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Capítulo IV: Construção da Problemática e Opções Metodológicas

4.3 Metodologia de análise dos textos da imprensa escrita

4.3.2 A análise de conteúdo e os textos da imprensa escrita

A análise de conteúdo que se aplicou a textos de artigos de dimensão reduzida, ou a segmentos de texto que versavam a INO como assunto claramente à margem do(s) tema(s) principal(is) do artigo, teve por base o recorte de cada texto e de cada excerto respeitante à INO em Unidades de

Informação (UI) e a sua reorganização em categorias. Assim, o modelo de análise de imprensa a

que se recorreu na análise destes textos foi aplicado pela primeira vez, em 1960, por Naville-Morin (Bardin, 2008; Chartier, 2003). Mais recentemente, este modelo foi adaptado por Chartier (2003). Segundo esta autora, pelo facto da quantidade de informação transmitida pelos média se apresentar optimizada (na tentativa de colocar o máximo no mais curto espaço), cada notícia é demasiado visível para passar despercebida e demasiado breve para ficar retida; como consequência disso, o leitor acumula as notícias antes de as selecionar e simplifica-as antes de as assimilar.

Segundo Chartier, Naville-Morin estipulou um paralelo entre o modo de recorte das UI e o modo de seleção da informação por parte do leitor, pois, na sua opinião, a UI adapta-se ao modo de leitura. Voyenne, compatriota de Naville-Morin, por seu lado, estabeleceu, segundo Chartier (2003, p. 68), uma analogia entre os modos de leitura e a forma de recorte da informação: “qualquer jornal convida o leitor a fragmentar a leitura em notícias ‘independentes’, ao sabor da deslocação do olhar”. Na perspetiva de Chartier (2003) este movimento analítico que oscila entre os modos de leitura e o modo de recorte da informação aproxima-se da forma como o jornalista transmite no seu discurso um certo número de ideias a propósito de factos ou de acontecimentos que lhe despertaram interesse e o levaram a partilhá-los com o seu público.

Do ponto de vista lógico, as UI contêm o nível mais geral de compreensão de uma ideia, que é exatamente a que corresponde à realidade concretizada pelo leitor. Do ponto de vista semântico, a

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UI pode compreender algumas palavras, uma frase completa ou um ou mais parágrafos, reatando a mesma ideia ou sentido sem que seja acrescentado mais algum significado (Chartier, 2003).

Com vista ao recorte da informação contida em cada um dos textos, tornou-se necessário definir as regras de recorte da informação em UI, ou seja, identificar as ideias ou assuntos, temas a recortar, a sua definição ou descrição precisa e a seleção de categorias de classificação. Consciente de que os métodos de análise de conteúdo obrigam a um grande distanciamento do investigador relativamente a interpretações espontâneas e, em particular, às suas próprias, como afirmam Quivy e Van Campenhoudt (1995/2008), este processo implicou uma leitura atenta de todos os textos e um cuidado e uma preocupação constantes com a transparência dos procedimentos e decisões.

À partida, face às questões de investigação, estavam definidas seis categorias de classificação: (a) o jornal, (b) o grupo profissional institucional do autor do texto/segmento de texto, (c) a data de publicação, (d) o tipo ou género de artigo dentro género jornalístico, (e) o contexto em que o tema da INO surgiu nesse texto/segmento de texto, e (f) o autor da voz no texto/segmento de texto. Após um processo de codificação e recodificação tendo por base o conteúdo dos textos, identificaram-se: (a) um conjunto de sete temas centrais do artigo no qual o assunto INO foi abordado; (b) um conjunto de três temas enquadradores do conteúdo, por sua vez subdivididos num total de 24 categorias; e (c) um conjunto de 17 agentes tipo, referidos ou citados pelo autor no excerto em análise (Anexo B).

Cada UI foi ainda caracterizada pela sua tonalidade positiva (+), negativa (-), ou neutra ou ambígua (0), consoante o seu autor manifestou uma opinião, crítica ou apreciação, respetivamente, favorável, desfavorável, neutra ou ambígua, relativamente ao assunto tratado, na categoria de conteúdo em que a essa UI se enquadrava. Deste modo, foi considerada positiva toda a opinião, informação, crítica ou apreciação que encorajou, favoreceu, suportou, apoiou, aderiu, subscreveu, susteve, consentiu ou apoiou o assunto em análise, quer tenha sido apresentada como sendo o seu ponto de vista quer tenha sido proferida como sendo de um autor por si referido ou citado; foi considerada negativa a opinião, informação, crítica ou apreciação que desencorajou, desfavoreceu, opôs-se, denegriu, rejeitou, desaprovou, destruiu, refutou, negou ou militou contra o assunto em análise, ainda que apresentada na perspetiva de um outro autor referido ou citado pelo autor do texto. Todos os enunciados factuais que descreveram de uma forma linear o assunto acontecimento ou incidente, sem que daí se inferisse qualquer juízo de valor, ainda que apresentados na perspetiva de um outro autor por si referido ou citado, foram considerados neutros. Consideraram-se, também, neutras todas as UI que revelaram uma tonalidade ambígua.

Finalizado o processo de recorte de cada texto em UI e encerrada a sua classificação procedeu-se ao tratamento dos dados. Partiu-se do geral para o particular e determinaram-se os valores dos índices de parcialidade, orientação e de tendência-impacto do conjunto total de UI. Determinaram-se também os valores dos índices de visibilidade e de peso-tendência (em relação ao

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115 conjunto) bem como os índices de parcialidade e de orientação por temas enquadradores e por categorias de conteúdo, de acordo com o método indicial proposto por Chartier (2003).

O índice de tendência-impacto—definido pelo quociente da diferença entre o número de UI classificadas com tom positivo (𝑈𝐼+) e o número de UI classificadas com tom negativo (𝑈𝐼) e a sua soma, (𝑈𝐼+− 𝑈𝐼)/(𝑈𝐼++ 𝑈𝐼), com sinal dado pelo tom predominante―, mede a impressão global que permanece na opinião pública ou que esta retém de determinado assunto apresentado pelos média. Em certa medida, este índice é, na nossa opinião, uma forma de quantificar a eficácia da luta de opiniões nos jornais, como sendo uma luta por uma opinião do público, isto é, por indivíduos que abraçarão a opinião publicada como sua, ou seja, que a apresentarão como sendo a “sua” opinião, como Silveirinha (2004) refere, citando Tönnies. Este índice de tendência-impacto, ao utilizar apenas as UI parciais (+ ou −) ignorando as unidades neutras (𝑈𝐼0), detém-se sobre a opinião parcial, ou seja sobre aquela em que o autor manifesta o seu compromisso com o assunto. Na opinião de Chartier (2003), a imprensa, na seleção dos assuntos e na sua forma de apresentação, esforça-se por responder aos gostos e às necessidades do auditório para que lhe permaneçam fiéis; ao fazê-lo revela, por uma espécie de simbiose, o estado de espírito da opinião pública. Assim, quanto mais afastado do zero estiver o índice de tendência- -impacto mais a imagem do acontecimento se embeleza ou se deteriora; por sua vez, quanto mais se aproxima do lado negativo tanto mais a impressão negativa do discurso deixa marca ou resíduo desfavorável na opinião pública.

O índice de peso-tendência, ou seja a tendência-impacto aplicada aos temas ou às categorias, permite visualizar o peso de certa categoria relativamente à tendência-impacto, e por conseguinte elucida sobre a forma como cada categoria concorre para o valor do índice de tendência-impacto registado no tema onde se encontra inserida. Por sua vez, a comparação dos pesos-tendência entre si permite saber onde é feita a maior aposta na opinião, ou seja, localiza o problema; é essencialmente neste ponto, ou seja, na introdução deste índice, que residiu a adaptação feita por Chartier (2003) ao modelo de Naville-Morin. O valor do índice peso-tendência de um tema enquadrador ou categoria obtém-se fazendo o quociente entre a diferença do número de 𝑈𝐼+com o número de 𝑈𝐼− do tema enquadrador (quando aplicado aos temas) ou da categoria em análise, pela soma do número de UI parciais totais.

O índice de parcialidade—determinado pelo quociente entre a soma do número de 𝑈𝐼+ e o número de 𝑈𝐼− e número total de UI, (𝑈𝐼++ 𝑈𝐼)/(𝑈𝐼++ 𝑈𝐼0+ 𝑈𝐼)—, em oposição à neutralidade, indica a parcialidade média da opinião emitida sobre o assunto. Este índice mede o interesse e o fervor com que a imprensa cobre um determinado assunto, a paixão com que fala do mesmo, quer em tom favorável (+) quer em tom desfavorável (-).

O índice de orientação—determinado pelo quociente entre a diferença do número de 𝑈𝐼+ e o número de 𝑈𝐼− e o número total de UI, (𝑈𝐼+− 𝑈𝐼)/(𝑈𝐼++ 𝑈𝐼0+ 𝑈𝐼), com sinal dado pelo

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sinal do tom predominante―, informa em que medida o artigo ou conjunto de artigos apresentam aspetos favoráveis ou desfavoráveis ao tema em estudo, quantificando, assim, a convicção com que os autores, de um modo geral, tratam o assunto.

O índice de visibilidade ou de presença indica a frequência, em percentagem, de um tema ou categoria em relação aos restantes, independentemente da sua orientação ou parcialidade e, é um indicador da importância dada ao assunto, no quadro em que se insere.

Por último, sublinham-se dois aspetos que revelam a pertinência deste método. O primeiro prende-se com a comparação dos valores dos índices de visibilidade e de peso-tendência a qual mostra que alguns grupos de UI, apesar de revelarem menor presença, podem ter um impacto mais determinante que outros, relativizando assim os efeitos decorrentes da maior visibilidade dada a um aspeto particular. O segundo, prende-se com o facto de que quanto maior for a parcialidade e mais elevada a orientação de uma categoria de conteúdo tanto maior poderá ser o seu peso-tendência, ou seja, quanto maior forem o fervor com que o autor debate determinado tópico e a convicção que coloca na argumentação tanto maior será a impressão que deixa na opinião pública (Chartier, 2003).

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