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Parte I – O Ensino Superior Brasileiro

3.4. A instituição em estudo

A instituição que compõe o caso brasileiro desta investigação é uma universidade pública instituída na década de 1950, tendo sofrido alguns processos de aglomeração e fusão com outras instituições. Dentro dessa universidade, interessa ao estudo a Faculdade de Educação. A história desta faculdade também é marcada pela conversão de uma outra instituição à universidade.

Como valores, a faculdade explicita o compromisso com a sociedade, tendo uma visão da educação como processo, ação social que transforma e é transformada. Destaca a preocupação com a educação para a classe trabalhadora e a população mais desfavorecida, além da preocupação com currículos atualizados e contextualizados. Afirma uma tentativa de vanguarda de políticas e propostas educacionais contemporâneas, progressistas, transformadoras e democráticas. Como áreas científicas, a faculdade dedica-se aos estudos aplicados ao ensino, ciências sociais e educação, estudos da infância, educação inclusiva e continuada, estudos da subjetividade e da formação humana, políticas públicas, avaliação e gestão da educação.

Em termos de oferta curricular, a faculdade oferece o curso de licenciatura22 em

pedagogia presencial e semipresencial e também é responsável pelos cursos de formação de professores de disciplinas específicas oferecidos pelo mesmo campus da universidade. A instituição tem, também, um programa de formação avançada com oferta de mestrado e de doutoramento.

As dimensões do trabalho do professor e o processo seletivo são os mencionados anteriormente. Destacamos que nesta instituição o processo seletivo para professor só permite o trabalho na licenciatura. Para a atuação na formação avançada, é preciso ser aprovado em um credenciamento interno. Apresentamos, a seguir, as condições para credenciamento do professor na pós-graduação e alguns critérios de avaliação do seu trabalho.

22 Em Portugal, a nomenclatura “licenciatura” se refere ao curso de 1º ciclo do ensino superior. No Brasil, este

curso intitula-se “graduação”. O que, no Brasil, se intitula “licenciatura” é a formação de professores de disciplinas específicas a nível superior. É a formação que, complementar ao bacharelado, habilita o estudante ao ensino de determinado conteúdo. Por exemplo, um curso de graduação em história implica o bacharelado em história. Paralelamente ao bacharelado, o estudante pode cursar a licenciatura, composta por disciplinas relacionadas com o ensino, para a habilitação para ser professor. Ao longo da tese, adotamos a nomenclatura portuguesa.

3.4.1. O trabalho na formação avançada e a avaliação do professor

A Portaria nº. 068 de 03 de agosto de 2004, da CAPES, discorre sobre os docentes da formação avançada no Brasil. Como categorias possíveis nos programas pós-graduação, os docentes podem ser permanentes, visitantes ou colaboradores. Os docentes permanentes, com vínculo funcional com a instituição, e que interessam ao nosso estudo, precisam desenvolver atividades de ensino na pós-graduação ou na graduação, ou seja, o professor que atua na pós- graduação pode dar aula nos dois níveis ao mesmo tempo ou optar por dar aulas, apenas, na pós-graduação. Também é preciso que o professor participe de projetos de investigação do programa de pós-graduação ao qual está vinculado e oriente estudantes no âmbito do mestrado ou do doutoramento. O documento destaca, ainda, a necessidade de estabilidade de docentes permanentes no programa. A portaria 174 de 30 de dezembro de 2014, da CAPES, que define as categorias de docentes dos programas de pós-graduação e das avaliações, acrescenta que a pontuação da produção intelectual dos docentes é definida em cada área de avaliação.

Observamos, no discurso de Ribeiro (2007), diretor de avaliação da CAPES à altura, a importância atualmente atribuída à investigação. A produção científica apresenta-se como fundamental no trabalho do professor e a investigação é apontada como mais importante do que a competência didática para o professor da pós-graduação. “Na pós-graduação, o volume de aulas é melhor e por isso mesmo a questão da boa didática é menos importante do que a da qualidade da pesquisa que o docente faz e na qual leva seu aluno a mergulhar” (p. 1). Sobre a política de avaliação baseada nos fatores de impacto, Ribeiro (2007) justifica que as revistas com forte fator de impacto garantem visibilidade e diálogo com a comunidade científica contra uma “esterilidade” de artigos publicados em revistas de baixo impacto. O então diretor defende a distribuição da produção científica e um equilíbrio na produção intelectual entre docentes mais experientes e docentes mais novos para garantir a experiência em investigação. Mais uma vez, sobressai a valorização da investigação.

Nos critérios de avaliação dos cursos de pós-graduação na área de Educação, além da proposta, do corpo discente, das teses e dissertações e da inserção social do programa, o corpo docente e a produção intelectual dos professores, também são avaliados.

Quadro 4: Critérios de avaliação dos cursos da formação avançada

Alguns critérios de avaliação de cursos de mestrado e do doutoramento que envolvem o trabalho do professor universitário

Corpo docente

- participação dos docentes em atividades de aprimoramento, especialmente no exterior; relação da formação dos docentes com as áreas e linhas de investigação do programa;

- Dimensão do corpo docente considerando o número de estudantes a as atividades de docência e de orientação; vínculo exclusivo ao programa de forma a não comprometer a dedicação do professor à pós-graduação;

- participação em equipas de pesquisa e coordenação de projetos; captação de recursos para projetos e participação em projetos com investigadores de outros países;

- atividades de docência e projetos que envolvam estudantes da graduação em projetos de investigação; gestão, supervisão e atividades extracurriculares; carga letiva pequena na graduação (uma carga letiva excessiva na graduação é vista como negativa para o desenvolvimento do programa de pós-graduação);

- participação em comissões nacionais e internacionais de avaliação; diretorias de associações científicas, comités, comissões, consultorias; comissões editoriais em periódicos qualificados; gestão académica na universidade.

Produção intelectual

- média de até 8 produções mais qualificadas por docente permanente, compreendendo livros, capítulos, verbetes e periódicos;

- Distribuição das produções entre os docentes; - número total de produções técnicas;

- diversificação dos veículos de publicação (livros, capítulos, verbetes e periódicos).

Fonte: Ficha de avaliação dos cursos de pós-graduação, CAPES

Observa-se, na avaliação dos cursos de pós-graduação (de mestrado académico e doutoramento) de Educação, elaborada pela CAPES, que o peso dado ao corpo docente é de 15% e à produção intelectual é de 35%. Sendo, assim, 50% da avaliação do programa de pós- graduação avaliada diretamente de acordo com o trabalho do professor e 50% por outros fatores que também estão ligados, de forma menos direta, ao trabalho dos professores. Esses outros envolvem o corpo discente, a qualidade das teses e dissertações e a inserção social do programa, isto é, o seu impacto científico e tecnológico regional e nacional. Destaca-se, portanto, a importância dada ao trabalho visível do professor, como já mencionado.

Em consonância com este guião de avaliação estão as regras de credenciamento de professores ao programa de pós-graduação. Na universidade pública brasileira, a aprovação no processo seletivo para admissão à docência universitária não implica a participação na pós- graduação. Para estar credenciado no programa de pós-graduação, o professor precisa de candidatar e ter os requisitos mínimos de admissão, que analisamos a partir das regras de credenciamento.

O professor precisa apresentar um projeto de investigação vinculado a uma das linhas de investigação já existentes no programa de pós-graduação e ser aprovado. É exigida uma pontuação mínima de 400 pontos considerando os “8 produtos efetivamente publicados e com melhor avaliação” nos 4 anos anteriores ao credenciamento. Para atuar no doutoramento, o

professor precisa ter concluído a orientação de 2 dissertações de mestrado e ter, no mínimo 1 artigo ou livro com a melhor classificação possível.

Há uma política de solidariedade entre os professores da mesma linha de investigação. Isto é, se docentes tiverem mais “produtos” com a classificação exigida, pode dividir com professores que queiram entrar, mas têm qualificação abaixo do patamar mínimo exigido. A política de solidariedade só pode beneficiar um professor uma única vez. Os professores do programa são avaliados todos os anos e, caso não atinjam o patamar mínimo por dois anos consecutivos, são descredenciados.

A pontuação de um artigo publicado depende da pontuação / avaliação do periódico. No Brasil, atualmente, a divisão é feita entre os periódicos de nível A1 e A2 e periódicos de nível B1, B2, B3, B4 e B5, começando com a pontuação mais alta 100 em A1 e diminuindo 15 pontos a cada nível, chegando aos periódicos de nível B5.

Quanto aos livros, também há uma divisão em níveis que depende da abordagem, da profundidade da discussão teórica, da presença de questões teóricas, metodológicas e empíricas, financiamento, colaboração com investigadores estrangeiros. Por exemplo, um livro não classificado é um que não tem resultados de investigação. L1 representa uma obra com pouca argumentação e sem distribuição nacional. Um livro L2 apresenta resultado de investigação, mas pode ser considerado uma produção regional. O L3 é produzido por uma editora nacional. O L4 tem financiamento de agência de fomento ou de editora internacional, coautoria com investigadores estrangeiros.

A avaliação dos periódicos é feita a partir da análise da sua indexação, a depender de em que base estão indexados e em quantas bases. Uma análise do relatório da avaliação quadrienal de Educação da CAPES, de 2017, permite observar que a ênfase na publicação provocou um crescimento alarmante do número de periódicos. Se no triénio 2007-2009 havia 1138 periódicos entre os estratos A1 e B5, no último triênio, 2013-2016, o número alcançou 2914 periódicos: um crescimento de 156%.

A internacionalização e a inserção internacional também são consideradas na avaliação dos programas. São valorizados eventos e cursos internacionais e intercâmbios de professores, estudantes, coorientações internacionais, publicações com parceiros internacionais e em periódicos internacionais, participação em redes e júris internacionais.