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Parte I – O Ensino Superior Brasileiro

3.1. História do Ensino Superior Brasileiro

Podemos entender que o primeiro momento do ensino superior brasileiro surgiu através de uma educação superior religiosa. Algumas ordens religiosas, como os jesuítas, mantinham cursos voltados para a reprodução da burocracia interna através de um currículo com ideologias e práticas comuns às classes dominantes da época (Dotta, 2011). O objetivo era a formação de padres, a formação das classes dominantes e a formação de quadros para o aparelho repressivo que tivesse forças, por exemplo, para legitimar a exploração colonial (Cunha, 2007). A prática mais frequente em relação ao Ensino Superior era a de que os filhos da elite brasileira fossem para a Europa frequentar os cursos em universidades europeias, principalmente na metrópole, sendo um período de centralidade da Universidade de Coimbra na formação das elites brasileiras (Mendonça, 2000). A universidade era vista como espaço para criar pensamento crítico e por essa razão existia uma resistência de Portugal para não estabelecer nenhuma universidade no Brasil, a fim de não possibilitar nenhuma independência cultural ou política, e garantir a influência da metrópole na formação da elite na colónia.

O ano de 1808 foi fundamental para o país, no que concerne à estruturação e à expansão do Ensino Superior. Com a transferência da corte de Portugal para o Brasil19, são instalados

cursos superiores, com o objetivo de atender às necessidades do Estado, formando profissionais para trabalho burocrático e liberal. Surgem, neste período, alguns cursos isolados ligados à

19 Em 1808, em decorrência das invasões francesas, a família real saiu de Portugal para o Brasil, onde se

preocupação com a defesa militar, pautados por uma preocupação paradigmática, visando suprir a necessidade de criar uma infraestrutura de qualidade para a presença da corte na colónia.

Com a Independência do Brasil, em 1822, foram criados cursos isolados, como os cursos jurídicos que podem ser vistos como importante influência na formação de elites e na construção de uma mentalidade política, de ideias filosóficas e de movimentos culturais. Eram cursos isolados e públicos que, mais tarde, foram incorporados a faculdades e, posteriormente, a universidades, num processo muito de incorporação comum ao longo da história do ensino superior no Brasil.

Desde o século XIX, o Ensino Superior Brasileiro esteve ligado à formação profissional, e era organizado em estabelecimentos isolados com diferentes formas. Saviani (2010) elenca, nas primeiras décadas da república brasileira, alguns “esboços de universidades” e “universidades passageiras”. Em 1920, foi criada a Universidade do Rio de Janeiro, de iniciativa federal, assegurando autonomia didática e administrativa. Esta universidade era um conglomerado de instituições que funcionavam de forma isolada.

Na década de 1920, destacava-se uma sociedade que precisava adequar a educação às novas condições sociais e económicas do país, passando a se destacar a necessidade de vincular a educação superior à formação de um pensamento próprio nacional (cf. Azevedo et al., 2010). Na década de 1930, pôde-se observar um maior poder do Estado na educação, através das tentativas de centralização dos diversos níveis de ensino e de projetos que tentavam adequar o ensino à modernização do país, como a Reforma de Francisco Campos. O documento destacava a necessidade de um ensino de qualidade e o estímulo à investigação original, apontada como indispensável para o progresso das ciências.

A constituição de 1934, pelo artigo 150, atribui à União a responsabilidade de criar um plano de educação nacional. A Universidade de São Paulo e a Universidade do Distrito Federal foram criadas com preocupação com a investigação e com os “altos estudos”. A influência e a qualidade destas universidades em formarem as elites que iriam orientar a nação e que deveriam ser exemplos para as universidades brasileiras, era visível e preocupava o governo que, na defesa de uma centralização da universidade, faz surgir, então, uma universidade padrão, um modelo a ser seguido pelas demais instituições, simbolizando a intenção de o governo federal controlar as iniciativas no âmbito cultural do país, pela Reforma Capanema (1937).

O modelo da Universidade do Brasil era um conjunto de escolas profissionalizantes, visando à formação de “trabalhadores intelectuais” para cargos técnicos e burocráticos do Estado. Quanto ao trabalho dos professores, a liberdade de cátedra foi restringida pelo controle da unidade de pensamento exercido por uma burocracia centralizada.

Se, na década de 1940, o Ensino Superior era restrito às elites, com o desenvolvimento urbano-industrial do país, verifica-se a pressão para o alargamento do acesso ao ensino superior e por mais vagas na universidade. As décadas de 1950 e 1960, então, marcaram o primeiro momento de expansão do Ensino Superior, dentro de um quadro político marcado pelo populismo. Estas universidades nasciam da agregação de escolas profissionalizantes, focando a formação de alto nível técnico. Reconhece-se, assim, uma política de tendência utilitária ou imediatista (Gusso, Córdova, & Luna, 1985).

Durante o regime de ditadura militar, cresceu a exigência por um maior orçamento e pela ampliação do acesso ao ensino superior por parte do movimento estudantil. Num contexto de repressão, a Lei n. 5.540/68 considerou a universidade como instituição de referência para o ensino superior e para a produção de conhecimento. Quanto ao trabalho dos professores, o documento defendia a indissociabilidade entre investigação e ensino, a institucionalização da pós-graduação e da pesquisa, a adoção de mecanismos como a dedicação exclusiva, o incentivo à qualificação em nível de mestrado e doutorado e investimento em financiamentos de projetos de pesquisas.

Por outro lado, relacionada com as demandas do regime militar, a reforma pretendia estreitar a ligação entre o ensino superior e os mecanismos de mercado, vinculando a universidade ao projeto político de modernização do país. Não se via, contudo, a autonomia das universidades por causa do controle exercido pelo governo, numa legislação permissiva e coercitiva (Fernandes, 1989). A expansão do ensino superior nos anos 1970 se deu pela abertura indisciplinada de escolas isoladas e instituições privadas. A “universidade funcional” (Chauí, 2003) representava a possibilidade de a classe média, desprovida de poder, alcançar prestígio e ascensão social através do diploma universitário. O objetivo do Ensino Superior era a formação rápida de profissionais altamente qualificados para o mercado de trabalho.

O protagonismo do estado nas universidades impõe-se até ao fim da década de 1980, com a constituição de 1988. Instaurando-se uma “universidade de resultados” (Chauí, 2003), há uma aproximação entre a universidade pública e as empresas privadas, que deveriam assegurar a empregabilidade dos universitários e financiar investigações de interesse empresarial. Pode-se perceber que, neste momento, é constituído um sistema dual entre universidades públicas e privadas, diferenciadas pela qualidade do ensino oferecido e pela investigação desenvolvida (Mendonça, 2000).

A partir de 1990, tornou-se objetivo do governo ampliar o número de pessoas com acesso ao ensino superior. Era necessário aumentar a oferta de ensino público, mas, sem investimento financeiro, a expansão feita recorreu à criação de estabelecimentos mais voltados para o ensino do que para a investigação e através da diversificação de instituições de ensino

superior, como centros universitários, cursos pós-secundários, cursos de menor duração e educação à distância, numa perspetiva generalista, produtivista e mercantilizadora de uma “universidade operacional” (Chauí, 2003). O país viveu um processo de diversificação das formas de ensino, estreitando a relação entre universidade e mercado (Saviani, 2000). Quanto ao trabalho do professor, Chauí (2003) argumenta que há micro-organizações dentro da universidade, que “ocupam seus docentes e curvam seus estudantes a exigências exteriores ao trabalho intelectual” (Chauí, 2003: 5).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei 9.394/96), de 1996, aborda as diretrizes para a Educação Superior, indicando que esta pode ser ministrada em instituições públicas ou privadas, com diferentes graus de abrangência e de especialização. De acordo com a LDB, podemos compreender a investigação, o ensino e a transferência do conhecimento como principais objetos do ensino superior, vinculado à ideia de desenvolvimento da sociedade brasileira, a partir do pensamento crítico, da sistematização do conhecimento e da sua divulgação.

Entre 2003 e 2010, assistiu-se a dois lados da expansão do ensino superior: ao mesmo tempo em que houve um investimento em universidades federais, pela criação de vagas, de novas instituições e campi, também houve um estímulo para a iniciativa privada, também servindo para dar resposta à expansão de vagas.

O quadro 1 tem o objetivo de sintetizar a história do ensino superior brasileiro até o momento atual, destacando alguns objetivos e algumas características do ensino superior, considerando o momento e o contexto histórico do país.