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Em Busca dos Primeiros Americanos A descoberta de colonização da era do gelo,

No documento Depois do Gelo (páginas 188-197)

1927-1994 d.C.

Os homens observados por John Lubbock estão parados pensativos ao lado dos ossos de bisão. Andam em volta da vala, curvam-se e raspam um pouco do solo, trocam algumas palavras, assentem com a cabeça e dão sorrisos de entendimento uns para os outros. Alguns usam macacões de brim azul, outros camisa branca e gravata-borboleta preta. Os olhos continuam retornando à peça central: uma ponta-de-lança, firmemente enfiada entre duas costelas. Um dos homens parece ter-se decidido; encaminha-se confiante até um outro defronte, aperta-lhe a mão, dá-lhe um tapinha nas costas. Um terceiro suga profundamente seu cachimbo e coca o queixo; também ele se convencerá, pois o caso sem dúvida foi comprovado. Quarenta anos de acalorado debate foram resolvidos: houve gente nas Américas antes do fim da era glacial.

John Lubbock encontra-se em Folsom, Novo México, a 30 de setembro de 1927. A disposição dos arqueólogos parece refletir a disposição do país em geral — a nação comemora o voo solo de Charles Lindbergh até Paris e acha-se em plena prosperidade econômica. Mas ideias de aviões e automóveis não passam pela mente de Lubbock enquanto também anda em volta das valas. Estas são limitadas por uma pequena enseada que corre da Mesa Johnson — a meseta que coroa a paisagem um quilômetro a leste.

Jesse Figgins, diretor do Museu de Denver, é o principal recebedor de elogios. Intensamente aliviado, continua meio aturdido com sua impressionante mudança de sorte. Apenas um ano antes, não tinha mais que o museu local em mente quando começou a recolher ossos de bisão da era do gelo para uma nova exposição. Agora reescrevia a história americana.

Os ossos de bisão em Folsom foram originalmente expostos por chuvas torrenciais em 1908, nos antigos sedimentos do que parece hoje o impropriamente batizado Vale do Cavalo Selvagem. Logo após começar a trabalhar, Figgins encontrou duas pontas-de-lança. Soube imediatamente de sua importância em potencial e levou-as a Ales Hrdlicka, o mais antigo antropólogo do Instituto Smithsonian em Washington. Hrdlicka era um imigrante nascido na Tchecoslováquia, tão temível na reputação quanto na aparência, com os cabelos puxados para trás, testa enrugada, espessas sobrancelhas pretas e colarinho branco engomado. Deu a Figgins um conselho crucial: se se encontrassem mais pontas-de-lança, elas deviam ser deixadas in situ, exatamente onde estavam. Figgins devia então notificar as instituições acadêmicas por telegrama, para que mandassem representantes inspecionar as descobertas.

Por isso, nesse dia de fim de verão em 1927 um grupo de acadêmicos reuniu-se em Folsom — tendo Lubbock como espectador privilegiado. O grupo incluía o fumador de cachimbo A. Y Kidder, um dos mais respeitados arqueólogos da época, Frank Roberts, estudante de destacado futuro, e Barnum Brown, paleoantropólogo do Museu de História Natural Americana. Lubbock observa Brown

apertar uma ponta-de-lança contra a camisa branca engomada e declarar que "a resposta à antiguidade do homem no Novo Mundo está em minha mão".

Barnum Brown estava errado; mas pode-se perdoar sua precipitação. Esse sentimento com toda probabilidade foi partilhado, embora não expresso, pela maioria dos arqueólogos americanos durante os últimos 150 anos. Apesar das descobertas de Folsom provarem que houve pessoas nas Américas antes do fim da era glacial, a data de sua chegada permanece desconhecida — 12000, 20000, 300000, 500000 a.C., ou até antes? Ninguém pode dar uma explicação definitiva de como e quando chegaram as primeiras pessoas às Américas. Tenho pouca duvida, porém, de que isso ocorreu após a grande glaciação de 20000 a.C.; foi uma das consequências-chave do aquecimento global para a história humana.

Em vez dessa explicação definitiva, John Lubbock precisa visitar os mais intrigantes sítios arqueológicos do mundo da era do gelo, do norte do Alasca até o sul do Chile. Enquanto ele viaja por entre esses sítios, há uma história admirável para contar, a da pré-história nas Américas — as paixões, criatividade, trabalho árduo e às vezes pura sorte dos que tentavam estabelecer-se exatamente quando se davam os primeiros passos na Idade da Pedra no último dos continentes habitáveis a ser colonizado. Robson Bonnichsen, Diretor do Centro de Estudos dos Primeiros Americanos, no Oregon, descreveu esses passos como "o último fato pioneiro... uma admirável gente nova num admirável mundo novo". De continente vazio a superpotência global — o Sonho Americano último.

David Meltzer, da Universidade Metodista do Sul, no Texas, um dos principais estudiosos da pré- história americana e historiador do pensamento arqueológico, mostrou que os debates sobre os Primeiros Americanos remontam aos primórdios da própria América. O primeiro contato entre exploradores europeus e americanos nativos ocorreu no fim do século XV Os recém-chegados faziam as perguntas óbvias: Quem era aquele povo indígena? De onde viera?

A resposta comum por mais de trezentos anos foi que eram uma das Dez Tribos Perdidas de Israel. Em 1590, Frei Joseph de Acosta especulou que essa tribo errante fizera uma migração por terra e chegara ao norte do continente, num ponto de encontro entre os Mundos Novo e Antigo. Meltzer documentou meticulosamente como se desenvolveram essas especulações até as descobertas em Folsom. Alguns dos estudiosos do século XIX — como Charles Abbott, físico e entusiástico arqueólogo amador de Trenton, Nova Jersey— foram inflexíveis ao afirmar que uma raça de pessoas da Idade da Pedra, usando instrumentos primitivos, habitara outrora as Américas. Outros eram ardentemente contra essas opiniões, sobretudo William Henry Holmes, do Departamento de Etnologia Americana. Membro do establishment arqueológico, era em parte motivado pela audácia de um amador como Abbott fazer afirmações sobre o passado humano.

Um estímulo para esse debate foi a demonstração de antiguidade humana na Europa, pela descoberta de artefatos humanos em associação com os ossos de animais extintos. Tempos pré- históricos explicara a importância desses achados, estabelecendo que pessoas tinham vivido na Europa durante a era glacial — embora ninguém soubesse bem a data em que isso ocorrera. O John Lubbock vitoriano também dedicara um capítulo à "Arqueologia Norte-Americana", ficando avidamente interessado na arqueologia de seus monumentos, túmulos e artefatos. Cético quanto a duas afirmações da associação de artefatos humanos com animais extintos na América do Norte, concluiu que não havia a menor necessidade de acreditar que pessoas tinham estado nesse

continente há mais de três mil anos. Mas teve o cuidado de não rejeitar a possibilidade de povoamento mais antigo; apenas observou que a exigida evidência não existia atualmente.

O tom calculado de Tempos pré-históricos era típico de um cavalheiro inglês escrevendo de longe — o John Lubbock vitoriano jamais cruzara o Atlântico. Os americanos na vanguarda do debate, como Abbott e Holmes, usavam uma linguagem mais severa e defendiam posições dogmáticas. Isso levou David Meltzer a batizar as poucas décadas antes da descoberta de Folsom como a "Grande Guerra Paleolítica" — o nível de aspereza, acusações de incompetência e insultos diretos entre os protagonistas fazem nossos debates atuais sobre a origem humana parecerem a mais jovial das atividades.

Não surpreende pois que Jesse Figgins se sentisse ansioso quando vários daqueles protagonistas se reuniram para inspecionar suas escavações a 30 de setembro de 1927. Sua descoberta de pontas- de-lança em meio a ossos de bisão fora bastante inesperada mesmo para os ardentes defensores da existência de americanos na era glacial. Já vinham prevendo a descoberta de instrumentos de corte toscos e restos humanos com características "primitivas" semelhantes aos dos neandertais da Europa. Mas as pontas-de-lança de hábil leitura encontradas no sítio de Folsom testemunhavam caça sofisticada.

As pontas-de-lança tinham cerca de 6 centímetros de comprimento, feitas lascando-se as duas faces (técnica conhecida como trabalho bifacial), e uma longa ranhura — flauta — estendendo-se desde a base até a ponta. Passaram a ser chamadas de pontas Folsom, e introduziu-se o termo paleoindígena. Hoje sabemos que as pontas Folsom tinham sido fabricadas em 11000 e 9000 a.C. Uma década depois da escavação de Folsom, descobriram-se muitos sítios semelhantes. Agora que as pessoas sabiam o que procurar, só precisavam explorar antigos canais fluviais e sedimentos lacustres em busca de ossos de animais extintos, e depois buscar entre eles a presença de artefatos humanos.

Em 1933, encontrou-se um sítio perto de Dent no Colorado. Mamutes, e não bisões, tinham sido a presa, e as pontas eram maiores que as Folsom. As pontas logo passaram a caracterizar uma nova cultura: "Clovis". Este nome veio de uma cidadezinha no Novo México perto do sítio de Blackwater Draw, onde também se encontraram mais pontas e restos de mamutes na década de 1930. As pontas Clovis eram maiores, tinham uma flauta que chegava apenas ao meio da ponta e bases esmerilhadas por uma pedra bruta para facilitar a fixação do cabo. A associação com mamutes — que se julgava terem-se extinguido antes do bisão de Folsom — sugeria que pré-datavam qualquer descoberta. As escavações em Blackwater Draw confirmaram isso, fornecendo depósitos nos quais as pontas Folsom e ossos de bisão ficam diretamente acima dos que contêm pontas Clovis e ossos de mamutes.

Durante a década de 1950, vários sítios Clovis foram escavados no vale do rio San Pedro, no sul do Arizona. Em 1953, encontraram-se não menos que oito pontas Clovis, misturadas com o quase completo esqueleto de um único mamute em Naco. Como não havia outros restos arqueológicos, logo se batizou esse como "o único que escapou" — um mamute que fora atacado, ferido, mas depois fugira e morrera não recuperado. Dois anos depois, 12 pontas-de-lança Foram encontradas com os restos de 8 mamutes na Fazenda Lehner, apenas alguns quilômetros de Naco.

Na década de 1970, dispunham-se de numerosas datas de radiocarbono para as pontas Clovis, indicando que nenhuma era mais antiga que 11500 a.C.Sem vestígios de qualquer colônia anterior, a cultura Clovis parecia ser a dos primeiros americanos. Eram os pioneiros que se originaram no nordeste da Ásia e fizeram a heroica jornada proposta por Frei Joseph de Acosta: pela hoje inundada massa de terra da Beríngia, que juntou a Sibéria e o Alasca quando o nível do mar atingiu seu ponto mais baixo, e depois para o sul, assim que as camadas de gelo que cobriam todo o Canadá

começaram a derreter-se. Eram duas: a Laurentida para o leste e a Cordilheirana para o oeste. Quando começaram a derreter-se, criou-se um "corredor livre de gelo" entre elas, pelo qual os caçadores Clovis supostamente passaram para as paisagens da América do Norte.

A descoberta de sítios como Naco e a Fazenda Lehner logo levou as pessoas Clovis serem caracterizadas como muito mais que simples pioneiros. Haviam evidentemente atacado mamutes com não mais que lanças com pontas de pedra, e muitos acreditam que os tenham levado à extinção — uma ideia que passou a ser conhecida como a "hipótese da matança excessiva". O mais ardente defensor dos "Primeiros Clovis" e da "matança excessiva" foi — e ainda é — Paul Martin, da Universidade do Estado do Arizona. Ele afirma que os caçadores Clovis chegaram ao extremo sul do corredor livre de gelo em 11500 a.C. Dali se espalha ra m pelas matas até as planícies e as florestas da América do Norte e do Sul em questão de algumas centenas de anos, levando não apenas mamutes, mas vários outros tipos de espécies animais gigantescas à extinção.

É fácil fazer a afirmação pós-moderna de que Paul Martin estava apenas inscrevendo o ideal do herói americano no passado Clovis, mas isso seria muito injusto. Na década de 1970, o cenário dos "Primeiros Clovis" era a interpretação mais razoável dos dados existentes. Já fora, porém, contestado por arqueólogos que afirmavam ter descoberto sítios pré-Clovis no continente americano. Louis Leakey, o reverenciado estudioso de origens humanas na África, declarou ter descoberto artefatos humanos "primitivos" nas montanhas Calico, no deserto Mojave Californiano. Estava errado — não passavam de pedras de rio quebradas. Mas em fins da década de 1970 já haviam surgido afirmações muito mais consistentes de colônias pré-Clovis.

É 1978 d.C., e John Lubbock se vê no vale do Yukon, logo na entrada do Círculo Ártico. Seu destino é o extremo noroeste, a terra que permaneceu livre de gelo durante todo o LGM, a Beríngia oriental que hoje chamamos Alasca. Se pessoas caçavam mamute na Fazenda Lehner, no sul do Arizona em 11500 a.C., certamente deve ser ali que se descobrirão seus ancestrais — os que primeiro atravessaram desde a África a ponte de terra hoje inundada.

É o solstício de verão, o céu continua claro durante todo o dia e a noite. Os altos picos da cordilheira Brooks ao norte, a cordilheira do Alasca ao sul e as MacKenzies a leste protegem essa paisagem, proporcionando-lhe um moderado calor estival. O Alasca é imenso — quase cinco vezes a área das ilhas Britânicas, mas com uma população inferior a um doze avos da de Londres.

Lubbock viajou por entre colinas ondulantes e montanhas baixas, bacias fluviais e infindáveis quilômetros de mato com tufos de erióforo. Viu muitos bandos de gansos acima, lobos e ursos. Mas as únicas criaturas em sua mente são os demoníacos mosquitos e mutucas. Precisa tolerá-los para poder chegar às Cavernas Bluefish, no noroeste do Yukon, onde, nesse ano de 1978, se vai fazer outra afirmação de quebra da Barreira Clovis.

Lubbock encontra as cavernas após percorrer a margem do rio Bluefish até um ponto cerca de 50 quilômetros a sudoeste da aldeia Old Crow. Os lados do vale coberto de espruces elevam-se num penhasco calcário denteado. Ele rasteja entre as árvores e encontra a escavação em andamento. Há duas pequenas cavidades na base dos penhascos; a boca de uma acha-se cercada por baldes, pás de ferro e colheres de jardineiro.

Trata-se do trabalho de Jacques Cinq-Mars e seus colegas da Pesquisa Arqueológica do Canadá. Cinq-Mars viu pela primeira vez as cavernas quando fazia um reconhecimento de helicóptero do rio Bluefish em 1975. Hoje ele está cavando numa das valas, vestindo grossas roupas como proteção contra o vento gelado e a praga de mosquitos. Do lado de fora, há uma pilha crescente de sedimento

escavado que consiste de loesses — sedimentos transportados pelo vento — e pedras que outrora desabaram do teto da pequena caverna.

Mesas, cadeiras, caixas, peneiras, livros de anotações e outras parafernálias de escavação são postos no abrigo das árvores. Alguém se senta e escreve rótulos para os grandes ossos escavados, os códigos cuidadosamente copiados nos livros de anotações. Os ossos são guardados seguros dentro de engradados como preparação para a longa viagem até o laboratório. Há várias caixas de ossos muito fragmentados, rotulados para indicar a camada e área em que foram encontrados. Os ossos vêm de uma imensa variedade de animais: mamute, bisão, cavalo, carneiro, caribu, urso e puma, junto com diversos animais pequenos, pássaros e peixes. Vários espécimes estão cobertos de marcas de dente e roedura — detritos deixados por lobos e ursos que usaram a caverna como abrigo nos tempos da era do gelo.

Também há artefatos de pedra, pequenas lascas e os restos dos nódulos dos quais foram separados. Tipos semelhantes de instrumentos já foram estudados em outros lugares do Alasca e designados como cultura Denali, e revelaram não ser mais antigos que 11000 a.C.

Um terceiro tipo de achado está sendo inspecionado, separado e rotulado: ossos animais que Cinq-Mars julga terem sido raspados e aparados por mãos humanas. Quando se obtiverem as datas de radiocarbono, esses "ossos trabalhados" — encontrados logo em seguida aos artefatos de pedra — serão datados de antes de 20000 a.C.

Na época da visita de Lubbock, essas datas são desconhecidas de Cinq-Mars. Mas ele trabalha com a convicção de que suas descobertas revelam uma colônia pré-Clovis nas Américas. Lubbock espreme-se para entrar na caverna e passa pelas condições de trabalho apertadas, escuras e entulhadas. Em vez de serem horizontais e empilhadas com cuidado, as camadas de sedimento mergulham e sobem, começam e param de maneira errática — quase impossível de decifrar. Seus pensamentos estão nos lobos que fizeram covis dentro da caverna e desarrumaram as camadas, e nos roedores que se entocavam nos sedimentos macios. Finas lascas de pedra podem facilmente ter-se deslocado com eles e se misturado com os ossos trazidos por lobos para a caverna, vários milhares de anos antes de as pessoas chegarem para lascar os nódulos de pedra.

Desde que os "ossos trabalhados" foram encontrados, arqueólogos têm debatido se as pontas lisas foram realmente feitas por mãos humanas. Talvez possam ter surgido das constantes lambidas de animais esfomeados, ou mesmo do vento ou da água, antes de fuçados de uma carcaça em putrefação e levados por desespero para a caverna. Se assim for, o fuçador poderia ter sido homem, mulher ou animal. Quase trinta anos após realizar suas escavações, Cinq-Mars continua convencido de que os ossos de bordas lisas são verdadeiros artefatos humanos e demonstram que havia pessoas no Alasca antes do LGM. Eu não vi os ossos, mas por suas descrições continuo cético — a natureza parece ser o mais provável operário.

As Cavernas Bluefish são o único sítio em todo o Alasca que pode reivindicar alguma colonização pré-11500 a.C., e a reivindicação é suficientemente fraca para permitir uma confiante rejeição. Se tais sítios estão ausentes no Alasca — ou Beríngia oriental, como devemos chamá-lo — parece limitada a probabilidade de que existam mais ao sul. Sua ausência no Alasca não pode ser explicada pela falta de trabalho de campo, como se poderia esperar numa paisagem tão desafiante quanto essa. Intensa pesquisa arqueológica encontrou mais de vinte sítios — lugares de acampamento do passado — com data da era do gelo. Vários deles encontram-se profundamente enterrados com conjuntos de artefatos, lareiras e ossos de animal esquartejado intocados. Mas nenhum data de antes de 11500 a.C.

Na verdade, a situação para os defensores do pré-Clovis é muito pior que a ausência de indícios do Alasca; não há sítios conhecidos em toda a Sibéria — que formava a parte ocidental da Beríngia — com uma idade maior que 15000 a.C. Comunidades de caçadores-coletores tinham-se certamente estabelecido na Sibéria nessa data, e é razoável imaginar que acabaram por espalhar-se para o Alasca, transpondo o que para eles era uma barreira intercontinental inteiramente invisível e desconhecida. As pessoas que chegavam nessa data, porém, não poderiam ter viajado para o sul, devido às maciças camadas de gelo que isolavam o Alasca da rica tundra e das densas florestas da América do Norte. É improvável que o corredor livre de gelo tenha sido percorrido até 12700 a.C.; se uma lacuna entre as camadas de gelo tivesse existido antes dessa data, teria sido inóspita para viajar, faltando-lhe quaisquer recursos de lenha e comida.

Mas se assim é, como pode haver artefatos de pedra datados de 16000 a.C. na Gruta do Prado na Pensilvânia? Este é o mais próximo sítio de conteúdo que temos de considerar, ao sul da camada de gelo de Laurentide.

Em 1973, James Adovasio, da Universidade de Pittsburgh, na Pensilvânia, começou a escavar uma pequena caverna no vale do Cross Creek, tributário do rio Ohio. Adovasio ia passar os trinta anos seguintes estudando e debatendo a importância da Gruta Meadowcroft para o povoamento das Américas — e continua firme. Suas escavações expuseram 5 metros de sedimentos distribuídos em camadas bem definidas, das quais se obtiveram várias datas de radiocarbono. As camadas mais inferiores datavam de cerca de 30000 a.C. e não têm sinal algum de presença humana. Acima delas, foi datada de cerca de 21000 a.C. uma camada dentro da qual se descobriu um nó de fibras trançadas, possivelmente um fragmento de cesto. As camadas seguintes foram datadas de 16000 a.C. e continham o que são incontestavelmente instrumentos de pedra feitos por mãos humanas.

Encontraram-se muitos ossos de animais e pássaros na caverna; alguns teriam sido de corujas

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