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O DECLÍNIO DO SETOR ERVATEIRO RIO-GRANDENSE (1871 –

Com o término da guerra, somado ao Rio Grande do Sul, à Santa Catarina e ao Paraná, outra região produtora de erva-mate emergiu no Brasil Imperial, o Mato Grosso. O sul dessa Pro- víncia possuía abundantes ervais, explorados apenas pela população indígena local. Thomaz La- rangeira, o responsável pelo fornecimento de suprimentos para as expedições demarcatórias dos

0,00 2,00 4,00 6,00 8,00 10,00 12,00 14,00 16,00 1864 1865 1866 1867 1868 1869 1870 Val o res em Rés ($ )/ Sa cas 6 0 Kg Anos

Erva-mate Feijão Farinha de Mandioca Milho

limites entre o Brasil e o Paraguai, vislumbrou a hipótese de explorar esses ervais para fins econômicos. Com essa meta e com a permissão da província do Mato Grosso, em 1878, ele cons- truiu um empreendimento industrial ervateiro. Posteriormente, em 1882, Larangeira recebeu a concessão de monopólio para a exploração desses ervais,233 que duraria até 1930. Durante esse período, sua empresa exerceu considerável influência política nas decisões governamentais.

A exclusividade econômica na exploração do mate transformou o referido empreendi- mento em um próspero negócio, a Companhia Matte Laranjeira. Na primeira metade do século XX, essa empresa possuía o domínio e o controle territorial de terras devolutas, uma área com cerca de dois milhões de hectares.234 A sua produção de erva-mate era destinada principalmente ao mercado argentino, que a comprava no estágio de cancheamento, tal como procedeu com a erva Rio-grandense. Com o passar do tempo, a produção Mato-grossense alcançou elevados índi- ces de exportação e se tornou uma forte concorrente para o Rio Grande do Sul.

Na mesma década de 70 oitocentista, concomitante ao início da exploração dos ervais no Mato Grosso, o setor ervateiro paranaense se recuperou da crise que viveu na segunda metade do século XIX. Essa recuperação foi marcada pela substituição tecnológica do engenho hidráulico para o engenho a vapor, o que aperfeiçoou os sistemas das secagens, das peneiras, dos pilões, dos misturadores e, de forma geral, de toda a maquinaria.235 Além disso, o mate paranaense já era comercializado em barricas ou em embalagens menores, ambas mais atrativas se comparados com os surrões. Com esses melhoramentos, o mate paranaense ganhou a preferência dos merca- dos uruguaio, argentino e chileno236. Outra consequência dessa nova mecanização foi à substitui- ção da mão de obra cativa pelo trabalho especializado e assalariado, assim como ocorreu em ou- tros setores econômicos do Brasil Imperial237.

Outro fator decisivo para a recuperação do setor ervateiro paranaense foi a implementa- ção de um sistema de escoamento ferroviário. As ferrovias, a partir da segunda metade do XIX, revolucionaram os meios de transporte e sua expansão ganhou grandes proporções em território britânico e em seguida nas demais nações do mundo, o que permitiu a expansão do sistema capi- talista, a transnacionalização de capitais – sobretudo o industrial e o financeiro – a interconexão de mercados outrora distantes e, também, a ocupação dos espaços “vazios”. Motivadas por essas

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Corrêa Filho. A Sombra dos Hervaes Mattogrossenses. São Paulo. Ed. Ltda. SP. 1925. p, 14-15. 234 Corrêa Filho. Op. Cit. p, 26

235

Romário Martins. Ilex Mate, Chá sul americano. Curitiba: gráfica Paranaense, 1926, p, 201 236Temístocles

Linhares. Op. Cit. p, 172 237

circunstâncias, as ferrovias, outro reflexo da revolução industrial, foram construídas em várias províncias do Império. No caso do Paraná, as estradas de ferro foram instaladas no decênio de 1880 e contribuíram à prestação de serviços de locomoção tanto de passageiros quanto de merca- dorias, o que exerceu profunda influência sobre a expansão comercial e industrial dos seus dois principais setores econômicos: o ervateiro e o madeireiro. Além disso, essas novas vias de trans- porte contribuíram à integração e a exploração dos ervais do planalto curitibano que, com o pas- sar do tempo, superou a produção dos primeiros polos ervateiros: Morretes e Antônia. Essa trans- ferência facilitou o escoamento do produto e dinamizou a economia regional238. Desta forma, a erva-mate paranaense retomou seu espaço no mercado internacional e, por conseguinte, superou o mate da província Rio-grandense, que vivia uma de suas piores crises.

Para a Província do Rio Grande do Sul, os quase cincos anos de guerra resultaram em desestabilidade econômica, desiquilíbrio na balança de pagamentos e vertiginosa queda de expor- tação dos setores tradicionais, como a charque e a erva-mate. De certo modo, isso ocorreu porque o setor ervateiro não se reinvestiu durante o período da guerra. As principais inovações desse setor foram realizadas nos finais de 1840-50 e, depois disso, embora essa tecnologia atendesse às demandas do mercado nos primeiros decênios de sua instauração, não ocorreram outros melho- ramentos significativos até o fim do Império. Por conta disso, essa defasagem tecnológica a longo prazo fatalmente contribui com a crise do setor. É difícil precisar a partir de que momento a crise se instaurou de fato pois, como mencionado anteriormente, a economia passava por um período de reestabilização dos preços de vários produtos. Além disso, é notável que a conjuntura interna- cional lhe deu folego durante a guerra do Paraguai, período em que o volume de exportação foi em média 20.000 sacas a mais que os anos antecedentes à guerra. Contudo, após a beligerância, e com o restabelecimento do Paraná, o setor ervateiro Rio-grandense se viu em meio à crise, pois não conseguiu competir.

O processo de inovação tecnológica transforma as estruturas de mercado e criam novos paradigmas, no médio e longo prazo. “Em geral”, ocorre o aumento da qualidade do produto, a queda nos preços e o crescimento da produção, vantagens decisivas sobre um concorrente. Esse processo ocorre progressivamente em todos os setores econômicos como meio de sobrevivência no mercado. E toda essa dinâmica tem como base a concorrência entre as empresas ou setores econômicos, e principalmente a concorrência através de inovações, tanto de produtos, quando de

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processos, pela busca do lucro239. Ou seja, de acordo com essa teoria, as inovações paranaenses proporcionaram o crescimento e maior competitividade do seu setor ervateiro.

Enfim, a emergência da produção ervateira no Mato Grosso e a recuperação do setor er- vateiro paranaense foram dois fatores relevantes para a instauração da crise do setor ervateiro Rio-grandense, pois ambas as regiões se tornaram fortes concorrentes, que, como pode ser obser- vado no próximo gráfico, apresentou significativa queda no volume de exportação.

Figura 3.8 – Gráfico do volume de exportação dos produtos agrícolas nos anos 1871-1878.

Para os anos de 1871-78, os volumes de exportação, em sacos de 60 Kg, da erva-mate, do feijão, da farinha de mandioca e do milho, estão mostrados no gráfico da Figura 3.8. De acor- do com este, o volume de exportação do mate, entre 1871-78, praticamente não ultrapassou a quantia de 50 mil sacas anuais, com exceção de 1872 (65 mil sacas). Esses valores sugerem um indicio de crise do setor ervateiro Rio-grandense, dado que o volume de exportação da erva-mate, comparado à média anual de 65 mil sacas do período da Guerra (1864-70), reduziu 38%. No entanto, os demais produtos, o feijão, a farinha de mandioca e o milho, apresentaram novamente um ligeiro aumento, especialmente o feijão, que, entre 1870-78, alcançou a média de 145 mil sacas.

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Joseph A. Schumpeter. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Rio de Janeiro: Zahar. 1984. P, 111-115.

0 50.000 100.000 150.000 200.000 250.000 300.000 350.000 400.000 450.000 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 Sa cas de 6 0 kg Anos

Erva-mate Feijão Farinha de Mandioca Milho

Diante desse quadro, o governo provincial propôs um programa de recuperação desse se- tor. Para isso, ele contratou técnicos estrangeiros para avaliar as condições dessa atividade extra- tivista e apontar os principais gargalos dela. Louis Couty, por exemplo, um especialista francês, elaborou um relatório no qual apontava os principais problemas e destacava as virtudes do setor ervateiro paranaense, que deveria ser tomado como exemplo. As principais falhas da produção Rio-grandense, segundo o técnico, estão elencadas adiante240.

Tecnologia: na província do Rio Grande do Sul o processo de beneficiamento da erva- mate até o final do Império foi realizado por meio do carijo. Enquanto isso, o setor paranaense já utilizava o barbaqua, um processo de secagem das folhas e galhos mais eficiente. Além disso, a moagem da erva Rio-grandense ainda era feita nos engenhos hidráulicos, ao invés dos modernos engenhos a vapor.

A mão-de-obra: a organização do trabalho foi um dos problemas apontados por Couty. No final do brasil Império o setor ervateiro paranaense, devido a presença dos engenhos a vapor, trabalhava com profissionais técnicos especializados no assunto. A mão-de-obra empregada no Rio Grande do Sul não estava no mesmo nível técnico, o que também influenciava na qualidade final do produto.

Estocagem: depois de beneficiada, a erva-mate era armazenada em surrões, bolsas de couro bovino, ou em barricas, caixas de madeira. Nesses recipientes, porém, o produto era mal acondicionado e, com isso, ficava exposto às intempéries, e principalmente, visualmente não era atrativo, o que prejudicava a comercialização com o mercado europeu.

Qualidade: os ervateiros burlavam as Leis e misturavam outras ervas baratas junto à ilex para aumentar a produção. Entretanto, com essa prática, o produto perdeu qualidade e espaço no mercado internacional. Era preciso, portanto, combater essas fraudes.

Transporte: Os ervais cresciam em regiões íngremes de difícil acesso. O transporte da matéria-prima ainda era realizado com o auxílio de mulas e carroças, obsoletos diante da concor- rência das ferrovias. Era necessário, tal como o Paraná, a implantação das estradas de ferro e de novas vias de acesso para o melhor escoamento da produção.

Mercado: o Rio Grande do Sul precisava conquistar novos mercados, especialmente o europeu, onde a erva-mate ainda não era tão apreciada e consumida como na região platina.

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Louis Couty. Le mate et les conserves de viande: rapport a son excellence Monsieur le Ministre de l'Agriculture et du Commerce : sur sa mission dons les provinces du Parana, Rio Grande et les Etats du Sud. Rio de Janeiro: Typ. A Republica, 1880.

No período pós-guerra, na opinião de Couty, esses eram os principais obstáculos do se- tor ervateiro gaúcho e os motivos da diminuição dos volumes (gráfico da Figura 3.8) e dos valo- res de exportação. O gráfico da Figura 3.9, que apresenta os valores de exportação, em contos de réis, da erva-mate, do feijão, da farinha de mandioca e do milho, para os anos de 1871-78, evi- dencia essa redução.

Figura 3.9 – Gráfico dos valores de exportação dos produtos agrícolas nos anos 1871-1878. Conforme o gráfico, a erva-mate, entre 1871-72, arrecadou cerca de 700.000$00 contos de réis. Para os demais anos, os valores de exportação oscilaram em torno de 400.000$00 réis. O feijão foi o produto de maior destaque nesse período, que entre 1875-78, ultrapassou os dividen- dos do mate. A farinha de mandioca, por sua vez, uma tendência de valores crescentes. Já o mi- lho, com exceção de 1875, não ultrapassou a marca de 200.000$00 réis anuais. Vale ressaltar que a baixa arrecadação do setor ervateiro estava diretamente relacionada ao baixo volume de expor- tação, como evidencia o gráfico adiante.

Por fim, os preços de exportação, em réis por saca de 60 Kg, da erva-mate, do feijão, da farinha de mandioca e do milho, estão mostrados no gráfico da Figura 3.10. Segundo este, o pre- ço médio da erva-mate ficou em torno de 12.00$00 réis. No entanto, descartado o ano de 1871, em que a saca foi vendida a um valor incomum (27.72$00), a média do período, na verdade, ficou

- 200.000 400.000 600.000 800.000 1.000.000 1.200.000 1.400.000 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 Val o res em Rés ( $ ) Anos

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em 10.20$00. Assim, a erva manteve praticamente o mesmo preço médio do período da guerra, em torno de 10.00$00 réis. Os preços dos demais produtos, como nos anos analisados anterior- mente, apresentaram médias menores do que o mate.

Figura 3.10 – Gráfico do preço de exportação dos produtos nos anos 1871-1878.

Além das razões já expostas, outros motivos internos também contribuíram com o apro- fundamento da crise do setor ervateiro Rio-grandense no pós-guerra. O primeiro deles foi a dimi- nuição da mão-de-obra. Grande parte dos soldados gaúchos que lutaram na guerra vieram do con- tingente de trabalhadores que, por consequência, desfalcaram a força produtiva dos setores econômicos. Outros dois motivos, extensamente trabalhados no capítulo 2, foram a sanção da Lei de terras de 1850, pois ela contribuiu com a mercantilização territorial em áreas de ervais, e o processo de colonização dirigida, pois ele contribuiu com o desmatamento de regiões ervateiras em detrimento da substituição de cultura agrícola. Além disso, no final da guerra, alguns coman- dantes dos Voluntários da Pátria foram beneficiados com doações de terras devolutas nas regiões dos ervais. Em outros casos, muitos soldados, capitães da guarda nacional, companhias de colo- nização e grandes proprietários de terra com, aproveitaram seus cargos ou de sua influência polí- tica ou econômica para se apossar de terrenos públicos tais como, por exemplo, o caso do capitão da Guarda Nacional, Tibúrcio Alvares Siqueira Fortes. Ele protagonizou disputas de terras devo-

R$- R$5,00 R$10,00 R$15,00 R$20,00 R$25,00 R$30,00 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 Val o res em Rés ($ )/ Sa ccas 6 0 Kg Anos

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lutas em Palmeira das Missões, município repleto de ervais públicos241. Todos esses agentes que compunham a conjuntura interna da Província foram tão essenciais na instauração da crise erva- teira.

As análises realizadas ao longo desse capítulo permitem a conclusão que ao longo de to- do período estudado, 1856-78, o setor ervateiro Rio-grandense apresentou primeiro ascensão com posterior crise, de acordo com os volumes e os valores de exportação. O início da segunda meta- de dos oitocentos, entre 1856-63, correspondeu ao período de apogeu, com média de arrecadação de 898.596$75 réis anuais. Como visto, os elevados índices ocorreram em parte devido ao desen- volvimento e estabelecimento das cinco regiões ervateiras, devido à crise no setor ervateiro para- naense e também devido à descoberta de ouro na Austrália, na Sibéria e na Califórnia, que gerava demanda e inflacionava os produtos agrícolas. Já no período da guerra, 1864-1870, os volumes de exportação da erva-mate foram maiores do que o período anterior, de 58.286 para 64.557 sacas anuais, em média, principalmente por causa da incorporação dos mercados uruguaio e argentino. No entanto, os preços de exportação se estabilizaram em torno de 10:00$00 réis a saca. O último período analisado (1871-78) correspondeu à crise do setor ervateiro, motivada por diversos fato- res: a emergência da produção ervateira no Mato Grosso, a recuperação do setor ervateiro para- naense, problemas internos como o sucateamento da indústria, a diminuição da mão-de-obra, o avanço da colonização e as disputas pelos territórios dos ervais. Todos esses apontamentos leva- ram ao declínio do setor ervateiro, que só se recuperaria adiante no período republicano.

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CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS

Os temas abordados neste trabalho levantam a questão da formação, na Província do Rio Grande do Sul, de um complexo econômico ervateiro, que provavelmente começou a se estrutu- rar, de acordo com os indícios desta pesquisa, a partir de 1835 com a insurgência da Revolução Farroupilha. Desse ano em diante, especialmente depois do término desse conflito em 1845, o setor ervateiro, pouco a pouco, integrou-se com outras atividades econômicas que completavam e assessoravam o comercio do mate. Nesse contexto, o conceito de “complexo ervateiro” subjaz uma conjunção de fatores que se consorciam para o desenvolvimento regional e que, de certa forma, também promovem uma acumulação de capital. A partir disso, a produção de erva-mate conquistou um espaço na economia da Província, fato que pode ser evidenciado por sua trajetória econômica ao longo século XIX.

Na primeira metade dos oitocentos, os extratores construíam acampamentos para se abrigarem das intempéries durante os meses de extração da erva-mate. De certo modo, da mesma forma que os acampamentos de bandeirantes foram importantes para a formação de vários muni- cípios no interior do Estado de São Paulo, no Rio Grande do Sul, os extratores de erva-mate tam- bém foram importantes para a formação de municípios nas regiões norte e noroeste da Província, como são os casos de Passo Fundo, Soledade e Palmeira das Missões. Essa urbanização ocorreu porque, com o passar dos anos, as pessoas se estabeleceram nesses acampamentos, onde construí- ram pequenos vilarejos, os quais posteriormente ganharam emancipação política e se tornaram municípios.

Com a formação desses povoados e o fomento à exportação de erva-mate, uma parcela da população de outras regiões da Província migrou para essas áreas e também se dedicou quase que exclusivamente ao seu extrativismo e fabricação. Esse fluxo imigratório atraiu comerciantes que abriram, bem próximo aos ervais, pequenas vendas em que aceitavam a erva como moeda de troca. Toda essa gente, com o passar do tempo, se estabeleceu lentamente nos lugares onde traba- lhava. Diante dessa nova realidade, era necessário a abertura de novas estradas, tanto para abaste- cer a região quanto para escoar a produção. Assim, o setor ervateiro contribuiu para integrar regi- ões, nesse caso o norte e o noroeste com o restante da Província. No entanto, durante o Império, quanto a questão de transporte, a economia ervateira não teve força econômica suficiente para que fosse implantada ferrovias para escoamento da produção, como aconteceu no Paraná, por

exemplo. Das regiões produtoras de erva-mate, o único município que construiu estradas de ferro foi Passo Fundo, já próximo ao final do Império. É possível que a crise do setor ervateiro tenha influenciado esse fato e postergado a implementação das ferrovias só para o início do período republicano. Destaca-se, portanto, a importância de um estudo acerca dessa hipótese para melhor compreensão da relação entre o setor ervateiro e os avanços dos meios de transporte.

Já em relação ao desenvolvimento agrícola, a extração do mate consorciado com a agri- cultura não gerava uma agricultura pujante. Sua plantação era primeiramente destinada para a subsistência e somente o excedente era enviado ao mercado. Isso ocorria, em parte, porque existia uma legislação municipal que regulamentava o setor ervateiro e não permitia a destruição dos ervais em detrimento do simples plantio agrícola, em espaços públicos. Além disso, a documen- tação consultada ao longo da pesquisa sugere que a extração e comercialização do mate era uma atividade econômica mais rentável do que a dos outros gêneros de subsistência. Ainda assim, a agricultura enquanto atividade subsidiária constituiu parte importante para a existência do com- plexo ervateiro. A erva-mate corroborava com a arrecadação dos municípios onde ela existia e, muitas vezes, tornava-se o principal produto econômico de muitos deles, que se preocupavam em regulamentar a sua extração para evitar a poda desenfreada e a sua consequente destruição. O governo provincial, por sua vez, regulamentava a qualidade do produto que seria exportado e fiscalizava os portos que podiam exportá-lo, forma de garantir o mercado externo.

A extração e o beneficiamento do mate impulsionaram uma série de atividades assesso- ras que atendiam as demandas do setor ervateiro. A produção de barricas, de cuias e bombas para o chimarrão, dos surrões e a presença de oficinas que fabricavam e consertavam carroças e ferra- rias são exemplos dessas atividades. Além disso, as pequenas ferrarias e comércios locais, que forneciam as ferramentas e peças utilizadas nos engenhos de moer erva e nos diversos estágios de produção, desenvolviam-se puxadas pela demanda do setor ervateiro. Essas atividades econômi- cas, realizadas em sua grande maioria manualmente, também proporcionavam emprego e estimu- lavam, em conjunto, o crescimento regional.

De certa forma, todo esse processo ocorreu devido a estruturação que o setor ervateiro começou a adquirir durante a Revolução Farroupilha, uma vez que o mesmo ajudou a financiar parte da guerra. Os desdobramentos desse episódio contribuíram com consolidação do mate no mercado externo, representado principalmente pelo Uruguai, pela Argentina, pelo Chile e pela Bolívia. Esse crescimento da demanda estimulou o desenvolvimento tecnológico, evidenciado

pelo surgimento dos engenhos de ferro movido a força hidráulica alguns anos após ao término da insurgência. O gráfico da Figura C.1 ajuda a visualizar essa significativa ascensão. De acordo