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Capítulo II: O Papel dos Média nos Processos de Microrregulação das Políticas

2.3 A mediação e a mediatização da política e das políticas

2.3.2 A mediatização segundo Winfried Schulz

Schulz (2004) relaciona a mediatização com quatro processos de mudança social no qual os média tradicionais e os novos meios de comunicação estão profundamente implicados: extensão, substituição, amalgamação, acomodação e adaptação. Segundo este autor, dada sua capacidade tecnológica, os meios de comunicação criam pontes espaciais e temporais que facilitam a comunicação e ampliam os limites da capacidade de comunicação; substituem (parcialmente) as instituições sociais e as formas tradicionais de socialização e de comunicação; na esfera privada ou na esfera pública as atividades combinam-se com outras que implicam o recurso a meios de comunicação; e, os meios de comunicação induzem uma adaptação das organizações e dos atores sociais à sua lógica:

Political actors adapt to the rules of the media system trying to increase publicity and at the same time accepting a loss of autonomy. On the other hand, the media also benefit from such transactions since they make politics more newsworthy and conveniently formatted. (Schulz, 2004, pp. 89-90)

A indústria dos meios de comunicação é uma fonte de capital, de emprego e de aquisição de informação e conhecimento, pelo que, simplesmente pelo facto de existirem, os meios de comunicação promovem a mudança social (Schulz, 2004). São três as funções dos diferentes meios de comunicação, assinaladas por este autor, que de um modo geral formatam os quatro processos de mudança social acabados de descrever e que constituem a essência do processo de mediatização―uma função de retransmissão, uma função semiótica, e uma função económica―do qual resulta um conjunto alargado de dependências e constrangimentos.

A função de retransmissão está relacionada com processos de gatekeeping e de newsmaking que impõem limitações aos mass media; nomeadamente, face à sua capacidade limitada de transmissão e de armazenamento, restringem a autonomia e impõem a heteronomia dos média. Segundo este autor, a função de retransmissão surge frequentemente associada à função de mediação. O termo “mediação”, e as metáforas “janela para o mundo” e “espelho da realidade” referem-se habitualmente, na perspetiva de Schulz, à função de retransmissão que permite que as pessoas acedam a uma realidade social que lhes é exterior e que de outra forma seria praticamente impossível (p. 90). Por outro lado, o facto de os média criarem pontes espaciais e temporais

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51 permitem uma mediação direta, através dos meios de telecomunicação, e uma mediação indireta, proporcionando, deste modo, uma plataforma para discussão e debate de temas entre os agentes no espaço público.

A função semiótica prende-se com o processo de comunicação. Recorrendo às palavras de Schulz (2004, p. 92) “Communication can only succeed if the messages are encoded and formatted in a way suitable for human perception and information processing”. Ora, como o meio define a modalidade―visual, áudio, audiovisual―e condiciona o formato das mensagens, quer a codificação, quer a formatação—elemento fundamental na teoria da mediação, na ótica deste autor—são fatores que afetam o sentido da mensagem e, por conseguinte, são aspetos trabalhados pelos média de acordo com determinadas regras, como por exemplo, as que existem no âmbito do género jornalístico notícia designadas por editing29 e highlighting30e que se prendem (também) com a dimensão cognitiva do processo de mediatização.

Por último, a função económica está relacionada com o facto dos meios de comunicação social utilizarem uma tecnologia que se baseia na produção uniformizada e em série. Porém, prende-se também com o desenvolvimento de economias de escala associadas à comunicação de massa as quais procuram maximizar o lucro através do incremento de bens e serviços a baixo custo de produção contribuindo, deste modo, para a omnipresença dos meios de comunicação. Por sua vez, como as mensagens dos média despoletam reações que geram novas mensagens dos média, estes alimentam este processo e estimulam a procura de novas informações através da divulgação de programas de entretenimento e pseudo-acontecimentos, especialmente adaptados à comunicação social, desencadeando, assim, um processo circular que se auto reforça continuamente e cria uma dependência crescente das funções dos meios de comunicação social.

Segundo Schulz (2004, p. 94), estes aspetos da mediatização aqui focados, são explicados na investigação em comunicação pelas teorias do agenda-setting, priming, cultivação e espiral do

silêncio.

Em suma, Rawolle e Schulz apresentam pontos de vista distintos sobre o processo de mediatização que, no nosso entender, se complementam. No entanto, é preciso, desde logo, sublinhar que o quadro conceptual que Rawolle nos apresenta tem como principal objetivo, como o próprio afirma (2010a), a construção de uma linguagem e um enquadramento metodológico para descrever o processo de mediatização das políticas educativas. Neste sentido, Rawolle

29

O editing é um procedimento que tem como objetivo principal transformar um acontecimento em notícia, dando-lhe uma representação sintética, breve, visualmente coerente e significativa do objeto da notícia (Wolf, 1985/2009).

30

O highlighting é um procedimento que funciona como uma modalidade do editing que seleciona aspetos salientes de um acontecimento, ação ou personagem, em detrimento de tudo o que pareça acessório ou não dramático; é, em suma, uma forma de captar, codificar e memorizar as informações recebidas (Wolf, 1985/2009).

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conceptualiza a mediatização das políticas como um conjunto de práticas―jogo jogado num campo social temporário―de que resultam efeitos cruzados do jogo da prática entre os agentes posicionados em campos distintos. Por sua vez, Schulz define a mediatização como “the role of mass media in a transforming society” (2004, p. 98) sublinhando as três funções dos média que lhe estão associadas.

Na perspetiva de Morgan (2011, p. 139), Schulz usa os dois conceitos como sinónimos. Muito embora Morgan não deixe de ter razão em alguns aspetos, em nossa opinião, Schulz incorpora a mediação na forma como conceptualiza a mediatização. Saliente-se que, para Schulz, a mediatização é um processo de mudança social que o autor atribui a quatro fatores―extensão, substituição, amalgamação e acomodação―, decorrentes, essencialmente, de três funções dos meios de comunicação social que formatam a natureza das mudanças―retransmissão, semiótica e económica―, sendo que as duas primeiras são o suporte da mediação e prendem-se com as funções de agenda-setting, framing e priming. Assim sendo, Schulz propõe-nos uma abordagem que nos parece mais próxima da investigação em ciências da comunicação.