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Da Zona de Desenvolvimento Próximo (ZDP) à aprendizagem interactiva – noções de “Scaffolding” e “Self-scaffolding”

TEORIAS E MODELOS NA COMPREENSÃO DO DESENVOLVIMENTO E DAS INTERACÇÕES HUMANAS

2. Desenvolvimento e aprendizagem em contextos naturais

2.2. Desenvolvimento cognitivo em contextos sociais

2.2.1. A teoria sócio-cultural do desenvolvimento de Vygotsky e continuadores

2.2.1.2. Relação entre Desenvolvimento e o processo de ensino-aprendizagem

2.2.1.2.3. Da Zona de Desenvolvimento Próximo (ZDP) à aprendizagem interactiva – noções de “Scaffolding” e “Self-scaffolding”

O conceito de ZDP foi desenvolvido por psicólogos contemporâneos em diferentes linhas de investigação. Uma dessas linhas de investigação concentra-se na utilização da ZDP em contextos de aprendizagem interactiva e em acções conjuntas. A ideia de Vygotsky (1978) que a noção de ZDP implica que a única boa aprendizagem é aquela que está à frente do desenvolvimento, parece conter, segundo Bruner (1985), uma contradição: por um lado a ZDP relaciona-se com o atingir “consciência

17 Para ilustrar o relevo da experiência de envolvimento num diálogo com os outros, Wertsch e Bivens (1993) referem os resultados de um estudo que

envolveu procedimentos de ensino recíproco com crianças que tinham sido identificadas como tendo dificuldades em desenvolver capacidades de leitura e que, segundo esta perspectiva necessitavam de ajuda para transitar de um plano interpsicológico para um plano intrapsicológico. Este procedimento de ensino recíproco, que envolvia uma prática em que professores e alunos tomavam a vez na liderança de diálogos acerca de textos, fazendo sumários e previsões ou clarificando partes do texto, resultou numa melhoria acentuada das capacidades de leitura dos alunos, que não se limitou à sua realização durante as sessões. Os autores contrastam este procedimento com abordagens do género da utilizada por Meichenbaum (1977; citado por Wertsch e Bivens, 1993) que se centram no treino e modelagem de directivas de auto-instrução em situações que não envolvem o tipo de interacção social dialógica

Desenvolvimento e aprendizagem em contextos naturais

e controlo”. Mas, segundo o autor, consciência e controlo só surgem depois de se ter adquirido espontaneamente uma boa mestria sobre uma função. Então, como poderia uma “boa aprendizagem” ser aquela que está à frente do desenvolvimento, visto estar inicialmente no plano inconsciente? Como resposta à sua própria interrogação, Bruner (1985) desenvolve a seguinte ideia:

Se é fornecida à criança a possibilidade de avançar sob a tutela de um adulto ou de um par mais competente, então o tutor ou o par que auxilia, servem como uma forma vicariante de consciência até ao momento em que a criança consegue mestria da sua própria acção, através da sua própria consciência e controlo. Quando a criança atinge o controlo consciente sobre uma nova função, ou sistema conceptual, torna-se capaz de o utilizar como um instrumento. Até esse ponto, o tutor realiza a função crítica de construir andaimes (“scaffolding”) na tarefa a aprender, tornando assim possível à criança, e utilizando as palavras de Vygotsky, interiorizar o conhecimento externo, convertendo-o num instrumento de controlo consciente (pp. 24-25).

Na teoria Vygotskiana, a concepção de “scaffolding” está intimamente ligada às ideias de ZDP e de internalização O ambiente social é o andaime necessário, ou o sistema de apoio, que permite à criança avançar na construção de novas competências. Segundo Wood, Bruner e Ross (1976), o termo “scaffolding”, foi introduzido pelos discípulos de Vygotsky numa tentativa para determinar os componentes mais importantes da tutorização. Segundo estes autores, numerosas pesquisas demonstraram que um “scaffolding” eficiente tem os seguintes componentes e objectivos: resolução conjunta de problemas; intersubjectividade; tom caloroso e responsividade; manter a criança na ZDP; promover a auto-regulação.

Estes aspectos serão posteriormente relacionados, neste trabalho, com os estilos interactivos dos prestadores de cuidados em contextos de educação de infância.

Ao desenvolver a noção de “self-scaffolding”, Bickard (1992) introduz a ideia da natureza funcional de “scaffolding”, realçando as suas propriedades de construtivismo selectivo. Nesta perspectiva, o desenvolvimento evolui de pontos de estabilidade para outros pontos de estabilidade, isto é, de organizações construídas que sobreviveram à selecção, para outras organizações que sobreviveram à selecção. A mudança de um ponto de estabilidade para o próximo, deverá ser uma mudança “próxima” relativamente aos processos de construção disponíveis e aos respectivos recursos. Segundo Bickard (1992), a chave para a natureza funcional de “scaffolding” advém do facto de, tanto a estabilidade funcional como a sua função oposta – a selecção – não serem propriedades intrínsecas nem do sistema nem do seu meio ambiente, mas serem, isso sim, propriedades relativas das relações funcionais entre sistema e meio. Deste modo, se certas pressões selectivas podem ser bloqueadas ou suspensas, então certos aspectos de construção selectiva – que não teriam sido concretizáveis de outra forma – tornam- se uma realidade, permitindo pontos de estabilidade, em relação a esse ambiente modificado. Se foram

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sistema poderá ser capaz de percorrer a trajectória desenvolvimental resultante até atingir um ponto de estabilidade não artificial, o qual já não necessite de bloqueamento das pressões selectivas normais. Funcionalmente o “scaffolding” é a criação destas trajectórias de desenvolvimento potencial através do estabelecimento de pontos próximos de estabilidade. Assim, seria só parcialmente correcto afirmar que a função de “scaffolding” é permitir à criança atingir algo que ela não conseguiria, de outra forma, atingir sozinha – permite, além disso, à criança desenvolver competências, fornecendo- lhe os tais bloqueamentos de pressões selectivas normais. “Scaffolding” reduz a complexidade dos problemas dividindo-os em componentes manejáveis pela criança, que ela tem possibilidade real de resolver. Pode-se conseguir isto, reduzindo a complexidade das exigências de pressões selectivas normais ou fornecendo recursos que seriam, de outra forma, inacessíveis. Funcionalmente ambas as abordagens atingem o mesmo objectivo. Os adultos podem realizar, e de facto realizam, tais funções em relação às crianças, e por vezes crianças mais velhas fazem-no relativamente a crianças mais novas.

No entanto, na visão habitual de “scaffolding” seria uma contradição interna posicionar uma pessoa como fornecendo “scaffolding” a si própria, visto que este conceito tem sido visto como colocar ao alcance da criança conhecimento ou capacidades que de outra forma estariam ausentes. A noção da criação de pontos de estabilidade que de outra forma estariam ausentes não requer necessariamente a circularidade da ideia de “já saber o que se necessita saber” de forma a construi-- lo. Nesta visão interactiva de construtivismo selectivo, a noção de “self-scaffolding” torna-se tanto possível como importante. Esta noção será posteriormente relacionada com os aspectos de controlo

contingente da criança sobre o meio e de iniciação (capacidade para iniciar interacções) referidos

por McWilliam & Bailey (1992), integrados na noção de competência e implicados em diferentes níveis de envolvimento (“engagement”).

Segundo Bickard (1992) “scaffolding” é essencialmente a redução das exigências do problema tendo em vista a eventual resolução da totalidade do problema. Assim, qualquer forma de simplificar um problema cognitivo ou social, facilitando a resolução do problema inicial, constitui uma versão de “scaffolding”. Suspender temporariamente as restrições que inibem a resolução do problema, dividir problemas em sub-problemas, pensar em casos ideais, utilizar analogias com situações mais bem solucionadas – todos estes exemplos demonstram que o desenvolvimento do “self-scaffolding” é essencial e central no desenvolvimento cognitivo. Jogo simbólico, jogos de regras, relações equalitárias e hierárquicas com pares, são exemplos de domínios de tarefas que proporcionam um “scaffolding mútuo” e que ajudam a formar trajectórias desenvolvimentais que promovem a competência social e o auto-respeito.

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“scaffolding”, mas também inclui a possibilidade de “scaffolding” através de materiais físicos, tais

como os materiais Montessori, ou do “scaffolding” social de competências não sociais, tais como atirar uma pedra ou apanhar uma bola. Engloba ainda um leque de “self-scaffoldings” tais como o desenvolvimento de competências implicadas na utilização de recursos não culturais (e.g.,. a utilização de um tranquilizador emocional).

2.2.1.2.4. Zona de Desenvolvimento Próximo (ZDP) – uma abordagem da actividade em contexto:

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