impostos. Nesse preceito, foi ainda estipulado que, também constituiria receita fiscal dos municípios uma participação no produto global do imposto sobre sucessões e doações e do imposto de sisa, entre outros tributos.

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criado como complemento à instituição do IRS e do IRC e como fonte de rendimento fiscal dos municípios portugueses258.

Assim, com a CA propunha-se a tributação não de rendimentos prediais, como acontecia com o antecedente imposto da CP, mas dos valores relativos aos prédios (não arrendados) em si mesmos (valor patrimonial), que ficavam excluídos da matéria coletável dos impostos de rendimento.

Contudo, esta solução discriminaria de forma negativa os prédios arrendados dos não arrendados, razão pela qual se decidiu que a CA incidiria sobre todos os prédios, permitindo- se que, quanto aos primeiros, fosse deduzida a coleta deste novo imposto à coleta dos impostos sobre o rendimento, a fim de atenuar a dupla tributação259.

Deste modo, com a CA e os novos impostos sobre o rendimento, o sistema fiscal português passou a tributar não só os rendimentos prediais, mas também o património e, neste sentido, a CA constituiu-se como um imposto sobre o património, de caráter proporcional, em que o valor tributável de um prédio correspondia ao seu valor patrimonial260.

Esse valor seria determinado nos termos do Código das Avaliações, conforme estabelecido no n.º 1 do art.º 7.º do CCA, logo que entrasse em vigor.

Encontramos no preâmbulo do CCA, o fundamento para a tributação patrimonial, em sede de CA, sendo aquele a “lógica do princípio do enefício”, ou seja, o pagamento do imposto por parte dos contribuintes correspondia, nas palavras do legislador, à “…

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Ponto 1 do preâmbulo do CCA - cit. 118, pp. 4754-(75).

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Como referido no ponto 2 do preâmbulo do CCA, o IRS e o IRC incidiriam sobre os rendimentos monetários obtidos com o arrendamento dos prédios e não sobre o seu valor patrimonial (cfr. CCA – cit. 118, p. 4754-(75)). Sobre esta matéria transcreve-se o ponto 11 do preâmbulo do CIRS, na sua redação original: “No domínio dos rendimentos prediais (categoria F), incluem-se na base de incidência apenas os rendimentos efetivamente percebidos dos prédios arrendados, tanto urbanos como rústicos, e não já, como acontecia no sistema da contribuição predial, o valor locativo ou a renda fundiária dos prédios não arrendados, pois se visa tributar apenas os rendimentos realmente auferidos. Tributam-se ainda os rendimentos decorrentes da cessão de exploração de estabelecimentos comerciais ou industriais. Concomitantemente, é criada uma contribuição autárquica sobre o valor patrimonial dos prédios rústicos e urbanos devida pelos seus proprietários, sendo a coleta desta deduzida à coleta do IRS, na parte proporcional aos rendimentos englobados de prédios e até ao montante desta. Para além dessa dedução, também se prevê nesta categoria de rendimentos a dedução de todas as despesas referentes aos prédios e não apenas os encargos presumidos previstos no atual regime da contribuição predial.” (cfr. DL n.º 442-A/88, de 30 de novembro – cit. 136, p. 4754-(7)). Esta matéria encontrava-se regulada no art.º 9.º do CIRS (cfr. DL n.º 442-A/88, de 30 de novembro – cit. 136, p. 4754-(7)) e, na versão atual do CIRS, no art.º 8.º.

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92 contrapartida dos benefícios que os proprietários recebem com obras e serviços que a coletividade l es proporciona.”261

.

Também por essa razão, entendeu o legislador que se justificava que aquele imposto constituísse uma fonte de receita das autarquias, mais concretamente, dos municípios, considerando serem estas as entidades que proporcionam grande parte das atividades que dão apoio e valorizam os prédios262.

Neste sentido, à semelhança de impostos vigentes noutros ordenamentos jurídicos, a contribuição autárquica foi configurada como um imposto patrimonial e municipal, como aliás decorria logo do art.º 1.º do CCA, o qual estabelecia que, a incidência do tributo seria o valor tributável dos prédios situados no território de cada município.

O imposto era devido pelo proprietário ou usufrutuário do prédio, à data de 31 de dezembro do ano a que aquele respeitasse (Art.º 8.º, n.º 1 e 2), numa opção do legislador em linha com a adotada para a CP e consonante com a natureza patrimonial do tributo263.

Para além dos benefícios que vieram a ser concedidos no âmbito do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), o CCA previa isenções objetivas, para prédios nas seguintes condições:

1. Os classificados como monumentos nacionais ou imóveis de interesse