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3.BREVE HISTÓRIA DO ENSINO ARTÍSTICO EM PORTUGAL

3.1. DO SÉCULO XVI AO SÉCULO

Que condicionantes determinaram a evolução da educação artística em Portugal e que explicações temos para esse crescente poder? Que meios se utilizaram e de que modo foi gradualmente sistematizado o ensino artístico em Portugal? Que consequências resultaram do ensino das artes no século XVIII para a pedagogia de forma geral e ao nível das ideias? Que problemas se colocaram no ensino artístico ao longo do século XIX e XX com as novas realidades culturais, económicas e políticas do país? De que forma Portugal conseguiu apresentar novas propostas pedagógicas para artistas, operários e público em geral num país que se queria mais culto e civilizado? Estas são algumas das questões que nortearam o nosso estudo neste capítulo e que se apresentaram como desafios numa interrogação e inquietação constante de olharmos o momento presente da educação artística como herdeiro desse passado agitado.

157 A evolução do ensino das artes plásticas em Portugal estruturou-se em três fases: a conventual, a oficinal e a do ensino público. No âmbito do interesse da nossa tese, focalizámos a nossa atenção nas últimas duas. Ponderámos ser fundamental esta análise histórica e evolucionista para entendermos o desenvolvimento da educação artística em Portugal, no sentido de compreender os avanços e recuos do ensino público e dos seus cruzamentos com o privado, à mercê de fases mais prósperas, outras menos desenvolvidas e dos fluxos e refluxos de artistas portugueses e estrangeiros que criam novas necessidades, levando ao aparecimento de escolas e movimentos artísticos. Seria difícil isolar a evolução da educação artística do restante processo da história da educação portuguesa e como tal fomos cruzando essas duas vertentes de modo a conseguir uma leitura da realidade em estudo mais esclarecedora e clarividente.

A partir do século XVI, o ensino artístico começa a deixar de estar limitado à transmissão oficinal de saberes e técnicas, como acontecera até ali, multiplicam-se, por isso, os tratados teóricos e surgem as academias, onde à transmissão das técnicas se acrescentava o debate teórico. As academias surgiram para ultrapassar o sistema corporativo e de status artesanal das guildas medievais de artistas, e tinham como desígnio fundamental a ideia de que a arte pode ser ensinada, através da sua sistematização num corpo de teoria e de técnica integralmente comunicável, minimizando a importância da criatividade como uma contribuição original e individual. Valorizavam antes a emulação de mestres consagrados, modernos e antigos, e adoptavam conceitos formulados colectivamente que possuíam, além de um carácter estético, uma origem e propósito éticos (Knabe, 2000: 23-34).

As academias foram importantes para a ascensão do status profissional dos artistas, afastando-os dos artesãos e aproximando-os dos intelectuais. Também tiveram um papel fundamental na organização de todo o sistema de arte enquanto funcionaram, pois além do ensino abarcaram a ideologia cultural, o gosto, a crítica, o mercado e as vias de apresentação e difusão da produção artística, e estimularam a formação de colecções didácticas que acabaram por ser a origem de muitos museus de arte. Essa ampla influência deveu-se principalmente à sua estreita união com o poder constituído dos Estados, tendo sido condutor da divulgação e consagração de ideários não apenas artísticos, mas também políticos e sociais (Kleiner, 2009).

158 Maria Luísa Malato (2009) tem uma perspectiva crítica relativamente à definição do conceito de Academia: ―Quantas academias poderiam efectivamente usar desse nome? ‖ Até que ponto se pode (…) dividir entre as suas funções especulativas e pragmáticas? Como pode procurar simultaneamente o conhecimento (ilimitado) e o controle (limitação desse conhecimento)? Mas se a academia tem somente algumas destas características, como distinguir então uma academia de uma universidade, de uma tertúlia, de um centro de investigação, de uma corporação profissional, ou de um comité de efemérides? Trata-se de uma escola ou de uma assembleia de interessados? Dedica-se a trabalhos práticos ou à sua teorização especulativa? Tem funções estatutárias e reuniões regulares ou é espontânea e esporádica?‖ Efectivamente, ao longo dos séculos, as academias tiveram funções diversas e nem sempre de forma regular, sendo distinto o contexto do seu funcionamento, de país para país.

A primeira academia moderna seria a Accademia Platonica, fundada em Florença (1459 ou 1462) por Marcílio Ficino, e tendo como patrono o influente Cosme de Medicis: ―À semelhança de outros humanistas, Cosme vai construindo uma biblioteca de textos raros, muitos de Platão, consultados por Ficino (que chamará a Plethon ―o segundo Platão), Pico de la Mirandola, Landino. O exemplo frutifica. Ao longo dos séculos XV e XVII, a academia torna-se uma força interessante: sempre próxima do poder, mas cada vez mais difícil de controlar― (Malato, 2009). Mais tarde, a Academia Bandinelli, é fundada em 1530 na cidade de Roma, mas transferida para Florença em 1550. Esta Academia procurava a meditação e a reflexão artística em torno da prática do desenho. A Academia do Desenho, fundada em Florença no ano de 1563, por iniciativa de Vasari, procurou um tipo de organização do ensino artístico distinto do que funcionava nos ateliês dos artistas. No entanto, será com a criação da Academia Romana de São Lucas em 1577 que um programa de ensino artístico aliou pela primeira vez as componentes teórica e prática. A primeira teoria do desenho foi produzida no contexto desta academia, por Frederico Zucarro, que a presidiu em 1593. Em Bolonha, em 1582, funda-se a Accademia degli Incamminati, a qual adoptou o modelo da Academia do Desenho de Florença (Knabe, 2000: 23-34).

Embora o ensino tenha, de certa forma, continuado ligado à tradição humanística e literária, principiaram a surgir as primeiras tentativas de escolarização inclinada para um saber prático. Em França, as novas necessidades económ icas levaram à tentativa de

159 organizar uma educação técnica formal. São criadas academias de nível superior para o ensino das artes e do desenho, a fim de atender ao desenvolvimento técnico (Nascimento, 1994).

A Academia do Desenho de Florença e a Academia Real de Pintura e Escultura fundada em Paris no ano de 1648 alteraram substancialmente o estatuto social do artista, deixando este de ser um mero artesão 53 Apesar da maioria das academias mencionadas terem aberto sem um programa definido e com objectivos pouco claros, não deixaram, porém, de alcançar pequenas vitórias e de irem dando consistência às formas de aprendizagem. Sublinhe-se o seu forte pendor humanista com uma preocupação central, a da imitação com base na origem aristotélica onde a imitação corresponde à fiel imitação da natureza. Por outro lado, destaca-se a influência de Platão onde a ―ideia existe a priori no espírito do artista‖ (Ferreira, 2006: 26).

Em Portugal, as primeiras tentativas de formação das academias começaram a fazer-se sentir nos finais do séc. XVII e o reinado de D. João V desenvolverá a criação das primeiras academias, a mais significativa das quais, foi a Academia Real de História, criada pelo monarca em 1720, responsável por uma produção historiográfica importante. O longo reinado de D. João V ficou ainda marcado por várias outras academias fundadas em Lisboa e noutras cidades do país, incluindo a Baía e o Rio de Janeiro, abarcando Poesia, História, Filosofia, Literatura e Ciência.

Ao longo do século XVIII, sob o exemplo francês, florescem as academias reais. Em 1700 surge a Academia Real das Ciências e das Letras, em Berlim. Em 1714, a Real Academia Espanhola, autora do principal dicionário da língua castelhana. Em 1725, a Real Academia de São Petersburgo, segundo o modelo da Academia de Berlim. Em 1739, a Academia Real Sueca. Em 1752, a Real Sociedade Holandesa das Ciências. Em 1772, a Academia Imperial e Real das Ciências e Belas-Letras de Bruxelas. Em 1779, a Academia Real das Ciências de Lisboa.

O título de Academia Real certifica não só a sua estabilidade financeira, mas também uma hierarquia do saber, estabelecido pelo poder político. O Rei decide os seus estatutos,

53Em 1648, ainda durante a regência de Ana de Áustria, dá-se a fundação da Academia Real de Pintura e Escultura; em 1661, a

fundação da Academia Real de Dança. Colbert, em 1663, funda a Academia das Inscrições e Belas-Letras; em 1666, a Academia Real das Ciências; em 1669, a Academia Real de Música (mais tarde, a Ópera de Paris); em 1671, a Academia Real de Arquitectura. A Academia de Paris esteve fechada entre 1793 e 1795 e quando reabre está dividida em duas vertentes: por um lado a Escola de Belas Artes dedicada ao ensino e, por outro, a Academia das Belas-Artes, responsável pela administração política das artes. Já no século XVIII, em 1768, foi aberta a Real Academia de Londres. Esta passou a organizar exposições anuais com trabalhos dos seus alunos, marcando uma fase que, no nosso entender, inicia a problematização e reflexão acerca do trabalho dos artistas e da sua importância na sociedade. (Maria Luísa Malato, 2009).

160 aprova-os, o que lhe dá o poder de fiscalizar. A academia real permite a instituição de um estilo, a valorização de certos temas ou géneros. Próximos do poder, os artistas adquirem visibilidade. Do ponto de vista político, é preciso também salientar que a imagem agressiva e militar do aristocrata estava a mudar profundamente (Malato, 2009).

Relativamente ao ensino artístico, será apenas com os governos saídos do Liberalismo que serão reunidas as condições para surgirem as academias de Belas-Artes. Até este período, a formação artística era feita no âmbito das corporações de ofícios, através de oficinas particulares com aprendizagem passada de mestre para aprendiz, ou em obras promovidas pela Igreja e associações religiosas ou pela corte. Uma situação que levou a que a produção artística em Portugal se baseasse em modelos práticos, ajustada às necessidades que iam surgindo, sem se fundamentar em discussões teóricas, em reflexões que pensassem a Arte e as suas obras, que criassem uma filosofia de criação artística. Um ensino que formava praticantes mas sem a indispensável componente intelectual, que fosse capaz de acompanhar a produção artística com uma saudável reflexão teórica que a complementasse.

As crises políticas e económicas que assolaram o país ao longo do século XIX foram pouco favoráveis ao desenvolvimento artístico e cultural. As invasões francesas, a saída da corte para o Brasil, o domínio económico inglês e a gradual perda do Brasil levaram à desagregação do Antigo Regime, culminando com a Revolução Liberal, a implantação da monarquia constitucional e a guerra civil entre liberais e absolutistas (Pereira, 1995: 353). O país mergulhou numa instabilidade crónica que o impediu de acompanhar o desenvolvimento técnico e cultural do resto da Europa54. Logo a seguir à revolução vintista, foram apresentados vários projectos com o objectivo de agrupar num só estabelecimento o ensino artístico nacional, entre os quais acrescentam a proposta de um Ateneu de Belas- Artes, iniciativa do pintor Domingos Sequeira (1768-1837) em 1823, mas com existência efémera, devido às agitações políticas que se seguiram; e o aparecimento na Ajuda da Academia de S. Miguel, em 1829, com uma curta existência.

O Ministro do Reino, Agostinho José Freire, em 1835, (A Portaria de 18 de Fevereiro) nomeou uma comissão para elaborar os estatutos da futura Academia de Belas-Artes. A comissão terá como objectivo estudar a criação de uma academia com os fins de promover a civilização geral dos portugueses, o gosto do belo, proporcionar os meios de

54 Carta de José Cid a João Chagas in João Medina (direcção), Vol. I s/d: 205 ―…você reconhece que a sociedade está toda

cretinizada por igual. Eu também reconheço (…) Não. Jamais raiará esse sol da inteligência que você desesperadamente reclama, como um chanceler de fé perdida e sem voz (…)‖.

161 melhoramento dos ofícios e artes fabris. Os atrasos, a revolução de Setembro e a morte do ministro Agostinho José Freire levam ao adiamento das medidas que serão retomadas por Passos Manuel, pelo decreto de 25 de Outubro de 1836 com a fundação de duas Academias em Lisboa e Porto (Serrão, 1989). No ano seguinte, o seu sucessor na pasta ministerial, Passos Manuel (1801-1862), que se distinguiu precisamente por uma notável acção de reforma educativa, com a criação de novas escolas politécnicas, liceus e conservatórios, criava enfim as novas academias de Lisboa e do Porto. Mas as academias dependiam da estrutura do ensino e da preparação e mentalidade dos professores escolhidos. O ensino seria assegurado por professores disponíveis, sendo a maioria originário das obras do Palácio de Ajuda. Reuniram-se oito professores, seis ―substitutos‖ e quarenta e seis artistas com a categoria de ―agregados‖, considerado por José-Augusto França: ‖Cotejando todos os nomes que nos aparecem nas listas da Academia, com as suas responsabilidades de ensino e de produção, um só emerge da mediania, ou da mediocridade, e foi ―Mestre Fonseca‖. Não que a sua obra seja, finalmente, importante, por qualidade: retratos régios e outros, conforme modelos clássicos, composições religiosas do mesmo gosto e muitas cópias feitas em Itália, segundo a melhor recomendação académica e com particular preferência por Rafael‖ (França, 2004: 84).

As academias foram instaladas, tal como aconteceu com inúmeras outras instituições, em edifícios antigos religiosos que ficaram disponíveis a partir da extinção das ordens religiosas nos anos de 1833 e 1834. Na Academia de Lisboa55 foi usado o convento de S. Francisco da Cidade, ao Chiado, no Porto o convento de Santo António, ambos sem as condições ideais, de que resultaram várias obras de adaptação, projectos para novas instalações que nunca foram realizados, e algumas ampliações, remédios sempre parciais (Lisboa, 2007:350- 359) que, ironicamente, acabaram por resultar em mais despesas bastante avultadas do que se tivessem construído novos edifícios. A exiguidade das verbas orçamentais, a falta de materiais, a redução de cursos e de artistas agregados seriam algumas das dificuldades pelas quais passará a Academia. Havia em média trezentos alunos por ano, sendo metade dos cursos nocturnos para ―artistas fabris‖. Refere José-Augusto França: ‖o desenho da História e o da Arquitectura tinham maior frequência,

55 A academia lisboeta teve de dividir o espaço do convento com a Biblioteca e com a Administração Geral de Lisboa; mais tarde, em

1846, teve de ceder várias dependências ao Batalhão de Voluntários do Comércio, ocupação que durou, debaixo de repetidas queixas, até 1852. Em 1875, foi a vez do Governo Civil de Lisboa se instalar também no velho convento.

162 que para a pintura de História e para a escultura faltavam vocações ou capacidades, e mais ainda para a paisagem, mal servida em cópia de estampas pelos mestres de outros tempos – com efeito de revolta de alunos logo em 1844, a pedirem trabalho do natural, com modelos vivos ou mortos e paisagens do campo‖ (França, 2004:87).

Os deficientes recursos económicos levaram a que a inspiração estética e os modelos de ensino recorressem a modelos setecentistas franceses e romanos de grande restrição. Apesar de pouco conhecerem os movimentos artísticos que já se faziam notar na Europa, regista-se lentamente uma certa revolta por parte dos jovens artistas portugueses que começa por ser temática rejeitando a iconografia clássica da pintura de história e a repetição da mitologia clássica. Lentamente, o único espaço de trabalho do artista que era o ateliê passa a ser partilhado pela prática ao ar livre ainda que fosse para os esboços iniciais, sendo o trabalho final terminado no ateliê (Silva, 1995: 332). As críticas eram inúmeras, pedindo-se uma reforma do ensino que vigorava considerado rotineiro, com estudos errados e incompletos. A Academia passa a designar-se Academia Real de Belas- Artes em 1862. Em 1871 dá-se a sua primeira (e tão exigida) reforma, destacando-se a criação de um curso preparatório de Desenho, com a duração de 4 anos. Mais tarde, com a grande reforma pedagógica de 1881, implementa-se a separação do sector escolar da Academia, criando-se a Escola de Belas-Artes (Serrão, 1989).

Com um atraso de séculos em relação às principais nações da Europa, estas academias propunham-se, em contra-corrente, formar alunos em duas vertentes, uma artística, outra de produção industrial, dirigida à formação de operários e artífices fabris, de modo a tentar recuperar o atraso do país nesta área fundamental para a economia. Uma decisão que evidenciava as deficiências do meio cultural português, dado que as academias europeias tinham marcado precisamente essa diferença entre criação artística e produção industrial, assente na superioridade da primeira, privilégio pelo qual os artistas tinham lutado duramente (Sandra F. Leandro, 2008). Mas, a instabilidade política continuou a provocar uma insegurança que não possibilitava um normal desenvolvimento das instituições, e só com a Regeneração, a partir de 1851, estão criadas as condições para uma evolução mais apropriada (Lisboa, 2007:350- 359).

163 Em 1870, o governo saído do golpe militar liderado pelo Duque de Saldanha criou um Ministério da Instrução Pública, de curta duração; em 1890, por decreto de 5 de Abril, foi criado pelo governo do regenerador António Serpa Pimentel, o Ministério de Instrução Pública e Belas Artes, responsável por todos os níveis de ensino e também pelo património artístico e cultural. Mas estes esforços estiveram sempre condenados a ter resultados efémeros, dado que as prioridades eram sempre outras: ―A sociedade portuguesa oitocentista, refugiada na sua inculta e falta de tradição artística, caía sistematicamente no erro de atribuir às belas artes – que incluíam a Pintura, a Escultura, a Arquitectura e a Gravura – um papel supérfluo e um estatuto de luxo. Este erro, infelizmente, afectou mesmo o julgamento de personalidades que nada tinham de incultas e que em outras áreas da cultura demonstraram uma capacidade de intervenção adequada e profícua.‖ (Lisboa, 2007).

A constante falta de verbas, as faltas de material pedagógico adequado, o atraso cultural do país e os poucos artistas de qualidade disponíveis para ensinar resultaram num ensino com muitas lacunas e sempre debaixo de muitas vozes críticas. ‗Monumento de vergonha‘56

foi mesmo afirmado em 1850, a pouco mais de uma dúzia de anos da criação da instituição, e arrastando nisso queixas políticas contra o Cabralismo. A reforma já era, porém, pedida em 1844, e de novo cerca de 1860, mas só será realizada em 1868‖. (França, 2004) O governo setembrista de Rodrigues Sampaio nomeou uma comissão dirigida pelo seu secretário Luciano Cordeiro, resultando num projecto de lei inovador, mas que não chegou a ser discutido no parlamento. Porém, o relatório de Luciano Cordeiro, a par do escrito Observações sobre o Actual Estado das Artes em Portugal, de Sousa Holstein, acabou por ter ampla divulgação e discussão, mostrando um panorama cultural muito deficiente. Uma reforma como a que vinha a ser reclamada pelas muitas vozes críticas – de que provavelmente a mais lúcida e informada seria a de Joaquim de Vasconcelos, que sublinhou uma crítica constante de centralismo que frequentemente foi feita pela academia do Porto que só seria efectivada em 1881, pelo ministro José Luciano de Castro, vigente até 1911.

Mesmo com todas as vicissitudes que marcaram a vida das academias de belas artes portuguesas, estas foram mesmo assim cumprindo o seu papel pedagógico, a um

56 Diversas acusações de desleixo e incúria, leva a direcção da academia lisboeta, através do vice-inspector Sousa Holstein, chegou

a solicitar o conselho de Viollet-le-Duc, em 1862, e no ano seguinte nomeou-o ‗académico de mérito‘, aparentemente sem grandes resultados.

164 nível muito aceitável, por onde passaram os maiores nomes da arte portuguesa de oitocentos, quer como alunos quer como professores. A formação destes cursos era por vezes complementada pela concessão de bolsas para aprendizagem no estrangeiro, nomeadamente em Itália e França, concedidas pelo estado e também por particulares, onde assumiu um papel destacado o Rei D. Fernando II, que directamente concedeu bolsas e também deu o exemplo de mecenato apoiando muitos artistas comprando as suas obras (Lisboa, 2007).

Apesar das suas deficiências, o trabalho de grande valor humano e artístico elevou substancialmente os padrões artísticos em Portugal e inovou os padrões estéticos de uma minoria mais culta e esclarecida. Baseadas nos modelos estrangeiros de países desenvolvidos, as academias portuguesas não deixaram de reflectir a menoridade cultural do país face aos países europeus mais desenvolvidos com os quais Portugal não se podia comparar. Para além disso, desde o início da existência das academias italianas e de outros países europeus, foi feita a distinção entre as artes mais nobres, assentes na criação artística, e as artes menores, mais dirigidas à produção de modelos para a indústria e para a decoração; ao mesmo tempo, a criação artística era acompanhada de reflexão teórica e intelectual, na esteira dos elevados padrões artísticos e culturais do