• Nenhum resultado encontrado

A elevada influência do Conselho Corporativo

3. A organização por secções e os sistemas de acesso: o impacto das corporações

3.8. A elevada influência do Conselho Corporativo

No relatório da primeira lei orgânica da Câmara Corporativa, em 1934, foram de imediato identificados alguns problemas relativamente à inexistência de organismos que representariam certos interesses, mas que, previsivelmente, poderiam ser solucionados no curto prazo. Nas secções do Comércio e da Indústria, nem sequer eram indicadas quaisquer possibilidades entre patrões, mesmo que para posterior escolha por parte do restrito e especializado Conselho de Ministros. Para breve, estava prevista a publicação do regime dos respectivos grémios facultativos (Decreto-Lei n.º 24715, de 5 de Dezembro de 1934). Noutro sector, já eram referidas as casas dos pescadores, mas a legislação ainda não tinha sido aprovada (Lei n.º 1953, de 11 de Março de 1937). O mesmo se diga para os casos das profissões livres, sobretudo médicos e engenheiros, mas também com a Ordem dos Advogados estava longe de ser pacífico o processo da sua integração na organização corporativa.

Por outro lado, caberia ao Conselho Corporativo proceder à escolha individual de vários procuradores, em função dos interesses a representar. Para além do estádio da organização assim o requerer, havia que ponderar a importância económica das instituições que poderiam proceder à escolha. Seria aquele reduzido conselho de ministros que estaria em condições para proceder a esta avaliação. E a eleição não poderia constituir um recurso recorrente, porque comportava «o risco de viciar a representação daí resultante».

Neste diploma, o Governo fixava desde logo alguns organismos corporativos que representariam determinados interesses. Os procuradores seriam os presidentes da direcção ou do equivalente órgão de direcção. Noutros casos, o executivo determinava dois ou mais organismos, cabendo ao Conselho Corporativo nomear como procurador um dos presidentes

das respectivas direcções. Se, porventura, viessem a ser constituídos novos organismos, o mesmo restrito conselho de ministros aplicaria, consoante se justificasse, uma das duas anteriores regras.

Algumas instituições teriam representação directa. Era o caso do Comité Olímpico Português ou da Igreja Católica. Também os institutos missionários, as universidades, as misericórdias, as federações desportivas e as câmaras municipais, que não as de Lisboa e Porto, indicariam os seus procuradores. À excepção do primeiro caso, a escolha do procurador seria realizada por intermédio de eleição. Excluindo o mais restrito universo de responsáveis com intervenção na designação (os reitores das universidades), o processo seria regulado por diploma publicado no mesmo dia (Decreto n.º 24684)178. Os representantes das academias e institutos de alta cultura e das academias e sociedades de belas-artes seriam, respectivamente, os presidentes da Academia das Ciências de Lisboa e da Academia Nacional de Belas-Artes. Para as cinco Secções de Interesses de Ordem Administrativa, o Conselho Corporativo nomearia «treze pessoas de superior competência e comprovado conhecimento das questões de administração pública e dos problemas que deverão ser estudados por cada uma» (art. 13.º). Este número de procuradores seria modificado como consequência da subsequente criação da secção de Finanças (de 13 para 14).

Note-se, também, a existência de uma interessante norma que é apenas referida aos representantes dos sindicatos nacionais, casas do povo e casas dos pescadores. Se, quando findassem os trabalhos da Câmara, não retomassem as respectivas profissões, perderiam o mandato.

Nos termos deste diploma, este restrito conselho de ministros publicaria a relação das entidades que compunham a Câmara Corporativa na I Legislatura. Constavam os organismos seleccionados, de entre as possibilidades constantes da lei orgânica, os procuradores individualmente nomeados e os já designados pelas diferentes instituições, incluindo aqueles que entretanto tinham sido eleitos (provedor da Misericórdia de Torres Novas, reitor da Universidade de Coimbra, presidente da Federação Nacional de Tiro Português, presidentes das Câmaras Municipais de Coimbra, Macedo de Cavaleiros, Figueiró dos Vinhos, Nisa, Funchal e Horta)179.

178

As eleições decorreriam a 6 (misericórdias, em Coimbra, e municípios, em Braga, Coimbra, Évora, Funchal e Angra do Heroísmo) e a 7 (federações, em Lisboa) de Dezembro de 1934. Como faremos referência, as eleições para escolha do representante dos municípios dos Açores seriam repetidas (em 30 de Janeiro seguinte, nos termos do Decreto n.º 24952, de 18.1.1935).

179

Em 1936, seria alterado o processo de designação dos representantes das academias e institutos de alta cultura e das academias e sociedades de belas-artes. Persistiam as mesmas instituições, mas poderiam ser escolhidos para o cargo de procuradores, não só os seus presidentes, como também os vice-presidentes. Para que estes últimos assumissem funções na Câmara, as Academia das Ciências de Lisboa e à Academia Nacional de Belas-Artes teriam de deliberar nesse sentido, por proposta dos primeiros (Lei n.º 1929, de 11 de Fevereiro de 1936).

Pouco tempo antes da publicação do diploma de Novembro de 1934, o presidente do Conselho declarava que a composição da Câmara não surpreenderia quem conhecesse o grau de implementação dos organismos corporativos, ainda que tivesse sido «um problema de certo modo difícil de resolver». A combinação entre os objectivos da instituição e os princípios da representação orgânica estava longe de ser linear. Era necessário que a Câmara produzisse «trabalho útil» e assegurasse, desde logo, «a função de estudo e de preparação dos assuntos que a Assemblea Nacional há-de apreciar e resolver». Constata, de igual forma, que «o quadro da organização nacional apresenta ainda algumas falhas…». Neste quadro, a Câmara seria «já a expressão abreviada das futuras Corporações», ainda que fossem previsíveis modificações de acordo com «o desenvolvimento da organização corporativa». As secções especializadas procuravam «resumir os futuros quadros superiores das Corporações.» Em termos numéricos, os membros da Câmara estariam próximos dos deputados eleitos para a Assembleia Nacional. Tendo em consideração o previsível número de projectos e de propostas de lei, era necessário que fosse composta por um «número muito elevado de técnicos e de especialistas, aptos a conhecerem questões de pormenor». Importava que os problemas que lhes fossem colocados tivessem uma abordagem específica. Para além de «directamente lhes dizerem respeito», também era necessário que os encarassem «no plano mais elevado do interêsse nacional e geral». Com as corporações, a Câmara apenas reuniria os «seus elementos superiores».

No que respeitava às entidades representadas, Salazar declarava as dificuldades próprias na identificação do factor patronal, porque ainda não tinha sido corporativamente organizado. E anunciava que tinha sido conferido assento a cerca de dez sindicatos nacionais (para além daqueles que se referiam às profissões livres). Também declarava que tanto na Assembleia Nacional como na Câmara Corporativa teriam assento «algumas senhoras»180.

180