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A ASCENSÃO DO MATE RIO-GRANDENSE (1856 – 1863)

Para avaliar o desempenho do setor ervateiro, durante seu período de ascensão e declínio ao longo do Império, foram considerados os seguintes agentes que o influenciaram: a sanção da Lei de Terras de 1850, a mercantilização das mesmas, os apossamentos em áreas de ervais, o avanço da colonização sobre tais áreas e os desdobramentos da Guerra do Paraguai. Os reflexos desses eventos sobre esse setor foram analisados a longo prazo (33 anos), espaço de tempo neces- sário para identificar como as decisões políticas e econômicas vieram a influenciar o desenvolvi- mento do complexo ervateiro.

Para alcançar tal objetivo, a seguinte proposta metodológica foi utilizada: a quantifica- ção e a análise do volume, do valor e do preço da erva-mate exportada, em comparação com ou- tros gêneros alimentícios que integravam a cesta básica regional e que eram atividades subsidiari- as à ervateira para a formação de um complexo econômico integrado. De acordo com esses crité- rios, os gêneros escolhidos foram o milho, o feijão e a farinha de mandioca. Por conseguinte, os índices de exportação desses produtos, anteriores, durante e posteriores à Guerra do Paraguai, foram pesquisados nas Revistas do Arquivo Público do Rio Grande do Sul,210 para que suas flu- tuações fossem monitoradas durante o período proposto. Com isso, pretende-se verificar que in- fluência a guerra exerceu sobre as oscilações desses índices e mensurar em que proporção às ex- portações do setor ervateiro se comparam com as demais atividades assessoras.

Em relação ao período anterior do conflito, 1856-63, os volumes de exportação, em sa- cos de 60 Kg, da erva-mate, do feijão, da farinha de mandioca e do milho, estão representados no

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Revista do Arquivo Público do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Oficina gráfica da escola de engenharia de Porto Alegre. Nº 08. Dez. 1922.

gráfico da Figura 3.2. De acordo com este, em quatro dos oito anos do período, os volumes de exportação do mate foram os maiores dentre todos os gêneros alimentícios e se mantiveram em torno de 60 mil sacos anuais, a melhor média. O alcance de quase 80 mil sacas de erva em 1862 ocorreu especialmente porque nesse mesmo ano as exportações paranaenses viviam o auge de sua crise, motivada pelo excesso de fraudes na produção. Inclusive, em discursos na Assembleia Le- gislativa, o então Presidente da Província do Paraná, Antônio Barbosa Gomes Nogueira, conjec- turou a paralização dessa atividade extrativa caso não fossem tomadas medidas de fiscalização urgentes211. No geral, também por conta dessa crise, a exportação do mate gaúcho, se comparado com os outros produtos, foi consistente no período de 1856-62 e apresentou ligeira queda em 1863. O milho e a farinha de mandioca, por exemplo, apresentaram oscilações de grande ampli- tude: em torno de 10 mil sacas em 1856 -58, acima de 80 mil em 1859, redução para 60 mil em 1860, nova redução para 30 mil em 1861-62 e, por fim, breve recuperação em 1863. Esse tipo de flutuação atrapalha qualquer expectativa de retorno financeiro para o produtor e caracteriza seto- res muito dependentes das condições sazonais. O feijão, por sua vez, exceto nos dois primeiros anos, apresentou volumes de exportação similares à erva-mate.

Figura 3.2 – Gráfico do volume de exportação dos produtos agrícolas nos anos de 1856-1863.

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Temístocles Linhares. Op. Cit. p, 128

0 20.000 40.000 60.000 80.000 100.000 120.000 1856 1857 1858 1859 1860 1861 1862 1863 Sa cco s d e 6 0 Kg Anos Volume de Exportação

Para os mesmos anos de 1856-63, os valores de exportação, em Contos de Réis, da erva- mate, do feijão, da farinha de mandioca e do milho, estão expostos no gráfico da Figura 3.3. Se- gundo este, a erva-mate foi o gênero alimentício com maior rentabilidade, se comparada aos de- mais produtos, com destaque para o ano de 1857, quando a soma exportada arrecadou 1.200:000$00. Entretanto, o gráfico apresenta uma evidente tendência de queda dos valores de exportação, ao longo do período. Já próximo ao desencadear do conflito, 1863, os dividendos do mate reduziram cerca de três vezes comparados à quantia arrecadada em 1857, o ano mais rentá- vel. Os índices dos outros produtos apresentaram comportamento crescente até os anos de 1859- 60 e decrescente até o final do período.

Figura 3.3 – Gráfico dos valores de exportação dos produtos agrícolas nos anos 1856-1863. Por fim, ainda para os referidos anos, os preços de exportação, em réis por saca de 60 Kg, da erva-mate, do feijão, da farinha de mandioca e do milho, estão mostrados no gráfico da Figura 3.4. Este confirma que a erva-mate foi o produto com a melhor cotação no mercado inter- nacional. Em 1857, ano da maior valorização, a cifra alcançou vinte contos réis por saco. Nesse mesmo ano, o feijão, segundo produto melhor cotado, foi vendido no mercado externo por apenas 11$75,ou seja, duas vezes menos que o valor da erva. No entanto, tal como os valores de expor-

- 200.000 400.000 600.000 800.000 1.000.000 1.200.000 1.400.000 1856 1857 1858 1859 1860 1861 1862 1863 Val o res em Rési ($ ) Anos Valores de Exportação

tação do gráfico 3.2, quanto mais próximo ao início da guerra, os preços decaíram até a marca de 9$94 em 1863.

Figura 3.4 – Gráfico do Preço de exportação dos produtos nos anos 1856-1863.

Essa tendência de queda dos preços dos produtos de origem agrícola, entre 1856-63, anos anteriores à Guerra do Paraguai, está relacionado com o boom inflacionário, da década de 50 dos oitocentos, que se alastrou pela economia mundial, devido principalmente à descoberta do ouro na Austrália, Sibéria e Califórnia. No Brasil, esse aumento da oferta do ouro contribuiu para que grande parte da mão-de-obra disponível se dedicasse ao trabalho nas fazendas de café, que vivia um período excelente. Com isso, as atividades agrícolas assessoras (o feijão, a farinha de mandioca, o milho), com menor oferta, apresentaram alta dos preços nos mercados interno e ex- terno212. Logo, o decréscimo dos dividendos, observado no gráfico 3.2, e a desvalorização dos preços, observado no gráfico 3.3, não indicam necessariamente um prenúncio de crise econômi- ca, mas sim, a reestabilização desses índices após um período de hipervalorização dos mesmos. Entre os produtos assessores, o setor ervateiro também foi influenciado por esse fenômeno.

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Sebastião F. Soares. Notas estatísticas sobre a produção agrícola e carestia dos gêneros alimentícios no Império do Brasil. Rio de Janeiro, RJ: IPEA, INPES, 1977.

R$- R$5,00 R$10,00 R$15,00 R$20,00 R$25,00 1856 1857 1858 1859 1860 1861 1862 1863 Val o res em Rés ($ )/ Sa cas 6 0 Kg Anos

Erva-mate Feijão Farinha de Mandioca Milho