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Capítulo IV: Construção da Problemática e Opções Metodológicas

4.3 Metodologia de análise dos textos da imprensa escrita

4.3.1 A análise do discurso e os textos da imprensa escrita

Procura-se, nesta seção, explicitar com relativo pormenor as opções tomadas em termos de procedimentos, no que respeita ao método de análise do discurso, seguindo a proposta de A. Carvalho (2000). Assim, numa primeira fase realizou-se uma análise textual a cada texto individualmente, considerando as seis dimensões definidas pela autora (p. 21)―descritores de superfície e organização estrutural, temas/tópicos, agentes, linguagem e retórica, estratégias discursivas, e posições ideológicas―e numa segunda fase efetuou-se uma análise contextual numa perspetiva diacrónica, recorrendo a uma ferramenta de análise qualitativa de dados assistida por computador (ATLAS.ti).

A primeira dimensão da análise textual, descritores de superfície e organização estrutural, compreendem, segundo a autora, (a) a data de publicação; (b) o autor e a posição institucional que assume; (c) a localização do artigo no jornal (por exemplo, primeira página, destaque, secção, etc.); (d) o tamanho do artigo; e (e) a organização estrutural que inclui o antetítulo, título e o subtítulo ou, em caso de ausência deste último, o lead do artigo, o primeiro parágrafo ou entrada.

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111 Os temas, tópicos ou assuntos, nem sempre são óbvios, como A. Carvalho (2000) sublinha. Estes, por vezes misturam-se ou relacionam-se com acontecimentos. Apresentando a ALV uma multiplicidade de significados, a descoberta dos assuntos pelo qual a INO é abordada, à partida, parece potenciar a possibilidade de desvendar os interesses do autor do texto.

A dimensão os agentes prende-se com os atores sociais102, com as personagens da história a que o autor se reporta e com o enquadramento do poder. A análise de como são construídas as imagens, relações e identidades dos atores sociais tem em vista perceber a sua influência na formação do sentido global, pois o facto do autor de um texto dos média, por exemplo um jornalista, os referirem confere-lhes a capacidade para transmitirem os seus pontos de vista e as suas interpretações, ainda que mediadas e mediatizadas pelos média.

A dimensão linguagem e retórica refere-se a aspetos específicos da linguagem, como sejam a identificação de conceitos chave, vocabulário utilizado (por exemplo, adjetivação, linguagem formal ou informal, técnica, etc.), metáforas, neologismos e outras figuras de estilo. Nesta área, bem como na seguinte, recorreu-se às obras de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2008) e de Breton (2006) sempre que se revelou pertinente.

A quinta dimensão, estratégias discursivas, engloba um conjunto vasto de estratégias das quais se salientam as seguintes: (a) apresentação da realidade sob determinada perspetiva, incluindo ou excluindo certos factos, opiniões ou juízos de valor; (b) construção de responsabilidades; (c) composição desses elementos com vista produzir determinado sentido; (d) narrativa-ação, a qual envolve a construção de uma sequência de acontecimentos previstos e a antecipação de consequências, e implica uma ação como o próprio nome indica; (e) posicionamento, o qual se prende com a construção de atores sociais e com as identidades dos agentes; (f) legitimação, seja através do recurso a normativos, autoridades reconhecidas, ou ainda de outra forma, tendo em vista justificar ou sancionar determinada ação ou poder; e (g) politização, ou seja, atribuição de estatuto ou caráter político a determinada realidade, como, por exemplo, à INO.

A sexta e última dimensão, posições ideológicas, relaciona-se com as representações sociais partilhadas por uma determinada comunidade. Para a autora, A. Carvalho (2000), esta dimensão possui um sentido político: a “ideology is an overarching aspect of the text. It influences the selection and representation of objects, actors, the language, and the discursive strategies employed in a text” (p. 26).

No momento da concretização da análise dos textos, apesar de se ter mantido esta partição da análise textual nestas seis dimensões, visto ter-se considerado uma estrutura bastante pragmática, adequada ao objeto de estudo e exequível, verificou-se que a linha que as separava era por vezes

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muito ténue. Por outro lado, atendendo às questões de investigação que conduziram todo o processo de análise, revelou-se importante sair do contexto do texto e efetuar cruzamentos com outros textos e contextos. Ora, em boa verdade, este aspeto que surgiu ao longo da realização da análise textual prendeu-se também com o facto de se tratar de um longo período temporal de publicações.

Por várias razões que se prendem com o volume das análises textuais seria inexequível integrá-las no texto desta investigação; assim, optou-se por inserir nos Anexos C, D e E, um conjunto representativo do processo de análise textual efetuada, respetivamente, (a) aos artigos dos

opinion makers e agentes entrevistados pelos jornalistas, (b) às Cartas ao Diretor(a)/Cartas do

Leitor, e (c) aos artigos do género jornalístico notícia e reportagem, de cada um dos três jornais. Quanto à análise contextual, esta extrapola a unidade de análise (cada texto individual). Com este tipo de análise pretendeu-se dar uma visão global da forma como o tema INO foi abordado na imprensa, quer em termos da importância que lhe foi atribuído quer da forma como cada grupo de atores, no interior de cada jornal, interpretou determinado assunto ou acontecimento, quer, ainda, da evolução do discurso e do impacto dos acontecimentos nos discursos (e reciprocamente) e destes discursos noutros discursos ao longo do tempo. Assim sendo, a análise contextual envolve duas dimensões temporais: diacrónica e sincrónica.

A análise diacrónica é uma etapa em que o binómio tempo-relação é relevante. Face à amplitude temporal da recolha de dados―2005 a 2013―considerou-se este tipo de análise fundamental. Nesta fase, o olhar incidiu quer sobre as sequências discursivas, isto é, sobre o impacto dos discursos em discursos subsequentes, quer sobre o curso da história, os diferentes acontecimentos, o contexto económico, social e político e ainda, sobre os resultados obtidos pela introdução da INO. Por sua vez, a análise sincrónica-comparada permite aceder às representações de diferentes atores, em determinados momentos, sobre o tema em questão. Através do cruzamento de perspetivas e práticas, procurou-se também reconstruir acontecimentos, cruzar com documentos de modo a conhecer melhor a forma como os discursos mediáticos interagiram e interagem com as políticas educativas.

Efetuou-se, também, uma análise contextual por tipo de artigo, considerando as seguintes

categorias: artigos de opinião e entrevistas, cartas dos leitores, notícias e reportagens; no interior de cada uma destas três categorias considerou-se a subcategoria: jornal de publicação. Assim, tomando por base as análises textuais e as seis dimensões de análise procedeu-se a uma sua análise de conteúdo. O método de codificação de dados respeitante às notícias e reportagens foi realizado através de um processo indutivo, com recurso a uma ferramenta de análise qualitativa de dados

assistida por computador—o programa ATLAS.ti—que tem subjacente a Grounded Theory

desenvolvida nos anos 1960 nos Estados Unidos da América. O recurso a este programa teve em vista facilitar o processo de análise e interpretação dos dados. Neste sentido, permitiu: (a) guardar e gerir uma quantidade significativa de dados; (b) segmentar os textos através de citações e

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113 sublinhados, e codificar texto e citações; (c) comparar segmentos de texto e respetivos códigos; (d) guardar anotações, fazer comentários e memorandos facilitando bastante o estabelecimento de relações entre os dados; e (e) tornou mais simples o acesso ao conteúdo das análises textuais e, por conseguinte, aos textos originais, sempre que se revelou necessário. Este processo foi realizado essencialmente com vista a olhar para os dados numa perspetiva diacrónica. Contudo, dificilmente se conseguiu alhear de atender também a um perspetiva sincrónica-comparativa, pois esta última acabou por emergir e transparecer no processo de análise. Noutros termos, visto os autores dos textos retomarem assuntos que abordaram noutros artigos, rejeitarem argumentos de outros autores na fundamentação da sua opinião, entre outros efeitos característicos do jogo da prática, realçaram- se, aquando da elaboração da análise textual e sempre que se afigurou pertinente, aspetos de contexto diacrónico e sincrónico.

Em suma, procurou-se adotar durante todo o processo de análise e de discussão dos dados um posicionamento metodológico que, embora sempre pautado pelo rigor, permitiu assumir uma atitude flexível.