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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC CENTRO DE ARTES – CEART MESTRADO EM TEATRO MILENE LOPES DUENHA

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MESTRADO EM TEATRO

MILENE LOPES DUENHA

PRESENÇA E(M) RELAÇÃO: A POTÊNCIA DE AFETO NO ENTRE CORPOS

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PRESENÇA E(M) RELAÇÃO: A POTÊNCIA DE AFETO NO ENTRE CORPOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Teatro do Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Teatro.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Sandra Meyer Nunes

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PRESENÇA E(M) RELAÇÃO: A POTÊNCIA DE AFETO NO ENTRE CORPOS

Dissertação, Pós-Graduação em Teatro / Centro de Artes / Universidade do Estado de Santa Catarina, grau de Mestre em Teatro.

Banca Examinadora:

Orientadora: _________________________________________ Prof.ª Dr.ª Sandra Meyer Nunes

Universidade do Estado de Santa Catarina

Membro: ____________________________________________ Prof. Dr. Gilberto Icle

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Membro: ____________________________________________ Prof.ª Dr.ª Maria Brígida de Miranda

Universidade do Estado de Santa Catarina

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DA GRATIDÃO

(A lista é grande. Até quantas folhas eu posso usar mesmo?) Às gentes que mantém, com seus trabalhos, as instituições Promop e CAPES, organizações que, ao concederem bolsas de estudos, permitem que o pesquisador possa chegar na cidade de mala e cuia e vivenciar o trabalho de modo mais comprometido. Que outros muitos tenham essa mesma oportunidade!

PPGT – Programa de Pós-Graduação em Teatro da UDESC, grata à competência de seus professores, secretárias e demais funcionários. Beijo Fran! Saudades de Sandra.

Às presenças que tão generosamente partilharam seus saberes/ fazeres:

Alejandro, Aline, Adilso, Anderson, Hedra, Jussara, Karin, Malu, Marcos e Mariana, artistas que eu admiro de perto, e que me ensinam muito sobre disponibilidade e comprometimento com a arte. Vocês são uns lindos que se jogam e arrasam!

Guillermo Gómez-Peña, Dani d’Emilia, Roberto Sifuentes e performeros que compartilharam a experiência do Exercises for rebel artists.

Tereza Franzoni, pela delicada acolhida quando a gente chega calourão, todos perdidos. E pelos muitos momentos de aprendizado com sorriso.

Regina Melim por apresentar tantas possibilidades de arte à academia.

André Carreira, pela generosidade ao dividir suas conexões e descobertas nas aulas, só não por ficar me zoando nos intervalos (brincadeira, agradeço o bom humor também).

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mostrando muitos caminhos possíveis.

Gilberto Icle por aceitar o convite à leitura e discussão das palavras aqui contidas, e pelo olhar generoso e pontual, que muito contribuiu com meu aprendizado.

Sandra Meyer (ela nem sabe, mas eu gosto muito dela). Bem, a Sandra é essa pessoa linda que me orienta pacientemente no trabalho acadêmico, que me diz umas verdades necessárias pra eu não voar feito balão. Mas que muito além disso, me ensina sobre delicadeza, ética, generosidade e presença. Obrigada sinceramente pela acolhida, e por ensinar compartilhando.

Troféu tudo de si:

Aos parceiros das danças, das performans e da coisarada toda da arte: André, Raquel, Paloma, Oscar. Que nos venham muitos desafios!

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apresentação do trabalho deste jeitinho que você vê(ele é o designer que resolveu tudo isso).

À galera do projeto Estratégia do Grupo Ronda e aos colegas de oficinas e performances que encontrei por aí e que também se dividiram nas experiências.

Um brinde ao ato de partilhar-se em presença e imprimir afetos À Família buscapé que vence a distância com sorriso, e me ensina sobre amor, aquele que esquenta o corpo, e transforma os olhos em mar.

À Cleber Pimenta que se faz presença em música, corpo, cuidado, sorvete, e que com sua lucidez e coragem me ensina sobre entrega.

À Andreia Paris por me receber tão generosamente, por me mostrar caminhos, e por discutir a novela depois das 12h de estudo.

Ao Alex de Souza por ser essa figura quirida, por cuidar da minha amiga e por ajudar a cuidar da nossa casa.

À turma do mestrado 2011, e aos amigos Juarez, Well, Francisco, Dai, Vívian, Val, e a todos os bons encontros de Floripa.

Aos amigos que fazem os afetos ultrapassarem as muitas léguas de distância: Ju, Mi, Cezar, Fer, Paula, Ké.

Aos amigos, alunos e ex-alunos da Rede Marista de Solidariedade, presenças determinantes no meu modo de olhar/estar no mundo. Saudades de Dan, Zebra, Ju Matta, Takeda, Bia, Juzinha, Cláudia, Jacke, Sergio, Monica, Van, Marquinhos, Marcio, Marcelo, Élcio, Letícia, Roberto, Lu, Mari, Seo Valdecir, D. Maria, e tantos outros queridos que tenho sempre comigo.

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Que noções de presença poderiam considerar o que emerge entre os corpos envolvidos em uma proposição nas artes presenciais contemporâneas? As palavras a seguir lançam um olhar à presença do artista nas relações possíveis ao ato do encontro. Para tanto, os afetos (in) contidos neste escrito revelam questionamentos, experiências vividas e conexões entre referências textuais, por meio de uma articulação de dados etnográficos, compreendendo teoria e prática, pesquisa artística e pesquisa acadêmica em uma relação de complementaridade. Alguns autores e artistas fornecem os elementos a serem discutidos: Hans Ulrich Gumbrecht problematiza a tangibilidade da presença; Bento Espinosa é referência na tentativa de compreender a incidência dos afetos na experiência artística; Walter Benjamin, Jorge Larrosa Bondía e John Dewey fornecem subsídios para o convite a uma experiência possível à arte da presença na contemporaneidade. O desenho de um percurso da presença relacional tem pistas em práticas de encenadores do início do século XX, observadas em estudos de Marco De Marinis, Béatrice Picon-Vallin, Eugenio Barba, Erika Fischer-Lichte e Suzanne M. Jaeger, entre outros. Teorias de António Damásio, Paul Churchland, Sandra Meyer, Michel Bernard e José Gil são articuladas em um movimento a favor da compreensão do corpo/embodiment. Há também a exposição de algumas vivências, diante do investimento em experimentações artísticas de conceitos pertinentes ao desenvolvimento da pesquisa, trajeto este que contém: as reverberações de uma aproximação com o trabalho do grupo Cena 11 Cia. de dança; o relato de uma experiência vivenciada com o grupo La Pocha Nostra; e a análise de questões geradas na aproximação com as ferramentas/conceitos do MODO OPERATIVO AND, de João Fiadeiro e Fernanda Eugénio.

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Which notions of presence could considere what emerges among the corps involved on a proposition at the contemporany presential arts? The following words cast a glance at the artist presence in the possible relations of the encounter act.Therefore, the affections (in)contained in this writing reveals questionings, lived experiences and connections among textual references, through an ethnographic data articulation, including theory and practice, artistic and academic research in a complementary relationship. Some authors and artists provide the elements that will be discussed: Hans Ulrich Gumbrecht discusses the presence tangibility; Bento Espinosa is a reference in attempt to understand the impact of afects in artistic experience; Walter Benjamin, Jorge Larrosa Bondia and John Dewey provide subsidies for the invitation to an possible experience to the contemporany art of the presence.The drawing of the path on the relational presence has vestiges in directors practices in the early 20th century, observed in studies of Marco De Marinis, Béatrice Picon-Vallin, Eugenio Barba, Erika Fischer-Lichte e Suzanne M. Jaeger, among others. Theories of António Damásio, Paul Churchland, Sandra Meyer, Michel Bernard e José Gil are articulated in a movement in favor of the body/embodiment comprehention. Also, there is the exposure of some experiences, in front of the investing in artistic experiments of concepts pertinent to the researching development, containing in this path: the reverberations of an approach to the work of the dancing group Cena 11; the report of an lived experience with the group La Pocha Nostra; and the analysis of issues generated in approaching with tools/concepts of the AND OPERATING MODE, from João Fiadeiro and Fernanda Eugénio.

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Imagem 1 - Fotografia da primeira vez em que me vesti de bailarina aos sete anos, para participar do desfile de comemoração à Independência do Brasil, no dia 7 de setembro de 1987 pela Escola Municipal Tisuro Tsuji Barros Cunha em Sarandi –

PR. 29

Imagem 2- Certificado de participação do concurso de coreografias da Academia Marcia Angeli do ano de 1998, em Maringá -

PR. 34

Imagem 3 – Trabalho da artista polonesa Erwina Ziomkowka – s/título.

35

Imagem 4- Anotações a partir de leituras do livro Arte como

Experiência de John Dewey do dia 02/05/2013. 37 Imagem 5 – Performance dos artistas chineses Sun Yuan e Peng Yu

Teenager teenager (2011) – Sofás, gel de sílica e fibra de

vidro 48

Imagem 6 – Trabalho de Manuel Alves Pereira – La chute (2004) –

C-print sobre Dibond, 105 x 75 cm 60

Imagem 7 - Anotações a partir de leituras do livro Produção de Presença

de Gumbrecht do dia 29 /04/2013. 69

Imagem 8 - Foto do casal Maria e Mauri durante uma entrevista à equipe do blog Artes Urbanas de Florianópolis no dia 22 de abril de

2013. 86

Imagem 9 - Jan Fersley, Julia Varley, Sofia Monsalve e Iben Nagel Rasmussen, do Odin Teatret, em cena do espetáculo A Vida Crônica. Foto: Rina Skeel – Divulgação 91 Imagem 10 - Anotações durante aula ministrada pelo Prof. André Luiz

Antunes Netto Carreira no dia 18/10/2012 por ocasião da participação na disciplina Espaços e teatralidades (ficções e realidades) no Programa de Pós-Graduação em Teatro da

UDESC. 98

Imagem 11 – Trabalho de Ana Tereza Barbosa – Série Bordado 2 s/título

(2006) – Técnica mixta. 147 x 140 101

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Foto: Marlène Ramírez-Cancio 111 Imagem 14 - Roberto Sifuentes em apresentação da performance LA POCHA

REMIX: PSYCHO-MAGIC ACTIONS AGAINST VIOLENCE.

Foto: Jorge Etecheber 112

Imagem 15 - Registro de exercício do Workshop Exercises for rebel artists com o grupo La Pocha Nostra no dia 08/07/2012 no SESC de São José do Rio Preto por ocasião do Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto. Foto:

Camila Bacelar 117

Imagem 16 - Registro de exercício do Workshop Exercises for rebel artists com o grupo La Pocha Nostra no dia 08/07/2012 no SESC de São José do Rio Preto por ocasião do Festival Internacional de Teatro de São José do Rio

Preto. Foto: Camila Bacelar 118

Imagem 17 - Registro de exercício do Workshop Exercises for rebel artists com o grupo La Pocha Nostra no dia 08/07/2012 no SESC de São José do Rio Preto por ocasião do Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto. Foto:

Camila Bacelar 119

Imagem 18 - Anotações realizadas no dia 06/07/2012 durante a

participação do Workshop Exercises for rebel artists com o grupo La Pocha Nostra no SESC de São José do Rio Preto por ocasião do Festival Internacional de Teatro de São José

do Rio Preto. 121

Imagem 19 - Anotações realizadas no dia 06 e 07/07/2012 durante a participação do Workshop Exercises for rebel artists com o grupo La Pocha Nostra no SESC de São José do Rio Preto por ocasião do Festival Internacional de Teatro de São José

do Rio Preto. 122

Imagem 20 - Alejandro Ahmed durante a Formação compartilhada em Artes Presenciais realizada pelo grupo Cena 11 Cia. de

dança no período de 03 à 07/12/2012. 124

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inimigo do grupo Cena 11 Cia. de dança, distribuído em sua estreia que aconteceu no dia 28 de agosto de 2012 no Teatro Pedro Ivo Campos, em Florianópolis – SC 127 Imagem 23 - Parte interna do programa do espetáculo Carta de amor ao

inimigo do grupo Cena 11 Cia. de dança, distribuído em sua estreia que aconteceu no dia 28 de agosto de 2012 no Teatro Pedro Ivo Campos, em Florianópolis – SC. 128 Imagem 24 - Foto do espetáculo Carta de Amor ao Inimigo do grupo

Cena 11 Cia. de dança. Foto: Cristiano Prim 136 Imagem 25 - Foto do espetáculo Carta de Amor ao Inimigo do grupo

Cena 11 Cia. de dança. Foto: Cristiano Prim 138 Imagem 26- Anotações sobre do processo de criação do espetáculo

Carta de Amor ao Inimigo do grupo Cena 11 Cia. de dança

do dia 11/05/2012. 143

Imagem 27 - Anotações sobre do processo de criação do espetáculo Carta de Amor ao Inimigo do grupo Cena 11 Cia. de dança

do dia 11/05/2012. 144

Imagem 28 - Anotações do dia 24/08/2012 sobre do processo de criação do espetáculo Carta de Amor ao Inimigo, e do dia 04/12/2012 sobre ensaios do grupo Cena 11 Cia. de dança. 145 Imagem 29 - Anotações do dia 23/09/2013 durante a participação da

Formação Compartilhada em Artes Presenciais realizada pelo grupo Cena 11 Cia. de dança entre os dias 20 e

24/09/2013 146

Imagem 30 - Anotações dos dias 23 e 24/09/2013 durante a participação da Formação Compartilhada em Artes Presenciais realizada pelo grupo Cena 11 Cia. de dança entre os dias 20 e

24/09/2013. 147

Imagem 31 - Anotações do dia 24/09/2013 durante a participação da Formação Compartilhada em Artes Presenciais realizada pelo grupo Cena 11 Cia. de dança entre os dias 20 e

24/09/2013. 148

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Conferência-ocasião do Festival Múltipla Dança. Foto: Cristiano

Prim 150

Imagem 33 - Resultado da escrita em papel durante o jogo realizado por Fernanda Eugénio e João Fiadeiro na Conferência

demonstração do MODO OPERATIVO AND que aconteceu no dia 01/06/2013 no SESC Prainha de Florianópolis/SC, por ocasião do Festival Múltipla Dança. Foto: Cristiano

Prim 151

Imagem 34 - Cópia das instruções do jogo distribuída no dia 03/06/2013 durante a residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival Múltipla

Dança. 153

Imagem 35 - Anotações do dia 03/06/2013 durante a demonstração das ferramentas-conceitos na residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/ UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival

Múltipla Dança. 154

Imagem 36 - Anotações do dia 03/06/2013 durante a demonstração das ferramentas-conceitos na residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/ UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival

Múltipla Dança. 155

Imagem 37 - Anotações do dia 06/06/2013 durante a demonstração das ferramentas-conceitos na residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/ UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival

Múltipla Dança. 156

Imagem 38 - Registro da demonstração das ferramentas-conceitos na residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival

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Eugénio e João Fiadeiro no CEART/UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival Múltipla

Dança. 163

Imagem 40 - Registro de um dos exercícios realizados no dia 05/06/2013 na residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival Múltipla

Dança. 164

Imagem 41 - Registro de um dos exercícios realizados no dia 04/06/2013 na residência MODO OPERATIVO AND com Fernanda Eugénio e João Fiadeiro no CEART/UDESC, em Florianópolis/SC, por ocasião do Festival Múltipla

Dança. 164

Imagem 42 - Fotografia de Erwin Olaf 170

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1 DA PRESENÇA DA BAILARINA QUE ACONTECEU COMO

OUTRAS PRESENÇAS 29

1.1 PRESENÇA CONSTRUÍDA 32

1.2 PERCURSO METODOLÓGICO E SUGESTÕES DE

NAVEGAÇÃO 38

1.3 MENOS IMPOSIÇÃO 43

2 ENTRE PRESENÇA E EXPERIÊNCIA TANGÍVEL 51

2.1 AFETO 51

2.2 EXPERIÊNCIA 53

2.3 ESCUTA 56

2.4 PRESENÇA E OUTROS SENTIDOS 59

2.5 PRESENÇA TANGÍVEL E(M) RELAÇÃO 64

3 IMINÊNCIAS DO CORPOMENTE NA ARTE: PISTAS PARA

UMA GENEALOGIA 72

3.1 A REDESCOBERTA DO CORPO 76

3.2 POR UM DIZER DO CORPO 82

3.3 OUTRAS PRESENÇAS 84

3.4 PRESENÇA COMO ENERGIA E DILATAÇÃO 88

3.5 PRESENÇA CONVITE 92

4 QUE CORPO PODERIA ESTAR NO AQUI-AGORA? 96

4.1 UM CORPO QUE NÃO SE CONFORMA 98

4.2 UM ENCONTRO 102

4.3 UM FAZER – VIVENDO 107

4.4 O RISCO E O AFETO, UM VER FAZENDO 123

4.4.1 O RISCO E A EXPERIÊNCIA LIMINAR 134 4.4.2 EXPERIÊNCIA LIMINAR E EFICÁCIA 139 5 POSSIBILIDADES DE PRESENÇA/AUSÊNCIA NO TERRENO

MOVEDIÇO DE CO-INCIDÊNCIAS 149

5.1 UM ESTAR AO LADO 168

6 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS ENCONTROS 176

REFERÊNCIAS 183

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1 DA PRESENÇA DA BAILARINA QUE ACONTECEU COMO OUTRAS PRESENÇAS

Quando eu era grande eu era bailarina.

Esta é uma lembrança, daquelas raras, de coisas que nos ocorrem na infância. Eu tinha quatro anos. Vivia pendurada no pé de goiaba a olhar o mundo de cabeça para baixo. Na verdade ele já era meio virado, porque o pai era pai e mãe, a avó era avó e mãe, e a tia Nice era quem guardava os dentes de leite quando caíam. Só consigo lembrar das pernas compridas, do ângulo que meu tamanho de três anos permitia ver do corpo de minha mãe. Ela parecia gigante. Dizem que eu era bem arteira; as cicatrizes, que foram mudando de lugar conforme eu crescia, não me deixaram esquecer suas histórias.

Imagem 1 - Fotografia da primeira vez em que me vesti de bailarina aos sete anos, para participar do desfile de comemoração à Independência do Brasil, no

dia 7 de setembro de 1987 pela Escola Municipal Tisuro Tsuji Barros Cunha em Sarandi – PR.

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Achava bonita aquela imagem-estereótipo da bailarina, queria ser uma, mas em Sarandi não tinha balé, e o pai não achava que a dança garantiria um futuro promissor. Não tinha balé, mas tinha Jazz, com a professora Glória, uma ex-ginasta vizinha da minha avó. Fui escondida. Aos 11 anos, pequena, magrela e desajeitada, eu dançava.

A bailarina do jeito que eu havia imaginado na infância ainda estava um pouco longe. Com o rosto vermelho – de vergonha, e dos 20 km pedalados na Caloi Ceci –,eu falei do meu sonho à diretora da escola de dança da cidade vizinha. Ganhei desconto, e aos 18 fazia aulas com as meninas de 11, e um intensivo com as formandas. Sentia um pouco de vergonha por não ter uma sainha de voal comprida e estampada de flor, a minha era curta e em jersey. Eram três horas de balé na escola de dança, e mais três horas de teatro no curso de extensão da UEM – Universidade Estadual de Maringá, onde conheci o professor Luthero de Almeida que disse que eu seria uma boa atriz com trinta anos; e onde conheci outro professor que me aconselhou a desistir. Ainda me faltavam mais onze anospara saber no que isso tudo daria.

A dança e o teatro se transformaram em profissão. A arte me fazia chorar e insistir. Vivê-la foi sempre algo intenso e desafiador, tanto do ângulo do palco, quanto do ângulo da plateia. Nunca via impavidamente a um espetáculo, só conseguia vivenciá-lo de um modo bem particular: Eu entrava na cena, dançava os passos dos bailarinos, e chorava no final. A arte sempre me afetou.

Em 2005, período em que cursava a faculdade de Artes Cênicas na UEL – Universidade Estadual de Londrina, sentada no chão do teatro, eu vivi um espetáculo bem de perto, do meu jeito, dentro. Era Salt1, de

Roberta Carreri e Jan Ferslev, integrantes do grupo dinamarquês Odin Teatret. O que eu havia estudado na teoria acontecia ali, à minha frente. Pontos de interrogação, que hoje movem a pesquisa que desenvolvo, começavam então a surgir. O que existia naqueles corpos que me convidava a imergir naquele ambiente? O encenador italiano Eugenio Barba, diretor do Odin Teatret, chamou esse potencial encantatório do artista de “presença cênica”, uma presença passível de emergir por meio

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de um treinamento, e da disponibilidade de relação do artista com a técnica e com o público (BARBA; SAVARESE, 1995).

Em 2006, perseguindo esse termo no teatro e na dança, fui assistir ao espetáculo de Pina Bausch (1940 – 2009)2: Para as crianças

de ontem, hoje e amanhã no teatro Alfa de São Paulo. Na ocasião eu dividia minha atenção entre o espetáculo, acontecendo à minha frente, e a presença de Pina, sentada a algumas fileiras de distância. O músico brasileiro Caetano Veloso, também estava lá nesse dia. Esse artista tem uma música que diz assim:

A tua presença

Entra pelos sete buracos da minha cabeça A tua presença

Pelos olhos, boca, narinas e orelhas A tua presença

Paralisa meu momento em que tudo começa A tua presença

Desintegra e atualiza a minha presença A tua presença

Envolve meu tronco, meus braços e minhas pernas [...]3.

As presenças de Pina e de seus bailarinos me envolviam. A trilha sonora que dizia que a presença de um “desintegra e atualiza” a presença do outro, passou a ressoar insistentemente em mim, e me ajudou a compreender que a presença cênica que eu reconhecia nos bailarinos do Tanztheater Wuppertal não se limitava à exímia execução de movimentos, pois cada bailarino tinha um modo particular de estabelecer a relação com a técnica e com o público, uma apresentação da própria vivência, de um segredo que me fazia acreditar, mesmo diante de seiscentas pessoas, que a dança era comigo4. Ao vivenciar isso, passei a perguntar: se a ideia

2 A alemã Philippine Bausch foi coreógrafa, dançarina, pedagoga de dança e diretora do Tanztheater Wuppertal por 36 anos.

3 A Tua Presença Morena – Caetano Veloso. Retirado do sítio: <http:// www.radio.uol.com.br/#/letras-e-musicas/caetano-veloso/a-tua-presenca-morena/94777>. Acesso em: 10/01/2013. Nesse link é possível também ouvir a música citada.

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de presença cênica está ligada a forma com que cada artista relaciona a técnica, a vivência pessoal na arte e a presença do público, que tipo de treinamento para a presença seria possível?

No processo de redação do Trabalho de Conclusão do Curso de Artes Cênicas (UEL), a ideia de presença, ainda bastante mistificada, esteve entre essa possibilidade de emergir das relações do artista com a técnica e com o público, e a possibilidade de se considerar a própria vivência do artista e seu modo singular de estar em relação, no ato presencial.

A incursão em campos teóricos que acolhiam a interdisciplinaridade na abordagem do corpo, e suas possibilidades relacionais nas artes da presença, foi o caminho que me levou até o Programa de Pós-graduação em Teatro da UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina, para ser orientada pela autora que havia revirado meu jeito de pensar/ser o corpo, a professora Sandra Meyer Nunes5.

As muitas possibilidades que emergiram no percurso de interrogações sobre o termo presença, convidavam a escolhas, uma delas é a que pretendo dividir neste trabalho, em uma breve exposição de reverberações de vivências, e de discussões com as quais tive contato.

A presença, aquela do potencial encantatório do artista, ganha muitos pontos de interrogação: seria mesmo uma atribuição do artista provocar encantamento no público e sustentar a relação com sua presença? Ou a potência do encontro na arte da presença poderia, por outro lado, alimentar-se no aqui-agora, no que acontece entre os que se envolvem nesse ambiente relacional?

1.1 PRESENÇA CONSTRUÍDA

A noção de presença, do modo que eu a compreendia ao ver a Roberta Carreri, ou os bailarinos de Pina Bausch, ou até mesmo a que

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teria alimentado meu sonho de infância de ser bailarina, poderia se tratar de uma presença socialmente construída, como observou a pesquisadora Maria Brígida de Miranda6 em uma discussão sobre esta dissertação7. Essa

presença construída estaria sujeita a uma noção prévia, que geralmente mensura os trabalhos artísticos por juízo de valor e, consequentemente, poderia nos provocar encantamento, admiração ou indiferença, antes mesmo de termos contato com os artistas e seus trabalhos.

Que dinâmicas poderiam ter construído tão fortemente uma presença da bailarina, capaz de fazer com que uma criança (eu) chegasse a prenunciar seu futuro, sem sequer ter assistido a um espetáculo de balé, e mal tendo acesso à mídia televisiva? Tenho perseguido, de muitos modos, a presença da bailarina desde então. E talvez muitas outras pessoas o tenham, a seus modos, porque há todo um sistema de construção de imagens-presença, envolta nos metros de tule engomado do tutu da bailarina8, e reafirmada tanto nos traços suaves e delicados

da figura da jovem princesa dos roteiros clássicos, quanto no poder de, virtuosamente, dançar nas pontas dos pés diante de um grande público.

Tais conexões convidam a discutir a esfera política dessa construção de presença, ao ter implícitas questões sócio-culturais que, de algum modo, determinam nossa forma de ver e viver as coisas, muitas vezes orientados por noções de maior ou menor valor. Essa baliza que constrói pré-presenças pode nascer e se alimentar em sistemas acadêmicos, literários, e midiáticos, apresentando artistas, espetáculos e pesquisadores de modo a se imprimir uma aura, que pode, por sua vez, cultivar em nós certo fascínio diante dessas presenças preconcebidas. A noção de presença, se abordada nesses termos, estaria ligada a uma espécie de validação, que tem o potencial de homogeneizar opiniões e alimentar estruturas de poder, como as problematizadas pelo filósofo francês Michel Foucault (1984).

6 Professora dos Cursos de Graduação e Pós-graduação em Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina.

7 Por ocasião de minha banca de qualificação que aconteceu no dia 16/09/2013 no Centro de Artes da UDESC.

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Imagem 2- Certificado de participação do concurso de coreografias da Academia Marcia Angeli do ano de 1998, em Maringá - PR.

Fonte: Acervo pessoal

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Imagem 3 – Trabalho da artista polonesa Erwina Ziomkowka – s/título.

Fonte: Blog da artista <http://erwina-ziomkowska.blogspot.com.br/>

Dinâmicas de validação que ratificam o ato de julgar as coisas, pessoas ou fazeres, por mais ou por menos, contribuem com uma configuração social que pode ser dintinguível em duas polaridades: ter poder ou sujeitar-se a ele. Fredric Jameson9 (2001) em sua observação do

desenvolvimento político-social pós-moderno, afirma que a cultura está associada às formas de manutenção do modo de produção capitalista. A diligência capitalista, por exemplo, reforça essas polaridades vinculadas à atribuição de juízo de valor ao construir modelos a serem seguidos, imagens-presença a serem conquistadas. Na arte, mais especificamente, na indústria da cultura, se sustenta um mecanismo de criação de pré-presenças diante da intenção de se vender produtos. E assim, movem-se em direção a um show de rock’n roll milhões de fãs, cujo maior sonho é ver determinado artista, de perto. E assim, permite-se que uma pintura de grafite possa valer sessenta dólares em um dia, quando apresentada por um vendedor anônimo na rua, e trinta e dois mil dólares em outro,

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ao ser revelada a identidade do artista que a pintou, o grafiteiro e ativista político britânico Banksy10.

John Dewey11 (2010), ao observar o contexto em que a

produção artística se desenvolve no início do século XX, afirma que o entendimento do espaço do museu como forma de ostentação de poder, e a transformação da arte em moeda de troca pelos colecionadores, imprimem um cerceamento da cultura, com a noção de bom gosto que determina o que faz (ou não) parte desse mundo da arte. Segundo Dewey, essas transformações ligadas ao crescimento do capitalismo desvinculam a experiência artística da experiência comum. Obra e artista ganham com isso uma aura, algo que os torna inacessíveis e admiráveis. O fazer artístico se afasta de uma possibilidade de partilha para, segundo Dewey, se prestar a contemplação. Seria quase como dizer: “Não se aproxime! Arte!” E, com isso, alimentar o fascínio por algo intocável12.

Para o filósofo norte-americano Abraham Kaplan (in: DEWEY, 2010, p. 39), as reações à arte dependem de convenções estabelecidas, essas convenções dizem respeito, entre outras coisas, a exigências de coerência, relacionadas à noção de significado. Conforme observa esse autor, “os materiais expressivos são prenhes de significação” e “os significados apreendidos são extraídos de experiências anteriores,

10 Refiro-me a uma das ações realizadas por Banksy em Nova York, que integram uma residência artística chamada Better Out Than In (Melhor fora do que dentro) que aconteceu durante o mês de outubro de 2013 em que o artista se encarregou de revelar pelo menos uma obra de arte por dia nas ruas de Nova York. Outras informações sobre esta ação podem ser conferidas no site: < http://en.wikipedia.org/wiki/Better_Out_Than_In > Acesso em: 02/01/2014. E outra ação do artista com esse mesmo caráter pode ser conferida no site: < http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/cultura-e-lazer/segundo-caderno/ noticia/2013/11/quadro-de-us-50-e-vendido-por-us-615-mil-apos-intervencao-de-banksy-4320674.html > Acesso em: 02/01/2014.

11 Filósofo, psicólogo e pedagogo norte-americano.

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inclusive do condicionamento cultural”. A presença previamente contruída estaria vinculada a essa ideia de condicionamento, que determina como recebemos a proposição artística. Embora o tema desta pesquisa ofereça possibilidades de aprofundar a discussão convocada por Hans Ulrich Gumbrecht13 (2010), sobre a criação e manutenção de significados para

as coisas, e as consequências de atribuição de juízo de valor nas relações, a abordagem de presença que esta dissertação contempla está mais direcionada ao que o artista pode produzir e compartilhar14.

Imagem 4- Anotações a partir de leituras do livro Arte como Experiência de John Dewey do dia 02/05/2013.

Fonte: Acervo pessoal

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1.2 PERCURSO METODOLÓGICO E SUGESTÕES DE NAVEGAÇÃO

Faço uma incursão nos campos da dança, do teatro e da performance, pesquisando as possibilidades de relação entre artista e público – no que se refere à noção de presença –, e colocando em jogo os conceitos que vivencio, seja por meio da literatura sobre o assunto, seja por meio da experimentação de proposições artísticas15. Nesta perspectiva de

conexões entre leituras e experimentos venho acompanhando o processo de pesquisa do grupo Cena 11 Cia. de dança, dirigido pelo coreógrafo Alejandro Ahmed, desde abril de 201216, experiência da qual extraio

grande parte dos elementos apresentados neste trabalho. Também faz parte deste campo experimental a participação em mais dois processos: o Workshop Exercises for rebel artists17, com o grupo La Pocha Nostra,

15 Desenvolvo atualmente uma pesquisa experimental de composição em dança e performance, partindo das noções de espacialidade, presença e interatividade, junto a outros quatro artistas-pesquisadores: André Sarturi, Michele Louise Schiocchet, Paloma Bianchi e Raquel Purper. Nos propomos a experiências compositivas que consideram a transformação das relações entre corpo-tempo-espaço. Observamos com isso as reverberações, na produção artística, da lógica da descentralização de informações, característica da cibercultura apresentada pelo filósofo da informação francês Pierre Lévy (1999). Embora essa experiência não seja analisada nesta dissertação, suas reverberações a integram, uma vez que entendo a experimentação de conceitos como modo de testar seus efeitos no corpo, de colocá-los em movimento. 16 O grupo, com sede em Florianópolis, tem vinte anos de existência; a pesquisa desenvolvida em seu trajeto implica no desenvolvimento de possibilidades de criação em dança a partir de direcionamentos éticos e estéticos que relacionam corpo e ambiente. Há nesse grupo um interesse em aliar dança e tecnologia, como a exploração de dispositivos de mídia, softwares interativos, robôs, e próteses, e quando não há a utilização desses aparatos, há a contaminação no movimento por uma lógica de operação algorítmica, que se revela esteticamente ao se provocar emergências no ato relacional entre os corpos por meio da exploração de parâmetros, que exploram basicamente estados de inevitabilidade e prontidão. Os integrantes do grupo são: Adilso Machado, Alejandro Ahmed, Aline Blasius, Anderson do Carmo, Hedra Rockenbach, Jussara Belchior, Karin Serafin, Malu Rabelo, Marcos Klann e Mariana Romagnani. Outras informações sobre o grupo podem ser consultadas em Spanghero (2003) e no site: www.cena11.com.br.

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liderado pelo artista mexicano Guillermo Gómez-Peña18; e a Residência

MODO OPERATIVO AND19 com João Fiadeiro e Fernanda Eugénio20.

As vivências desses três processos artísticos, em suas diferenças e semelhanças, contaminaram o percurso desta pesquisa de mestrado, ao que se incluem as questões geradas, as descobertas e as contradições. O modo pelo qual esses artistas/pesquisadores abordam as relações entre corpo e ambiente foram cruciais para o desenvolvimento do meu processo de escrita sobre presença, uma vez que, ao experimentar seus conceitos e modos de operação, a pesquisa pôde se aproximar da ordem da vivência no corpo, da materialidade da relação com outros corpos e ambientes.

o trabalho do grupo intitulado La Pocha Remix: Psycho-Magic Actions Against Violence,o qual tive a oportunidade de presenciar no dia 12 de julho de 2012.

18 Performer que incursiona em distintas áreas artísticas como fotografia, vídeos e ciber-arte, explorando assuntos como: imigração, novas tecnologias e políticas da linguagem. É fundador do grupo La Pocha Nostra em parceria com Roberto Sifuentes e Nola Mariano, sediado em San Francisco, EUA, que conta hoje com a colaboração de nove performers de diferentes países, além de parcerias com outros grupos de performance do México, Espanha, Austrália, Inglaterra, Colômbia entre outros. O grupo mantém pesquisas constantes sobre performance e propõe atividades pedagógicas nos países em que apresentam seus trabalhos. A experiência aqui descrita tem entre outras fontes o livro: Exercises for Rebel Artists: Radical Performance Pedagogy, de Guillermo Gómez-Penã e Roberto Sifuentes (2011). Outras informações sobre o grupo podem ser obtidas no site: <http://www.pochanostra.com/home/>.

19 Residência que aconteceu em Florianópolis na semana de 03 a 07 de junho de 2013, por ocasião do Festival Múltipla Dança. Organizada pela professora Sandra Meyer Nunes e promovida pelo Programa de Pós-graduação em Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina, contou com a parceria da Funarte. Os encontros aconteceram nas dependências do Ceart – UDESC, totalizando 20h/aula.

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No percurso metodológico da dissertação, articulo, inicialmente, dados provenientes de pesquisa bibliográfica, com a intenção de levantar certas questões que considero importantes sobre a noção de presença; em seguida, faço conexões entre essas referências literárias, problematizando o conceito de presença em algumas práticas artísticas contemporâneas que observei, e que vivenciei de modos distintos no decurso da pesquisa, considerando suas especificidades, mas também buscando o que pudesse ser comum entre esses processos, não distinguindo, por atribuição de juízo de valor, uma e outra prática. A orientação metodológica tem referência nas afirmações de Sylvie Fortin21 (2009) que, a partir de um

estudo sobre metodologia de pesquisa em artes, propõe a etnografia e a auto-etnografia como possibilidades metodológicas que consideram as especificidades do fazer artístico na pesquisa acadêmica em artes.

Fortin (2009) defende que uma forma de compreender a prática artística seria “colocá-la em relação ao pensamento e ao agir dos participantes”, e para isso, uma das proposições seria acolher a transposição do processo de “bricolagem”, inerente aos processos artísticos, para a metodologia da escrita, bricolagem esta definida como a “integração de elementos vindos de horizontes múltiplos” (2009, p. 78). A autora afirma que a coleta de material na pesquisa etnográfica é fundamental, e a vivência do pesquisador sobre o campo pode considerar, inclusive, as suas reações somáticas como um tipo de dado etnográfico. Tal investimento carrega “o potencial de aproximar o leitor de uma compreensão baseada na experiência do pesquisador em presença íntima com a coisa a ser compreendida” (FORTIN, 2009, p. 82). Por outro lado, Fortin ressalta que há distinção entre estudos etnográficos e dados etnográficos, pois os dados etnográficos poderão emergir de métodos distintos, tais como: a etnografia, “descrição para compreender as culturas dadas”; a fenomenologia, “descrição para compreender a essência de um fenômeno”; a heurística, “descrição para compreender a experiência vivida”; e a sistêmica, “descrição para compreender uma dinâmica de conjunto” (FORTIN, 2009, p. 79).

Diante dessa possibilidade de percurso metodológico

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apresentada por Fortin, considero as referências textuais sobre presença e sua relação com as vivências em contato com os coletivos Cena 11 Cia. de dança, La Pocha Nostra e AND Lab, como uma articulação de dados etnográficos, pois tanto na conexão de leituras quanto nas observações e experimentações de conceitos, exponho minhas percepções e meus afetos acerca do vivido – compreendendo a leitura e a escrita também como vivência.

O sociólogo norte-americano Howard Becker (2007) afirma que há uma estreita ligação entre ciência e conceito, e que este, por sua vez considera o empírico. Para esse autor, o cruzamento de informações advindas de áreas distintas, podem convergir para um mesmo fim, ou até mesmo originar questões ao se comparar diferentes abordagens. Becker volta a atenção à falta de consenso quanto ao conceito, o que pode trazer embates para a pesquisa, mas que também podem instrumentalizá-la, alargando o campo de visão com as questões que possam emergir desses encontros de informações. Os encontros são percebidos nesta pesquisa como um meio de aproximação entre teorias, e também entre teoria e prática, e por esse motivo tanto a articulação de referências bibliográficas, quanto as experimentações de conceitos aparecem como possibilidades de cruzamento de dados que podem contribuir com o desenho de uma noção de presença relacional.

Bruno Latour22 (2008, p. 52), afirma haver um equívoco na

ideia de distância entre o que deve ser pesquisado e o pesquisador, para ele, “a distância que devemos investigar não é entre observador e observado – exotismo barato –, mas entre os conteúdos do mundo antes e depois da pesquisa, nem a distância nem a empatia são bons indicadores de que se fez boa ciência”. Diante disso, convido o leitor a uma navegação em territórios distintos, em um percurso que acolhe as descobertas, as deducões e os equívocos, entendendo-os por uma perspectiva etnográfica, como elementos inerentes ao fazer artístico e acadêmico. A dissertação que aqui apresento é composta por uma articulação entre: referências textuais, observações de trabalhos artísticos, vivências de processos artísticos, entrevista com integrantes de um dos grupos abordados, e exposição de reverberações das

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vivências no percurso da pesquisa. A partir dessa iniciativa, gostaria de explicitar a tentativa de diluição de hierarquias de valor na abordagem sobre presença relacional, discussão que se inicia já na divisão dualista entre corpo e mente, e que vai direcionar, por muitos anos o modo de sermos e percebermos o corpo, de percebermos as coisas, de vermos e/ou produzirmos arte, e até mesmo de escrevermos sobre ela. O espanhol Jorge Larrosa Bondía23 questiona a divisão entre teoria e

prática ao exemplificar uma postura comum nos centros de ensino, em que “se aprende na teoria o saber que vem dos livros e das palavras, e no trabalho se adquire a experiência, o saber que vem do fazer ou da prática” (2002, p. 23). Muitas são as instâncias pelas quais se podem observar os resquícios dualistas, que inclusive favorecem atribuições de maior ou menor valor. Nesta dissertação procuro alguns meios para problematizar questões como essa, utilizando diferentes fontes de informação, não distinguindo teoria e prática por hierarquia de valor.

Chamo a atenção neste trabalho para alguns hábitos enraizados na divisão entre corpo e mente, teoria e prática, e diferenciação por juízo de valor, o que identifico inicialmente na linguagem, sublinhando algumas palavras que denotam uma herança dualista, e de atribuição de significados estanques às coisas, as quais revelam também a minha própria dificuldade em substituí-las por termos mais abrangentes. Com essa postura, pretendo dar foco à noção de presença tangível, conforme é apresentada por Gumbrecht (2010).

O desejo de aproximar pesquisa acadêmica e prática artística, nessa mídia que é a palavra escrita, explicita-se na desobediência a algumas convenções indicadas para dissertações e teses. O leitor poderá observar: a eventual utilização de uma linguagem coloquial, que se aproxima da fala; a presença de vestígios da pesquisa com esboços manuais e imagens de trabalhos artísticos não relacionados diretamente com o texto entre as páginas digitadas; a exposição do não saber, como elemento da pesquisa; e a minha exposição pessoal. Diante disso, insiro algumas marcas do processo de desenvolvimento desta pesquisa como possibilidade de deixar transparecer os afetos que me incorreram no

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decurso de sua escrita, sem o compromisso de que sejam explicativas. Ao vivenciar a leitura desta dissertação, o leitor poderá verificar a defesa de algumas ideias, descobertas e interrogações que podem transparecer certa pretensão; contudo, tais características nada mais são do que a revelação de momentos entusiasmados na imersão no tema. Paixão haverá de ser uma consideração para este trabalho, por mais que eu tente explicitar as tentativas de imparcialidade. As informações vivenciadas são impressas também em outras memórias, as memórias estimuladas pelas sensações, como a muscular e a do estômago, por exemplo. Reconheço o desafio de recuperar as fontes provenientes de leituras no momento da escrita, muitas delas dissolvidas ao experimentar, como performer, o conceito de presença. Assumo tais riscos diante da vontade de convidar o interlocutor a um fazer junto, a um questionamento de padrões inerentes à prática artística, a exemplo da postura dos artistas e pesquisadores do La Pocha Nostra, Cena 11 e AND Lab.

1.3 MENOS IMPOSIÇÃO

As noções de presença mais evidentes em práticas e discussões herdadas de artistas do teatro, principalmente encenadores, com registro e produções datadas no início do século XX – como Constantin Stanislavski24 (1863 – 1938), Edward Gordon Craig25 (1872 – 1966),

Vsevolod Meyerhold26 (1874 – 1940) e Antonin Artaud27 (1896 – 1948) –

aparecem com proposições que buscam uma aproximação com os aspectos sensoriais das relações. De acordo com o pesquisador teatral italiano Marco De Marinis28 (1995), um movimento em favor da redescoberta do

corpo, a partir da reação à sujeição ao texto dramático, acontece nesse período. Tais intenções direcionaram práticas pedagógicas nas artes presenciais que requeriam um aprimoramento da atenção, da escuta, por

24 Ator, diretor, pedagogo e escritor russo.

25 Ator, cenógrafo, produtor e diretor de teatro inglês.

26 Ator de teatro, diretor e teórico de teatro russo.

27 Poeta, ator, escritor, dramaturgo, roteirista e diretor de teatro.

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meio da percepção das possibilidades da ação corporal para a abertura às relações, assumindo a probabilidade de se provocar efeitos no performer e no espectador. De acordo com De Marinis (1995), uma ação cênica eficaz deveria conter o potencial de gerar (e de gerir) o acontecimento – acontecimento esse que ocorre nos momentos em que a experiência artística torna-se potente e intensa ao ponto de provocar transformações nos corpos. A possibilidade de se causar efeitos sobre o espectador foi atribuída, dentre outros elementos, à presença do artista.

A presença seria aproximada, tempos depois, à ideia de dilatação, proposta pelo encenador Eugenio Barba, que, a partir de um conjunto de abordagens da ação do ator/bailarino, desenvolve preceitos pré-expressivos, destinados à articulação de energia que evidenciariam a presença cênica do artista (BARBA; SAVARESE, 1995). O pesquisador brasileiro Gilberto Icle29 (2011 p. 17) ressalta que “Eugenio Barba e o

grupo de pesquisadores e artistas que compõe a ISTA (International School of Theater Anthropology) circunscrevem os elementos da presença em torno do paralelismo com o significado, ao cunhar o termo pré-expressividade”. Ao trazer essa informação, Icle aponta para uma das questões a serem abordadas nesta dissertação que diz respeito a uma tradição de interpretação de significados que, segundo Gumbrecht (2010), nos afasta da materialidade das coisas, e que parece, portanto, se afastar das relações tangíveis entre os corpos envolvidos em uma experiência estética, assunto que será retomado ao longo desta dissertação.

No final do século XX e início do século XXI, as noções atribuídas à energia do ator não parecem ainda descartadas, mas agregadas a outras demandas que respondem às aspirações de uma abordagem contemporânea do corpo a partir da noção de embodiment30,

uma reação ao pensamento dualista, como se observa em afirmações de Meyer (2009). A adesão à interdisciplinaridade, ao crescimento de um movimento que reage à noção de corpo fragmentado – dividido em dimensões físicas e espirituais –, a confluência de discussões filosóficas, científicas e artísticas não dualistas, contaminam gradualmente o modo de fazer arte, evidenciando a noção de experiência vivida no corpo.

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A ênfase na experiência do corpo foi ganhando inúmeros desdobramentos, e estes foram potencializados em práticas performativas, como se pode observar em trabalhos como os dos artistas brasileiros Lygia Clark (1920 – 1988) e Hélio Oiticica (1937 – 1980), e da performer sérvia Marina Abramovic. Tais encadeamentos abriram caminhos a abordagens do corpo em devir constante, tornando possível também a incorporação mais recente das ciências cognitivas às pesquisas artísticas31.

Novas palavras surgem para descreverpossibilidades desse fazer nas artes presenciais, a presença cênica passa à presença, aproximando-se da noção de performatividade enraizada em conceitos de John Langshaw Austin32 (1962), e que atualmente é abordada por muitos

estudiosos das artes presenciais, dentre eles a alemã Erika Fischer-Lichte33

(2011). A apresentação transforma-se em presentação, ao considerar esse artista que transita entre a ficção e a realidade do seu estado corporal, em produções cujas fronteiras de linguagens tornam-se cada vez mais fluídas. O estar ali, característica primeira da arte da presença, passa a exigir outros modos de operação do artista e do público. O artista parece mais o propositor do que o determinante da experiência, que já não se faz somente vinculada aos significados (GUMBRECHT, 2010): quer subvertê-los, como na abordagem da performance que a brasileira Eleonora Fabião34 (2009) nos apresenta. O público, antes testemunha da

ação, passa a participante, a compositor no ato presencial do encontro. A presença passa a se configurar como ausência de uma pessoalidade exacerbada, em favor da emergência do acontecimento entre corpos que se afetam mutuamente na relação.

Explico as conexões.

31 Estudos como os das pesquisadoras brasileiras Christine Greiner; Helena Katz (2005), de Meyer (2009), e do pesquisador italiano Marco De Marinis (2012) estabelecem conexões interdisciplinares entre a arte e as ciências cognitivas em abordagens do corpo em relação com o ambiente.

32 Filósofo britânico.

33 Professora no Instituto de Estudos de Teatro na Universidade Livre de Berlim.

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O artista, já na era da reprodutibilidade técnica que Walter Benjamin35 (1987) observa, perde, juntamente com a obra, sua aura.

Na era da cibercultura, a lógica digital influencia o comportamento humano que a recria constantemente, mas que também é recriado nesse movimento fractal, rizomático, como as afirmações de Pierre Lévy (1999) nos esclarecem. Neste contexto “hipertextual” (LÉVY, 1999) da lógica digital – contexto em que absorvemos e somos absorvidos, simultaneamente, por múltiplas janelas que se abrem instantaneamente aos nossos sentidos –, a proposição artística que se mantém nos apegos ilusórios de uma audiência passiva, arrisca-se ao congelamento mútuo. Em tempos de simultaneidade, a noção de experiência artística presencial ganha novas articulações ao assumir os afetos (ESPINOSA, 1992), já que estes incorrem no aqui-agora do encontro entre corpos36.

A arte como experiência presencial, no aqui-agora, convida aos múltiplos sentidos com outros meios relacionais que parecem invitar o artista a um dado de renúncia, de espera, de ausência, pois a potência de acontecimento, de mudança, reside agora nas emergências do encontro entre os corpos (AHMED, 2012), (EUGÉNIO; FIADEIRO, 2012), (LEPECKI, 2012). A audiência já não é somente audiência, o espectador não espera para testemunhar o que acontece ao artista; o público, já acostumado às mídias, às muitas janelas, carece de outras vias de afeto, e assim é convidado a participar, a comprometer-se no ato do encontro, a exemplo do que aponta a psicanalista brasileira Suely Rolnik (1996, p. 9): “O artista como propositor de condições para o receptor deixa-se embarcar no desmanchamento das formas – inclusive as suas –, em favor das novas composições de forças que seu corpo-vibrátil vai vivendo ao longo do tempo”.

Ao identificar que, em uma relação, todos os envolvidos podem sofrer transformações, a noção de verticalidade vai sendo substituída pela de horizontalidade. O filósofo francês Jacques Rancière37 (2010), ao

35 Walter Benedix Schönflies Benjamin (1892 - 1940) foi um filósofo, sociólogo e pensador judeu alemão.

36 No primeiro capítulo desta dissertação faço uma breve exposição da definição de afeto pelo filósofo holandês Bento Espinosa (1632 – 1677), a fim de incorporá-la à discussão sobre presença relacional.

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questionar a distância que se criou entre artista e espectador, traz pistas para essa configuração de disposição hierárquica entre o propositor da experiência artística e o participante, associando esse fato à herança de uma educação que imprimiu a divisão entre sábios e ignorantes. Em uma entrevista concedida a Guilherme de Freitas38, Rancière afirma:

Creio que a questão não é tanto o que as artes podem fazer pela emancipação das pessoas, mas sim o que podem fazer para emancipar a si mesmas. Os artistas só poderão contribuir para a emancipação se entenderem que se dirigem a semelhantes, em vez de achar que estão transformando ignorantes em sábios. Isso só é possível se a instituição artística colocar seus princípios em questão permanentemente. Assim como um pedagogo não pode achar que está lidando com aprendizes incapazes, um artista não pode tentar antecipar o que o espectador deve ver ou compreender. Nessa nebulosa confusa que chamamos de arte contemporânea, abraçar a dúvida sobre as capacidades da arte pode ter uma função emancipatória (RANCIÈRE apud FREITAS, 2012).

Nesta observação de Rancière é possível identificar que o mesmo defendea diluição de uma barreira de pré-conceitos39 que colocam de um

lado o artista, como aquele que sabe das coisas, e do outro o espectador, como aquele que, passivamente, recebe as informações. Essa postura de diferenciação, que estabelece um tipo de hierarquia, é ainda vigente nas práticas artísticas contemporâneas. Algumas possibilidades de diluição dessas fronteiras (in)surgem nesse movimento em favor de uma arte relacional, que quer afetar sensorialmente, e que posiciona o artista como aquele que também é afetado na relação. Nestes termos, a tentativa de antecipar o que o espectador deverá sentir na experiência artística, já não parece tão adequada, uma vez que as relações passam a considerar, nesse

38 Publicada no jornal O Globo em 08/12/2012.

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trânsito, as conexões de cada sujeito diante dos estímulos sensoriais e das respostas a eles. A segurança do significado, do consenso, nos quais antes era possível se apegar, parece escorrer entre os dedos daqueles artistas que ainda insistem nessa ilusão de domínio sobre o espectador.

Imagem 5 – Performance dos artistas chineses Sun Yuan e Peng Yu Teenager teenager (2011) – Sofás, gel de sílica e fibra de vidro

Fonte: <http://highlike.org/?s=sun+yuan++peng+yu&x=0&y=0>

Considero que os projetos dos artistas aqui citados – grupo Cena 11, grupo La Pocha Nostra e AND Lab –, em suas respectivas abordagens, buscam uma espécie de emancipação próxima àquela apontada por Rancière. A noção de presença, aquela do destaque, da segurança, da apreensão da atenção do espectador, se dilui em favor da incidência, do que emerge das presenças no aqui-agora, no entre corpos. Tais evidências contaminam minha prática artística e minha escrita. Com o intuito de dividir essas conexões, faço um convite à imersão neste contexto, ciente de que se trata de uma possibilidade investigativa dentre muitas que já existem sobre presença, acreditando também que, ao se tecer questões por meio de experiências teórico-práticas, convida-se ao movimento na arte.

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vivida, buscando referências para os termos: afeto – em Espinosa (1992); experiência e experiência na arte – em Benjamin (1987) e Dewey (2010); sujeito da experiência e escuta – em Bondía (2002); e inicio uma discussão acerca dos efeitos das atribuições de significado em relação à presença tangível, a partir de teorias de Gumbrecht (2010), que traz um posicionamento sobre a distância da materialidade das coisas diante da cultura da interpretação de significados.

No segundo capítulo, intitulado Iminências do corpomente na arte: Pistas para uma genealogia, apresento reflexões acerca da noção de presença na arte a partir do advento da redescoberta do corpo, observada em práticas de encenadores do início do século XX, chegando a algumas abordagens da presença como: a capacidade de gerar empatia; a presença como energia e dilatação; a presença como conexão com o ambiente; e a presença como possibilidade de afeto/convite. Neste capítulo, utilizo referências de Marco De Marinis (2005), Béatrice Picon-Vallin40 (2008),

Eugenio Barba e Nicolas Savarese41 (1995), Erika Fischer-Lichte (2011) e

Suzanne M. Jaeger42 (2006), entre outros.

No decurso da escrita do terceiro capítulo, questiono: Que corpo poderia estar no aqui-agora?, traçando um recorte em favor da noção de embodiment a partir de abordagens de António Damásio43

(1996, 2004, 2011), Sandra Meyer (2003, 2009), José Gil44 (2001, 2004),

Paul Churchland45 (2004) e Michel Bernard46 (2001), entre outros.

Neste capítulo, exponho também alguns encontros que tive no percurso desta pesquisa de mestrado, experiências com as quais apresento as

40 Professora de história do teatro no Conservatório Nacional Superior de Arte Dramática de Paris.

41 Pesquisador teatral membro da ISTA (International School of Theatre Anthropology).

42 Professora de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Central Florida em Orlando.

43 Médico neurologista, neurocientista português que trabalha nos estudo do cérebro e das emoções humanas. É professor de Neurociência na University of Southern California.

44 Filósofo, ensaísta e professor universitário português.

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reverberações das leituras em situações vividas na condição de artista e espectadora. Encontrei Guillermo Gómez-Peña, Dani d’Emilia e Roberto Sifuentes em um compartilhamento de seus processos, no Workshop Exercises for rebel artists, uma experiência-ritual na qual pude experimentar as possibilidades de presença que estavam latentes em mim, descobrindo as potências e as impotências nesse movimento; e encontrei Alejandro, Aline, Adilso, Anderson, Hedra, Jussara, Karin, Malu, Marcos e Mariana, que dançaram, discutiram, caíram, mudaram-se, correram riscos, nesse processo investigativo que o Cena 11 propõe, permitindo que eu trouxesse a esta pesquisa o movimento de exposição de afetos, ora os deles, ora os meus.

Finalizo a sequência deste percurso da pesquisa apresentada no quarto capítulo, intitulado: Possibilidades de presença/ausência no terreno movediço de co-incidências, ambicionando uma abordagem da presença como ausência. Neste capítulo, trago relatos de um encontro que vivenciei na aproximação com as ferramentas-conceitos do MODO OPERATIVO AND de João Fiadeiro e Fernanda Eugénio (2012), que propõem uma oposição a algumas lógicas de funcionamento já automatizadas no corpo, como a da manipulação das coisas e da busca pela grande ideia, em favor do ato de re-parar, convidando o artista a se desvencilhar da figura propositiva para permitir que a potência de acontecimento seja gerada e gerida no encontro, na comunidade. Ainda neste contexto, o antropólogo cultural e estudioso de performance brasileiro André Lepecki47 (2009, 2012) oferece algumas possibilidades

de abordagem da presença no ato de refinar a escuta, ao analisar as relações entre sujeito, objeto e dispositivo. O autor oferece também em seu trabalho um percurso acerca da presença como ausência, deixando pistas para a continuidade do processo instigante que tem sido a abordagem da presença em relação.

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2 ENTRE PRESENÇA E EXPERIÊNCIA TANGÍVEL

A abordagem de presença que tem me interessado, cada vez mais, no decurso desta pesquisa, está muito próxima de noções vivenciais, do aqui-agora, dos modos de incursão em terrenos de iminências no encontro entre os corpos. Diante disso, proponho a articulação de algumas referências acerca da noção de experiência tangível e presença, que servirão como uma espécie de introdução ao tema que pretendo problematizar ao longo deste trabalho. Algumas questões direcionam o recorte teórico que apresento, e também serão recorrentes nesta pesquisa, sendo uma delas: Que noções de presença poderiam carregar o potencial de gerar afetos na experiência artística?

2.1 AFETO

A acepção espinosiana de afeto (affectus) o traz como efeito que emerge do encontro entre os corpos. Segundo Espinosa (1992), o corpo é constantemente modificado diante dessas relações, o que poderia aumentar ou diminuir sua potência de agir. Há, para ele, um esforço inerente à existência para conservar sua natureza, o que é chamado de conatus, mas há também os efeitos dos encontros que não são passíveis de controle, pois não seria possível comandar a interferência de um corpo sobre outro.

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compreendido por Espinosa como paixões ativas. Portanto, por mais que os afetos possam ser imprevisíveis, e que não seja possível ter consciência de todos os afetos que incorrem em um encontro, conforme nos esclarece o autor, é possível compreender as impressões dos afetos no corpo ao reconhecê-los.

A filósofa francesa Chantal Jaquet (2011, p. 126) afirma que Espinosa “restringe o domínio dos afetos somente às afecções que aumentam ou diminuem, ajudam, ou coíbem a potência de agir”. Segundo ela, Espinosa chega a fazer uma separação do que são afetos e afecções. A admiração é afecção mais não é afeto. Alegria e tristeza o são porque alteram nossa potência de agir. Desta forma, Jaquet (2011, p. 124) conclui que “todo afeto é uma afecção, mas nem toda afecção é um afeto”. Segundo a autora, a afecção é uma espécie de estado da essência humana, inato ou não, em suas transformações no tempo, seja atribuído pela extensão seja pelo pensamento.

Se nos aproximarmos das noções de afecção e de afeto, do modo que Espinosa (1992) as expõe, a noção de presença em relação consideraria também as afecções que circunscrevem o encontro entre artista/performer e público. O performer seria capaz de afetar com sua presença, mas ao mesmo tempo perceber os afetos que a presença do público lhe causaria. Nas palavras de Espinosa: “Por afeto, entendo as afecções do corpo, pelas quais a potência de agir desse corpo é aumentada ou diminuída, favorecida ou entravada, assim como as ideias dessas afecções” (1992, p. 267). O filósofo holandês traz as proposições de afecção e afeto nesse trânsito entre o afetar e perceber-se afetado.

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e ser afetado. As duas acepções serão evocadas ao longo deste trabalho, por permitirem aproximações com as práticas artísticas contemporâneas que tem foco na relação entre artista e espectador.

Vincular produção de afeto à proposição artística, reconhecendo os efeitos que um corpo ou um objeto artístico tem sobre o outro corpo, conforme observa Simon O’Sullivan48 (2011), é um movimento que se

mostra contra a efetivação de uma abordagem transcendente da arte. O afeto, neste contexto, estaria ligado à factualidade nas relações, ao que escapa à ideia de controle dos afetos que podem incorrer em uma relação presencial. Às artes da presença parece pertinente assumir as consequências de habitar um terreno movediço, no qual as conexões entre corpo e ambiente se fazem e refazem no aqui-agora.

2.2 EXPERIÊNCIA

Para tratarmos da noção de experiência, convido a uma breve incursão à teoria de Walter Benjamin (1987), um autor que localiza esse conceito na modernidade, distinguindo experiência (Erfahrung) e vivência (Elerbnis). Para Benjamin, a experiência - entendida como o conhecimento tradicional passado de geração a geração - se liga à possibilidade de narração, o que assegurava ao ser humano uma ligação com sua história. Porém, na modernidade, narrar a história já não seria mais possível, segundo o autor, diante do avanço da capacidade técnica, vinculada ao desenvolvimento do capitalismo, e também diante das situações extremas da primeira Guerra Mundial que, na visão do autor, emudeceu o homem e gerou um desapego à história. Benjamin afirma que, como consequência desses fatos, o homem passa a não aspirar a novas experiências, querendo libertar-se delas, numa existência simples e episódica que se basta por si só.

Os pesquisadores João Lima49 e Luis Baptista50 (2013, p. 464),

48 Professor de História da Arte / Cultura Visual no Departamento de Culturas Visuais da Goldsmiths College University de Londres.

49 Piscólogo, doutorando no Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica, na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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ao exporem um itinerário do conceito de experiência em Benjamin, observam que o autor apresenta uma alternativa para que ressurgisse na modernidade outro conceito de experiência. Esta possibilidade residiria em “transformações éticas no homem moderno” ao saber dessa pobreza de conhecimentos acumulados, ao “contentar-se com pouco, seguir sempre em frente”, com “clareza de seus limites e possibilidades”. Nas palavras de Lima e Baptista:

Assumir a pobreza da experiência era, portanto, dar uma oportunidade para que o real caráter dessa nova experiência surgisse em todo o seu vigor e simplicidade; era, enfim, uma chance para que o excesso de experiência que não se ligava à sensibilidade moderna pudesse escoar, deixando à vista apenas o pouco que cabia à modernidade. E que com esse pouco, enfim, esse homem soubesse o que fazer – ou ao menos tentasse, mas que essa tentativa fosse definível, material e verdadeira.

Mais próxima a essa noção de experiência para Benjamin, estaria a possibilidade de se desenvolver uma nova arte narrativa, extrato dessa condição fragmentária da experiência da modernidade, e “limitada à existência de um homem” (LIMA; BAPTISTA, 2013, p. 472). Lima e Baptista (2013, p. 452) observam que Benjamin, em um de seus últimos escritos, passa a utilizar a palavra Erlebnis (vivência), com a intenção de “definir uma qualidade especial de experiência”. A experiência, situada mais ao campo da sensibilidade, passaria então a ser nomeada por Benjamin como vivência (Erlebnis) e não mais como experiência (Erfahrung).

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de vivência, conservando suas devidas especificidades. A proposição de Dewey (2010, p. 82) acerca uma visão que se fixa mais ao presente do que se apega ao passado, ao afirmar que “não desfrutamos o presente, porque o subordinamos àquilo que está ausente”. O autor observa ainda que “somente quando o passado deixa de perturbar, e as expectativas do futuro não são aflitivas, é que o ser se une inteiramente com seu meio, e com isso, fica plenamente vivo”.

Se em Benjamin (LIMA; BAPTISTA, 2013) a experiência possível à modernidade é aquela que se limita a existência de um homem diante da impossibilidade narrativa de se relacionar com sua história, as perspectivas de futuro também parecem limitadas, estreitando o espaço deste acontecer. Diante do desejo de aproximação com uma noção de experiência sensível, e de uma experiência possível à arte presencial contemporânea, assumo para esta dissertação a adesão à ideia de experiência artística como vivência, o que Gumbrecht (2010) apresenta também como experiência não conceitual. Portanto, a utilização recorrente da palavra experiência se refere, neste trabalho, à experiência vivida, a erleben, como se observa na tradução alemã, não ignorando o olhar de Benjamin sobre a condição fragmentária da experiência da modernidade, mas considerando a possibilidade de se vivenciar uma experiência limitada à duração das relações tangíveis da proposição artística presencial.

Além dos escritos de Benjamin (1987) sobre experiência e de Dewey (2010) sobre a experiência na arte, escritos de Jorge Larrosa Bondía (2002) sobre o sujeito da experiência, e de Gumbrecht (2010) sobre a tangibilidade da presença, fornecem elementos a serem articulados na abordagem da experiência artística como vivência, como intensidade que emerge na tangibilidade das relações, em um trânsito de afetos, considerando o aqui-agora como possibilidade de conexão entre corpo e ambiente.

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ambiente em que se localiza e aos saberes que ali vigoram. Para esse autor, a experiência é entendida como “o resultado, o sinal, e a recompensa da interação entre organismo e meio que, quando plenamente realizada, é uma transformação da interação em participação e comunicação” (2010, p. 89). O meio seria entendido não somente como espaço em que o corpo se insere, mas também seria o que acontece nesse ambiente, observando-o por uma perspectiva dinâmica sobre o que o compõe. Desse modo, ao tratarmos da possibilidade de interação entre organismo e meio que configuraria a experiência, segundo Dewey (2010) - e diante do desejo de aproximação de uma experiência sensível, como vivência - um refinamento da escuta aparece como elemento a ser explorado.

2.3 ESCUTA

Jorge Larrosa Bondía (2002) oferece alguns subsídios para articularmos uma noção de experiência, relacionada à escuta, que interessa a esta pesquisa, pois sua visão de experiência tem implícito um comprometimento do corpo, exigente de uma abertura ao ambiente em que o sujeito está inserido. Para esse autor, “a experiência não é o que se [grifo meu] passa, mas o que nos [grifo meu] passa, o que nos acontece, o que nos toca” (2002, p. 20). Com essa descrição, Bondía oferece uma abordagem da relação com o meio que convoca a noção de escuta como gesto de interrupção, que requer

[...] parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço (2002, p. 24).

Referências

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