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Sobre as relações entre a dança e o teatro no CEFAR: o que vi, ouvi e percebi

2. Um estranho no espelho: relações entre a dança e o teatro

2.2 Sobre as relações entre a dança e o teatro no CEFAR: o que vi, ouvi e percebi

Eu acho que existe uma tendência de rompimento de fronteiras mesmo. Não só de dança e teatro, mas de todas as linguagens, todas as artes. Isso sim eu percebo que é algo que vem ganhando espaço (Marise Dinis).

Como descrito no primeiro capítulo, de acordo com minhas observações e as entrevistas realizadas, muito pouco é feito para que haja a integração entre as escolas de dança e de teatro no CEFAR.

Durante as entrevistas, alguns professores mais antigos narraram algumas tentativas de integração que já ocorreram em outras épocas:

Assim que eu entrei para a escola, logo nos primeiros anos, eu fiz coreografia com música composta por professores e alunos da escola. Isso no final da década de 80. A gente fazia laboratórios de integração com as três áreas também. E teve uma época que eu fiz uma coisa com Cláudia Ciberlis e Luiz Garrocho, uma coisa que eu não sei que nome que a gente dava, mas era tipo um laboratório de integração também com alunos das três áreas (Lúcia Ferreira).

A gente fez umas experiências em uma época de fazer uma aula comum. E eu, na época que eu dava aula na dança e no teatro, pelo menos uma vez por semestre eu juntava a turma. Isso era quase uma obrigação no bom sentido. Eu achava que eles tinham que pelo menos ter uma experiência. E nós chegamos a fazer também a formatura da dança junto com o teatro. A gente

chamou a Carmen Paternostro para dirigir o trabalho. Era um espetáculo de dança-teatro. Parte de uma época onde a gente acreditava nisso, desejava, acreditava que era possível (Lúcia Ferreira).

Numa época que eu fui coordenador lá a gente tinha um programa, chamava “Três para rir um para chorar”, eram cenas que os alunos propunham de dança, de teatro e de música. Então a gente fazia um espetáculo, o diretor dava uma mexida lá e a gente fazia uma temporada no mês de julho. Era as 11 horas da manhã na Sala Ceschiatti. Ficava lotado. Era de graça, de vez em quando eles passavam o chapéu lá. Era muito interessante. Esse foi o único que eu vi que os alunos faziam por eles mesmos (Walmir José). Quando eu tinha o laboratório existia mais comunicação. Às vezes apareciam pessoas da dança (Luiz Garrocho).

É interessante notar que os professores falam dessas experiências sempre como algo muito positivo. Há um tom de saudosismo de uma época em que as possibilidades pareciam maiores. Eu acredito que as experiências que eles citam são, entre outras coisas, fruto de uma época onde os professores estavam mais abertos a experimentações, talvez muito influenciados pela fase que as artes cênicas viviam.

De acordo com Guinsburg et al (2006), no Brasil, foi durante a década de 70 que começaram as primeiras experimentações cênicas de dança-teatro. E especialmente após os anos de 1980, muitos experimentos artísticos surgiram com uma grande diversidade de estratégias para contaminar dança e teatro. Foi nessa época que tiveram início as primeiras experiências laboratoriais do corpo como centro da criação cênica.

Uma pista que evidencia essa abertura para uma maior integração, surge no relato da professora Lúcia Ferreira quando cita que convidaram a artista da dança Carmen Paternostro38 para dirigir o espetáculo de formatura39 das duas escolas – de dança e de teatro. De acordo com os levantamentos feitos durante a pesquisa, foi a única vez que houve um espetáculo de formatura unificado.

No material de divulgação do espetáculo, lê-se:

A poesia: fundadora do ser e da essência de todas as coisas.

O movimento: a mais cotidiana expressão dos homens, a própria criação e condução do universo.

Na aventura teatral dos “Estudos” o movimento invade a poesia que transborda no canto de Rosa e na retórica de Erasmo. A junção de poesia e movimento – ritmo,

38 Carmen Paternostro aparece como um importante nome na história da dança-teatro brasileira por ter participado

das primeiras experiências laboratoriais do corpo, em que se testavam a interiorização de personagens e a improvisação de movimentos. Participou de diversas incursões pela dança-teatro nas décadas de 1970 e 80 (GUINSBURG et al, 2006, p.108). Atualmente é professora da Escola de Dança da UFBA.

39 “Dois estudos para fim de ano” – espetáculo integrado dos alunos formandos em Teatro e Dança do CEFAR,

forma, gesto, palavra, música – tornou possível um encontro estimulante entre as Escolas de Teatro e Dança do Centro de Formação Artística.

O que se viu foi troca de segredos, fantasias compartilhadas, comichão estético: um flerte interdisciplinar...

Para nós, professores e assistentes da direção, foi muito gratificante acompanhar a criação de Carmen e dos alunos e cooperar no processo de pesquisa e descoberta da magia deste espetáculo.

“Esta estória se segue é olhando mais longe. Mais longe do que o fim; mais perto”.

(Ângela Mourão; Lúcia Ferreira; Wilson Oliveira)

Uma outra informação interessante, que a meu ver relaciona-se com a primeira, é que alguns professores do CEFAR tiveram durante suas formações artísticas experiências que mesclaram a dança e o teatro. Dentre eles, gostaria de destacar Ângela Mourão, Gil Amâncio e Lúcia Ferreira, que passaram pelo grupo e pela escola do Trans-Forma, o que, sem dúvidas, os influenciou quanto a um trabalho mais integrado entre as artes. Sobre o grupo:

O Trans-Forma Grupo Experimental de Dança foi fundado em 1971 por Marilene Martins40. Trata-se de um grupo que compôs o cenário da dança mineira de forma singular, influenciando toda uma geração da dança em Belo Horizonte. Seus integrantes faziam aulas de dança moderna, de ballet clássico, de dança afro e ainda tinham uma biblioteca à disposição para estudar. O grupo também recebia muitos convidados que traziam novas visões sobre o movimento, o corpo e sobre o corpo na dança. Eram realizados exercícios de improvisação em laboratórios de criação colaborativa, possibilitando aos bailarinos a oportunidade de trabalharem de acordo com suas particularidades de movimento (Generoso, 2007).

A professora Lúcia Ferreira contou um pouco de sua experiência com o Trans- Forma durante sua entrevista:

O Trans-Forma já fazia uma ligação com outras áreas artísticas, as artes plásticas, o cinema, o teatro, a música. Isso foi muito importante. (...) A composição dos espetáculos do Trans-Forma, já tinha uma característica que era a ideia do bailarino-intérprete, do bailarino criador. (...) Os espetáculos tinham roteiros onde a gente precisava ler muito. Tinha diretor teatral. Era uma linguagem muito diferente do que se produzia na época. E eu acho que isso me proporcionou um contato muito grande com o teatro também. É claro que depois disso eu passei a fazer milhões de outros cursos, oficinas. Depois dancei em alguns trabalhos independentes.

40 Marilene Lopes Martins, ou Nena, como também é chamada, nasceu em 05 de agosto de 1935, na cidade de

Teófilo Otoni, MG. Em 1952, mudou-se para Belo Horizonte, onde começou a ter aulas de ballet clássico na escola de Carlos Leite. Fez parte do Ballet Minas Gerais, também dirigido por ele. A partir de 1956, integrou o Ballet Klauss Vianna, ainda na cidade de Belo Horizonte. No início da década de 60, mudou-se para Salvador para estudar no Curso Superior de Dança da UFBA. Depois de formada, passou dois anos na cidade do Rio de Janeiro retornando, em seguida, para a capital de Minas Gerais. Em 1969, fundou a primeira escola de Dança Moderna de Belo Horizonte (Escola de Dança Moderna Marilene Martins) e, em 1971, o Trans-Forma Grupo Experimental de Dança, cujas ressonâncias artísticas ainda permeiam os dias atuais (CHRISTÓFARO, 2010).

Um ponto importante a ser ressaltado sobre a influência do Trans-Forma é que os cursos de aperfeiçoamento promovidos pela escola não eram restritos aos bailarinos do grupo. Isso acabou por influenciar toda uma geração da dança em Belo Horizonte pois mesmo bailarinos que não fizeram parte do grupo, puderam se alimentar de toda a diversidade artística que seus cursos ofereciam (Generoso, 2007).

Ainda sobre o mesmo tópico, outra questão que merece destaque é a influência de Klauss Vianna na formação de alguns professores do CEFAR. Há quem tenha feito aulas diretamente com Klauss – como é o caso do professor Walmir José - e, em outros casos, há quem o tenha conhecido por vias indiretas – os que foram alunos de alunos dele. O professor Lenine Martins narrou um pouco de sua experiência com a técnica Klauss Vianna:

Na minha época, o movimento que vinha do Klauss Vianna, das técnicas corporais que ele desenvolvia, a gente chamava isso de expressão corporal, estava muito latente. Então, de uma certa maneira, os atravessamentos entre teatro e dança eram mais fortes. Klauss Vianna trazendo um monte de técnicas que o teatro se apropriou e para o teatro ficaram muito fortes. Depois disso eu tive aula com Dudude Hermann no Oficinão, tive aula com a nora do Klauss Vianna [Neide Neves] – que para mim foi o melhor trabalho que eu desenvolvi em torno do corpo na minha vida (Lenine Martins).

Como se pode notar, a integração entre a dança e o teatro (incluindo também outras linguagens artísticas) não é novidade para uma grande parcela dos professores da escola. Partindo dessa realidade, a grande questão que surge, e que esta pesquisa ainda não foi capaz de responder, é: o que mudou? O que fez com que as escolas se fechassem em suas salas de aula não buscando mais a integração de seus corpos docentes e discentes (inclusive entre os corpos de seus docentes e seus discentes)? Se há o desejo – como declarado por diversos estudantes e professores – o que impede que de fato a integração aconteça?

Apesar de não ter alcançado argumentos suficientes para responder a esta questão, foi possível perceber que uma das consequências da atual falta de integração entre as escolas é o desconhecimento dos cursos por parte dos estudantes. Eles frequentam diariamente o mesmo prédio – é verdade que uma rua para trânsito interno os separa, ainda que uma espécie de passarela os una –, mas os estudantes de teatro pouco sabem sobre seus colegas da dança e vice- versa. Suas ideias sobre “o outro” são baseadas no imaginário coletivo sobre o que é dança e o que é teatro, e por relances de aulas que uns conseguem espiar dos outros. Esse desconhecimento pode ser verificado em seus depoimentos:

Eu sei que o Paulinho dava aula [para o curso de teatro]. Mas não sei de mais nada. Eu tenho uma amiga que fez o curso básico de teatro e me contava algumas coisas, mas do profissionalizante eu não sei nada (Carol Nogueira).

O que eu sei... em relação a técnicas mesmo eu não sei nada. A gente sabe o que a gente vê dando uma espiada rápida quando passa. A gente até brinca falando: esse povo do teatro é meio doido! Faz umas coisas! (Mateus Alves). Eu sei pouco. Eu não sei exatamente o que que é o curso deles. Eu sei que tem, na verdade eu não sei, eu imagino que seja diversos tipos de dança (contemporânea, clássico). Deve ter também essas coisas de técnica mesmo da mesma forma que a gente tem essas maneiras de interpretações, esses tipos de interpretações, imagino que deva ter também as maneiras de dança, técnicas de dança. Como se comportar, como parar. Trabalhar o mecanismo. Deve ter essas coisas também. (Éder Reis).

Na verdade, eu não sei muito não. A gente não conversa muito sobre as disciplinas. Ficam coisas muito no meu imaginário. De ser uma aula muito dura, muito rígida. Principalmente quando se fala em clássico. Eu acho que quando eles vão fazer o contemporâneo deve ser mais legal (Diego Ferreira). O curso de dança daqui é só de ballet? Eu não conheço! Eu não sei como é que funciona. Geralmente quando a gente conversa é mais papo furado. Ninguém fala sobre o curso, então não sei nada sobre o curso. Pelo o que eu vejo quando desço ali e fico olhando, eles já sabem mais ou menos o que fazer. Fazem tudo certinho (Luiza Rodrigues).

Nas entrevistas, quando professores e estudantes foram convidados a falar sobre as diferenças e semelhanças entres as duas linguagens, todos souberam pontuar com muito mais facilidade e rapidez as diferenças. Alguns conceitos apareceram de forma recorrente e acredito que mereçam ser discutidos.

Houve quem sintetizasse as diferenças entre as duas linguagens na presença do texto (e, portanto, da fala) no teatro, e sua ausência na dança:

A diferença básica é que um trabalha com a voz do movimento, o outro com o movimento da voz. O teatro fala muito, tem o texto (Paulo Buarque). O ator tem um texto. O corpo é veículo para esse texto. E no ballet, principalmente, você tem apenas o corpo enquanto corpo (Cristiana Menezes).

No tipo de teatro que eu fazia, a grande diferença era usar a voz. O que eu acho muito difícil. A minha potência vocal é baixa. Para eu conseguir falar nas peças de teatro era o óh! Exercitar isso foi muito difícil. E isso eu nunca vou usar na dança, pelo menos eu acho que não (Júlia Alves).

De fato, a utilização do texto (e da fala) é uma diferença constatada mas refere-se, especificamente, a um conceito determinado de dança e de teatro. Conceito este que já foi rompido no século passado, com o aparecimento da dança-teatro, do teatro-físico, dentre outras manifestações consideradas híbridas. Como aponta Fernandes (2006, p.374) a respeito das artes da cena na contemporaneidade: “Não podemos mais esperar uma dança pura ou um teatro puro. Tampouco classificar dança como gestos abstratos feitos por um corpo tecnicamente treinado, e teatro como gestos do cotidiano que acompanham um texto e fazem um sentido específico numa estória ou contexto real”.

Uma diferença apontada pela estudante de teatro Gabriela Fernandes: “Eu acho que

na dança tem uma perfeição do movimento. E no teatro as vezes a gente releva um pouco isso para cair na relação”, a meu ver, está ligada à questão colocada pela estudante de dança Carolina Nogueira: “[...]na dança a gente é exigido fisicamente por algo muito maior do que eles. De musculatura mesmo, de físico”. Esta exigência física (e, portanto, técnica) que Carolina aponta, realmente não acontece no teatro. A estudante de teatro Priscilla Monteiro, que tem formação em dança anterior à sua entrada no CEFAR, explicitou muito claramente essa diferença:

Eu sinto muita diferença. Porque talvez, a preparação física que eu tive no Sarandeiros41, ela seja mais direcionada para uma alta performance. Como se fosse um esporte de alto nível. E a preparação que eu vejo no CEFAR [no curso de teatro], é uma preparação talvez mais holística. Tem essa coisa de volta à calma, de percepção do corpo, ver o que o corpo está pedindo. E também porque as vezes no teatro não existe nada previamente definido [cita como exemplo o trabalho com partituras corporais]. Isso coloca o corpo em um estado de alerta maior porque é um lugar que não me é confortável. Eu estou acostumada com essa coisa do 7, 8, vai nessa direção, vira, abaixa, levanta. Eu estou acostumada com esse tipo de presença (Priscilla Monteiro).

As colocações dessas estudantes resumem ainda que de forma simples uma das diferenças essenciais entre as duas linguagens: a forma de conceber e lidar com o corpo no processo de formação42.

Um último ponto que trago à luz, o qual foi bastante citado nas entrevistas é a questão da disciplina. O professor Paulo Buarque - que na época trabalhava nas duas escolas – aponta a disciplina como uma diferença essencial:

De forma particular, a disciplina é muito diferente. [Em uma aula de dança] o mais importante é ter disciplina. É passar disciplina. É exigir disciplina. Muitas vezes essa disciplina é traduzida como rigidez. No teatro o pessoal já entra esculachado. Conversam! Eu acho que eles começam a aula e eu não percebo. Eles têm uma outra... o aquecimento é diferente.

Outros depoimentos corroboram com essa visão:

Eu acho o entendimento de disciplina, de obediência, muito diferente. O bailarino é disciplinado, obediente, metódico. Ele não come muito. Porque isso vai fazê-lo alcançar um.... alcançar esse sucesso. E aí é uma disciplina bem tolhida (Joelma Barros).

Disciplina é uma coisa que eu acho que falta muito no teatro e sobra na dança. Eu passo na aula de dança está todo mundo lá parado, quietinho, sério, focado... (Luciano Magno).

41 Grupo de Projeção Folclórica dirigido por Gustavo Côrtes, vinculado à Escola de Educação Física da UFMG. 42 Este assunto será aprofundado no Capítulo 4.

Em consonância com essa ideia, encontramos Strazzacappa (1994) apresentando um dossiê com os problemas mais frequentes enfrentados pelos atores que observou em sua pesquisa, no que se referia especificamente ao trabalho corporal. O item apontado como o que mais interferia na qualidade do fazer de cada ator foi a indisciplina. A autora explicita uma série de regras comuns à formação de um bailarino (organização da aula, utilização do espaço, relacionamento entre os praticantes, normas de comportamento, dentre outras), que normalmente não fazem parte da formação de atores. Nas palavras dela: “Essas regras não fazem parte do mundo dos atores. São poucos os grupos e companhias teatrais que acreditam e estimulam a disciplina em seu meio” (ibid, p. 22).

Discutidas as diferenças, voltemos a atenção para as semelhanças. O depoimento de Elisa Crespo, estudante de dança, apresenta, com uma certa simplicidade característica de sua idade, uma visão bastante interessante quanto à semelhança das duas linguagens:

Quando a gente fez a Mostra de Composição e Arte, era dança, música e teatro juntos. A gente ficou no mesmo camarim. E a menina do teatro que estava lá fazia a mesma coisa. A gente maquiou, ela maquiou, a gente colocou o figurino, ela colocou o figurino, aí cada um foi para o seu canto, rezou, preparou, entrou e fez o que precisava fazer.

Em sua descrição sobre a rotina executada antes de se apresentar, verifica-se a essência do ofício do artista da cena. O que também se revela no depoimento de Joelma Barros, porém referindo-se ao que vem antes do apresentar-se, ao processo de preparação de um trabalho:

Eu acho que de similaridade é a necessidade de lapidação para alguma coisa. De lapidar, de lapidar.... Eu ouvia muito esse termo. Vamos lapidar o trabalho! Então de poder aprimorar mais o conhecimento sobre aquele saber ali, e desenvolvê-lo principalmente com o olhar do professor ou do diretor.

Outras semelhanças como: a busca da presença cênica, o corpo como matéria- prima, a expressão corporal, também foram apontadas pelos entrevistados. Muitos, inclusive, trouxeram em seus discursos questões sobre a fusão de linguagens. O que mostra que ao falar das semelhanças aproxima-se muito mais de uma ideia contemporânea das artes da cena, do que quando o foco está nas diferenças. De qualquer forma, uma coisa que fica clara é que falar das diferenças ou das semelhanças depende muito das concepções que se tem a respeito de cada linguagem. Percebe-se no discurso dos entrevistados que há uma coexistência de pensamentos sobre o que é dança e o que é teatro.

Uma questão que não foi apontada objetivamente, mas surge atrelada ao discurso de alguns entrevistados é a diferença do comportamento político entre atores e bailarinos. As palavras do professor Walmir José exemplificam bem o que quero enfatizar:

A dança a gente considerava até – excetuado um ou outro, uma ou outra pessoa da dança – a gente considerava um movimento bem reacionário, sabe? Ele se baseava muito nas escolas de dança. Naquela época – final dos anos 70, princípio dos 80 - Belo Horizonte tinha mais de 400 escolas de dança. Não tinha academia então as pessoas faziam escola de dança. Todas as moças estavam na escola de dança. Mas espetáculos mesmo não havia e não havia praticamente nenhum comprometimento das pessoas da dança com o movimento político ou até uma boa parte das pessoas da dança – muitas delas – eram ligadas à uma elite econômica da cidade e tal. Em geral elas estavam mais próximas da ditadura do que de uma abertura democrática. [...] Aí no meio dos anos 80 começa a surgir a ginástica aeróbica que desestruturou as escolas de dança. Começou a surgir as academias e muitas escolas de dança que eram tradicionais foram perdendo aluno e foram obrigadas a encerrar. Só nos anos 90 que a dança começou a se reorganizar como arte mesmo e não como uma atividade física onde as pessoas iam para cuidar do corpo. Com menos ênfase no trabalho artístico mesmo.

As palavras de Klauss Vianna em seu livro, A dança, ilustram muito bem essa situação. Sobre a época em que começou a se envolver com o teatro, no auge da ditadura militar, ele afirma: “(...) era o tempo da perseguição ao teatro, aos atores, ao pensamento. Mais do que