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3.3 ORIGEM DO CONCEITO DE JORNALISMO IMERSIVO

3.3.1 Telepresença e antecedentes do jornalismo imersivo

Em 1980, Marvin Minsky, pioneiro no estudo da cibernética e fundador do Artificial Intelligence Laboratory84 do MIT, projetava um futuro em que não haveria a necessidade de nos deslocarmos para um determinado local para sentir, o que ele chamava, do “estar lá”. Para esse sentido ele cunhou o termo telepresença. Essa definição tinha por intenção substituir os termos tele operadores e tele atores, muito utilizados por cientistas da época ao referirem-se aos sistemas controlados remotamente. Ele projetava que, possivelmente até os anos 2000, sistemas vestíveis com uma série de sensores conseguiriam compreender e transferir cada mínimo movimento do corpo para um sistema de motores remotos. Esses atuariam como músculos de máquinas, robôs, e, para o próprio Minsky, estariam localizados “em outra sala, em outra cidade, em outro país ou em outro planeta”.

A tradução dos sensores deveria atender desde a maior força necessária para operar de forma segura uma usina nuclear, grande preocupação na década de 1980, até os mais detalhados e minuciosos movimentos de um cirurgião operando seu paciente a milhares de quilômetros. Mas para além de simplesmente transferência de movimentos, o grande destaque para essa tecnologia era permitir que o seu operador pudesse também sentir de forma completa, ou selecionada, o ambiente em que o robô estivesse. Para Minsky (1980, p. 45, tradução nossa) “calor ou dor são traduzidos em sensação informativa, mas tolerável. Seu trabalho perigoso se torna seguro e agradável”85. Minsky morreu em 2016 e não viu a concretização das suas projeções a respeito da telepresença.

No entanto, o sentido de “estar lá”, foi trabalhado por outros cientistas e serviu como elemento de articulação para o trabalho de De la Peña na constituição do jornalismo imersivo. A partir de Slater (2009, p. 3551), De la Peña (2010) aponta que,

84 Atualmente o laboratório se chama MIT Computer Science & Artificial Intelligence Lab. Disponível em: https://www.csail.mit.edu/.

85 No original: Heat or pain is translated into informative but tolerable sensation. Your dangerous job becomes safe and pleasant.

no início da década de 1990, a ideia de telepresença foi transplantada para a RV por autores como Held e Durlach (1992) e Sheridan (1992), onde, em vez de estar no ambiente físico remoto, o participante estava em um ambiente virtual com uma sensação de estar no local representado pelos monitores virtuais.

Telepresença foi atualizado para o conceito de ilusão de lugar, que é a forte sensação de estar em um espaço desenvolvido a partir de um sistema de RV. [...] uma qualidade da nossa experiência que é impossível de descrever, e é especificamente a ilusão de estar no espaço virtualmente renderizado, mesmo que você saiba que não está lá86 (DE LA PEÑA, 2010, p. 8, tradução nossa).

Segundo a autora (2010), o sentido de estar presente em um lugar é atingido a partir da movimentação da cabeça e corpo do usuário, que determinam perspectivas diferentes em sistemas de RV, e é essa capacidade tecnológica que separa por completo as experiências narrativas em RV do modelo tradicional de visualização de imagens a partir de monitores e telas convencionais.

No exemplo do visor de RV, quando você vira a cabeça em 180 graus, você está continuamente recebendo pelo menos sensações visuais da realidade virtual. Em um monitor padrão, por maior que seja, quando você vira a cabeça, as imagens da realidade física se intrometem no campo visual. […] A conclusão é que o rastreamento da cabeça e do corpo, e as mudanças multissensoriais apropriadas na correspondência com os movimentos do corpo, mudanças que seguem as regras das contingências sensoriais e cotidianas, tenderão a levar à ilusão de lugar 87 (DE LA PEÑA, 2010, p. 9, tradução nossa). A segunda instância fundamental do jornalismo imersivo está na plausibilidade, ou seja, a sensação de que a situação que é observada ou vivenciada é real, ou aceitável. De acordo com De la Peña (2010), enquanto a ilusão de lugar está relacionada à estaticidade, à plausibilidade, voltada normalmente para questões dinâmicas, é a ilusão de que os fenômenos observados estão realmente acontecendo. A plausibilidade também está relacionada às respostas que o ambiente virtual produz a partir da interação do usuário, como, por exemplo, aproximar-se de algum

86 No original: [...] the strong sensation of being in the space depicted by the virtual-reality system. […] a quality of our experience that is impossible to describe, it is specifically the illusion of being in the virtually rendered space even though you know that you are not there.

87 No original: In the HMD [Head Mounted Display] example, as you turn your head around 180 degrees you are continually receiving at least visual sensations from the virtual reality. On a standard monitor, however large, as you turn your head eventually images from physical reality will intrude into the visual field. […] The conclusion is that head and body tracking, and appropriate multisensory changes in correspondence with body moves, changes that follow rules of everyday sensorimotor contingencies, will tend to lead to PI [Place Illusion].

personagem virtual e esse realiza ações, como olhar ou inicia um diálogo com o participante da experiência, entre outras e infinitas possibilidades.

Mas a ilusão de lugar e plausibilidade, para De la Peña (2010), não são suficientes para o atendimento de conteúdos imersivos que proponham atuar dentro do que ela denomina como alto nível de imersão. Para isso, é necessária uma terceira característica: o corpo virtual. A posse de um corpo virtual é determinante para completar as duas primeiras características, no entanto, essa característica apresenta, conforme a autora, características maleáveis, e que segundo ela, baseada em trabalhos de diferentes autores sobre o tema do corpo virtual, descreve: “com as correlações multissensoriais apropriadas, é possível dar às pessoas a ilusão de que objetos estranhos, como uma mão de borracha, fazem parte do seu corpo [...] ou dão às pessoas um senso de propriedade sobre um corpo virtual, como se o corpo virtual tivesse se tornado seu” (DE LA PEÑA, 2010, p. 10, tradução nossa)88. Observando por essa perspectiva, é possível localizar que De la Peña concentra a produção em RV nas capacidades visuais e sugere, ainda que limitada, a possibilidade de recursos de interatividade. Não amplia o uso das capacidades espaciais e destaca a necessidade de incluir um corpo virtual durante a experiência.

3.3.2 Indução de sofrimento psicossomático na RV: a primeira experiência de