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A concepção de formação de professores do Pacto Nacional pela

4. RESULTADOS E ANÁLISES

4.3 O QUE SE DIZ – ANÁLISE DAS ENTREVISTAS DE FORMADORES E

4.3.1 A concepção de formação de professores do Pacto Nacional pela

Para o desenvolvimento da pesquisa, além de analisar os documentos, acompanhar as formações de orientadores de estudos e a formação das professoras alfabetizadoras, se entendeu importante entrevistar uma professora formadora e uma orientadora de estudos, para conhecer, na perspectiva delas, qual é o lugar dos conhecimentos das professoras alfabetizadoras no processo de formação. As entrevistas foram realizadas com o auxílio de um roteiro, mais como uma conversa entre pesquisadora e entrevistadas, deixando liberdade para exporem seus pensamentos em relação ao tema, com a garantia de que seus nomes se manteriam no anonimato.

Além de duas entrevistas gravadas em um gravador digital, as quais foram transcritas para posterior análise, realizou-se algumas conversas via rede social e por e-mail, para sanar dúvidas e aprofundar temas. As conversas também foram copiadas e salvas no computador. A internet foi uma ferramenta utilizada para aproximar distâncias, já que a professora formadora reside em outra cidade e o tempo para tal tarefa era escasso, com a proximidade do fim das formações do PNAIC, assim como todas as envolvidas mantém uma carga horária semanal de trabalho bastante extensa, não dispondo de tempo para os encontros necessários.

Das entrevistas, foram destacadas algumas categorias importantes para o entendimento da concepção de formação na visão das formadoras. A primeira é o vínculo necessário entre

formadora e cursistas. A segunda é o olhar sobre os saberes da experiência dos professores alfabetizadores e o trato desses saberes nos encontros de formação do PNAIC. A terceira é a concepção de formação continuada tendo como foco as professoras alfabetizadoras, a reflexão sobre a prática e a busca da qualidade profissional.

4.3.1.1 O vínculo

A professora formadora destaca o vínculo criado entre ela e as professoras orientadoras de estudos, importante para que todas possam colocar a sua palavra, sem medo de represálias. Diz a formadora: “acho fundamental esse vínculo, essa troca tem que existir. Não pode ser algo que vem de cima para baixo. Tem que ser colocado e falado”. A formadora acredita que entre ela e as professoras orientadoras do seu grupo de formação, não deveria ter desconfiança na hora de fazer alguma crítica em relação ao programa e o estabelecimento de um vínculo facilita essa comunicação. O formato do programa, com dois anos de duração, promove a criação desse vínculo, pois com o passar do tempo, formadora e orientadoras adquirem uma proximidade, importante para a formação.

A orientadora de estudos também destaca o vínculo criado entre os componentes do grupo como facilitador dos trabalhos. Diz que, no início havia algumas desconfianças em relação ao programa e à própria orientadora de estudos, vista como uma representante do governo e defensora do programa sob quaisquer condições. Com o passar do tempo, essa imagem negativa por parte de algumas professoras alfabetizadoras foi se desconstruindo, aumentando a confiança na orientadora.

No início havia desconfiança em relação ao programa. Na audição de algumas gravações dos encontros de formação da orientadora de estudos, percebe-se que nos primeiros encontros da Alfabetização Matemática, um tempo considerável era dedicado a conversas entre as professoras alfabetizadoras. Algumas se queixavam do programa, principalmente do formato, por demandar encontros aos sábados, depois de uma exaustiva semana de trabalho. Outras se queixavam das direções das escolas que não ofereciam o apoio necessário às formações e não dando a devida importância às mudanças que elas vinham realizando nas escolas.

4.3.1.2 O “olhar” sobre os saberes experienciais dos professores alfabetizadores

Esse item trata do olhar que professora formadora e professora orientadora de estudos lançam sobre os saberes da experiência dos professores alfabetizadores. É por meio da percepção dos saberes da experiência das professoras alfabetizadoras, que os encontros de formação tomam um rumo, que pode ser o da transmissão dos conteúdos dos cadernos de formação ou, diferente disso, da reflexão sobre a prática dos professores, utilizando o material como suporte para o processo.

No diálogo com as entrevistadas evidenciou-se que, tanto a professora formadora como a professora orientadora de estudos, conheciam a proposta de Maurice Tardif sobre saberes docentes. Nas entrevistas, esses conhecimentos vieram à tona. A professora orientadora de estudos destaca que, nas formações ela precisa lembrar que as professoras alfabetizadoras de seu grupo de formação são profissionais que tem saberes e uma caminhada que precisam ser levados em conta:

Depois de ler Tardif eu tenho que pensar nos três saberes. Os professores tem um saber, eles trazem os saberes da formação científica, todo professor passa pela iniciação científica, tanto de leituras que eles realizaram nos cursos de magistério. Junto com isso tem todo o saber pedagógico que é também oferecido nos cursos de formação. Por fim, o saber da própria experiência dos professores (PROFESSORA ORIENTADORA DE ESTUDOS - transcrição em 30/09/2014, p. 9).

A formadora também relaciona os saberes da experiência como ferramentas importantes num processo de formação continuada. Para ela, a formação serve para refletir o que já se sabe, mais do que aprender coisas novas. Afirma que, os professores que vêm para uma formação, não são “tábula rasa”. Possuem experiência de sala de aula que precisam ser confrontados nos encontros de formação.

Tardif (2013) afirma que é por meio do confronto de saberes da experiência que eles adquirem objetividade. Nos encontros de formação continuada é que esses saberes deveriam se transformar num discurso capaz de formar outros professores e de auxiliar na resolução dos problemas típicos da profissão docente. Corroborando com as palavras de Tardif, a formadora afirma ser “fundamental para a formação trazer as suas experiências, para que haja diálogo, troca”. Segundo Tardif (2013), essas trocas acontecem além dos encontros de formação, no cotidiano escolar. Isso acontece quando os professores trocam material didático, sugerem dicas uns aos outros sobre como realizar uma tarefa, de como organizam uma atividade e de como preparam a turma para uma tarefa.

A formadora, sabendo que os professores alfabetizadores possuem esses saberes, postulados por Tardif, questiona: “Como colocar esses saberes em segundo plano? Vejo isso na sala de aula. Os professores trazem muitos saberes, tanto os que adquiriram como alunos, observando seus professores, como os que adquiriram na formação inicial”. E reitera:

Tenho convicção de que os saberes da experiência, os saberes dos professores, sejam dos orientadores, sejam dos alfabetizadores, devem estar presentes em todos os momentos. Devem ser ponto de partida e de chegada. O próprio material traz muitos relatos de experiência buscando isso, essa interlocução entre o que ocorre na escola e a discussão provocada pela reflexão sobre isso. Essa é a função do Pacto, levar à reflexão à luz de suas experiências e de seus conhecimentos (PROFESSORA FORMADORA - transcrição em 10/11/2014, p. 5).

A formadora afirmou que em seu grupo de formação há a participação do professor. Itera que incentiva a participação e que essa é “livre, com momentos para que tragam suas experiências, problematizando algumas ações”. E conclui dizendo: “a gente sabe que as contribuições são importantes, mesmo concordando ou não com elas. Acho legal a participação, porque traz contribuições. Até a compreensão surge no momento de participar” (PROFESSORA FORMADORA - transcrição em 10/10/2014, p. 3).

No entanto, a formadora vê esse saber experiencial como um saber que precisa ser trabalhado e aperfeiçoado na formação continuada. Muitas vezes, o saber está ancorado em práticas tradicionais de alfabetização, pois, segundo Tardif (2013) os saberes são oriundos da própria prática do professor e ele vai constituindo um saber- fazer específico, intimamente ligado à sala de aula, a sua tarefa de ensinar e os alunos. A formadora destaca que muitos professores “se acomodam e adoram repetir dia após dia sempre as mesmas coisas e acham que são detentores de um saber inquestionável”. E interroga:

[...] como a gente quebra a força do saber experiencial? Vejo isso na sala de aula. O professor traz muitos saberes, tanto os que vivenciou como aluno como os que adquiriu na formação inicial, quando entra pra sala de aula de formação continuada. Parece que quanto mais ele faz isso mais ele resiste a refletir e mudar. É onde fica mais forte. Como é que a gente muda isso? Como a gente quebra a resistência? Não temos que desconsiderar esses saberes. Isso tem um valor importante no trabalho de cada um, mas não pode ser superior (PROFESSORA FORMADORA - transcrição em 10/10/2014, p. 2).

Nesse sentido, a professora orientadora de estudos também sinaliza para o perigo do saber experiencial ou aqueles construídos na observação enquanto alunos, se sobrepor aos saberes provenientes da formação profissional. Observa que, muitas vezes, o saber que o

professor adquiriu enquanto aluno, observando seus professores, reflete em seu fazer na sala de aula. E exemplifica:

Por exemplo, uma vez coloquei para uma professora: você tem que trabalhar a multiplicação cuidando o processo. Por que é 2x3? Por que é dois grupos com três elementos. Mas ela aprendeu diferente enquanto aluna e continua do seu jeito. Então, mesmo colocando para ela que é importante o aluno saber da onde saíram esses números, ela continua ensinando como ela aprendeu na escola enquanto aluna (PROFESSORA ORIENTADORA DE ESTUDOS - transcrição em 30/09/2014, p. 9).

Percebe-se que, tanto a formadora como a orientadora de estudos, ao mesmo tempo em que reconhecem o saber experiencial das professoras alfabetizadoras, veem nele, um empecilho para aquisição de novos conhecimentos. Quando esse saber está alicerçado em teorias que estão em pauta na formação continuada, ele colabora com o desenrolar dessa formação, enriquecendo as discussões e validando o discurso. No entanto, o saber, quando alicerçado em outras metodologias, principalmente as tradicionais de alfabetização, onde o professor segue um modelo repetitivo no fazer pedagógico e insiste nisso, atrapalha a formação. Tanto para a formadora, como a orientadora de estudos, dizem que esse saber dificulta ou até mesmo impede o diálogo.

4.3.1.3 Concepção de formação continuada na visão da professora formadora e da professora orientadora de estudos

A professora orientadora de estudos destaca que as professoras alfabetizadoras necessitam se sentir sujeitos da formação realizada pelo PNAIC. Qualifica o programa como um espaço de produção e troca de novos conhecimentos, que oportuniza as professoras a refletir suas práticas e construir competências profissionais. Nesse sentido completa:

É com a formação que os educadores entram em contato com as novas metodologias, discutem as teorias atuais e assim contribuem para as mudanças que se fazem necessárias para a melhoria da prática pedagógica na escola e na educação. Hoje não faz mais sentido o professor pensar que, ao terminar sua formação escolar, Curso Normal e Graduação, estará pronto para atuar na sua profissão. As exigências, na área educacional, são constantes e é necessária a busca da qualidade profissional (ORIENTADORA DE ESTUDOS - transcrição em 07/10/2014, p. 11).

Para mim a formação continuada tem o propósito de reelaborar e refletir sobre o conhecimento adquirido na formação inicial, a luz das experiências vivenciadas por cada pessoa. É ela a responsável por desenvolver uma atividade investigativa e reflexiva, valorizando as experiências pessoais, possibilitando incursões teóricas, atribuindo novos significados através da discussão, da mediação de diferentes práticas e posturas. Não é uma formação compensatória, como se fosse necessária para compensar as falhas ou faltas da formação inicial. Não! Ela tem outro caráter, ela se debruça principalmente na reflexão sobre a prática, por isso acredito que o Pacto deva proporcionar isso em todas suas pontas, seja eu com vocês, seja vocês com as alfabetizadoras (PROFESSORA FORMADORA - transcrição em 10/10/2014, p. 6).

A formação continuada auxilia o professor alfabetizador a ir além da prática. Alferes (2009) destaca que a formação continuada, muitas vezes, é uma decisão pessoal que alavanca desenvolvimento e crescimento profissional. É o próprio professor que mantém uma atitude ativa perante a continuidade de sua formação, reorientando seus saberes construídos na formação inicial.

No entanto, a formadora critica o fato das professoras alfabetizadoras terem sido obrigadas a participar do Pacto. Concebendo a formação continuada como um investimento profissional que o próprio professor deve buscar, a fim de melhorar sua prática. Nesse sentido, vê a bolsa de estudos (incentivo financeiro que as alfabetizadoras recebem mensalmente no valor de R$ 200,00), como uma forma de comprar a presença dos professores nos encontros de formação. Para a formadora, as professoras alfabetizadoras deveriam participar da formação de livre e espontânea vontade, mesmo com a concessão de bolsas de estudo. Mas, apesar de ser contra a obrigatoriedade, vê no Pacto uma configuração de formação continuada que acredita “ser a melhor forma de crescermos enquanto educação nesse país”.