• Nenhum resultado encontrado

4. RESULTADOS E ANÁLISES

4.2 O QUE SE VÊ E OUVE – ANÁLISE DOS CASOS OBSERVADOS

4.2.2 Um grupo de formação de professores alfabetizadores no Pacto Nacional

4.2.2.1 Descrição do caso de formação dos alfabetizadores

Da mesma forma como aconteceu com a formação das orientadoras de estudos, foi necessário gravar parte das formações das professoras alfabetizadoras do grupo da orientadora de estudos em questão. O objetivo era o mesmo, observar como a orientadora de estudos dialogava com os saberes experienciais das professoras alfabetizadoras e como o processo de formação acontecia. Para fazer o relato, escolheu-se um encontro específico, que foi desenvolvido, nos dias 26 e 27 de setembro de 2014, sexta-feira, nos turnos tarde e noite e sábado nos turnos manhã e tarde, totalizando 16 horas.

O encontro foi organizado em um ambiente agradável e acolhedor, tendo em vista a convivência do grupo, as professoras alfabetizadoras apresentaram comportamento mais acessível, comparado ao dia em que houve a explanação da pesquisa e o modo como se realizariam as gravações e observações. A orientadora começou o encontro falando do tema contido no caderno, realizando uma breve explanação do assunto. Iniciou as atividades do dia com a leitura para deleite do livro “Que Delícia de Bolo” de Elza Calixto e Sílvia Calixto.

Durante a leitura, realizou o levantamento de hipóteses a respeito da sequência do enredo e das relações de grandezas e medidas que a literatura apresenta, reforçou que a literatura possibilita uma significativa mediação com a Língua Materna e com a Educação Matemática. Argumentou também que na Educação Matemática, a literatura potencializa o trabalho com a comparação de substâncias utilizando unidades não convencionais de medida, imprescindível antes da introdução do trabalho com as unidades padronizadas.

Retomou o encontro anterior “Cadernos Educação do Campo e Educação Inclusiva”. A atividade solicitada era fotografar uma experiência com os alunos que considerassem significativa e relatar para as colegas de formação. A maioria das alfabetizadoras participou desse momento, socializando os trabalhos realizados com os alunos a partir do registro fotográfico. Dessa forma, mostravam a imagem, diziam o que tinham registrado e contavam a experiência realizada com os alunos. A orientadora de estudos organizou a apresentação, fazendo o chamamento por escola para que socializassem as experiências. As apresentações duraram mais de uma hora. Algumas resumiam rapidamente, enquanto outras contavam detalhes do trabalho realizado. A ênfase dessa tarefa estava na atividade realizada pela professora com seus alunos. A orientadora de estudos, nesse momento, limitava-se em escutar os relatos, assim como as demais.

Na sequência assistiram o vídeo: Inmetro – O tempo todo com você. Por que trabalhar Grandezas e Medidas no Ensino Fundamental? O vídeo traz uma explicação sobre grandezas e medidas e sobre o trabalho do Inmetro. Na continuação, apresentou os slides sobre os assuntos do Caderno 6: Seção “Iniciando a Conversa” e “Grandezas e Medidas a partir do Universo Infantil”. Os slides proporcionaram discussões sobre a teoria contida no caderno e a experiência das alfabetizadoras. Percebeu-se que nesse momento todas queriam falar sobre suas experiências escolares e falavam, muitas vezes sem esperar sua vez, causando agitação na sala de formação. A orientadora de estudos precisou retomar a ordem na sala, organizando as falas. As experiências eram ouvidas por todas e algumas comparadas com as de outras professoras, porém não eram registradas.

Logo após esse momento, a orientadora solicitou a realização da atividade em grupo: criar uma receita do que imaginam ser um bom professor alfabetizador, utilizando as palavras: (curiosidade, disposição para o novo, paciência, perseverança, presença, conhecimento, determinação, harmonia, dinamismo, lúdico, respeito, disciplina, criatividade, dedicação, amor a profissão, alegria, coragem, comprometimento, envolvimento). Constatou-se na socialização da atividade, que, as professoras iniciam as atividades cansadas e com certa

resistência, mas depois a empolgação toma conta dos grupos de trabalho e um quer apresentar melhor que o outro.

No livro “Que delícia de bolo”, oferecido como leitura para deleite, é apresentada a receita de um bolo de chocolate, então, a orientadora de estudos trouxe para a sala de formação um bolo e solicitou que dividissem em partes iguais para que todas pudessem degustá-lo. Questionou: Foi fácil dividir o bolo? Foi difícil? Quais os critérios utilizados para dividir o bolo?

Para finalizar os trabalhos do turno da tarde, entregou como brinde para cada professora alfabetizadora o “Caderno de Receitas do PNAIC” – Sabores & Saberes – Uma

experiência gastronômica em Educação – Letramento, Alfabetização e Matemática. Percebe-

se grande euforia nesse momento, que é esperado por todas nos encontros. A cada encontro um mimo diferente, sempre de acordo com o tema em estudo.

Para finalizar o turno, a orientadora organizou, com auxílio de algumas alfabetizadoras, uma mesa com café, chá, refrigerante, bolachas, doces e claro, o bolo de chocolate. As professoras alfabetizadoras enquanto degustavam o lanche conversavam entre si sobre os mais diversos assuntos, perguntavam sobre o trabalho nas escolas umas das outras, falavam sobre suas famílias, filhos e alunos e riam muito.

No turno da noite as atividades foram realizadas na seguinte sequência: leitura para deleite: “Só um Minutinho” de Yugi Morales – Tradução de Ana Maria Machado. O livro infantil proporciona a discussão das possibilidades pedagógicas do trabalho com grandezas e medidas. Leitura e discussão do texto “A Medida em nossas vidas”, disponível no Caderno 6. A leitura foi feita de forma dinâmica, cada alfabetizadora lia uma parte e em determinados momentos a orientadora parava a leitura para fazer alguma colocação, nesse momento também algumas alfabetizadoras colocavam a sua palavra.

Eu introduzi sistema de medidas com brincadeiras. Aquela: Mamãe quantos passos posso ir? Pois a criança está caminhando. Exemplo: cinco passos de tartaruga, dois passos de girafa e assim vai reproduzindo necessidade de medida e aí posso usar o metro (fita métrica) (ALFABETIZADORA A - transcrição da gravação em 26/09/2014, p. 39).

A mãe de um aluno é costureira, então pedi pras crianças escolherem uma roupa, já que a mamãe é costureira. Trabalhar medidas de roupas, mede com barbante e faz comparações. Como as medidas ficam todas diferentes, se introduz o metro (ALFABETIZADORA B - transcrição em 26/09/2014, p. 39).

Percebi, nas falas das docentes, que essas possuem saberes construídos na experiência de sala de aula, centrados nas atividades que realizam com os alunos. Na formação, procuram

demonstrar esses saberes por meio de relatos dessas atividades realizadas e, como nas falas acima, que possuem os próprios meios de introduzir ou trabalhar um conteúdo, que antecede à formação.

Após a leitura iniciou-se uma atividade prática, envolvendo noções de medida: as alfabetizadoras precisavam utilizar o próprio corpo como medida - (1 metro); medir da mão até o ombro, ou da mão até o pescoço e ainda virando o rosto de lado, até o nariz; organizar-se em fila por altura; atividade de medir os colegas com canudinhos e representar em papel pardo; organizar-se em fila por altura novamente pela ordem do sistema de medida e comparar se a lista anterior continua a mesma. Essa atividade caracterizou-se por uma grande brincadeira, porém com um objetivo claro, a necessidade de trabalhar o sistema de medidas, medindo. As docentes relatavam umas as outras suas formas de trabalhar com as unidades de medidas, como realizaram determinada atividade com seus alunos.

Na sequência, a orientadora de estudos solicitou a confecção de um álbum, denominado por ela “Quem Sou Eu?”. A mesma, durante a semana solicitou, por meio de e- mail, que as alfabetizadoras trouxessem para o encontro, objetos e memórias do I Ciclo de alfabetização. Solicitou que na primeira página fossem colocados os dados de identificação e colado um barbante que, anteriormente foi cortado do tamanho de cada uma (representação da altura). Solicitou também que organizassem informações relevantes de suas vidas, que requereram outras noções (peso, idade, datas...). Na segunda, terceira e quarta páginas, cada professora alfabetizadora construiu a sua linha do tempo, observando suas memórias. Na quinta página solicitou que escrevessem sobre a atualidade, como se veem na condição de professoras alfabetizadoras (Figura 2).

Com essa tarefa a orientadora apresentou os slides dos assuntos que davam sequência ao Caderno 6: A importância de ensinar Grandezas e Medidas. Após, leram juntas mais um texto do caderno: “Tempo Cabeça, Tempo Mão” de Carlos Roberto Vianna.

No dia 27 de setembro, sábado, as atividades da manhã foram desenvolvidas com a apresentação dos vídeos “Patrulha do saber - A origem do dinheiro”, um vídeo de desenho animado que fala o que o título se propõe e “Jogo monetário com garrafa pet”, um vídeo curto que apresenta um jogo envolvendo o sistema monetário para ser trabalhado nas classes de alfabetização. Retomaram os estudos do Caderno 6 com auxílio de slides, agora sobre o “Valor Monetário”. Na sequência, foi solicitada outra atividade, as alfabetizadoras confeccionaram uma maquete onde exploraram trilhas, ruas, avenidas e observaram as possibilidades com grandezas e medidas. Para concluir a atividade, criaram um jogo com a maquete. Antes de encerrar o turno, foi feita a socialização da atividade, momento em que as

alfabetizadoras mostravam ao grupo como confeccionar o jogo que criaram e demonstrar como se joga.

Figura 2 - Professoras Alfabetizadoras realizando medidas para o álbum “Quem sou eu?”

Fonte: A autora

Nessa atividade as alfabetizadoras tiveram oportunidade de trazer para o encontro de formação o que vêm desenvolvendo nas salas de aula. Os jogos que construíram a partir da maquete foram jogos que não constam nos cadernos de formação, mas sim, que elas desenvolveram com os alunos. Isso se explica pelo fato de, ao explanarem a confecção e desenvolvimento do jogo, e ao jogarem com as colegas do grupo, esclareciam como tinham jogado na sala de aula, como seus alunos reagiram aos jogar e que tarefas tinham trabalhado após o jogo. Com isso, as alfabetizadoras trouxeram para o encontro seus conhecimentos e experiências que realizaram com os alunos. As experiências complementam e consolidam o que dizem os cadernos de formação.

O turno da tarde iniciou com a leitura para deleite “A Economia de Maria” de Telma Guimarães Castro Andrade. Na sequência, foi solicitada outra atividade, adaptada pela orientadora de estudos de um texto do Caderno 6, que descreve o trabalho com folhetos de propaganda. As professoras alfabetizadoras organizaram um mercadinho utilizando embalagens vazias, essas embalagens foram trazidas pelas próprias professoras. Utilizando o dinheirinho promoveram a atividade de compra e venda. Após, assistiram ao vídeo “De onde

vem o dinheiro dos adultos?”

Após, as professoras em formação foram convidadas para a seguinte atividade em grupo: leitura dos relatos de experiências de professoras alfabetizadoras contidos no caderno, socialização dos relatos, planejamento e desenvolvimento de uma atividade para apresentar para as colegas, que contemplasse o sistema de medida exposto no relato de experiência lido. Ficaram assim distribuídos os grupos de trabalho: o primeiro grupo com o relato “Trabalhando com volume e capacidade no ciclo de alfabetização”; o segundo grupo com o relato “Feira de demonstração de produtos”; o terceiro com o relato “Salto em distância”; o quarto com “Trabalhando com o tempo no ciclo de alfabetização”; o quinto grupo com “Trabalhando com receitas culinárias”; e o sexto grupo com “Construindo calendários”. Todos os relatos são de professoras alfabetizadoras da rede municipal de cidades de Pernambuco e Paraíba, região nordeste do Brasil. Após a leitura do relato de experiência, as alfabetizadoras, nos seus grupos, criados por afinidades, foram convocadas pela orientadora de estudos a criar uma atividade nova ou relatar uma atividade desenvolvida com os alunos.

Observou-se que as alfabetizadoras explicaram as atividades contidas no caderno e após, criaram outra sobre o assunto tratado, pensando na sua realidade. Outras, após explanarem a experiência contida no caderno, demonstraram atividades já realizadas em suas salas de aula, trazendo suas memórias e sua experiência sobre assunto, como a que segue:

Na minha experiência pedagógica, já antes do Pacto, realizava atividades práticas em aula para trabalhar os tamanhos: pequeno, médio e grande. A partir da história ‘Os Três Ursos’ da editora Edelbra, adaptação de textos de Paulo Dias Fernandes, trabalho os tamanhos pequeno, médio e grande. Ao contar a história já é possível que as crianças vão percebendo a relação dos objetos do pai: grande, da mãe: médio e do filho urso: pequeno. Exemplo: cadeirão, cadeira e cadeirinha. Também, sem o uso do vocabulário específico, vão aprendendo o grau dos substantivos. Após a história realizo atividade prática com as crianças, a partir de três desenhos de ‘bonecos estilizados’: pequeno, médio e grande, onde as crianças devem perceber o tamanho do colega em relação a figura apresentada. Faço a conferência colocando as crianças de costas, duas a duas e pondo uma régua sobre as cabeças para as crianças perceber se estavam certas. Para finalizar a tarefa a turma é desafiada a organizar duas filas, meninas e meninos, por tamanho. Algumas vezes do menor para o maior e outras do maior para o menor. Também realizo o jogo da memória dos tamanhos: pequeno, médio e grande. Com figuras dos três ursos, em três tamanhos e de cores

diferentes. Cada grupo, por sorteio do dado, recebe a cartela com a cor e a ilustração da sombra dos ursos: pequeno, médio e grande. No quadro, são coladas as figuras pequenas, médias e grandes com a cor escondida. Cada grupo faz a jogada tentando pegar a cor certa, primeiro do pequeno, depois do médio e por último do grande. Se não acertar, pegando o tamanho e a cor perde a jogada. Também, em grupos realizam o jogo dos objetos dos ursos. Cada grupo recebe uma cartela onde deve separar os objetos dos ursos em: pequenos, médios e grandes, conforme o tamanho do “boneco” desenhado na cartela (ALFABETIZADORA C - transcrição da gravação em 27/09/2014, p. 40).

A atividade solicitada para o “Diário de Bordo” foi trazer para o próximo encontro uma receita significativa da sua vida, socializar entregando uma cópia para as colegas e colar no Caderno de Receitas. A partir da “Seção Compartilhando” realizar a atividade solicitada pela Orientadora de Estudos, adaptando e colocando em prática com seus alunos, concretizar com registro fotográfico e socializar no próximo encontro. No término do encontro foi entregue a avaliação, onde as alfabetizadoras escreveram os aspectos positivos e negativos, bem como sugestões para serem desenvolvidas nos encontros seguintes. Para concluir o encontro foi projetado o vídeo - música: “Oito anos” de Adriana Calcanhoto, momento em que a Orientadora de Estudos entregou mais um brinde para as alfabetizadoras, um pequeno “Calendário do PNAIC”.

O que se observa, a partir dos relatos das formações de orientadores de estudos e da formação de professores alfabetizadores, é que uma formação se despende da outra. Os encontros de formação de orientadores de estudos seguem uma pauta, contida nos cadernos de formação e nos documentos oficiais do programa, que serve de base para a formação das professoras alfabetizadoras. Nas formações observadas, verificou-se que a sessão “aprofundando o tema”, que contém textos organizados por professores das universidades parceiras, geralmente é trabalhada, tanto nas formações de orientadores como nas de professores alfabetizadores, por meio de slides, que trazem o tema de forma resumida. Porém, a orientadora de estudos tem liberdade para utilizar ou não os slides fornecidos pela formadora, planejar os seus ou trabalhar os textos diretamente no caderno, por meio de leituras.

A seção “compartilhando”, que traz experiências bem sucedidas de alfabetizadores das diversas regiões do país, é trabalhada por meio de leituras e tarefas em grupo, onde cada um fica com uma experiência para ser contraposta com a experiência de sala de aula de cada participante. A atividade da seção “atividades para casa e escola”, que a formadora pesquisada denominou “diário de bordo”, é escolhida dentre as sugestões que trazem o caderno de

formação. Observou-se que há liberdade na escolha dessa atividade por parte da orientadora de estudos.

Não há, por parte da universidade ou da formadora, uma regra rígida a ser seguida pelas orientadoras de estudos sobre como conduzir seu grupo de formação. Observou-se que, tanto a primeira como a segunda dão liberdade às orientadoras para planejarem os encontros de formação em conformidade com o grupo de alfabetizadoras, no entanto, está pautado que os cadernos de formação precisam ser trabalhados em sua totalidade e atividades práticas devem ser inseridas nos planejamentos.

As “leituras para deleite” são retiradas das sugestões contidas nos cadernos de formação na seção “sugestões de atividades para os encontros em grupos”, mas também há a liberdade de, tanto formadora como orientadora de estudos, escolherem outras, que se adaptem ao tema em estudo. Ainda assim, nas observações, os textos utilizados estavam todos sugeridos nos cadernos.