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PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM PSICOLOGIA SOCIAL

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(1)

Maria Eduarda Abrantes Torres

Discursos de avós sobre o bebê, sua educação e cuidado

MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

(2)

Maria

Eduarda Abrantes Torres

Discursos de avós sobre o bebê, sua educação e cuidado

MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

Dissertação apresentada à

Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, como

exigência parcial para

obtenção do título de Mestre em Psicologia Social, sob a orientação da Profa. Dra. Fúlvia Rosemberg.

(3)

234f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP, 2013.

Página Linha Onde se lê Leia-se

38 Rodapé Rosemberg (2013) Rosemberg (2012)

56 27 A sociedade em geral

tem reconhecido a criança pequena como cidadã...

A sociedade em geral tem

começado a reconhecer a criança pequena como cidadã...

68 Tabela 02 Valor anual estimado

por aluno para os estados de

Pernambuco, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul (2012).

Valor anual estimado por aluno para os estados de Pernambuco, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul. Brasil, 2012.

69 Tabela 03 Valor anual estimado

por aluno para estados da região Nordeste (2012).

Valor anual estimado por aluno para estados da região Nordeste. Brasil, 2012.

70 Figura 02 Taxas de frequência à

creche ou escola por grupos de idade. Brasil (2000 e 2010).

Taxas de frequência à creche ou escola por grupos de idade. Brasil, 2000 e 2010.

70 Figura 02 Fonte: Rosemberg e

Artes (2012a).

Fonte: Rosemberg e Artes (2012a). Microdados dos Censos

Demográficos 2000 e 2010 (IBGE, 2012).

70 Tabela 04 Taxas de frequência à

creche ou escola, por faixas de idade e situação de domicílio. Brasil (2010).

Taxas de frequência à creche ou escola, por faixas de idade e situação de domicílio. Brasil, 2010.

70 Tabela 04 Fonte: Rosemberg e

Artes (2012a).

Fonte: Rosemberg (2012), ANPED. Microdados do Censo Demográfico 2010 (IBGE, 2012).

71 Tabela 05 Matrículas em educação

infantil por etapa, anos e grandes regiões. Brasil (2000 e 2010).

(4)

Básica 2000 e 2010 (MEC/INEP, 2000 e 2010).

72 Tabela 06 Tabela 06 Quadro

72 Tabela 06 Taxas de frequência à

creche ou escola de crianças de 0 a 6 anos por localização e

variáveis selecionadas. Brasil (2010)

Taxas de frequência à creche ou escola de crianças de 0 a 6 anos por localização e variáveis

selecionadas. Brasil, 2010

72 Tabela 06 Fonte: Rosemberg e

Artes (2012b).

Fonte: Rosemberg e Artes (2012b). Microdados do Censo Demográfico 2010 (IBGE, 2012).

74 Figura 03 Percentual de

distribuição da população de 0 a 5 anos por regiões – Pernambuco, censo demográfico (2010).

Percentual de distribuição da população de 0 a 5 anos por regiões – Pernambuco, Censo Demográfico 2010. Brasil, 2010.

74 Tabela 07 População de 0-3 e 0-5,

matrícula em creches e pré-escolas, taxas de atendimento, demanda reprimida –

Pernambuco (2011).

População de 0-3 e 0-5, matrícula em creches e pré-escolas, taxas de atendimento, demanda reprimida – Pernambuco, 2011.

161 10 São Paulo: Cortez

Editora, 2003;

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(6)
(7)

AGRADECIMENTOS

À minha amada família: meus pais, Maria Fernanda e Flávio Torres; meu marido, Rodrigo Travassos; meus irmãos, Daniel e Pedro Torres; meus avós, tias e tios, primos e primas, sogro e sogra, cunhadas, sobrinhos, pelo incentivo, apoio e carinho.

À minha orientadora, Fúlvia Rosemberg, pela disponibilidade em dividir e multiplicar seu conhecimento, por tudo que me ensinou.

Aos colegas do Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade (NEGRI), Carla Santos, Carlos Temperini, Lourdes Secanechia, Elcimar Pereira, Alciene Ferreira, Marta Lúcia, Miguel Pereira, Renata Ishida, entre outros, e em especial Maria Sílvia Ribeiro, pela amizade e apoio.

À Pricila Gunutzmann, colega de mestrado que me acompanhou durante todo o percurso e se tornou uma grande amiga.

Às professoras Ana Maria de Araújo Mello e Luciana Maria Giovanni, pela participação como banca examinadora e consequente colaboração e contribuição com essa pesquisa e meu aprendizado.

Aos professores do programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Social.

À secretária do programa Marlene Camargo, pela disponibilidade e auxílio durante todo o processo, desde o meu ingresso no Mestrado até a última etapa.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), pela concessão da bolsa que possibilitou a realização dessa pesquisa.

Às amigas Letícia Souto e Liana Feldman, pelo incentivo e leitura atenta do meu pré-projeto.

Às amigas Mariana Albuquerque e Juliana Barreto, pelo suporte e acolhida em São Paulo, fazendo-me sentir mais perto de casa.

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“Na casa da minha vó Muita coisa boa há Muitos primos, muitos tios

Muita comida que dá Pra alimentar todo mundo Que vive passando lá (...)

Vovó me leva ao parque E depois para lanchar Me dá banho, me perfuma

Vive me dizendo que Ela que vai me criar (...)

Na casa da minha vó Eu me divirto, eu aprendo

Pois é como ela me diz Que o tempo passa correndo

Mas se a gente for com ele Vai continuar vivendo (...).”

(9)

RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivo geral descrever e interpretar discursos de mulheres-avós sobre a educação e o cuidado de bebês. A investigação se insere na linha de Pesquisa do NEGRI - Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, coordenado pela professora doutora Fúlvia Rosemberg, que vem estudando o processo de construção social da infância no Brasil. Inserida no grupo de pesquisas que investiga discursos proferidos por atores sociais contemporâneos sobre o bebê, sua educação e cuidado, esta dissertação busca colaborar com a construção de uma concepção de cuidado e educação de bebês que inclui a creche de qualidade como direito das crianças de 0-3 anos. Para tanto temos problematizado a construção da agenda de políticas públicas para a infância brasileira contemporânea, nomeadamente a posição subalterna destinada à pequena infância nas políticas educacionais. Adotamos os aportes teóricos dos Estudos Sociais da Infância, que consideram essa fase uma construção social e histórica e a criança um ator social, isto é, também produtor de cultura; dos estudos sobre a construção de problemas sociais, que têm permitido desnaturalizar a concepção de que a agenda de políticas sociais seria tradução de necessidades sociais objetivas. O método adotado foi hermenêutica de profundidade (HP). Foram entrevistadas quatro mulheres-avós com nível superior de escolaridade, residentes na cidade do Recife e pertencentes às camadas médias urbanas da população, que possuem neto(a)(s) na faixa etária de 0 a 3 anos de idade. As entrevistas foram transcritas e analisadas utilizando técnicas de análise de conteúdo baseadas em Bardin e Rosemberg. De uma maneira geral, apreendemos que as avós dispõem de poucas experiências concretas ou informações atuais sobre a creche e as políticas públicas para o bebê, entretanto, estão conscientes que faltam vagas nas creches públicas. Apesar de, em sua maioria, as entrevistadas terem afirmado que já haviam pensado sobre o direito do bebê à creche, aparentemente não o compreendem como um direito para todos os bebês, inclusive seus próprios netos, mas apenas para aqueles que necessitam, para pessoas de camadas menos favorecidas. Destacamos que para as avós entrevistadas, a mãe, no espaço privado de sua própria casa, seria a melhor opção de cuidado e educação do bebê até o ingresso na escola. A avó seria a segunda melhor opção, sendo protagonista ou apenas supervisora de uma babá/empregada doméstica de confiança, terceira opção de educação e cuidado mais citada. A creche apareceu como última alternativa, para os casos em que as mães precisem trabalhar e não tenham alguém de confiança com quem deixar seus filhos.

(10)

ABSTRACT

This study aims to describe and interpret general discourse of grandmothers on babies’ education and care. It integrates the Center for Research on Gender, Race and Age (NEGRI), of the Social Psychology Postgraduate Study Program of the Pontifícia Universidade Católica of São Paulo, coordinated by Professor Fúlvia Rosemberg, who has been studying the process of social construction of childhood in Brazil. Inserted in the research group that investigates speeches by contemporary social actors about the baby, its education and care, this dissertation seeks to collaborate with the construction of a conception of care and education for babies including the right to quality child care education for children from 0-3 years old. For this purpose, we have questioned the construction of the public policy agenda for the Brazilian contemporary childhood, including the subordinate position proposed for early childhood educational policies. We have adopted the theoretical contributions of Social Studies of Childhood, which consider this stage a social and historical construction and the child a social actor, that is, also a producer of culture; the studies on the construction of social problems have allowed us to denaturalize the idea that the social policy agenda would be a translation of the objective social needs. The method adopted was depth hermeneutics (HP). We interviewed four grandmothers with higher level of education, living in the city of Recife and belonging to the middle class urban population, who have grandchildren aged 0-3 years old. The interviews were transcribed and analyzed using content analysis techniques based on Bardin and Rosemberg. In general, we apprehended that the grandmothers have few concrete experiences or current information about the daycare and public policies for the baby, however, are aware of the lack of vacancies in daycare centers. Although, in most cases, the interviewees stated that they had already thought about the baby’s right to a daycare center, they apparently do not understand it as a right for all babies, including their own grandchildren, but only for those who need, for people of disadvantaged social classes. We note that for the grandmothers interviewed, the mother, in the private space of her own home, would be the best option for baby care and education until it enters school. Grandmothers would be the second best option, being a protagonist or just a supervisor of a reliable nanny/maid, third most cited choice of education and care. The daycare center appeared as a last resort for cases where mothers have to work and do not have someone reliable to leave their children with.

(11)

LISTA DE QUADROS

Quadro 01 - Produções do NEGRI. 16

Quadro 02 - Linha do tempo da EI brasileira. 64

Quadro 03 - Descrição das subescalas avaliadas. 78

Quadro 04 - Dissertações e Teses da base de dados da CAPES com os termos avós/avô/avó no título (1987-2011).

90

Quadro 05 - Caracterização das entrevistadas. 108

Quadro 06 - A sociedade e/ou o Estado têm responsabilidade sobre os bebês?

109

Quadro 07 - Responsabilidades da sociedade e/ou do Estado com relação aos bebês.

110

Quadro 08 - Interesse de adultos e políticos pelos bebês. 111

Quadro 09 - Concepção de bebê. 115

Quadro 10 - Palavras usadas para se referir aos netos/aos bebês e uso de diminutivos.

116

Quadro 11 - Concepção de criança pequena. 117

Quadro 12 - Diferenças entre o bebê e a criança pequena. 118

Quadro 13 - Pessoa/instituição responsável pela educação e cuidado (avós, entrevistadas, filhos, netos).

120

Quadro 14 - Idade de ingresso na creche ou pré-escola (avós entrevistadas, filhos, netos).

122

Quadro 15 - Período ideal de licença maternidade e paternidade. 123

Quadro 16 - Conhece alguém que utiliza a creche? 130

Quadro 17 - Nomenclatura/termo utilizado para se referir à creche. 131

Quadro 18 - Aspectos que diferenciam/podem diferenciar creches públicas e privadas.

132

Quadro 19 - Creche de boa qualidade. 135

Quadro 20 - Creche de má qualidade. 136

Quadro 21 - Apoio à educação dos netos em creche. 137

Quadro 22 - Idade ideal para ingresso na creche ou pré-escola/Horário ideal de funcionamento da creche e da pré-escola.

138

Quadro 23 - O que é ser avó. 139

(12)

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 - Formas de investigação da hermenêutica. 52 Figura 02 - Taxas de frequência à creche ou escola por grupos de

idade. Brasil (2000 e 2010). 70

Figura 03 - Percentual de distribuição da população de 0 a 5 anos por

Regiões - Pernambuco, censo demográfico 2010. 74 Figura 04 - Produções localizadas no banco de teses e dissertações da

(13)

LISTA DE TABELAS

Tabela 01 - Investimentos financeiros em educação no Brasil - gasto

anual por aluno (2009). 68

Tabela 02 - Valor anual estimado por aluno para os estados de Pernambuco, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul (2012). 68 Tabela 03 - Valor anual estimado por aluno para estados da região

Nordeste (2012). 69

Tabela 04 - Taxas de frequência à creche ou escola, por faixas de idade

e situação de domicílio. Brasil (2010). 70

Tabela 05 - Matrículas em educação infantil por etapa, anos e grandes

regiões. Brasil (2000 e 2010). 71

Tabela 06 - Taxas de frequência à creche ou escola de crianças de 0 a 6 anos por localização e variáveis selecionadas. Brasil (2010).

72

Tabela 07 - População de 0-3 e 0-5, matrícula em creches e pré-escolas, taxas de atendimento, demanda reprimida - Pernambuco (2011).

74

Tabela 08 - Comparações Censo Escolar 2011 e 2012 – resultados

preliminares. 75

Tabela 09 - Taxas de atendimento por população – Pernambuco vs.

Brasil. 76

Tabela 10 - Percepção da responsabilidade sobre a criança Nordeste

vs. Sudeste (2012). 87

Tabela 11 - Avaliação das creches pelos residentes em regiões do

Brasil (2012). 88

(14)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEDEPLAR Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais

CF/88 Constituição Federal de 1988 CLT Consolidação das Leis do Trabalho COEDI Coordenação de Educação Infantil DCB Departamento da Criança no Brasil DNCr Departamento Nacional da Criança ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

EI Educação Infantil

ERIC Education Resources Information Center FACE Faculdade de Ciências Econômicas

FEIPE Fórum em Defesa da Educação Infantil em Pernambuco FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação

Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e da Valorização do Magistério

HP Hermenêutica de Profundidade

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada LBA Legião Brasileira de Assistência

LDBEN 9.394/96 Lei de Diretrizes e Bases da Educação MEC Ministério da Educação e Cultura

(15)

NEGRI Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade

OCDE Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico

ONGs Organizações Não Governamentais

ONU Organização das Nações Unidas

PAC Programa de Aceleração do Crescimento

PDE Plano de Desenvolvimento da Educação

PIB Produto Interno Bruto PL 2654/2003 Projeto de Lei 2654/2003

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNE Plano Nacional de Educação

PROINFÂNCIA Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil

SCIELO Scientific Electronic Library Online

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

(16)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...15

2 TEORIAS E MÉTODO...21

2.1 Construção de problemas sociais...21

2.2 Estudos Sociais da Infância ...33

2.2.1 Os diferentes enfoques teóricos dos Estudos Sociais da Infância...40

2.2.2 O enfoque estrutural...42

2.2.3 Tensões que perpassam o campo...46

2.3 Método: hermenêutica de profundidade...50

3 CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO...55

3.1 Creches no Brasil...55

3.1.1 Um pouco de história...57

3.1.2 Dados sobre o Brasil e Pernambuco...66

3.1.3 Estudos sobre demanda...80

3.2 Avós no Brasil contemporâneo...88

3.2.1 Envelhecimento da população: dados demográficos...92

3.2.2 Avós e cuidados com os(as) netos(as)...93

4 ENTREVISTANDO AS AVÓS...100

4.1 Procedimentos ...100

4.1.1 Escolha dos sujeitos...100

4.1.2 Realização das entrevistas...101

4.1.3 Procedimentos para análise...104

4.2 Resultados...106

4.2.1 Apresentação das entrevistadas...106

4.2.2 Os temas analisados...107

(17)

4.2.4 Análise das entrevistas...109

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...146

REFERÊNCIAS...150

APÊNDICE A - Transcrição das entrevistas...162

(18)

1 INTRODUÇÃO

Esta pesquisa tem como objetivo geral descrever e interpretar discursos de mulheres que são avós sobre a educação e o cuidado de bebês. A investigação se insere na linha de pesquisa que vem estudando o processo de construção social da infância no Brasil no Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade (NEGRI) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), coordenado pela professora doutora Fúlvia Rosemberg.

Em seu conjunto, as pesquisas do NEGRI têm contribuído para a constituição de um campo de estudos que visa tirar a pequena infância da invisibilidade. Além disso, objetivamos colaborar com a construção de uma concepção de cuidado e educação de bebês que concebe a creche de qualidade como direito das crianças de 0 a 3 anos. Por conseguinte, temos problematizado a construção da agenda de políticas públicas para a infância brasileira contemporânea, nomeadamente a posição subalterna destinada à pequena infância nas políticas educacionais.

Alguns indicadores como a qualidade insatisfatória e a insuficiência de vagas nas creches, além da diferença entre o número de crianças que frequentam a pré-escola e a creche, apontam para a desvantagem e a posição subalterna da pequena infância, ou seja, dos bebês, em relação às crianças mais velhas. De acordo com o Censo Demográfico de 2010, a frequência à EI de crianças na faixa etária de 0 a 3 anos era de 23,5%, já para aquelas com idade de 4 a 5 anos, a taxa chegou a 80,1% (ROSEMBERG; ARTES, 2012a).

É importante explicitar que, no NEGRI, concebemos o bebê como a criança com idade entre 0 e 3 anos e a creche como a instituição coletiva de educação e cuidado para a criança de até 3 anos de idade conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96 (LDBEN/96). Concebemos ainda a infância como uma categoria social no contexto das relações de idade como etapa subordinada à etapa adulta. Consideramos, portanto, que as relações de idade, além das relações de gênero, raça/etnia, classe e nação, sustentam e produzem relações de dominação (ROSEMBERG, 2010a).

(19)

sido apreender o tratamento dado por diversas mídias para adultos – acadêmicas e não acadêmicas – a temas ligados à infância. Essas pesquisas podem ser divididas em dois subgrupos: o primeiro aborda temas considerados sensacionalistas ou demarcados como “problemas sociais” na agenda da política social brasileira; e o segundo, mais atual, a creche e o bebê na mídia.

Quadro 01 - Produções do NEGRI1

Ano Título Autor(a)

2008 A criança pequena, seu cuidado e educação nos discursos de homens-pais Bárbara Radovanski Galvão

2010 O bebê, sua educação e cuidado em discursos de mães de camadas médias Elaine Cardia Laviola

2011 Uma interpretação à luz da ideologia de discursos sobre o bebê e a creche captados em cursos de Pedagogia da cidade de São Paulo

Lourdes Pereira de Queiroz Secanechia

2000 O discurso acadêmico sobre gravidez na adolescência: uma produção

ideológica? Gabriela Junqueira Calazans

2001 Prostituição infanto-juvenil e mídia: estigmatização da pobreza e ideologia Leandro Feitosa Andrade

O tema trabalho infanto-juvenil na mídia: uma interpretação ideológica Rosângela Ramos de Freitas

O discurso da mídia sobre a adolescente grávida: uma análise da ideologia Leila Nazareth

2005 A categoria "meninos de rua" na mídia: uma interpretação ideológica Marcelo Pereira de Andrade

2008 Infância associada ao tema aborto voluntário em peças jornalísticas

publicadas no jornal online da Folha de S.Paulo Vanessa Monteiro Bizzo

2009 O tema trabalho infanto-juvenil em artigos acadêmicos de psicólogos(as): uma interpretação ideológica Renata Lopes Costa Prado

2010 Direitos da criança e do adolescente: marcos legais e mídia Carmem Lúcia Sussel Mariano

Discursos sobre a creche na revista Pais e Filhos: análise da ideologia Leila Nazareth

Concepção de creche em revistas brasileiras de Pediatria: uma interpretação

a partir da ideologia Flávio Urra

2012 Discursos sobre creche no jornal Folha de S. Paulo on line (1994-2009) Carla Pellicer dos Santos

O bebê sua educação e cuidado

A infância como problema social

A creche e o bebê na mídia

2011 2004

Fonte: elaborado pela autora.

Nesta dissertação daremos continuidade ao grupo de pesquisas que tem investigado discursos de atores sociais adultos e urbanos contemporâneos sobre o bebê, sua educação e cuidado, complementando, então, as pesquisas: A demanda e escolha das mães por Educação Infantil: um novo tema para o estudo da Educação Infantil (LIMA, 2004), A criança pequena, seu cuidado e educação nos discursos de homens-pais (GALVÃO, 2008), O bebê, sua educação e cuidado em

(20)

discursos de mães de camadas médias (LAVIOLA, 2010) e Uma interpretação à luz da ideologia de discursos sobre o bebê e a creche captados em cursos de Pedagogia da cidade de São Paulo (SECANECHIA, 2011).

Juntamente com as pesquisas de Lima (2004), Galvão (2008) e Laviola (2010), que analisaram discursos de pais e mães, formamos um subgrupo que tem abordado os discursos de atores sociais em posição geracional, ou seja, de membros adultos da família sobre o bebê, sua educação e cuidado. Nossa proposta política é a de dar visibilidade aos direitos à educação do bebê na política de creche. Para tanto, nesta dissertação entrevistamos quatro mulheres-avós com nível superior de escolaridade, residentes na cidade do Recife e pertencentes às camadas médias urbanas da população, cujos netos têm até 3 anos de idade.

De uma maneira geral, nossas pesquisas têm identificado discursos sobre o bebê que indicam a reduzida visibilidade pública do mesmo – geralmente vinculando-o ao espaço privado – e ausência de discussão sobre as políticas de Educação Infantil (EI) para esse grupo de idade, ou seja, sobre as políticas de creche como direito de bebês e familiares. Os bebês são geralmente descritos como frágeis e dependentes e a concepção de creche é negativa, associada à ideia de “risco” e de serviço de baixa qualidade, além de ser indicada apenas nos casos em que a mãe não tem condições de realizar a tarefa de educar e cuidar no espaço doméstico (LIMA, 2004; GALVÃO, 2008; LAVIOLA, 2010; SECANECHIA, 2011). Além desses dados, pesquisas mais recentes sobre a imagem da creche na mídia indicam que esta é tratada como instituição em crise, estigmatizada, não recebendo destaque como assunto de política social (NAZARETH, 2011; URRA, 2011; SANTOS, 2012).

Estando os bebês associados à esfera do privado e a creche associada principalmente à baixa qualidade e à crise, destaca-se o reduzido prestígio do direito à educação dos bebês nas negociações da agenda de políticas sociais. Por isto importa, aos(às) pesquisadores(as) do NEGRI, apreender como atores sociais adultos – portanto com acesso ao exercício do poder em diferentes esferas da vida social – concebem o dever do Estado e da sociedade para com a educação dos bebês.

(21)

(2008) e Lima (2004) serviram de inspiração para a presente pesquisa.

Por outro lado, diversos autores(as) têm mencionado a ativa atuação de avós do sexo feminino no apoio (aos seus filhos/as e noras) quanto à educação e cuidado de seus netos, o que aponta para indícios de solidariedade feminina entre gerações. A mulher-avó busca conciliar a própria independência, vida pessoal e a ajuda na educação e cuidado dos netos (LINS DE BARROS, 1987; ROCHA-COUTINHO 1998 apud CARDOSO, 2011; DESSEN; BRAZ, 2000; VITALE, 2003; SILVA; SALOMÃO, 2003; RAPOPORT, 2003; LOPES; NERI; PARK, 2005; MOREIRA; BIASOLI-ALVES, 2007; ARAÚJO; DIAS, 2010; CARDOSO, 2011).

Segundo dados do Na Medida, Boletim de Estudos Educacionais do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP, 2009), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2007, a proporção de crianças com idade entre 0 e 5 anos que não frequentam a EI é maior em famílias que têm a presença de avós, maternas ou paternas, as quais, muitas vezes, assumem o papel de cuidadoras.

Na pesquisa de Laviola (2010) todas as oito mães entrevistadas, exceto uma, relataram ter tido ajuda da própria mãe ou sogra nos primeiros dias em casa com os seus bebês. Dentre as quatro mães que já haviam retornado ao trabalho, três escolheram a avó materna como opção de cuidado para a criança. Nessa perspectiva, concebemos as avós como atores sociais importantes que produzem e reproduzem concepções, ideias e noções de educação e cuidado de bebês.

Assim, questionamos: por que a sociedade, especialmente os familiares – pais, mães e os avós – de bebês com idade entre 0 e 3 anos não reivindicam, mais intensamente, a oferta de vagas em creches públicas de qualidade? Por que a insuficiência e a baixa qualidade das creches brasileiras não são um problema social para a sociedade brasileira, que prioriza outras questões relacionadas à infância ou a outras etapas da vida como problema social?

Consideramos, no NEGRI, que concepções, ideias, noções expressas e apreendidas em discursos participam da construção do ciclo de políticas sociais, particularmente da construção de seu ponto de partida: “o problema social”.

(22)

tradução exclusiva de necessidades sociais objetivas. Têm permitido sistematizar, descrever e interpretar informações sobre o privilegiamento de uma retórica dramática, do espetáculo, associada à construção de “problemas sociais” que ocupam um lugar de destaque na agenda de políticas para a infância brasileira. Assim, os estudos sobre a construção de problemas sociais têm nos auxiliado a relacionar discursos e políticas para a infância focalizando os temas que têm destaque e visibilidade – os temas associados à violência, à dramaticidade – e os temas que ficam na invisibilidade total ou parcial – os bebês e a creche.

Outra importante contribuição para esta pesquisa são os Estudos Sociais da Infância2 que têm nos auxiliado em nossas análises e interpretações envolvendo

concepções de infância e de criança. Esses estudos consideram a infância uma construção social e histórica e a criança um ator social, isto é, também produtor de cultura. Essa nova visão procura romper com concepções adultocêntricas e naturalizantes de infância e criança.

Os Estudos Sociais da Infância têm contribuído para uma reviravolta nos paradigmas acadêmicos e políticos sobre infância e criança à medida que dão visibilidade a esta etapa da vida. A mudança nos conteúdos e nas abordagens do estudo das crianças e da infância foi considerável o bastante para merecer o nome de um novo paradigma. Porém, aqui também temos destacado a reduzida visibilidade dos bebês e as contradições neste campo de estudos, como apresentaremos no tópico sobre as tensões que perpassam os Estudos Sociais da Infância.

Finalmente, adotamos na pesquisa o método hermenêutica de profundidade (HP), inspirada em J. B. Thompson (1998), escolhido para orientar a elaboração da pesquisa e organizar o texto da dissertação. A HP estabelece três etapas para análise das formas simbólicas: análise do contexto sócio-histórico de produção, circulação e recepção das formas simbólicas, ou seja, dos discursos; análise formal dos discursos; e interpretação e reinterpretação.

2 ROSEMBERG, 1976, 2003, 2006, 2009a, 2009b, 2010a, 2010b; SARMENTO; PINTO, 1997;

(23)

Este texto consta de cinco capítulos ou partes contando com esta introdução. No segundo capítulo apresentamos os estudos sobre Construção de Problemas Sociais, os Estudos Sociais da Infância, e o método HP.

No terceiro capítulo, apresentamos o contexto sócio-histórico de produção das formas simbólicas a serem analisadas via revisão da literatura sobre a educação e cuidado de bebês/crianças pequenas focalizando os seguintes temas: história da creche no Brasil, dados sobre a frequência à creche no Brasil e em Pernambuco, uma breve síntese dos estudos sobre demanda de EI e sobre os avós no Brasil contemporâneo, incluindo dados sobre o envelhecimento da população e os avós e o cuidado com o(s) neto(s)(as).

O quarto capítulo é destinado às entrevistas, no qual apresentamos os procedimentos de seleção das quatro avós entrevistadas, de realização e de análise das entrevistas, bem como os cuidados éticos tomados nas etapas da pesquisa.

Por fim, no capítulo 5, apresentamos as considerações finais. Alguns aspectos observados nas considerações finais foram a presença da avó na educação e cuidado dos bebês ou crianças pequenas nas duas últimas gerações; as avós participando da educação e do cuidado dos netos, mas carregando o que chamamos de “contemporaneidade do passado”, ou seja, conhecimentos não atualizados sobre o cuidado e a educação de bebês.

Com relação à creche, as avós entrevistadas revelaram uma concepção positiva, de qualidade. Já ao falarem sobre as creches que conheciam, descreveram principalmente aspectos negativos. Desta forma, apreendemos que as avós entrevistadas, de uma maneira geral, possuem poucas experiências concretas ou informações atuais sobre creche e as políticas públicas para o bebê, uma vez que não souberam avaliar muito bem a oferta de creches na cidade de Recife.

No que diz respeito à nomenclatura, apesar de duas das entrevistadas preferirem o termo creche e duas o termo escola, ao analisarmos as entrevistas como um todo, pudemos apreender o estigma do termo creche, explicitado por uma das avós como local para crianças pobres. Como apontado por outras pesquisas do NEGRI, observamos que o estigma do nome, a creche como uma instituição “pobre para pobres”, reflete na aceitação da instituição.

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2 TEORIAS E MÉTODOS

Neste capítulo serão apresentados estudos sobre a construção de problemas sociais, os Estudos Sociais da Infância e o método hermenêutica de profundidade (HP), que nortearam o desenvolvimento desta dissertação.

2.1 Construção de problemas sociais

Alguns autores têm apontado que questões relacionadas a crianças e à infância têm sido tratadas com frequência como problemas sociais no Brasil e no exterior (RIZZINI, 2002; CASTRO; KOSMINSKY, 2010; CORSARO, 2011). Assim, Sarmento e Pinto (1997), ao destacarem a dimensão internacional da visibilidade das crianças e emergência das problemáticas associadas à infância na cena social, chamam atenção para o impacto público de situações catastróficas e dramáticas envolvendo crianças.

Por outro lado, em contexto norte-americano, Corsaro (2011) enumera três das formas mais comuns de entendimento da criança como problema social: as crianças como grupo externo; a preocupação com relação à segurança das crianças; e a culpabilização da criança como vítima.

A primeira está relacionada à discriminação: as crianças são vistas como grupo externo que perturba a vida dos adultos – como inferiores, não merecedoras do mesmo respeito que os adultos. Como exemplo para essa visão, Corsaro (2011) menciona que nos EUA, por exemplo, as crianças podem ser banidas de determinados locais, como em cruzeiros marítimos destinados apenas para adultos, ou até mesmo de comunidades. Neste caso, adultos percebem ou concebem criança(s) como sendo em si um problema para aquela sociedade.

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Para Corsaro (2011), a terceira forma de entender crianças como problema social consiste em culpar a vítima, neste caso, a criança. O autor percebe uma “tendência de responsabilizar pessoalmente certas crianças pelos complexos problemas e forças sociais que afetam de forma dramática suas vidas” (CORSARO, 2011, p. 253). Temos os exemplos dos casos de gravidez na adolescência e das crianças que fogem de casa e moram nas ruas – que tendem a ser culpabilizadas sem questionamento e reflexão sobre os fatores complexos que estão por trás desses problemas.

Corsaro (2011), bem como Rizzini (2002) e Castro e Kosminsky (2010), têm tratado do tema problema social a partir de análises que tratam problema social em seu sentido ou acepção realista: algo que “incomoda” por ser uma “patologia” ou “anomalia social”. Entretanto, nossa perspectiva ao estudar problema social não é essa. Nosso objetivo em trazer os estudos sobre a construção de problemas sociais é pensar sobre a infância e a criança e a construção da agenda de políticas públicas para esse segmento da sociedade.

No Brasil, nas últimas décadas, principalmente nos anos 1990, tem havido grande mobilização pelos direitos das crianças e adolescentes e, ao mesmo tempo, ampla publicização, especialmente na mídia, de crianças e adolescentes em situações degradantes como forma de denúncia e busca por soluções (ROSEMBERG; ANDRADE, 2007). De acordo com esses autores, o empenho de instituições sociais contemporâneas em chamar a atenção da opinião pública para as condições sociais degradantes em que vivem crianças e adolescentes pobres tem gerado uma gama de problemas sociais publicizados por meio de uma retórica específica que muitas vezes estigmatiza crianças, adolescentes e famílias pobres.

Temos desenvolvido no NEGRI uma série de pesquisas que analisaram a retórica midiática sobre questões demarcadas como “problemas sociais” associados à infância brasileira entre os anos 1990 e 2000: prostituição infanto-juvenil (L. ANDRADE, 2001), trabalho infanto-juvenil (FREITAS, 2004; PRADO, 2009), gravidez na adolescência (CALAZANS, 2000; NAZARETH, 2004), "meninos de rua" (M. ANDRADE, 2005), aborto voluntário (BIZZO, 2008). \em tais pesquisas, buscamos problematizar a construção da agenda de políticas públicas voltadas para a infância à luz dos estudos sobre construção de problemas sociais.

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questão como problema social, isto é: a sociedade demarca uma questão como problema social porque acredita que, objetivamente, se trata de um problema, de uma necessidade social a ser enfrentada ou resolvida.

De acordo com Best (2009), autores(as)3 objetivistas têm definido problema social como:

a) “pontos de conflito dentro da sociedade – arranjos sociais que não funcionam devidamente” (BEST, 2009, p. 3, tradução nossa);

b) “uma condição social que tem sido vista como prejudicial para o indivíduo e/ou bem estar social” (BASSIS; GELLES; LEVINE, 1982 apud BEST, 2009, p. 3, tradução nossa);

c) “uma condição que é amplamente considerada como indesejável ou como uma fonte de dificuldades, causada pelas ações ou omissões de pessoas ou da sociedade, e que afeta ou pensa-se que afeta um grande número de pessoas” (FARLEY, 1987 apud BEST, 2009, p. 3, tradução nossa).

Essas acepções, ao apontarem que o cerne do problema social está em condições sociais objetivas, falham ao ignorar ou minimizar a dimensão subjetiva dos mesmos. Ao contrário, numa perspectiva subjetivista, para uma questão se tornar um problema social, as pessoas precisam desenvolver um sentido subjetivo de que a questão é um problema que precisa ser solucionado. Essa dimensão subjetiva pode ser exemplificada pelo confronto da delimitação de problemas sociais antes e depois do movimento feminista contemporâneo. Após o movimento, problemas relacionados à igualdade de remuneração, ao assédio sexual, à discriminação de gênero, ao sexismo, entre outros, passaram a fazer parte dos livros, textos e artigos que tratam de problemas sociais bem como de políticas sociais (BEST, 2009). Isto não significa que tais problemas tenham começado a “existir” com o movimento feminista e que antes não ocorriam tais problemas: de fato, passaram a ser publicamente demarcados e reconhecidos como tal principalmente graças ao aporte do movimento feminista.

Portanto, a perspectiva subjetivista focaliza as atividades dos indivíduos e grupos na construção de problemas sociais, nesse caso, no ato de fazer

3 A partir deste momento, abandonaremos o uso da fórmula o (a) e empregaremos o masculino

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reclamações e reivindicações, e não apenas em condições sociais objetivas. Desta forma, para esta perspectiva, as condições em si não importam, o que importa é que pessoas estejam fazendo reivindicações sobre essas condições.

Assim sendo, em dada sociedade, em dado momento histórico, uma prática social pode ser alçada, ou não, à condição de problema social que deve ser resolvido mediante a tomada de diversas medidas políticas, por exemplo, a legislação. Um bom exemplo brasileiro atual refere-se ao Projeto de Lei 2654 de 2003 (PL 2654/20034), mais conhecido como “lei da palmada”. Este projeto

estabelece “o direito da criança e do adolescente a não serem submetidos a qualquer forma de punição corporal, mediante a adoção de castigos moderados ou imoderados (...)” (PL 2654/2003) – ou seja, uma prática social comum como a palmada pode ser proibida por ter sido reconhecida pela atenção pública como um problema social que precisa ser solucionado.

Apesar deste enfoque sobre “problema social” ser relativamente pouco conhecido no Brasil, sua relevância no âmbito das Ciências Humanas e Sociais, principalmente naquela produzida em inglês e francês, é inconteste. A prova é a disponibilidade de teorizações sobre o tema que se iniciaram já nos anos de 1970 e 1980. Assim, no contexto de preocupações de autores nesses idiomas, encontramos algumas definições pertinentes de problema social. Spector e Kitsuse (1977 apud BEST, 2009, p. 6, tradução nossa) definem problema social como “atividades de indivíduos ou grupos fazendo afirmações de queixas e reclamações com relação a determinadas supostas condições”. Para Hilgartner e Bosk (1988, p. 55), os problemas sociais são definidos como “suposta condição ou situação que é rotulada como um problema nas arenas de discurso público e ação”. Isto é, é problema social o que se considera “problema social”.

No mesmo sentido, Hilgartner e Bosk (1988) contribuem com a noção de problemas sociais como sendo produto de um processo de definição coletiva. Isso explica porque algumas questões que poderiam ser consideradas problemas sociais – como a reduzida cobertura de creches no Brasil – muitas vezes não são.

Nesse processo, vários atores sociais contribuem para a construção de um problema social: pesquisadores que escrevem sobre uma determinada questão,

4 Aguardando Deliberação de Recurso na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, o projeto seguirá

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jornalistas que publicam artigos nos jornais em favor dessa mesma questão, políticos que propõem ou aprovam uma lei que protege essa causa, ONGs, empresas, organizações internacionais, sindicatos, partidos políticos, entre outros.

Para ser alçada à condição de problema social, uma questão ou necessidade social deve despertar a atenção pública que, além de escassa, já é despertada por outras questões ou necessidades: “a atenção do público é um recurso escasso, alocado por meio de competições em um sistema de arenas públicas” (HILGARTNER; BOSK, 1988, p. 55).

As arenas públicas nas quais as definições coletivas dos problemas sociais ocorrem incluem os meios de comunicação (televisão, rádio, jornais, revistas, cinema, internet, entre outros), o governo, grupos de ação social, partidos políticos, sindicatos, os tribunais, as sociedades profissionais, a comunidade de pesquisa ou academia, livros que falam de questões sociais, organizações religiosas, entre outros. “É nessas instituições que os problemas sociais são discutidos, selecionados, definidos, enquadrados, dramatizados, embalados e apresentados ao público” (HILGARTNER; BOSK, 1988, p. 59, tradução nossa).

Nessa perspectiva, as arenas, apesar de diferentes, compartilham similaridades, como a capacidade limitada de problemas sociais que conseguem apresentar publicamente, umas com maior e outras com menor capacidade. Diante da discrepância entre o número de problemas em potencial e a extensão do espaço público, os problemas precisam competir por espaço e tempo no discurso social.

Enquanto um grande número de problemas em potencial poderia ser considerado problemas sociais, apenas um número bem menor se torna tema dominante nos discursos políticos e sociais: uma boa parte dessas supostas condições preocupantes permanece fora das arenas públicas (HILGARTNER; BOSK, 1988).

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Atores sociais, como pesquisadores, gestores, cidadãos eleitores, movimentos sociais, comunidades de pesquisa, entre outros, ao reivindicar uma questão, podem contribuir para a hierarquização dos problemas sociais. Assim, Os avós de crianças pequenas são atores sociais que podem reivindicar o direito de bebês e de seus pais à creche de qualidade e colaborar, por exemplo, mediante o voto, com a agenda de políticas públicas para a infância. Os avós, assim como pais e mães, são atores sociais que podem estar interessados na educação, no cuidado e no bem-estar de bebês e de suas famílias, além disso, têm papel importante na construção da agenda de políticas públicas, seja pelo voto, pela participação em passeatas, manifestações e divulgação das questões pela infância etc.

Best (2008) sugere um modelo básico de “história natural” para visualizar o processo de construção dos problemas sociais composto por seis etapas:

1. reivindicações – nesta etapa, atores sociais fazem reivindicações sobre uma situação preocupante, um problema social que deve ser solucionado; 2. cobertura da mídia – neste momento, os atores que estão fazendo a

reivindicação buscam cobertura da mídia para chamar atenção de um grande número de pessoas;

3. reação pública – o público em geral fica sabendo da reivindicação diretamente pelos atores ou pela mídia;

4. formulação de políticas públicas – as políticas são as ferramentas que a sociedade adota para solucionar situações preocupantes ou problemas sociais;

5. trabalho com o enfrentamento dos problemas sociais – as políticas são implementadas por pessoas responsáveis como assistentes sociais, gestores, psicólogos, médicos, professores etc.;

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O modelo propõe que uma reivindicação que consegue atenção do grande público por meio da mídia, provavelmente se tornará um problema social reconhecido e, portanto, reivindicado por mais pessoas. Assim, políticos ou gestores se sentirão “pressionados” a solucionar esta situação preocupante ou “problema social” e implementarão políticas públicas específicas para sanar o problema.

A cobertura da mídia tende a alterar ou influenciar o processo de construção dos problemas sociais. O processo, que geralmente começa sem o envolvimento da mídia, vai depender dela para ser divulgado para o grande público e para tanto terá que se adequar aos padrões midiáticos. Sendo assim, a mídia transformará a reivindicação inicial em uma reivindicação mais direta, mais dramática.

O papel dos diferentes atores sociais reside em fazer reivindicações que competirão pela atenção da mídia – espaço limitado diante do número de reivindicações. Reivindicações com ar de novidade e que tenham apoio de pessoas interessantes – pessoas famosas, ou que sejam vítimas do “problema social” – terão mais chances de conseguir um espaço. Este processo é chamado por Thompson de “valorização cruzada”, quando o tema em destaque valoriza a personalidade pública que, desta forma, ganha visibilidade ao se associar ao tema, tratando-se de uma via de mão dupla. Por outro lado, questões conhecidas que afetam muitas pessoas (como questões relacionadas à EI) podem não conseguir tanto destaque quanto outras temáticas mais “atuais” ou “dramáticas”.

De forma equivalente à analise de Best (2008), o modelo de arenas de Hilgartner e Bosk (1988) contempla uma série de princípios de seleção que influenciam quais serão os problemas abordados em cada arena e que também inclui: o uso de linguagem ou retórica direta, persuasiva, urgente e dramática; apresentação dos problemas como novidade, para não haver saturação; orientações políticas e preocupações culturais compartilhados, entre outros.

Rosemberg e Andrade (2007) asseveram sobre a dramatização:

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As arenas de negociação estão em constante movimento. No Brasil, a agenda de políticas públicas para a infância tem destacado dois temas principais: ora a infância associada ao sensacionalismo (político, acadêmico e midiático), destacando temas espetaculares e dramáticos; ora associando a infância ao trabalhador de amanhã, principalmente Ensino Fundamental e formação do trabalhador cidadão.

O interesse público brasileiro se dirige mais a crianças maiores, adolescentes e jovens. (...) Guardada, o mais das vezes, em espaços fechados, não tendo visibilidade pública, a criança pequena não é tida como vítima nem constitui ameaça, sentimentos que parecem mobilizar a atenção pública do adulto. É como se no Brasil, questões relacionadas à criança pequena fossem consideradas como sendo da esfera privada, do espaço da casa (ROSEMBERG, 2006, p. 3).

De acordo com nossas pesquisas, problemas relacionados à infância que fazem uso de uma retórica do espetáculo conseguem maior destaque (CALAZANS, 2000; L. ANDRADE, 2001; FREITAS, 2004; NAZARETH, 2004; M. ANDRADE, 2005; BIZZO, 2008; PRADO, 2009; NAZARETH, 2011; URRA, 2011). Crianças e adolescentes recebem destaque na mídia quando praticam ou são vítimas de atos infracionais ou violentos, principalmente quando são crianças pobres, ou quando ganham destaque em alguma atividade considerada importante pela sociedade, por exemplo, um adolescente que se sobressai nos estudos ou no esporte. O bebê ou a criança pequena tem pouca visibilidade midiática a não ser quando é vítima ou envolvida em alguma situação considerada de risco ou pouco adequada para sua idade. Temas como violência, abuso, abandono e maus tratos, com grande apelo dramático, são os que mais dão destaque a esse grupo de idade na mídia.

Conforme Santos (2012), o estado de “crise”, e não a violência, parece ser o qualificativo que mais se associa a matérias sobre creche na Folha de SP on line nos anos de 1994 a 2009. Aparentemente crise não é sinônimo de sensacionalismo, não acarretando grande visibilidade ao tema creche no jornal. A questão fica: como angariar visibilidade pública ao tema sem reforçar estigma?

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A quinta etapa faz referência ao trabalho social em si, ou seja, à implementação de novas políticas públicas – a ação ou conjunto de ações que são tomadas para tentar solucionar determinado “problema social”. Assistentes sociais, psicólogos, policiais, médicos, gestores, professores, entre outros, são geralmente os responsáveis por colocar em prática e fazer com que as políticas públicas entrem em vigor e sejam aplicadas. Por fim, a última etapa se refere aos resultados de tais políticas, o que inclui avaliações de resultados, críticas e elogios, que podem resultar em novas questões a serem tratadas, novos problemas a serem solucionados (BEST, 2008).

Em pesquisas recentes do NEGRI sobre a creche na mídia, Nazareth (2011), Santos (2012) e Urra (2011) apreenderam como a temática é tratada por revistas e jornais, importantes arenas para divulgação de questões ou problemas sociais.

Nazareth (2011) localizou 65 matérias sobre creche publicadas em 40 anos da revista Pais e Filhos, tendo destacado o silêncio em torno do tema e a forma como a revista aborda o assunto. As poucas reportagens apresentam a creche como alternativa de educação e cuidado para bebês quando a mãe considera esta a melhor opção. Entretanto, mesmo nas matérias que incentivam o uso da creche, o texto apresenta receios e temores com relação à fragilidade do bebê e à capacidade da instituição em acolhê-lo.

Por sua vez, Santos (2012), ao analisar 86 peças jornalísticas publicadas pela Folha de SP on line entre 1994 e 2009, observou a presença reduzida do tema creche, sua associação a situações de risco, além de conceituação em desacordo com a LDB. Nessa pesquisa, foram propostos os seguintes núcleos de sentido ao tratamento dados pela Folha de SP on line ao tema:

reduzida visibilidade do tema creche; opacidade em sua caracterização; retórica de denúncia/ataque em contexto de crise; concepção norteadora de instituição focalizada e não universalista; ausência de crianças, de suas vozes, de suas individualidades, de suas histórias (SANTOS, 2012, p. 140).

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3 anos, questões positivas que valorizam esta etapa da EI, não ganham destaque nas mídias.

Best (2008) comenta a predominância, na mídia, de reivindicações que interessam às classes dominantes e a exclusão de questões de interesse dos mais pobres e com menos poder, o que, para nós do NEGRI, indica a sustentação de relações de poder e dominação. O autor explica que a segmentação do público afeta o papel da mídia no processo de construção de problemas sociais. As mídias, como os diversos canais de televisão, jornais ou revistas (para crianças, adolescentes, adultos, esportistas etc.), procuram apelar para públicos socialmente distintos e a cobertura das reivindicações inclui assuntos que pareçam interessantes aos seus telespectadores ou leitores. Isto acontece uma vez que os anunciantes frequentemente preferem colocar suas propagandas em mídias que atinjam tipos específicos de clientes, ou seja, clientes mais ricos que possam consumir seus produtos. Acresce que as mídias jornalísticas estão menos propensas a focalizar públicos mais pobres, o que significa que a cobertura de problemas sociais tende a minimizar reivindicações de maior importância para os pobres.

Os profissionais da mídia podem ver as pessoas que são mais pobres - que não têm poder, riqueza ou status elevado - como menos dignos de ter suas reivindicações veiculadas, e os atores sociais que representam essas pessoas têm dificuldade para obter cobertura para suas reivindicações. Da mesma forma, aqueles com pontos de vista considerados muito fora do

mainstream - muito impopular ou muito radical - encontrarão muito mais dificuldade em obter cobertura da mídia para suas reivindicações (BEST, 2008, p. 143, tradução nossa).

Nesse sentido, a creche de qualidade como um direito de bebês e mães e a necessidade de um maior número de vagas nestas instituições não parecem se adequar aos padrões das reivindicações capazes de mobilizar e indignar a atenção pública – especialmente do público mais rico e detentor de maior poder de negociação.

Duas autoras, Rosemberg (2009b) e Gottlieb (2009), uma no âmbito da Psicologia Social e outra na Antropologia Cultural, apresentam alguns pontos de reflexão que assinalam a desvantagem dos bebês, foco das políticas de EI em creches, devido à sua reduzida visibilidade pública e acadêmica com relação a outros atores sociais.

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• A pequenina infância ainda é considerada um tempo social relativo à esfera privada e não pública, reconhecida como dimensão da vida reprodutiva e não produtiva. Nesse sentido, a esfera privada é abordada em duas dimensões: a família (a mãe e as figuras femininas) e a casa. Assim, a pequenina infância, remetida a estas duas esferas, tem pouca visibilidade pública “seja a partir do espaço privado (família, casa), seja a partir do espaço público (creches), pois sua institucionalização a retira dos olhos dos formadores de opinião” (ROSEMBERG, 2009b, p. 17).

• Os adultos, enquanto formadores de opinião, de modo geral, não possuem experiências em espaços institucionais coletivos para educação e cuidado de bebês como as creches. “Suas imagens se constituem fantasmagoricamente (local de desamor) alimentadas por representações arcaicas (abandono, orfanato) e suspeitosas” (ROSEMBERG, 2009b, p. 17).

• As mídias têm pouco contribuído para aumentar a visibilidade de crianças pequeninas em outros espaços sociais além do espaço doméstico. Crianças pequeninas aparecem em anúncios de produtos usados em espaço doméstico. “Crianças pequeninas são matéria de mídia apenas quando associadas à condição de vítima, notícias à sensação, e que ocorrem particularmente em situações de tragédia no espaço privado” (ROSEMBERG, 2009b, p. 17).

• A curta duração da pequena infância, um pequeno período diante de toda a trajetória de vida de uma pessoa, em vistas da diminuição do número de nascimentos e da ampliação da esperança de vida.

• A intensa associação entre as crianças pequenas/bebês e as mulheres, segmento social com menor poder de atuação política.

• O tempo da criança pequena coincide com o momento da vida familiar de maior fragilidade, voltada para as próprias necessidades, dificultando a participação em ações políticas reivindicatórias.

• “A associação entre criança pequenina e a condição de filho, e não de criança cidadã, não desperta o interesse de adultos que ainda não são pais de crianças pequenas ou que já foram pais de crianças pequenas, mas não mais o são” (ROSEMBERG, 2009b, p. 17).

Por sua vez, Gottlieb (2009) destaca seis razões que para ela, podem explicar a reduzida visibilidade acadêmica dos bebês no campo da Antropologia.

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uma experiência remota; os pesquisadores são geralmente jovens e sem filhos, assim, não conhecem os desafios dessa faixa etária e aqueles que já são pais estão ocupados e não têm tempo para desenvolver trabalhos de campo.

• Em contraposição a noção ocidental de que os bebês são passivos e dependentes, em sua pesquisa de campo na Costa do Marfim, a autora se deparou com uma cultura na qual os bebês são concebidos como ativos, com opinião e impacto sobre a vida dos demais.

• Na maioria das sociedades, os bebês passam a maior parte de seu tempo em ambiente doméstico junto a mulheres, que até recentemente eram negligenciadas pelos antropólogos como sujeitos sociais. Porém, antropólogas feministas têm privilegiado estudos sobre a vida reprodutiva das mulheres.

• As pessoas, em geral, acreditam que o bebê não pode falar, entretanto, os diversos sons que os bebês produzem podem ser considerados significativos em determinadas sociedades. Alguns autores interrogam a dominância adulta na comunicação verbal dos humanos.

• O desconhecimento ou desinteresse ocidental por outras formas de comunicação como fluidos (lágrimas, urina, fezes, vômito, sono). Ao observar bebês de Uganda, a autora interroga o desenvolvimento motor como invariável em bebês saudáveis: os bebês nesta cultura conseguem se sentar sozinhos aos quatro meses de idade. Antropólogos podem estudar o desenvolvimento de bebês em diferentes culturas e como estas interpretam o corpo e os fluidos.

• Os antropólogos privilegiam os sistemas racionais do pensamento em detrimento de outros modos de experimentação da vida: a autora propõe a noção dos sentidos e do corpo como culturalmente construídos. Por exemplo, os bebês ocidentais tendem a ser reconhecidos como pré-culturais e ligados ao lado biológico e não racional, enquanto bebês da Costa do Marfim são concebidos como seres humanos com rica vida interior.

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Concluímos que nosso objetivo enquanto atores sociais, pesquisadores, é trazer a criança pequena, o bebê e sua família, seus direitos e necessidades para o espaço público, “fortalecendo seu poder de negociação na arena pública de debate e embate sobre prioridades em políticas públicas” (ROSEMBERG, 2009b, p. 17).

Nesse sentido, o direito das crianças pequenas à creche e o dever do Estado em suprir tal direito não se constrói facilmente enquanto problema social. Deste modo, no NEGRI, temos procurado captar significados atribuídos a este tempo social entre diferentes atores sociais: mães, homens-pais, professoras de Pedagogia e mulheres-avós, pois “[...] pensamos que o estudo das representações sociais sobre o bebê pode ser um caminho para fortalecer sua visibilidade pública” (ROSEMBERG, 2009b, p. 17).

2.2 Estudos Sociais da Infância5

Neste tópico apresentaremos uma síntese sobre os Estudos Sociais da Infância, enfoque multidisciplinar que postula um novo paradigma para os estudos da infância e da criança. Retomaremos aqui sua constituição, seus principais avanços, enfoques e tensões, bem como explicitaremos porque afirmamos ocorrer uma mudança de paradigma neste campo de estudos em construção.

Adotamos a expressão Estudos Sociais da Infância para caracterizar este campo de conhecimentos em construção e consolidação no Ocidente a partir, principalmente, dos anos 1980 no hemisfério norte e dos anos 2000 no Brasil. De modo geral, a produção brasileira se refere à Sociologia da Infância como se tal disciplina fosse a única que vem contribuindo para a mudança paradigmática nos estudos contemporâneos sobre a ou da infância/criança. De nosso ponto de vista, a expressão Estudos Sociais da Infância é preferível por várias razões: assinala uma movimentação que vem ocorrendo em várias disciplinas como na Psicologia, Educação, Antropologia, Direito, História e Sociologia, entre outros; por outro lado,

5 Como trabalho de conclusão das disciplinas Construção Social da Infância: análise de discursos contemporâneos e Estudos sociais da infância: pesquisas em contexto internacional e brasileiro, alguns mestrandos então filiados ao NEGRI realizaram um trabalho coletivo que redundou no texto

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delimita melhor seu campo de atuação que, no nosso caso, são estudos e pesquisas sociais sobre a infância6. Além disso, para nós do NEGRI, tal expressão está mais próxima daquela já consagrada “Estudos Feministas” que não separa o debate acadêmico da compreensão e tomada de posição frente às relações de poder.

Pesquisadores de diferentes áreas de conhecimento e de diferentes partes do mundo vêm contribuindo para a constituição do campo dos Estudos Sociais da Infância, sejam eles sociólogos ou não. Entre os autores de língua inglesa destacamos Chris Jenks, Allison James, Alan Prout, William Corsaro, Priscilla Alderson e Berry Mayall. Dos países nórdicos, temos a contribuição principalmente de Jens Qvortrup e Leena Alanen. Entre os franceses, incluímos Cléopâtre Montandon e Régine Sirota. Manuel Pinto e Manuel Sarmento estão entre os portugueses. Da Espanha temos Lourdes Muñoz. Alguns dos brasileiros são Fúlvia Rosemberg, Lúcia Rabello de Castro, Fernanda Müller, Ethel Kosminsky, Clarice Cohn, Rita de Cássia Marchi, entre outros. Apesar de colocá-los em sequência, as diferenciações entre esses(as) autores(as) são intensas do ponto de vista de suas abordagens específicas e disciplinares.

A literatura do hemisfério norte trata do surgimento ou consolidação deste campo de estudos em duas perspectivas complementares: os motivos ou determinações sociais que orientaram sua eclosão/consolidação; os precursores que já apontavam sinais, senão de ruptura, pelo menos de mudança nos paradigmas das Ciências Humanas e Sociais (SARMENTO; PINTO, 1997; JAMES; JENKS; PROUT, 1998; ALANEN, 2001; MONTANDON, 2001; SIROTA, 2001; JENKS, 2002; JAMES; PROUT, 2003; ALANEN; MAYALL, 2003; QVORTRUP, 2003, 2010a, 2010b, 2011; MOLLO-BOUVIER, 2005; MUÑOZ, 2006; GOTTLIEB, 2009; CORSARO, 2011).

Quanto às determinações sociais que sustentaram tais mudanças paradigmáticas, são assinaladas transformações que ocorreram nas sociedades - como movimentos da antipsiquiatria, anticolonial, pelos direitos civis, pelos direitos das mulheres - e alguns fatores que orientaram o campo dos estudos da infância:

• o reconhecimento da criança enquanto ator social e sujeito de direito;

• a reformulação (por parte de alguns pesquisadores) do conceito de socialização;

• a inclusão das crianças como sujeitos de pesquisas acadêmicas.

6 Não podemos deixar de mencionar que alguns pesquisadores focam seus estudos nas crianças e

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Na reconstituição histórica da construção do campo em cenário internacional, algumas autoras dão destaque a movimentações que ocorreram na Sociologia e de precursores na Antropologia e na História.

Assim, voltando nossa atenção para a Antropologia, Muñoz (2006) destaca os trabalhos precursores de Ruth Benedict7 e Margaret Mead8, que mostraram em suas pesquisas como as noções de infância e o papel da criança variam de cultura para cultura; e da pedagoga sueca Ellen Key que escreveu, no ano de 1900, o texto clássico O século da criança, apresentando ideias à frente de seu tempo. Ainda no campo da Antropologia, trazemos a importante contribuição de Alma Gottlieb (2009) com o artigo Para onde foram os bebês? Em busca de uma Antropologia de bebês (e de seus cuidadores), publicado no ano 2000 no idioma inglês, mas traduzido para o português apenas no ano de 2009 e que, em sintonia com os trabalhos de Fúlvia Rosemberg e do NEGRI, destaca o papel marginalizado dos bebês na literatura antropológica e nos estudos interdisciplinares sobre a construção sociocultural da infância. No âmbito brasileiro, temos a contribuição de Clarice Cohn com o livro Antropologia da criança (2005), que aborda as concepções de infância da Antropologia e apresenta a criança como ator social. A autora tem realizado pesquisas nas subáreas Antropologia urbana, da criança, da educação, da saúde e etnologia indígena.

Tratando da produção em Sociologia francófona, Sirota (2001) apresenta um debate sobre a emergência de uma Sociologia da Infância, contemplando a evolução do objeto como uma interseção entre algumas disciplinas das ciências sociais (Sociologia da Educação, Sociologia da Família, Demografia, Sociologia do Direito) e as perspectivas de análise registradas nos anos 1990. Ressalta que a infância fora exclusivamente estudada pelos pesquisadores como objeto sociológico por meio dos seus dispositivos institucionais, como a escola, a família e a justiça. A autora aponta o historiador francês Philippe Ariès como um dos precursores desse novo olhar com a publicação, em 1960, do livro L'Enfant e la vie familiale sous l'Ancien Régime, dando início a uma nova abordagem nos estudos da infância e seu contexto social. Apesar de ter recebido algumas críticas, Ariès (1960 apud SIROTA,

7 Ruth Benedict (1935). Patterns of culture, London, Routledge and Kegan Paul. 8 Margaret Mead (1928, 1969). Coming of age in Samoa, Harmondsworth, Penguin.

Margaret Mead and Martha Wolfstein (Eds) (1955). Childhood in contemporary culture. Chicago, Chicago University Press.

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2001) consolidou a noção de infância como construção social e colocou-a como objeto digno de estudos no âmbito das Ciências Sociais, isto é, da História. Sirota (2001) destaca, ainda, ser “por oposição à concepção da infância como objeto passivo de uma socialização regida por instituições, que vão surgir e se fixar os primeiros elementos de uma Sociologia da infância” (SIROTA, 2001, p. 9).

Paralelamente, Montandon (2001), ao apresentar um balanço dos trabalhos sociológicos publicados em língua inglesa, além de ressaltar o grande número de estudos sociológicos sobre a infância e as crianças a partir dos anos 1980, sugere sua organização em quatro categorias temáticas bastante amplas: relações entre gerações; relações entre crianças; crianças como grupo de idade e aqueles estudos que analisam os diferentes dispositivos institucionais dirigidos às crianças. Detecta também, assim como na produção francófona, que os autores anglófonos propõem uma oposição à concepção determinista de infância e de criança considerada como simples objeto passivo de uma socialização orientada por atores ou instituições sociais.

No Brasil, apesar de alguns precursores (ROSEMBERG, 1976; PRIORE, 1991; FERNANDES, 1979, 1994), a ênfase nos novos paradigmas ocorre a partir dos anos 2000 e principalmente na Sociologia. Com efeito, foi a partir da virada da primeira década deste milênio que localizamos as primeiras traduções seja do francês (SIROTA, 2001; MONTANDOM, 2001), seja do inglês ou ainda da entrada de textos portugueses, principalmente da Universidade do Minho (SARMENTO; PINTO, 1997; PINTO, 1997; SARMENTO, 2005). Além disso, os textos brasileiros recentes abordam, principalmente, a emergência da Sociologia da Infância em plano internacional e focalizam a busca de autonomia conceitual, de descrição e compreensão das categorias criança e infância.

Alguns autores (QUINTEIRO, 2002; ABRAMOWICZ; OLIVEIRA, 2010) ressalvam o papel precursor de Florestan Fernandes com o trabalho original publicado em 1947 As trocinhas do Bom Retiro, que registra elementos do processo de socialização das crianças e constitutivos das culturas infantis, captadas a partir de observações de grupos de crianças residentes nos bairros operários da cidade de São Paulo, que se reuniam nas ruas para brincar depois da escola.

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Figura 01 - Formas de investigação da hermenêutica.
Tabela 01 - Investimentos financeiros em educação no Brasil - gasto anual por aluno (2009)
Tabela 03 - Valor anual estimado por aluno para estados da região Nordeste (2012).
Figura 02 - Taxas de frequência à creche ou escola por grupos de idade. Brasil (2000 e  2010)
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Referências

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