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Temperamento, adaptação, socialização e problemas de comportamento da criança em

TEORIAS E MODELOS NA COMPREENSÃO DO DESENVOLVIMENTO E DAS INTERACÇÕES HUMANAS

5. Resultados de investigação:

5.1. Envolvimento e características da criança

5.1.4. Envolvimento e temperamento

5.1.4.4. Resultados da investigação

5.1.4.4.1. Temperamento, adaptação, socialização e problemas de comportamento da criança em

em contextos de educação de infância

Rothbart e colaboradores (1994) realçam o papel mediador do temperamento nos processos de aprendizagem social e sugerem que o temperamento pode interagir com a experiência de formas diversas na produção de resultados sociais. Assim, crianças que diferem em termos de reactividade social terão experiências efectivas diferentes, mesmo em situações idênticas. As características temperamentais podem contribuir para que as crianças elaborem os ambientes de forma diferente e para que aprendam coisas diferentes em situações que, aparentemente, são idênticas. Deste modo os conceitos de temperamento podem ajudar a explicar as origens das diferenças individuais na forma como as crianças se adaptam aos seus ambientes próximos (Bates, 1989a), sendo a adaptação considerada em termos das dimensões do funcionamento da criança que são indicativas do seu ajustamento a contextos particulares (Rothbart & Bates, 1998). Estes autores referem que frequentemente têm sido encontradas relações directas e lineares entre temperamento e adaptação e que têm sido referidos padrões de diferenciação teoricamente significativos, com dimensões específicas da adaptação a serem prognosticadas por variáveis de temperamento específicas.

De facto, autores que abordaram o papel do temperamento da criança em contextos de educação de infância concluíram que a percepção que os educadores têm acerca do temperamento das crianças se relaciona com a adaptação das crianças a esses mesmos contextos, tal como era percepcionada por esses mesmos educadores, e identificaram algumas dimensões temperamentais da criança – humor, adaptabilidade e aproximação (approach) – como preditores relevantes, indicando que crianças mais

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situações novas e para conhecerem pessoas, tinham melhor adaptação ao grupo (Klein, 1982, 1991; Zajdeman & Minnes, 1991). Humor positivo e adaptabilidade são também as características da criança

“fácil”no NYLS (Thomas & Chess, 1977, 1981).

O nível de actividade da criança, a sua persistência e distractibilidade são dimensões temperamentais da criança que têm sido igualmente referidas como estando relacionadas com uma melhor adaptação a contextos de educação de infância: crianças menos activas, altamente persistentes e menos sujeitas a distraírem-se eram consideradas como estando mais bem adaptadas aos contextos de educação de infância (Klein, 1991). Outros aspectos específicos do temperamento têm sido relacionados com uma melhor adaptação e com uma melhor execução das crianças em tarefas cognitivas, em contextos pré-escolares e de creche. Nomeadament, Jewsuwan e colaboradores (1993) referem três aspectos do temperamento como sendo particularmente úteis para prognosticar a adaptação da criança a contextos pré-escolares: a sociabilidade, a emocionalidade e a capacidade de se acalmar (soothability). A dimensão emotiva foi igualmente realçada por Rothbart e colaboradores (1994) ao concluírem que a afectividade negativa estava relacionada com todos os traços sociais examinados no seu estudo – enquanto os afectos negativos de irritação, tais como propensão para zanga ou angústia se relacionavam com traços anti-sociais, os afectos de internalização negativos, tais como tristeza ou medo, estavam associados com traços pró- sociais. No mesmo sentido, Schmitz e colaboradores (1999) encontraram relações moderadas entre temperamento e problemas de comportamento durante a primeira infância, sendo que a emocionalidade era a dimensão do temperamento das crianças que revelava uma relação mais forte com problemas de comportamento em idades posteriores. Guerin e colaboradores (1997) referem que bébés que mais frequentemente expressavam emocionalidade negativa e tinham uma adaptação mais lenta, eram mais tarde avaliados como manifestando mais problemas de comportamento durante a infância.

Rothbart e colaboradores (1994) encontraram relações fortes entre uma dimensão temperamental de controlo do esforço (effortful control), desenvolvimento social eficaz (traços sociais de propensão para ter consciência da culpa e para a empatia) e baixa agressividade. Estes autores sugerem que a ausência de auto-regulação da atenção pode predispor a criança para problemas de socialização. No mesmo sentido, num outro estudo, rapazes de 4 a 6 anos, com um controlo de atenção elevado, tinham tendência a utilizar métodos verbais não hostis para lidar com a zanga, em vez de métodos agressivos (cf. Rothbart, 2004). Este tipo de resultados levou alguns autores a sugerir que o controlo do esforço pode apoiar a empatia pelo facto de permitir que a atenção da criança se centre nos pensamentos e sentimentos dos outros, sem ficar subjugada pelo seu próprio mal-estar. De modo semelhante, o controlo do esforço poderá contribuir para desenvolver sentimentos de culpa, pelo facto de permitir à criança aperceber-se dos sentimentos negativos dos outros, e relacioná-los com o sentimento de responsabilidade relativamente às suas próprias acções, mas também às consequências negativas dessas acções (ibd.). De forma geral, um baixo controlo do esforço tem sido associado a dificuldades de

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adaptação, incluindo problemas relacionados com externalização e com comportamento anti-social na infância e, posteriormente com utilização de drogas e agressividade (Rothbart & Bates, 1998). Mobley and Pullis (1991) referem que o grau de orientação para a tarefa e de reactividade se relacionam com a adaptação a contextos de educação de infância. Crianças que manifestavam graus mais elevados de orientação para a tarefa e baixa reactividade, foram cotados pelos seus educadores como mais adaptados em termos de persistência, cooperação na sala e cooperação com outros. Além disso os educadores consideravam que estas duas características das crianças se relacionavam com níveis mais baixos de actividade e com numerosos aspectos de socialização positiva relativamente aos educadores e à dinâmica da sala de educação de infância.

Reactividade e auto-regulação são dois traços de temperamento referidos por Wachs (2000) como influenciando o subsequente desenvolvimento e variabilidade inter individual. Assim, relativamente ao grau de reactividade e sensibilidade à estimulação, Strelau (1994; citado por Wachs, 2000) relaciona um grau elevado de reactividade com inibição comportamental, como numa situação em que níveis moderados de estimulação são demasiado intensos e perturbadores para um indivíduo altamente reactivo que, consequentemente, revela comportamentos de evitamento relativamente à situação. Tem sido sugerido que graus extremamente elevados e graus extremamente baixos de reactividade são igualmente problemáticos para o desenvolvimento subsequente, sendo no entanto de notar que o facto de um indivíduo ser classificado como hiper-reactivo ou como hipo-reactivo pode depender do estímulo ou da medida do resultado considerado (cf. Wachs, 2000). Como exemplo, este autor refere um estudo de Field no qual crianças prematuras e crianças com síndroma de Down parecem ser hipersensíveis a estimulação de intensidade elevada e simultaneamente manifestar níveis muito baixos de responsividade a tentativas dos pais para os acalmar. A importância das diferenças individuais em reactividade para explicar a variabilidade individual pode ainda ser moderada por diferenças individuais em capacidades de auto-regulação (Rothbart, 1989b). Por exemplo, diferenças individuais na reactividade individual tornam-se melhores preditores de problemas de adaptação à medida que a auto-regulação diminui (Eisenberg, Fabes, Murphy, Karbon, Smith, & Maszk, 1996). Para além das possíveis interacções com reactividade, as diferenças individuais na auto-regulação podem também influenciar directamente a variabilidade do desenvolvimento subsequente (cf. Wachs, 2000).

Globalmente, o temperamento difícil é considerado um factor de risco para o desenvolvimento, na medida em que está associado a problemas de comportamento (Lee & Bates, 1985; Kochanska, 1991, 1997). Por exemplo Mobley e Pullis (1991) concluíram que crianças altamente reactivas em idade pré-escolar apresentavam problemas de comportamento em diversas áreas, especialmente de auto- controlo e persistência. Por outro lado, características de adaptabilidade, de aproximação (approach) e de humor não se relacionavam com nenhuma das categorias de problemas de socialização cotados pelos educadores, estando, no entanto relacionados com melhor socialização com pares (ibd.). De facto

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os autores concluíram que crianças com maior flexibilidade, medida com aspectos de adaptabilidade, aproximação/retraimento e humor positivo, eram mais persistentes e activas e eram cotadas como tendo mais amigos e como sendo menos tímidas, menos medrosas e menos deprimidas.

De uma forma geral os resultados indicam que as cotações de aproximação/retraimento (approach/

withdrawal), adaptabilidade/humor positivo, persistência/atenção e auto-regulação se relacionam com

medidas de adaptação em contextos de educação de infância. Além disso, Rubin, LeMare e Lollis (1990) sugerem dois tipos de temperamento vulnerável (difícil e slow-to-warm-up) como preditores de risco desenvolvimental.

Temperamento difícil é uma medida compósita de diversas características individuais de temperamento (Wachs, 2000). A natureza compósita da dimensão dificuldade temperamental é ilustrada num estudo de natureza ecológica que pretendeu compreender as características comportamentais de dois grupos de bebés, com desenvolvimento típico, relativamente à sua adaptação e comportamento em contexto de creche (Portugal, 1995), no qual a autora verificou que as crianças identificadas pelos educadores como manifestando dificuldades de adaptação eram consideradas temperamentalmente mais difíceis e mais dependentes e revelavam, tipicamente, comportamentos que eram identificáveis no início e ao longo do ano, nomeadamente: (a) maior perturbação emocional (mais choro e mais solicitações de atenção, medos, tristeza, etc.), (b) mais problemas de comportamento (comportamentos agressivos e dificuldade em lidar com os pares), (c) maior dificuldade de concentração e envolvimento em jogo construtivo (nível de actividade ou letárgico ou hiperactivo, baixa concentração e frequente actividade sem objectivo ou olhar vazio), (d) maiores dificuldades de interacção social (isolamento, dificuldade de relacionamento com pares e adultos) e (e) mais tiques e maneirismos (balanceamentos, chupar no dedo, chupeta, etc.). Por outro lado, as crianças do grupo sem dificuldades de adaptação eram consideradas temperamentalmente mais fáceis e calmas, mais independentes e com maior facilidade de lidar com situações novas e, embora pudessem apresentar problemas emocionais, alguns tique e maneirismos, dificuldades de concentração e envolvimento nas actividades no início do ano, raramente apresentavam dificuldades de interacção social e não apresentavam problemas de comportamento (ibd.). No mesmo sentido, uma revisão de estudos sobre as relações entre temperamento da criança e as suas interacções com adultos e crianças indicou que crianças de temperamento difícil parecem manifestar brincadeiras mais agressivas e violentas que crianças com temperamento fácil (cf. Portugal, 1995). De facto, crianças mais activas envolviam-se em mais situações conflituosas que as inactivas, embora fossem consideradas mais sociáveis (maior frequência de trocas de brinquedos com os pares e menos tempo simplesmente a observar ou a olhar). Crianças que revelavam valores mais elevados numa dimensão de intensidade pareciam preferir lidar com os seus pares a nível físico (toques e contactos mais frequentes num pólo positivo e agressões físicas num pólo negativo) e crianças com baixo limiar de resposta tinham tendência para reagir batendo nas outras crianças e para se envolverem menos em trocas sociais

resultados de investigação: factores que influenciam o envolvimento da criança em contextos educativos

No mesmo sentido, os resultados de um estudo desenvolvido de acordo com um enquadramento conceptual considerando as relações pessoa-processo-contexto, apoiam a importância da variável

“pessoa”, na medida em que mostram que as crianças que são cotadas pelos seus educadores como

tendo um temperamento difícil têm menor probabilidade em serem obedientes de forma comprometida (obedecer cordial e completamente aos pedidos) e tinham maior probabilidade de não obedecerem, de forma passiva (nem obedecer nem recusar abertamente obedecer) (Wachs, Gurkas, & Kontos, 2004).

Wachs (2000) refere estudos que fornecem evidência empírica para a associação entre temperamento

difícil em crianças e um maior risco de se desenvolverem problemas de internalização, bem como

de externalização. Além disso, foram encontrados padrões de associação entre características temperamentais específicas, avaliadas nos primeiros anos de vida e posteriores problemas de comportamento específicos, com dimensões de angústia (distress) perante a novidade e irritabilidade (irritable distress) mais associados a comportamentos de internalização, tais como ansiedade e medo, e dimensões de resistência ao controlo ou de baixa flexibilidade (manageability) mais associadas a problemas de externalização, tais como problemas de atenção ou comportamento anti-social (cf. Rothbart & Bates, 1998). A confirmar esta hipótese, Hagekull e Bohlin (1995) referem que as avaliações dos pais acerca do grau de flexibilidade da criança (manageability) (dificuldade, emocionalidade negativa, irritabilidade) estão associadas com posteriores comportamentos de externalização (nível elevado de actividade motora global, agressividade, comportamentos problemáticos) tal como são percepcionados tanto por pais como por educadores. Por outro lado, crianças que eram percepcionadas pelas suas mães como sendo mais difíceis em termos de adaptabilidade e irritabilidade (irritable distress), manifestavam mais problemas de internalização, mais problemas de comportamento de forma global, menos satisfação e eram menos alegres nos contextos de educação de infância, de acordo com a percepção dos seus educadores (De Schipper, Tavecchio, Van Ijzendoorn, & Van Zeijl, 2004). Estes resultados parecem apoiar a hipótese colocada por Rothbart e Bates (1998) que dimensões específicas do temperamento se relacionam, de forma diferenciada, com comportamentos de internalização e de externalização em crianças e estão em concordância com estudos prévios que relacionaram temperamento com posteriores problemas de comportamento em casa (cf. Bates, 1989a; Rothbart & Bates, 1998), em contextos de educação de infância (Klein, 1991; Zajdeman & Minnes, 1991), e entre contextos educativos (Hagekull & Bohlin, 1995).

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