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3. MODOS DE ORGANIZAÇÃO DO DISCURSO

3.6. Modo de organização discursiva retórico

3.6.3. A dimensão emotiva: emoções, desejos e ações

A dimensão emotiva compreende as emoções, uma vez que tem por finalidade sensibilizar e mobilizar o interlocutor. A probabilidade de um discurso sensibilizar, mais ou menos, depende de sua capacidade de atingir as emoções do interlocutor. Assim, as emoções são de fundamental importância ao processo argumentativo. Por um lado prepara o espírito do interlocutor para que, pelo menos, se disponha a ouvir o locutor. Por outro lado, procura

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sensibilizá-lo para os valores e crenças que o locutor busca alcançar por meio da argumentação, conforme atestam Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000).

Embora durante muito tempo tenha se afirmado a primazia da razão30 (logos) na célebre dicotomia racionalismo cognitivo e tensões/perturbações da alma (emoções e sentimentos31), é inegável a importância das emoções na argumentação. Conforme Sodré (2006), desde a Antiguidade grega, os grandes oradores tinham consciência de que a eloqüência mais poderosa é aquela que se vale da paixão calculada (as figuras de sentido sempre constituíram excelentes recursos de mobilização emocional do interlocutor pela palavra). Aristóteles chegou, inclusive, a dedicar um livro inteiro a esse assunto:

[...] é necessário não só procurar que o discurso seja demonstrativo e digno de crédito, mas também que o orador mostre possuir certas disposições e prepare favoravelmente o juiz. Muito conta para a persuasão, sobretudo nas deliberações e, naturalmente, nos processos judiciais, a forma como o orador se apresenta e como dá a entender as suas disposições aos ouvintes, de modo a fazer que, da parte destes, também haja um determinado estado de espírito em relação ao orador (ARISTÓTELES, 2005, p. 159, grifo nosso).

Na dialética aristotélica, portanto - assim como também na platônica32 - sempre se apelou para as emoções, ou seja, para uma retórica que se valesse de estados ou disposições psíquicos. Hoje, mais do que nunca, parece que é justamente no plano do sentir que a nossa época exerceu o seu poder (PERNIOLA, 1993). Bem como afirma Sodré (2006), vivemos a época do estético, não por sua relação direta com as artes, mas por seu campo estratégico do sentir (aisthesis) em contraponto ao do cognitivo e do prático. O discurso político contemporâneo, por exemplo, mediante as grandes transformações pelas quais passa33, parece se inserir bem nesse contexto.

30 O logos era considerado a fonte de todo conhecimento e verdade (SODRÉ, 2006).

31 Durante séculos, as emoções e paixões foram condenadas, consideradas como fator de perturbação e perda

temporária da razão. Para muitos autores, as paixões perturbavam a alma, impediam o homem de pensar, portanto era necessário domá-las por meio da razão. As paixões, uma vez oriundas dos “pensamentos confusos”, eram sem valor e desnecessárias. Possuí-las era resultado de ignorância humana e sua estupidez, uma vez que o homem é dotado de razão, e sem a razão os homens são vazios e sem sentido. Somente na racionalidade reside a fonte da sabedoria (SODRÉ, 2006).

32 Platão é considerado o criador da primeira teoria sobre as emoções (SODRÉ, 2006).

33 Há algumas décadas, a mediação do discurso político era somente por meio da palavra, seja ela falada ou

impressa. Ora o orador se instalava no palanque e, ali, marcava sua presença com sua voz, seus gestos, suas vestes; ora sua imagem vinha delineada em cartazes e santinhos. Com o advento do rádio, a forma de contato entre o político e seu público mudou. O político chegava quase pessoalmente – por meio de sua voz – a recantos

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Conforme já dissemos, a argumentação, em sentido amplo, só é possível mediante a conjugação de três operações discursivas, tendo em vista que aquele que visa a persuadir e a convencer deve instruir, agradar e fazer agir (docere, delectare e movere)34.Ou seja, ele precisa tocar a razão e o coração, articular as dimensões técnica, representacional e emotiva.

Segundo Marques (2008), ao longo da história, vários autores mostraram a importância das emoções à argumentação como, por exemplo, Pascal, Plantin, Quintiliano e Cícero. Pascal, por exemplo, conforme a autora, afirma que para persuadir um indivíduo é necessário saber do que ele gosta, conhecer o seu espírito e o seu coração: “A arte de persuadir consiste tanto na arte de agradar como na de convencer, pois os homens governam-se mais por capricho que pela razão!” (PASCAL, 2001, p.133). No entanto, conforme ressalta o autor, é preciso levar em conta que ensinar regras para agradar é tarefa bem mais difícil, mais sutil, mais útil e admirável do que ensinar a usar o entendimento e a razão para convencer.

Plantin (2004) salienta que a retórica das emoções é tida como uma das dimensões essenciais da retórica. É aquela que se liga com os afetos. Segundo o autor, sem emoção e sem comoção não há retórica. Em Quintiliano (1975), nas palavras de Marques, o ethos funde-se nos afetos e define-se como um afeto doce ou longo sobre o qual se adoçam as modulações emocionais. Cícero, por sua vez, salienta Marques, enumera uma série de emoções retóricas de base justificadora da primazia dos afetos na palavra argumentativa:

Les sentiments qu´il nous importe le plus de faire naître dans l`ame des juges, ou de nos auditeurs quels qu´ils soient, sont l`affection, la haine, la

que mesmo os impressos alcançavam com dificuldade. No entanto, o rádio não alterou tanto o estilo do discurso político. Seu discurso ainda parecia de comício, com um tom de palanque. Depois, o cinema trouxe algumas mudanças. Mas, ainda havia o privilégio a uma locução empostada, com cenas de palanque, marcando a distância em relação ao espectador – uma distância que a própria sala de exibição e os rituais próprios da projeção de filmes já enfatizavam. Somente com o advento da televisão é que houve uma modificação radical na forma do discurso político. Através da imagem, a televisão trouxe o homem político para dentro da casa do cidadão. Os gestos e o rosto do orador ficaram mais próximos do público do que nunca. O cidadão, além de ter a imagem, o que não ocorria com o rádio, passou a tê-la agora de forma instantânea. Assim, a televisão trouxe um sentimento de intimidade, de proximidade. Nas palavras de Miguel (2000), a televisão trouxe mais que uma aproximação. Ela permitiu o próprio contato face a face: há um rosto para ser reconhecido. Essa intimidade modificou o formato do discurso. O tom de palanque, que remete à praça pública, soava, agora, inadequado. Foi surgindo um meio cada vez mais propício à patemização. Assim, as provas localizadas no auditório tiveram que ser repensadas para um ambiente próprio a esta mídia: a produção do espetáculo (MIGUEL, 2000). Em seu depoimento do dia 30/06/2005, no Senado Federal, Roberto Jefferson, por exemplo, mostra, claramente, saber que está no ar: “Exmo. Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sras. Deputadas, cidadão do Brasil que me ouve, cidadã do Brasil que me ouve” [...]. (Pronunciamento realizado no Plenário da Câmara dos Deputados no dia 14/09/2005).

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colére, l`envie, la pitié, l`esperance, la joie, la crainte, le mécontentement35

(CÍCERO, 1956, II, p. 205).

Rien n´est en effect plus important pour l´orateur, Catulus, que de gagner la faveur de celui qui écoute, surtout d`exciter en lui de telles émotions qu`au lieu de suivre le jugement el la raison, Il cede à l`entraînement de la passion et au trouble de son ame36 (CÍCERO, 1956, II, p. 178).

Mas o que são as emoções?

O tema emoção é de complexa abordagem e se encontra em constante discussão na Psicologia, Sociologia, Lingüística, Neurologia, Psiquiatria, Biologia, Antropologia etc. A palavra “emoção” provém do latim emovere, emotus - donde, commuovere: movimento energético ou espiritual desde um ponto zero ou um ponto originário na direção de outro, como conseqüência de certa tensão, capaz de afetar organicamente o corpo humano. Emotus que dizer abalado, sacudido, posto em movimento (ENCICLOPÉDIA LAROUSSE, 1998). Assim, como a própria etimologia sugere, as emoções são reações manifestas perante condições afetivas que, pela sua intensidade, nos mobilizam para algum tipo de ação, o que nos permite dizer que há uma estreita relação entre emoção, desejo (aqui compreendido como intenção) e ação.

Ao longo do tempo, vários sinônimos foram usados para o termo: paixões, sentimentos, percepções, sensações, perturbações, distúrbios, condutas, hábitos, valores morais, desarmonias do organismo etc. O que um autor denomina emoção, outro denomina afeto, e um terceiro, sentimento ou paixão. Outros estabelecem diferenciações entre emoção, sentimento e paixão. Outros, como Aristóteles (2005), por exemplo, usam esses termos como sinônimos. Além disso, as emoções foram qualificadas em boas ou más, primárias e secundárias, ligadas ou não a fatores biológicos, a valores sociais e morais.

Não constitui nosso objetivo aqui discutir a trajetória dos estudos sobre as emoções. Portanto, adotaremos a nomenclatura “patemização” que engloba tanto sentimentos, emoções e paixões, de forma indistintiva, além da perspectiva de Aristóteles (2005, p. 160): “as emoções são as

35 “Os sentimentos que mais desejamos fazer nascer na alma dos juízes, ou de nossos auditores quem quer que

sejam, são a afeição, o ódio, a cólera, a inveja, a piedade, a esperança, a alegria, o temor, o descontentamento” (CÍCERO, 1956, II, p.205, tradução nossa).

36 “Nada é, com efeito, mais importante para o orador Catulo que ganhar o favor daquele que escuta, sobretudo,

nele excitar emoções tais que, ao invés de seguir o julgamento e a razão, ele cede ao movimento da paixão e à perturbação de sua alma” (CICERO, 1956, II, p. 178, tradução nossa).

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causas que fazem alterar os seres humanos e introduzem mudanças nos seus juízos, na medida em que elas comportam dor e prazer: tais são a ira, a compaixão, o medo e outras semelhantes, assim como as suas contrárias”. Nesse sentido, acreditamos que as emoções podem incitar uma ação, uma vez que elas portam uma intencionalidade (desejo). Por exemplo, Roberto Jefferson se sentia ressentido tendo em vista a traição de seus colegas parlamentares. Assim, tencionando se vingar, revelou o esquema do “Mensalão”.

No entanto, é fundamental que as emoções correspondam às representações sociais (relacionada aos valores, às crenças, aos conhecimentos) do interlocutor para poder desencadear sensações ou comportamentos e ser usadas no intuito de seduzir, ameaçar, aterrorizar, enfim, atrair o interlocutor. Isto é, o sujeito falante precisa conhecer de antemão pelo menos alguns valores comungados por seu interlocutor para poder tentar persuadi-lo. Nessa perspectiva Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000)37 ressaltam que todo o movimento da argumentação consiste em transpor a adesão inicial que o auditório (sujeito interpretante) tem relativamente a uma opinião que lhe é comum para outra de que o orador (sujeito falante) o quer convencer. Daí a importância do kairós e do conhecimento que o orador (sujeito falante) deve possuir do seu auditório (sujeito interpretante), das suas opiniões, das suas crenças, de seus conhecimentos, enfim de tudo aquilo que ele tem por admitido que sejam as premissas da argumentação: as teses sobre as quais há um acordo. É claro que se pode sempre utilizar o estratagema da petição de princípio simulando tomar por acordado precisamente aquilo que se trata de demonstrar. No entanto não é esse o procedimento habitual.

Na perspectiva de Charaudeau (2006), as representações sociais se estruturam através dos saberes de conhecimento e de crenças. Os primeiros, ao contraírem representações classificatórias do mundo, os últimos ao darem um tratamento axiológico às relações do homem com o mundo. Os saberes de conhecimento, segundo o autor, possuem a função de estabelecer uma verdade sobre os fenômenos do mundo. São oferecidos como existindo além da subjetividade do sujeito, pois o que funda essa verdade é algo exterior ao homem. Esses saberes dizem respeito aos fatos do mundo e à explicação que se pode dar sobre o porquê ou o como desses fenômenos. Portanto, eles participam de uma razão científica que constrói uma representação da realidade que vale pelo conhecimento do próprio mundo. Essa razão

37 É indiscutível a contribuição de Perelman tanto na revalorização teórica da Retórica quanto na sua equiparação

a uma teoria geral do discurso persuasivo, que é visto como visando a uma adesão, tanto intelectual quanto emotiva, seja de tipo de auditório for (PERELMAN, 1993, p. 172).

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científica possui necessidade de fiadores. Ela usa instrumentos de visualização (microscópio, lunetas, telemática), sistemas de medida ou de cálculo (estatística, informática), procedimentos de figuração codificada (cartografia) e define conceitos e modos de raciocínio que podem ser utilizados pela coletividade, portanto, que escapam à singularidade do indivíduo. Nesse sentido, se constrói um discurso que não pertence a dada pessoa enquanto tal, que seria a realização de um terceiro impessoal (a ciência ou aquilo que ocupa esse lugar), que é independente de todo ato de enunciação pessoal e que desempenharia, ao mesmo tempo, o papel de referência e de verificador do saber. Esses saberes de conhecimento dependem das culturas nas quais nascem.

Já os saberes de crença, para Charaudeau, objetivam sustentar um julgamento sobre o mundo e se referem aos valores que lhe atribuímos e não ao conhecimento sobre o mundo, que é um modo de explicação centrado na realidade e que, supostamente, não depende de julgamento humano. Os valores são procedentes de um juízo não relativo ao conhecimento do mundo, mas aos seres que habitam o mundo, seu pensamento e seu comportamento. Os saberes de crença são procedentes de um movimento de avaliação, findo o qual o sujeito determina seu julgamento a respeito dos fatos. Agora é o sujeito que vai ao mundo e não este que se impõe àquele. Portanto, deve-se admitir a existência de vários julgamentos possíveis. O sujeito que fala faz sua escolha conforme uma lógica do necessário e do verossímil, na qual pode intervir tanto a razão quanto a emoção. Uma vez que existem vários julgamentos sobre o mundo, eles são objeto de confrontação e de divisão. Todo juízo de crenças está fundado sobre uma partilha, pois se pode dizer que ele tem também uma função identitária.

Na concepção de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000), há dois tipos de acordo presentes nas premissas da argumentação: acordo sobre o real e sobre o preferível. O acordo sobre o real exprime-se em juízos sobre o real conhecido ou presumido: tudo o que é admitido pelo auditório como fato, verdade ou presunção. Já o acordo sobre o que é preferível exprime-se em juízos que estabelecem uma preferência em termos de valor, hierarquia ou ainda nos lugares (comuns) do preferível: quantidade (a maioria preferível à minoria), qualidade (o que é raro preferível ao que é banal), existente (prefere-se o que existe).

Segundo Aristóteles (2005), o discurso será emocionado se, relativamente a uma ofensa, o estilo for o de um indivíduo encolerizado; se relativo a assuntos ímpios e vergonhosos, for o de um homem indignado e reverente; se sobre algo que deve ser louvado, o for de forma a

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suscitar admiração; com humildade, se sobre coisas que suscitam compaixão (ARISTÓTELES, 2005, p. 257).

Já para Charaudeau (2006), um discurso pode produzir um efeito emocional em um auditório (sujeito interpretante) conforme a maneira como se combinam três fatores: i) a natureza do universo de crença ao qual o discurso remete; ii) a encenação discursiva que pode, ela própria, parecer dramática, trágica, humorística ou neutra; iii) o posicionamento do interlocutor em relação aos universos de crença convocados e o estado de espírito no qual ele se encontra. Assim, o sujeito falante escolhe universos de crença específicos, tematiza-os de determinada maneira e procede à determinada encenação, tudo em função do modo como ele imagina seu interlocutor ou seu público e em função do efeito que espera produzir nele.

O auditório (sujeito interpretante) pode ser sensibilizado basicamente através de três “recursos”. Um deles consiste na construção de imagens de si (ethos), estratégia muito usada por Roberto Jefferson durante o evento da CPMI dos Correios: “a forma como o orador se apresenta é mais útil nos atos deliberativos [...]” (ARISTÓTELES, 2005, p. 159).

A outra estratégia, bastante usada nos discursos jurídicos, é o recurso a objetos concretos. “O objeto real deve acarretar uma adesão que sua mera descrição parece incapaz de provocar; é um auxiliar precioso, contanto que a argumentação lhe valorize os aspectos úteis” (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2000, p. 133). O orador traz à presença objetos, imagens e cenas que crê poderem sensibilizar o auditório - efeito de presença. Roberto Jefferson, por exemplo, durante seu depoimento à CPMI dos Correios, trouxe uma pasta vermelha que, segundo ele, continha tanto sua prestação de contas das campanhas eleitorais quanto as de seus adversários, o que causou maior efeito de intimidação do que suas próprias palavras agenciadas naquele momento.

Além disso, conforme salientam Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000, p. 181), também o emprego dos recursos lingüísticos, como a descrição, por exemplo, permite agir sobre o auditório (sujeito interpretante). Toda língua oferece ao sujeito falante possibilidades que mereceriam um estudo minucioso. Nesse sentido, os autores ressaltam o uso do tempo verbal “presente” que, segundo eles, além de expressar o universal, tem a propriedade de proporcionar mais facilmente o que chamamos de “sentimento de presença”, talvez motivo pelo qual Roberto Jefferson contou os fatos no tempo presente, auxiliado pelo discurso direto.

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No entanto, independentemente do recurso, a seleção dos dados constitui um item fundamental na sensibilização e mobilização do interlocutor:

o fato de selecionar certos elementos e de apresentá-los ao auditório já implica a importância e a pertinência deles no debate. Isso porque semelhante escolha confere a esses elementos uma presença, que é um fator essencial da argumentação [...] (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2000, p. 132).

Segundo Perelman e Olbrechts-Tyteca, “a presença atua de um modo direto sobre a nossa sensibilidade. É um dado psicológico que, como mostra Piaget, exerce uma ação já no nível da percepção” (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2000, p. 132).

Na perspectiva dos autores, através da forma verbal é possível trazer à presença do auditório o que está efetivamente ausente e que o orador (sujeito falante) considera importante para a argumentação, ou valorizar, tornando-os mais presentes, certos elementos efetivamente oferecidos à consciência.

Outros recursos lingüísticos podem ser usados como, por exemplo, o estilo lento que, segundo os autores, é criador de emoção; a repetição; a acentuação de certas passagens, pela voz ou pelo silêncio; a acumulação de relatos mesmo contraditórios sobre dado sujeito pode suscitar a idéia da importância deste.

Ainda nesse sentido, é importante a insistência; a evocação de detalhes (mostrar como se tomou conhecimento de algum fato ou detalhar as etapas de algum fato ou processo torna isso presente na mente e facilita a tomada de posição); a especificação (as noções gerais, os esquemas abstratos não atuam muito sobre a imaginação); o uso do termo concreto em vez do termo abstrato (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2000, p. 166). Segundo os autores, quanto mais especiais os termos, mais viva a imagem que evocam; quanto mais gerais eles são, mais fraca ela é.

Jefferson, por exemplo, ao descrever a invasão da casa de sua filha pela Polícia Federal, o faz de maneira tão viva (hipotipose) que parece fazer crer que o auditório a tenha diante dos olhos. Além disso, sempre que ele se referia à mídia, em especial à Revista Veja, agenciava o verbo “linchar”:

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Primeiro depoimento – fragmento 03

Nesse dia, a Juíza da 10ª Vara Federal de Brasília, Sr. Presidente, Sr. Relator, Srs. Senadores, Srs. Deputados, manda invadir duas residências em Petrópolis, de forma leviana. Que ela esteja me ouvindo, para eu repetir isso para ela ouvir: leviana, solerte. Primeiro, invade a casa de um menino que mora no Valparaíso, chamado Marcos Silva Vasconcelos, que trabalha no Rio com a esposa, em frente à Beneficência Portuguesa, ao lado do metrô. Arrombaram a porta, levaram tudo. Só que esse rapaz não é o meu genro. Meu genro mora no Retiro, do outro lado da cidade. No dia em que eu estava depondo, a ordem judicial tão leviana não sabia onde era a casa de minha filha – tão leviana, tão açodada, tão solerte, tão desonesta, tão comprometida com o Governo, como estava o inquérito da Polícia Federal e o civil do Ministério Público.

Uma hora da tarde, recebo uma ligação da mãe de meus filhos. Fabiana estava em casa, ela... Os marginais: minha filha de 28 anos, meu neto de um ano de idade, o Bernardo, o caseiro, a empregada. Seis homens de colete e metralhadora da Polícia Federal, mais um Procurador e um Delegado arrombaram o portão e invadiram a casa – helicópteros, um cerco de helicópteros – da minha filha, na hora em que eu ia sentar para depor.

Aristóteles ressalta que (2005, p. 159), ao passo que a forma como o orador se apresenta é mais útil nos actos deliberativos, predispor o auditório de uma determinada maneira é mais vantajoso nos processos judiciais. Acreditamos que Roberto Jefferson, durante o evento da CPMI, quando estava sendo “julgado”, articulou muito bem essas duas categorias, tendo em vista que se tratava tanto de depoimentos quanto pronunciamentos (as imagens construídas