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A Cidade dos Espectros Ritual, religião e colapso econômico,

No documento Depois do Gelo (páginas 71-78)

7500 – 6300 a.C.

De Beidha, John Lubbock encaminha-se diretamente para oeste, seguindo um rio em meio a um vale de mata até as baixadas e por fim o rio Jordão. A vegetação é luxuriante, junco e papiro dos dois lados do rio, mas fora isso trata-se de uma paisagem seca e estéril. Além do Jordão, a terra sobe e logo se torna o que é hoje o deserto de Negev. Amanhece. Do outro lado do rio, ergue-se um preguiçoso fiapo de fumaça de uma fogueira.

O fogo arde para um grupo de homens de Jericó que se dirige para o sul com cestos de excedente de grãos. Uma dúzia deles carregou o pesado fardo, indo a um encontro com caçadores- coletores que vivem dentro do Negev. O grão será trocado por conchas marinhas e carne de caça selvagem.

Os desertos de Negev e Sinai foram colonizados pouco depois do fim do Jovem Dryas. Fizeram- se novos assentamentos no deserto exatamente no mesmo lugar dos do Natufiano Tardio, como Abu Salem no centro do Negev. Os novos ocupantes talvez tenham permanecido no deserto o ano todo, vivendo como caçadores-coletores; ou talvez fossem apenas visitantes de verão, passando os invernos nas cidades neolíticas como Beidha. Em qualquer dos casos, podem ter fornecido carne aos citadinos.

À medida que os animais domesticados se tornavam a principal fonte de carne, é provável que a caça selvagem tenha virado uma comida de prestígio para as pessoas dentro das cidades. Os moradores de Beidha e outros assentamentos fizeram uma variedade de flechas e pontas-de-lança,

sugerindo que a matança de caça selvagem adquirira então um status especial. Em Ain Ghazal — cidade nos arredores da moderna Amã — estavam presentes os restos de não menos que 45 espécies selvagens, incluindo algumas espécies de gazela, gado selvagem, javali e pequenos carnívoros. Parece provável que uma tal gama podia ser caçada nas vizinhanças da cidade, e portanto alguns desses ossos podem ter chegado em juntas de carne adquirida de caçadores-coletores do deserto.

Conchas do mar Vermelho também chegavam às cidades por algum meio. O interesse em sua aquisição, por troca ou por expedições ao litoral, remonta até o LGM e atingiu antes um pique no Natufiano Inicial. Mas teve uma mudança nos tipos mais desejáveis: o interesse pelas conchas tubulares de dentálio parece ter sido substituído pelo gosto por caurins.

Enquanto os mercadores se dirigem para o sul, Lubbock viaja para o norte, para visitar Jericó uma segunda vez. Segue a base das montanhas da Judéia, ao longo da margem ocidental do mar Morto. Wadis, alguns contendo pequenos riachos que logo secarão sob o sol quente, cortam as colinas. Lubbock passa por rebanhos de cabras que são levadas a pastar por meninos, e pequenos grupos que recolhem betume e sal.

Chega em 7000 a.C. O assentamento mudou desde quando ele viu o primeiro trigo sendo semeado: os conjuntos de pequenas moradias circulares foram substituídos por esparramados prédios retangulares em meio não apenas a campos aráveis e rebanhos de cabras, mas a filas e filas de adobe secando ao sol. Jericó passou de uma aldeia de caçadores-coletores-cultivadores a uma cidade de camponeses, artesãos e mercadores.

Lubbock atravessa pátios e entre as casas, envolvido pelo clamor da vida neolítica. Muito trabalho se faz ao ar livre — preparação de comida, corte de pedra, fabrico de cestos, tecidos e artigos de couro. Ele se lembra de Beidha; enquanto passeia pela cidade, vê bandos semelhantes de cachorros que revolvem o lixo, e o mesmo fluxo entre o fedor de carne pendurada, a simplicidade da fumaça e a fragrância de ervas fumegantes. Pára para observar uma mulher socando um pilão; o instrumento é tão grande que ela se senta numa ponta e curva repetidas vezes as costas ao estender-se com a mão de pedra até a outra — trabalho de incontáveis futuras gerações.

As casas são construídas mais de adobe que de pedra. Têm um só andar e parecem de desenho um tanto mais simples que as de Beidha, não tendo sinal dos prédios com corredores. Lubbock escolhe uma ao acaso. Portas de madeira dão-lhe acesso a três aposentos retangulares sucessivos, cada um com piso de reboco polido e tapetes de palha. Não há ninguém em casa, e pouca coisa à guisa de móveis. Um monte de tapetes e couros sugere uma área de dormir, cestas e tigelas de pedra parecem ser bens valiosos.

No terceiro aposento, veem-se numa parede três estatuetas de barro, todas femininas e com cerca de 5 centímetros de altura. Uma é particularmente impressionante — veste o que parece uma túnica solta e foi esculpida com os braços cruzados, de modo que cada mão repousa em um seio. Junto a elas, há o que parece uma cabeça humana. Lubbock ergue-a com cuidado — é literalmente uma cabeça humana, ou pelo menos uma caveira cujo rosto foi delicadamente modelado com reboco.

Enquanto anda pela cidade, Lubbock encontra mais cabeças rebocadas em outras casas, junto com simples caveiras colocadas em quinas de quartos ou dentro de nichos nas paredes. Após muito procurar, encontra um homem sentado dentro de casa trabalhando num rosto. Está sendo modelado na caveira de seu pai, o homem que construiu a casa em cujas mãos deitaram o piso de argamassa sob o qual agora repousam seus ossos. Depois que o corpo ficou enterrado durante vários anos, a cova

foi reaberta, o crânio removido e o piso remendado com nova argamassa. Agora o filho homenageia o pai.

O homem que trabalha está de cócoras ao lado de bacias de argamassa branca, tinta vermelha e uma variedade de contas. As cavidades nasais e órbitas oculares já foram tapadas e deixadas a secar; nivelou-se a base do crânio, para que se mantenha em pé sem apoio. Agora aplica-se a camada final de fina argamassa, que logo será pintada de vermelho. Contas de caurim serão inseridas como olhos, e depois se exporá o crânio dentro da casa. Enquanto ele amassa, afila e modela a argamassa, sua esposa colhe lentilhas nos campos, lutando com o peso do bebê amarrado às costas. Um dia esse filho exumará com amor e modelará a cabeça do pai, para assegurar que também ele continue a viver dentro da casa, mesmo depois de ter os ossos enterrados sob o piso.

As caveiras rebocadas de Jericó foram talvez a mais impressionante das descobertas de Kathleen Kenyon. Ela encontrou sete dentro de um único poço, junto com vários crânios isolados sob pisos domésticos. A maioria era mais ou menos quadrada, uma vez que rostos inteiros haviam sido moldados sobre crânios sem a mandíbula inferior. Mas um estava completo, e a escultura de argamassa parece um elegante retrato de um reverenciado ancestral. Se os crânios foram expostos, pertenciam aos "fundadores" da casa e aspiravam a ser retratos, são questões especulativas. Tudo o que sabemos é que em algum momento eles foram enterrados em poços, talvez um ato final de lembrança ou como o último passo para chegar à outra vida.

Desde as escavações de Kathleen em Jerico, encontraram-se crânios rebocados em inúmeros sítios neolíticos, fazendo-os cada assentamento de forma sutilmente diferente mas segundo o mesmo desenho básico.

Um diferente tipo de crânio enfeitado foi encontrado em Nahal Hemar — a caverna da qual se recuperaram os fragmentos de tecido. Ali, restos de seis crânios foram encontrados, todos com faixas de betume dispostas num desenho de rede de um lado a outro do crânio, talvez usadas para grudar cabelos, mas sem argamassa nos ossos faciais.

Juntava-se a esses crânios na caverna uma série de outros objetos ritualísticos, além das peças de tecido. Entre eles achavam-se os fragmentos de duas máscaras de pedra pintadas com faixas vermelhas e verdes alternadas, e é provável que tenham tido cabelos e barba grudados. Encontraram-se quatro esculturas de rostos humanos, cada um feito de um pedaço de um comprido osso e enfeitado com argamassa, ocre-vermelho e betume para assinalar os olhos, cabelos e barba, aplicados em várias ocasiões, o que sugere que a figura foi intencionalmente "envelhecida". Fragmentos de argamassa foram encontrados em chumaços de capim que, à luz das descobertas que em breve descreverei, é provável que tenham sido figuras de argamassa moldadas. Havia muitas contas dentro da caverna, várias centenas feitas de conchas marinhas do Mediterrâneo e do mar Vermelho, e outras de pedra, argamassa e madeira.

David Alon e Ofer Bar-Yosef, os escavadores de Nahal Hemar, esforçaram-se para explicar por que uma coleção tão preciosa de objetos fora colocada dentro de uma minúscula caverna a muitos quilômetros de distância de qualquer assentamento conhecido. A caverna deve ter sido reverenciada por causa de sua localização na fronteira entre dois territórios sociais, e na verdade dois tipos distintos de paisagem — os desertos do Negev e da Judéia — e portanto usada como depósito de objetos ritualísticos. Pouco mais se pode dizer no presente. Tudo o que podemos fazer é visitar a caverna, descrever seus objetos e admitir nossa lamentável ignorância sobre o mundo sagrado do Neolítico.

De Jericó, uma viagem de 100 quilômetros para noroeste levaria Lubbock às colinas de Nazaré e ao centro funerário de Kfar HaHoresh. Este é vigiado por guardas residentes, e é para onde as pequenas cidades e aldeias da região levam seus mortos para enterrá-los — ou, com mais frequência, reenterrá-los, depois que os ossos foram exumados. Em Kfar HaHoresh ocorre uma legião de práticas rituais: modelagem facial com argamassa, matança e enterro de animais selvagens, colocação de superfícies de argamassa cercadas por baixos muros em que os ossos são às vezes colocados de modo a imitar uma morte recente, e banquete comunal. Na verdade, à medida que Nigel Goring-Morris, da Universidade Hebraica em Jerusalém, continua suas escavações, iniciadas em 1991, vem à luz uma gama sempre maior de práticas exóticas.

De Ktar HaHoresh, mais uma caminhada de 30 quilômetros levaria Lubbock à costa mediterrânea abaixo do monte Carmelo. Visto que lhe tomou cerca de 500 anos, ele poderia então visitar a comunidade costeira de Atlit-Yam. Embora seu povo plante cereais, e tenha gado, cabras e porcos, esta era basicamente uma aldeia de pesca. Barcos partiam diariamente para pegar com redes cangulos, que viviam no leito arenoso e rochoso. Mas o mar acabará por trazer a morte da cidade, à medida que os níveis crescentes do mar inundam a costa mediterrânea, deixando Atlit-Yam inteiramente submersa.

O tempo de Lubbock na era neolítica do oeste asiático esgota-se rapidamente. Ele tem portanto de abrir mão de visitas a Kfar HaHoresh e Atlit-Yam, e viajar 50 quilômetros até o lado oriental do vale do Jordão, onde encontrará a maior das cidades neolíticas, a hoje conhecida como Am Ghazal. E assim, durante dois dias, ele atravessa a densa mata do vale, subindo sua íngreme escarpa oriental e entrado em terras de mato baixo pontilhadas de árvores espalhadas.

O primeiro sinal de uma cidade estar próxima é quando as trilhas de cabras que ele segue se alargam em estradas bem palmilhadas entre pequenos campos, alguns plantados com lentilhas e ervilhas, outros com trigo e cevada. Mulheres e crianças trabalham, colhendo as lentilhas e partindo aos pares e trios para levar suas pesadas cargas até a cidade. Muitos cestos esperam para ser levados, c assim Lubbock toma um nos ombros e segue uma mulher com seus dois cansados filhos. Acompanha-os no vale hoje conhecido como Wadi Zarqa; há caminhos de pedra para atravessar o rio, onde se amarraram muitas cabras. Uma trilha conduz então diretamente ao coração da cidade.

Enquanto anda, Lubbock nota que todo trato de solo disponível foi plantado. O motivo logo se torna claro — a cidade é três ou talvez quatro vezes maior que Jericó. Os lados do vale de Wadi Zarqa próximos, porém, são inteiramente estéreis — o solo exaurido pelas repetidas safras, e depois levados pelas chuvas do inverno depois que a vegetação restante foi cortada para fornecer lenha. Algumas das encostas foram aterradas para a construção de novas casas, e famílias vivem em tendas e abrigos de taipa temporários. Ain Ghazal "desfruta" de uma explosão populacional, em parte de seus próprios habitantes, em parte do influxo de pessoas cujas próprias aldeias já foram abandonadas devido à erosão e exaustão da terra circundante.

A data é 6500 a.C., e a cidade é um labirinto de construções — algumas novíssimas, algumas em reparos, outras caindo aos pedaços e abandonadas. São construídas de pedra bruta, madeira, juncos, barro e argamassa. As pessoas retornam às suas casas com o cair da noite; algumas se põem a comer, outras se preparam para dormir. Lubbock deixa o cesto diante da casa da mulher a quem seguiu, que agradecerá às crianças por terem-no carregado, para grande surpresa delas. Durante a hora seguinte ele explora a cidade, espiando por janelas e por cima dos ombros de outras pessoas. Muita coisa é igual a Beidha e Jerico, com cabeças rebocadas c pequenas estatuetas de barro exibidas em destaque. Numa das casas, ele vê um excelente modelo de uma raposa — na verdade,

modelos de animais parecem particularmente importantes para as pessoas que aí vivem, sobretudo de gado, embora se doméstico ou não permanece incerto.

Em outra casa, um grupo senta-se em torno de uma fogueira em chamas, enquanto lâminas de obsidiana, peças de coral e pedras de cores fortes passam de mão em mão. Vêm de um homem de roupas e estilo de cabelo distintos — um mercador que chegou recentemente do norte. Espiando pela porta, Lubbock vê pequenas esferas, discos e pirâmides de barro que são contados e postos em bolsas de couro. Esses artigos são inteira novidade para ele, mas o cansaço vence a curiosidade e ele encontra uma casa abandonada para dormir.

Na manhã seguinte, Lubbock acorda e encontra a cidade silenciosa e deserta: não se cozinha nos pátios, mulheres não partem para os campos, homens não erguem madeiras e deitam pisos de argamassa. Enquanto atravessa os becos entre as casas, um baixo murmúrio se transforma num baixo balbucio de vozes. Ao dobrar uma esquina, encontra uma reunião de várias centenas de pessoas. Meninos sentam-se nos ombros dos pais, as crianças mais velhas subiram em muros e balaustradas de janelas. Todos clamam por uma visão. No momento em que Lubbock chega, as portas de madeira de um prédio se abrem e sai uma procissão. Pairam o silêncio e a quietude.

Seis homens vêm à frente, usando máscaras, túnicas e adereços de cabeça muito parecidos aos descobertos em Nahal Hemar. Trazem uma plataforma contendo um grupo de estátuas, feitas de feixes de junco revestidos de argamassa amarrados para formar torsos, braços e pernas. Há talvez doze estátuas de argamassa, algumas de cerca de 1 metro de altura, outras muito menores. Têm corpos achatados, pescoços alongados, grandes caras redondas, olhos arregalados com profundos centros negros. Os narizes são modelados como tocos; os lábios mal existem. A argamassa é branco puro; algumas estátuas estão envoltas em finas peças têxteis. Uma tem os braços cruzados sob os seios, projetando-os para o espectador, ao qual prende com seu olhar acerado.

A multidão clama para ver as estátuas, sabendo que será a sua última oportunidade, pois elas serão enterradas. Mas as pessoas também sabem que dentro de alguns anos outro conjunto de estátuas será trazido por essas portas de madeira, e depois outro e mais outro; nova vida sempre seguirá a morte, como as plantas da primavera sempre seguem a colheita.

Lubbock junta-se à procissão até uma casa abandonada e espreme-se lá dentro para ver a cerimônia de enterro e ouvir as preces e cantos. Cada estátua é erguida e depois cuidadosamente colocada num poço cavado no piso. Mais preces, e fecha-se o poço. Os "sacerdotes" retornam ao prédio de onde saíram, as portas fecham-se com estrondo. A multidão se dispersa; algumas pessoas parecem em estado de choque, algumas enlutadas, outras confusas.

A cidade de Ain Ghazal foi descoberta em fins da década de 1970, quando a construção de uma nova estrada revelou paredes e ossos humanos. As estátuas de argamassa foram encontradas em 1983, durante a terceira temporada de escavação dirigida por Gary Rollefson, então da Universidade de San Diego. Ele e seus colegas também encontraram vários crânios com argamassa, muitos túmulos humanos, indícios de artigos trocados com obsidiana da Turquia e coral do mar Vermelho, junto com numerosos "sinais" de barro que podiam ser mecanismos de fazer conta, talvez representando a distribuição de campos a determinadas famílias. Também se escavou uma enorme quantidade de ossos de animais, a maioria vinda de cabras que evidentemente eram mantidas em grandes rebanhos.

Rollefson pôde documentar a prosperidade e eventual fim dessa cidade agrícola. Assim, mesmo sem as estátuas de argamassa, Ain Ghazal teria fornecido mais intuições sobre a vida econômica,

social e religiosa dos primeiros camponeses do Neolítico. Mas são as estátuas que distinguem Ain Ghazal de todas as outras cidades neolíticas. Embora pedaços de argamassa com impressões de juncos fossem encontradas em Nahal Hemar e Jericó, só em Ain Ghazal as encontraram intactas.

Dois grupos foram descobertos. O primeiro consistia de doze estátuas e treze bustos, todos colocados no mesmo poço, com as figuras maiores alinhadas num eixo leste-oeste. Dois anos depois, encontrou-se um segundo poço, menor, datando de cerca de 2 mil anos depois na história de Am Ghazal. Suas estátuas eram de desenho muito semelhante, embora um pouco maiores e mais padronizadas. Incluídos nessa segunda cova havia três espetaculares bustos de uma figura de duas cabeças.

Denise Schmandt-Besserat, da Universidade do Texas, buscou nas práticas religiosas de civilizações babilônicas muito posteriores pistas para o que as estátuas representavam, acreditando que as origens daquelas crenças babilônicas estão nas primeiras comunidades agrícolas do oeste asiático. Uma das possibilidades é que as estátuas de argamassa fossem representações de fantasmas. As primeiras escritas babilônicas registram que às vezes se baniam fantasmas das casas enterrando-se efígies longe das moradias ocupadas. Denise está segura de que as pessoas de Ain Ghazal teriam temido essas estátuas, e que sua aparência fantasmagórica — grandes olhos fitos, cabeças desproporcionais, e num caso seis dedos nos pés — poderia sugerir espectros.

Assim, talvez Ain Ghazal tenha sido uma cidade cheia de fantasmas, que tinham de ser repetidamente banidos das casas e pátios, dos cercados de cabras e dos campos, enterrando-os no chão. Mas Denise está mais convencida de outra possibilidade — a de que essas estátuas representem um panteão, os deuses e deusas do Neolítico.

Na literatura babilônica, o grande deus Marduk tem duas cabeças, muito parecido com algumas das estátuas de argamassa e semelhantes a figuras de duas cabeças na arte das comunidades pré- históricas e históricas posteriores do oeste asiático. A estátua de massa que expõe os seios lembra uma deusa babilônica que adota uma pose semelhante. Assim, surge a possibilidade de que as raízes da religião babilônica estejam na cultura neolítica do vale do Jordão por volta de 6500 a. C.

Mas por que seriam enterradas as estátuas? O fato de que duas covas foram encontradas na minúscula parte escavada da cidade sugere que se fizeram outrora muitas estátuas. Talvez isso se devesse a não outro motivo que uso e desgaste — as figuras de massa logo se rachavam e desfaziam, e assim o enterro era uma maneira de possibilitar a fabricação de novas estátuas. Ou talvez, como em religiões posteriores, os deuses tivessem de "morrer" e depois renascer cada ano, para assegurar uma primavera fértil.

As estátuas de massa indicam uma mudança para uma forma mais pública, e talvez centralizada, de atividade religiosa do que a antes presente no Neolítico. Isso também é sugerido

No documento Depois do Gelo (páginas 71-78)

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