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OS ENTRELAÇAMENTOS

No documento NOVOS TEMPOS, MESMAS HISTÓRIAS (páginas 38-48)

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Scripta Alumni - Uniandrade, n. 13, 2015.

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Por muito tempo, desde a Antiguidade até o surgimento da escola francesa, e sua posterior hegemonia, a arte do ator ou do comediante6, como era chamado, estava totalmente atrelada aos tratados da retórica e muitas vezes associada à figura do orador ou declamador. A escola francesa era alvo de inúmeras críticas em datas anteriores aos acontecimentos narrados por Goethe em seu romance. Em 1694, o ator e dramaturgo italiano Evariste Gherardi que chegara à França anos antes, criticava o ator que “recita o que aprendeu de cor, sem levar em conta seu parceiro, numa furiosa impaciência de se livrar do papel, ao contrário do comediante italiano que interpreta tudo o que diz” (ASLAN, 2005, p. 6).

Os estudos do texto tinham como tendência geral lê-los como uma continuidade e não apenas como fragmento de um todo. Existia então, no fragmento do romance destacado na página anterior, uma preocupação explícita com o estudo preliminar deste texto: as indicações presentes no texto, suas pontuações e do jogo, que poderia surtir a partir deste. Pierre Regnier, professor do Conservatório francês, em seu estudo O Tartufo dos comediantes (1896), trazia um panorama de interpretações mais antigas do papel principal – a partir do texto Tartufo, de Molière. Ele anotava verso por verso “a motivação de uma palavra posta em relevo ou uma pausa respiratória” (ASLAN, 2005, p. 27). Parece-me que a intenção de Regnier era a criação de um método, pois ele mesmo declarava que levou anos que compreender sozinho todos esses elementos e lamentava não ter tido acesso a mestres e escritos que pudessem tê-lo ajudado nessa empreitada. Outro professor da época, Louis Jouvet, também da escola francesa, trazia algumas inovações relacionadas ao primeiro contato dos atores com o texto:

É preciso ler o texto como se não nos pertencesse, até que, de tanto ler as frases, de repente tenhamos um sentimento de tal modo vivo, de tal modo profundo dessa pessoa, que dizemos para nós mesmos:

vou tentar dizê-los como ela as diria. Infelizmente não fazemos isso.

Tomamos o texto e dizemos a nós mesmos: vou representá-lo.

(JOUVET, citado em ASLAN, 2005, p. 32)

Notamos que Goethe, talvez influenciado pela viagem que fez à Itália (1786-1788), traz ideias inovadoras ao contexto teatral alemão, através da narrativa de Meister, contrariando os preceitos vigentes e mais aceitos pelos artistas da época, na escola francesa.

6 “O termo comédien, na maioria das vezes é traduzido como ator. Especificamente em português, ele é atrelado apenas ao gênero cômico. Mas, a partir de uma perspectiva clássica, para Jouvet e Diderot, ambas as palavras possuem especificações distintas. O ator é aquele e só pode interpretar papeis que correspondem ao seu emploi ou à sua imagem e o comediante aquele que pode desempenhar todos os tipos de papeis, independente de suas características físicas” (PAVIS, 2005, p. 57).

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Passamos ao próximo fragmento, onde durante os ensaios da peça Hamlet, de Shakespeare, que seria encenada pela trupe comandada por Serlo e Meister, duas figuras “aficionadas por teatro”7, davam grandes contribuições para as cenas:

A presença desses dois homens se revelou bastante útil aos ensaios.

Haviam convencido sobretudo nossos atores de que, durante os ensaios, deveriam sempre unir o gesto e a ação à palavra, tal como pensavam fazer durante a apresentação, e através do hábito juntar tudo aquilo de um modo mecânico. Especialmente com as mãos não deveriam fazer nenhum movimento vulgar, mesmo que fosse durante o ensaio de uma tragédia; o ator trágico que no ensaio, se pusesse a tomar rapé, era para eles motivo de temor, pois tinham por muito provável que, durante tal passagem no decorrer da representação, daria por falta da pitada de rapé. Eram inclusive da opinião de que nenhum ator deveria ensaiar com botas, se fosse representar com sapatos. Mas nada, asseguravam eles, nada lhes causava mais aflição que ver durante os ensaios mulheres com as mãos escondidas nas dobras das saiais. (GOETHE, 2009, p. 304)

No trecho retirado do romance de Goethe, notamos o termo ensaio no início do fragmento. Comumente, segundo Patrice Pavis, podemos entendê-lo como:

“Trabalho de aprendizagem do texto e do jogo cênico efetuado pelos atores (...)” (PAVIS, 2005, p.129). Porém, atentando para a variação que o termo sofre de acordo com o contexto linguístico8, o pesquisador francês, salienta, a partir das ideias do diretor Peter Brook, que:

(...) a palavra francesa evoca um trabalho quase mecânico, ao passo que os ensaios se desenvolvem cada vez de maneira diferente, e são, às vezes criativos. Se não o fossem ou se se prolongassem na repetição infinita da mesma peça, a morte do teatro seria rapidamente perceptível. O alemão probe ou o espanhol ensayo (“tentativa”) traduz melhor a ideia de experimentação e de tateio antes da adoção da solução definitiva. (PAVIS, 2005, p. 129, ênfase no original)

7Estes “aficionados por teatro” eram os chamados Dramaturg. O primeiro Dramaturg foi Lessing: sua Dramaturgia de Hamburgo (1767), coletânea de críticas e reflexões teóricas, está na origem de uma tradição alemã da atividade teórica e prática que precede e determina a encenação de uma obra. “O alemão distingue, diversamente do francês, o Dramatiker, aquele que escreve as peças, do Dramatur, que é quem prepara sua interpretação e sua realização cênica. As duas atividades são desenvolvidas simultaneamente pela mesma pessoa” (PAVIS, 2005, p. 117).

8 Podemos verificar, por exemplo: no francês: répétition; no inglês: repetion, reherseal; no alemão: probe; e no espanhol: ensayo.

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Não podemos deixar de destacar que, mesmo que o enfoque de Brook seja numa perspectiva mais contemporânea, o fragmento do romance mostra que existe a tentativa de uma visão mais arrojada em relação ao teatro que era feito e praticado no contexto de Meister.

Mostra-se no trecho acima, o início de uma preocupação com o gestual, diferente do que se ensinava na formação tradicional do ator, onde a educação corporal era quase nula ou inexistente. A maioria dos professores eram mestres na arte do dizer. Os atores da época não tinham o costume de ensaiar continuamente. Para entrar em cena e apresentar uma peça para o público, apenas deveriam seguir algumas normas pré-estabelecidas, além dos manuais de retórica, já mencionados anteriormente.

Cito algumas destas normas: nunca dar as costas para o público, respeito à cruz cênica (os pés deveriam estar com as pontas separadas) e a posição ereta. Procedimentos que não possuem critérios suficientes para que alguém consiga se tornar um ator, no mínimo, mediano, na arte da atuação.

Os primeiros estudos do corpo como um todo que se têm notícias, são as pesquisas de François Delsarte (1811-1879). Delsarte criou seu Curso de estética aplicada, a partir de suas observações sobre os sentimentos exprimidos na vida real, da tradição clássica e de aulas de anatomia. Seu curso era frequentado por uma gama de artistas de diferentes áreas: pintores, compositores, atores, cantores, além de padres e advogados. Deste curso criou dois grandes fundamentos: a Lei da Correspondência e a Lei da Trindade. Em linhas gerais, ele supunha que “a cada função do espírito corresponde uma função do corpo, a cada grande função do corpo corresponde um ato do espírito” (ASLAN, 2005, p. 37). Delsarte acreditava que o gesto exprimia muito mais que palavras, e, que este deveria partir do coração, com o auxílio da respiração e dos músculos do intérprete. Dividia a emanação dos gestos a partir de nove regiões diferentes, englobadas em três focos (abdominal, epigástrico e torácico) chegando assim à Lei da Trindade, citada acima.

Alguns estudiosos acreditam que por influência da proposta delsartiana, o músico Emile Jacques-Dalcroze criou a ginástica rítmica, primeiro como resposta aos bailarinos da época por esquecerem de que o movimento interior é que dava sentido à expressão e à ação. Seus princípios partem do questionamento das relações entre música e movimento e entre a voz e os gestos. Acredita-se que exista o senso rítmico muscular “que faz de nosso corpo o instrumento em que se representa o ritmo, o transformador onde os fenômenos do tempo se transformam em fenômenos do espaço” (DALCROZE, citado em ASLAN, 2005, p. 41). Como o próprio nome sugere, a técnica parte de exercícios simples tendo como fio condutor a utilização da respiração e outros temas rítmicos. O primeiro a aproximar esta técnica ao teatro foi o diretor Adolphe Appia, que colaborou com Dalcroze. Tanto os estudos de Delsarte como a rítmica de Dalcroze influenciaram os estudos de Jacques Copeau, Constantin Stanislavski e outros estudiosos que iniciaram um método propriamente dito de ensino para os intérpretes, constituindo um novo modo de formação artística.

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Copeau em sua tentativa de desconstruir o ator, de todos os seus defeitos e manias, funda em 1913 a Escola Vieux-Colombier9, dedicando-se à renovação da arte dramática. Dentre seus inúmeros ensinamentos (ginástica-rítmica, acrobacia, dança entre outros), estavam treinamentos específicos como a esgrima.

Em outro trecho do romance de Goethe, os “aficionados pelo teatro”

sugerem que todos aqueles atores que fossem representar papéis de militares, deveriam aprender a lutar, outro exemplo de que Goethe estava avançado em relação aos discursos que eram proferidos sobre a arte do teatro em outros pontos da Europa.

Ainda sobre os procedimentos utilizados durante os ensaios da peça, Goethe nos mostra sua preocupação, através de Meister e dos “aficionados” em transformar os atores e, consequentemente, o teatro, a partir de técnicas de aperfeiçoamento. Podemos destacar outros trechos que nos levam a pensar desta maneira: “(...) recomendar expressamente aos atores o seguinte ponto fundamental: o dever que tinham de falar em voz alta e clara” (GOETHE, 2009, p. 305). E, para tanto, sugeria exercícios como este:

Este [Meister] pediu a todos que, durante os ensaios, se sentassem nos cantos mais distantes e batessem com uma chave no banco toda vez que não ouvissem claramente. Ele articulava bem, expressava-se com moderação, subia o tom gradualmente e não gritava nem mesmo nas passagens mais violentas. A cada novo ensaio ouvia-se menos o bater das chaves; pouco a pouco os outros foram aceitando a mesma operação, e já se podia esperar que ao final da peça fosse ouvida por todos em todos os cantos da casa. (GOETHE, 2009, p. 305)

A normatização de um método interpretativo moderno e relativo à peça que seria montada só apareceria com estes locais de experimentação, criados por Copeau, na França; por Stanislavski, no Teatro de Arte de Moscou; e, mais tarde, por Grotowski, em Opole.

Outro fato interessante na obra é o papel que Meister ocupa no romance, que – além de adaptar, atuar e dirigir – cria todo o contexto artístico relacionado à montagem da peça Hamlet, antecipando o aparecimento de uma figura conhecida posteriormente na história da teoria teatral como encenador. Destaco três trechos do romance nos quais se evidencia esta figura, a partir de alguns fatores que envolvem uma encenação, como: escolha do recorte do texto, escalação do elenco e cenografia/espacialidade da cena.

9 Comumente traduzido como “Velho Pombal.

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(...) pude distinguir duas vertentes na composição desta peça: a primeira, refere-se às grandes e íntimas relações das personagens e dos acontecimentos, aos poderosos efeitos derivados dos caracteres e atos dos protagonistas (...) a segunda vertente que deve ser observada nessa peça, refiro-me às relações exteriores das personagens, pelas quais elas são levadas de um lugar ao outro (...).

Minha proposta, portanto, é não tocar absolutamente naquelas primeiras e grandes situações, conservando-as tão cuidadosamente quanto possível tanto em seu conjunto quanto ao seu detalhe, mas rejeitar de vez estes motivos exteriores, particulares, dispersivos e dispersadores, substituindo-se por um só. (GOETHE, 2009, p. 290)

Já haviam discutido previamente os papéis: Serlo faria Polônio;

Aurelie, Ofélia; Laertes já estava predestinado pelo próprio nome; um jovem recém-chegado atarracado e muito vivo, recebeu o papel de Horácio; quanto ao rei e ao espectro havia um certo embaraço.

(GOETHE, 2009, p. 293)

Deveríamos mostrá-los – dizia Wilhelm – em tamanho natural, no fundo da sala, ao lado da porta principal, e o do velho rei, com a armadura completa, como o espectro, deve estar pendurado justamente na parte da sala por onde ele entra. (GOETHE, 2009, p.

306)

Podemos concluir, segundo as palavras de Patrice Pavis, que o encenador é: “Pessoa encarregada de montar uma peça, assumindo a responsabilidade estética e organizacional do espetáculo, escolhendo os atores, interpretando o texto, utilizando as possibilidades cênicas à sua disposição” (PAVIS, 2005, p. 128). Continuando com as reflexões relativas ao termo, o autor ainda descreve que seu surgimento situa-se na primeira metade do século XIX, mas existiram indivíduos que praticavam ações semelhantes, que poderiam ser mencionados como seus precursores.

Na Antiguidade Clássica, o didascalo era o próprio autor e organizador; na Idade Média, existia o meneur de jeu, ou seja, o condutor do jogo. No Barroco e Renascimento eram os arquitetos ou cenógrafos que organizavam de acordo com o seu ofício e, por fim, no século XVIII, os atores Iffland e Schröder serão os grandes ensaiadores, coincidindo com a exposição de Goethe em seu romance.

Segundo Jean-Jacques Roubine (1998, p. 14), a encenação torna-se uma arte autônoma, somente a partir do ano de 1887, quando Antoine funda o Théâtre- Libre. Outros estudiosos elencam outras datas que marcam esta nova etapa da história do teatro. São elas: 1866, com a criação da companhia dos Meininguer; ou 1880, com

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chegada de iluminação elétrica na maioria das salas de teatro da Europa. Não há, portanto, um consenso entre os estudiosos, em relação ao surgimento exato do termo.

Inúmeros fatos desenvolvem-se nos últimos anos do século XIX para a chegada deste dito Teatro moderno, onde a encenação torna-se o centro de um intrincado maquinário teatral. Até aproximadamente os anos de 1840, existia uma fronteira, tanto geográfica quanto política, dos preceitos vindos da França e da estética shakespeariana. A partir de 1860, estas barreiras rompem-se e não existem maneiras de mantê-las restritas à apenas um determinado local. Começam a aparecer em diversas cidades da Europa, espetáculos com certas características que se compõem num movimento que será chamado de naturalismo. Grande parte deste êxito de uma multipolaridade cênica é em decorrência das turnês empreendidas pela companhia dos Meininger, por diversos países da Europa, excetuando-se a França, que, pelo que podemos supor, não aceitava as ideias vindas a partir da crítica intelectual do restante da Europa.

Podemos concluir que a partir desta época, o encenador passa a ser o grande responsável pela ordenação do espetáculo. Não só por todas as grandes inovações da época, mas também por um fator que ainda não foi mencionado: o público.

“(...) não há mais para os teatros, um público homogêneo (...) não existe mais nenhum acordo fundamental prévio entre espectadores e homens de teatro sobre o estilo e o sentido destes espetáculos” (DORT, citado em PAVIS, 2005, p.122).

Segundo Roubine, por convenção, considera-se Antoine o primeiro encenador do Teatro Moderno, pois foi o primeiro a imprimir uma assinatura na encenação como arte autônoma. Foi um grande inovador e soube como nenhum outro mesclar as inovações científicas com as práticas teatrais. Continuando com as reflexões de Pavis, este propõe a partir dos estudos do escritor francês Alain Veinstein duas definições para o termo encenação. Uma do ponto de vista do público e outra da perspectiva dos especialistas:

(...) o termo encenação designa o conjunto dos meios de interpretação cênica: cenário, iluminação, música e atuação (...). Numa acepção estreita, o termo encenação designa a atividade que consiste no arranjo, num certo tempo e num certo espaço de atuação, dos diferentes elementos de interpretação cênica de uma obra dramática.

(VEINSTEIN, citado em PAVIS, 2005, p.122)

Para que todos estes elementos estejam colocados harmoniosamente em cena, percebemos a necessidade de um indivíduo que possa criar sua obra, conciliando os diversos elementos cênicos. Sua decisão sobre a maneira de apresentá-los poderá privilegiar alguns elementos em detrimento de outros, criando assim uma coerência que, talvez, somente para o pensamento único do encenador faça sentido, mas

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assim que posta em cena mostra-se ao grande público como uma apresentação concreta e representável. Uma visão particular que dará forma à nova significação.

Percebemos alguns destes aspectos no personagem de Meister, quando este se coloca no papel de encenador. E também podemos perceber a preocupação de Goethe em colocar esta situação de aprendizado de Meister em destaque, utilizando o próprio teatro como metáfora para reflexão.

Numa passagem do texto em que há uma discussão entre Meister e Jarno – um misterioso personagem que posteriormente descobre-se fazer parte de uma sociedade secreta – este deixa claro que o teatro é um reflexo da vida. “Pois saiba, meu amigo (...), o que descreveu não foi o teatro, mas o mundo, e que poderia eu encontrar em todas as classes sociais personagens e ações suficientes para suas duras pinceladas”

(GOETHE, 2009, p. 417). Mas, como reforça Lukács, a escolha do contexto teatral e a peça de William Shakespeare, Hamlet, não foram um mero acaso.

(...) para Goethe a questão shakespeariana ultrapassa e muito a esfera do teatro. Shakespeare é, para ele, um grande educador para uma humanidade e personalidade; seus dramas são, para ele, modelos do modo como o desenvolvimento da personalidade atingiu a plenitude nos grandes períodos do humanismo e de como esse desenvolvimento deveria se completar no presente. (LUKÁCS, citado em GOETHE, 2009, p. 583)

CONCLUSÃO

Por esta breve análise, podemos afirmar que Goethe foi um grande fomentador da arte, estando sempre à frente de seu tempo. Auxiliou na construção de um teatro nacional, onde houvesse uma preocupação com a estética, aliada a dramas que se adaptassem aos diferentes países da Europa, como era o caso das peças de Shakespeare. Anteriormente à tentativa de criação deste teatro nacional, só havia os teatros feitos pelas trupes de comediantes itinerantes e o teatro feito, sob encomenda, pela corte. No período em que Goethe foi diretor do Teatro de Weimar, tomou suas melhores realizações e encenou Shakespeare, Schiller, Iffland e peças de sua própria autoria. Podemos concluir essas ideias, a partir da afirmação de Berthold:

As metas propostas e as realizações efetuadas no seu exercício da intendência teatral continuaram a exercer influência direta e às vezes indireta no teatro alemão. Berlim e Viena tinham estreitas ligações com Weimar; nos países de língua alemã, ambas tornaram-se foco do

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desenvolvimento e do destino da herança clássica e das formas classicistas. (BERTHOLD, 2001, p. 420)

Segundo a autora, Goethe é autor do manuscrito Regeln für Schauspieler10, que consiste num apanhado de anotações e notas, posteriormente coletadas por John Peter Eckermann, em 1824. Mesmo que este manual não se configure como uma obra de grande significação para a teoria do teatro universal e torne-se obsoleta se comparada a outras, sua importância no campo das artes cênicas calca-se em sua busca por uma linguagem que pudesse refletir a sociedade da época, construindo uma visão acerca de seu futuro, mesclando literatura e realidade. E uma destas importantes ações foi a problematização que propôs através de seu romance Os anos de aprendizado de William Meister, em que nos apresenta uma narrativa recheada de intrigas, desenlaces e revelações contundentes muito bem amarradas num contexto de um jovem burguês que busca sua formação através do teatro. Ao mesmo tempo, em que nos dá um panorama teatral da época em que foi escrito, antecipa em muitos aspectos os estudos relacionados à arte do teatro, que só deixariam grandes marcas anos mais tarde.

REFERÊNCIAS

ASLAN, O. O ator do século XX: evolução técnica, problema da ética. Tradução de Raquel Araújo de Baptista Fuser, Fausto Fuser e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 2005.

BERTHOLD, M. História mundial do teatro. Tradução de Maria Paula V. Zurawski, J.

Guinsburg, Sérgio Coelho e Clóvis Garcia. São Paulo: Perspectiva, 2001.

BROCA, B. A vida literária no Brasil – 1900. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1956.

CARLSON, M. Teorias do teatro: estudo histórico-crítico dos gregos à atualidade.

Tradução de Gilson César Cardoso de Souza. São Paulo: UNESP, 1997.

GOETHE, J. W. von. Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister. Tradução de Nicolino Simone Neto. São Paulo: 34, 2009.

MAAS, W. P. M. D. O cânone mínimo: o Bildungsroman na história da literatura. São Paulo: UNESP, 2000.

MAUGHAM, W. S. Os três romances de um poeta. In: _____. Pontos de vista. Rio de Janeiro: Globo, 1964, p. 1-40.

10 Regras para o ator (BERTHOLD, 2001, p. 418).

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PAVIS, P. Dicionário de teatro. Tradução de J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: Perspectiva, 2005.

ROUBINE, Jean-Jacques. A linguagem da encenação teatral. Tradução e apresentação de Yan Michalski. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

No documento NOVOS TEMPOS, MESMAS HISTÓRIAS (páginas 38-48)