• Nenhum resultado encontrado

A ECONOMIA CRIATIVA E O DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

O PLANEJAMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A ECONOMIA

3. A ECONOMIA CRIATIVA E O DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A Organização das Nações Unidas – ONU, ao definir o ano de 2021 como o Ano Internacional da Economia Criativa para o Desenvolvimento Sustentável, pretendeu estimular o compromisso dos governantes em

de-ROSÂNGELA TREMEL (ORGS.)

senvolver essa indústria, reconhecendo que a comunidade internacional também deve apoiar os esforços nacionais dos países em desenvolvimento para aumentar sua participação e se beneficiar de setores dinâmicos e para fomentar, proteger e promover suas indústrias criativas.

Nesse contexto, necessário pontuar que o planejamento das políticas públicas destinadas à economia criativa deve considerar que as frequentes modificações tecnológicas e sociais demandam uma constante capacitação dos profissionais ligados a esses setores, inclusive para redirecionar os pro-fissionais que atuam em setores fadados a serem substituídos por máquinas ou cujas funções não mais serão necessárias em um futuro próximo.

Além disso, os governantes devem analisar as particularidades desse setor, como, por exemplo, o surgimento de novos tipos de relações de trabalho e o expressivo número de trabalhadores que se utilizam do que se convencionou chamar de “pejotização”, artifício segundo o qual o tra-balhador cria uma pessoa jurídica para ser contratado e prestar serviços à empresa integrante da indústria criativa, no caso, não constituindo relação de emprego e não garantindo ao trabalhador o amparo da proteção social legalmente estabelecida, mas, por outro lado, permitindo maior flexibi-lidade para a empresa e para o próprio trabalhador, que poderá trabalhar para diversas empresas.

A despeito de todos os prós e contras, o fato é que o mundo está mudando, tornando-se mais conectado e, com isso, as relações de trabalho vêm-se alterando. Como era de se esperar, a Indús-tria Criativa se comporta como uma catalisadora desse processo e já apresenta evidências de consolidação e aumento da “pejotiza-ção”. Dentro da Indústria Criativa, os PJs já constituem um tipo de contratação muito mais difundido e usual: para cada cinco em-pregados formais criativos, existe uma pessoa jurídica que trabalha formalmente com criatividade. Esse volume é bem superior ao do total da economia brasileira – em que a relação é de 18 empregados para apenas um PJ. Essa prática é bastante recorrente na Indústria Criativa devido à natureza dos projetos, que não necessariamente ocorrem em um fluxo contínuo de produção (mas sim por deman-da, de maneira mais flexível), no qual diferentes etapas do proces-so produtivo são executadas por profissionais com especialidades

V I S Õ E S I N T E R D I S C I P L I N A R E S S O B R E P O L Í T I C A S P Ú B L I C A S - V O L . 1

distintas. Essa especificidade da Indústria Criativa vem-se consoli-dando com firmeza. Nas áreas criativas, os PJs crescem muito mais do que no total da economia: são +4,4% de PJs criativos no biênio 2015-2017, frente a +0,9% de PJs no total da economia brasileira.

(SISTEMA FIRJAN, 2019, p. 14-15).

Ademais, as políticas públicas devem ser concebidas considerando-se o impacto social e econômico potencial de pequenos projetos culturais em uma determinada região. No sistema capitalista em que vivemos, a lógica mercadológica tende a favorecer projetos que promovam o maior retorno lucrativo para seus patrocinadores, não considerando o impacto social que adviria do consumo de produtos específicos da indústria cultural. Nesse cenário, as produções das grandes empresas contam com maior divulgação, crítica direcionada e paga, dentre outros fatores que lhe permitem maior alcance e, consequentemente, maior retorno econômico, enquanto as pro-duções culturais regionais são fortemente prejudicadas nesse sistema, tanto no que se refere à viabilização de acesso aos seus produtos como na qualida-de do material produzido em comparação com as empresas qualida-de maior porte.

Sem a necessária intervenção estatal, restaria prejudicada também a diversidade dos projetos culturais, uma vez que, nessa conjuntura, para garantir a sobrevivência do empreendimento e daqueles que dependem do retorno financeiro daquele negócio, os artistas acabariam por sucumbir à lógica mercadológica e produziriam o conteúdo que repercutiria com maior facilidade e aceitabilidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, resta patente a importância do papel dos governos como fomentadores da indústria cultural, a qual é convertida em renda e desenvolvimento para uma expressiva coletividade. Nesse contexto, cum-pre realçar que a economia da cultura engloba não apenas obras literá-rias, musicais ou cinematográficas, mas também moda, design, turismo e os diversos outros ramos relacionados à cultura e que produzem impacto econômico.

Ademais, é nítido que as ações governamentais para aumentar a efi-ciência da economia criativa devem considerar não apenas as

caracterís-ROSÂNGELA TREMEL (ORGS.)

ticas desse sistema no presente momento, mas as possibilidades futuras, equilibrando a necessária flexibilidade da indústria criativa com pontuais intervenções governamentais para estimular o desenvolvimento sustentá-vel, benéfico para todos os cidadãos.

O estímulo governamental pode ser, em grande parte, direcionado a promover maior diversidade na indústria e, consequentemente, ampliar a inclusão e as externalidades positivas em pontos específicos daquela eco-nomia, que representa o meio de sobrevivência e uma perspectiva de fu-turo mais digno para milhares de integrantes de regiões e comunidades economicamente desfavorecidas, amenizando uma possível concentração de demanda por determinados produtos e bens construída a partir de vo-lumosos investimentos midiáticos privados, outra poderosa instituição que compõe esse sistema.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei Federal nº 8313, 1991.

______. Lei Federal nº 14.017, 2020.

______. Lei Federal nº 14.150, 2021.

CERQUEIRA, Amanda Patrycia Coutinho de. Política cultural e tra-balho nas artes: o percurso e o lugar do Estado no campo da cul-tura. Scielo. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ea/a/qp6yJm-DWS6w9gWdmX3T9jjm/?lang=pt. Acesso em: 27 jul. 2021.

ESTADÃO CONTEÚDO. Qual o impacto da pandemia do corona-vírus na produção artística? Exame. Disponível em: https://exame.

com/casual/qual-e-o-impacto-da-pandemia-do-coronavirus-na--criacao-artistica/. Acesso em: 01 set. 2021.

FGV; SEC-SP; SEBRAE. Conjuntura do setor de Economia Cria-tiva: Efeitos da crise da Covid-19. Secretaria de Cultura de São Paulo. Disponível em: https://www.cultura.sp.gov.br/wp-content/

uploads/2020/07/Pesquisa-FGV-Impacto-pandemia.pdf. Acesso em: 21 set. 2021.

V I S Õ E S I N T E R D I S C I P L I N A R E S S O B R E P O L Í T I C A S P Ú B L I C A S - V O L . 1

GÓES, Geraldo Sandoval; ATHIAS, Leonardo Queiroz; MARTINS, Felipe dos Santos; SILVA, Frederico Augusto Barbosa. O setor cultural na pan-demia: O teletrabalho e a Lei Aldir Blanc. Repositório IPEA. Disponí-vel em: http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/10383/9/201015_

cc_49_cultura.pdf. Acesso em: 22 jul. 2021.

MINISTÉRIO DA CULTURA. Economia da Cultura – Um Setor Estratégico para o País. Casa Rui Barbosa. Disponível em: http://

static.sapucaia.ifsul.edu.br/professores/lrkoppe/Livros%20e%20ou- tros%20materias%20de%20gest%C3%A3o%20cultural/texto-so-bre-o-prodec-paula-porta.pdf. Acesso em: 26 jul. 2021.

ORGANIZAÇÕES DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU. Assembleia--Geral, Segundo Comitê, Agenda item 17 Questões Políticas Ma-croeconômicas, 74ª Sessão, 08/11/2019. In Unesco. Disponível em:

https://undocs.org/A/C.2/74/L.16/Rev.1. Acesso em: 25 jul. 2021.

______. Relatório da economia criativa. Ampliando caminhos do desen-volvimento local. In Unesco. Disponível em: http://www.unesco.

org/culture/pdf/creative-economy-report-2013.pdf. Acesso em: 26 jul. 2021.

______. Relatório da economia criativa. Tendências no comércio interna-cional nas indústrias criativas 2002-2015. Unesco. Disponível em:

https://unctad.org/system/files/official-document/ditcted2018d3_

en.pdf. Acesso em: 19 jul. 2021.

SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS – Sebrae. Guia do empreendedor criativo. Brasília:

Sebrae, 2015.

SISTEMA FIRJAN. Mapeamento Da Indústria Criativa no Brasil, 2016.

In Firjan. Disponível em: https://www.firjan.com.br/Economia-Criativa/downloads/MapeamentoIndustriaCriativa-Firjan2016.pdf.

Acesso em: 22 jul. 2021.

______. Mapeamento Da Indústria Criativa no Brasil, 2019. In Firjan.

Disponível em: https://www.firjan.com.br/EconomiaCriativa/down-loads/MapeamentoIndustriaCriativa.pdf. Acesso em: 22 jul. 2021.