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A Pedagogia das Competências por Philippe Perrenoud

CAPÍTULO 2: ORGANIZAÇÃO CURRICULAR DOS SABERES ESCOLARES: A

2.1 A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS

2.1.1 A Pedagogia das Competências por Philippe Perrenoud

A Pedagogia das Competências tem sido uma referência para a organização dos saberes escolares no currículo. No Brasil, são as proposições de Philippe Perrenoud que têm dado fundamentos a essa Pedagogia.

Segundo o próprio Perrenoud (1999, 2000b), o desenvolvimento de competências não é novidade, é sim um retorno à origem, à razão de ser da escola, ou seja, oferecer ferramentas para dominar a vida e compreender o mundo, procurando superar a perspectiva enciclopédica da escola, na qual se oferece aos alunos uma cultura geral, da qual ninguém deve ser excluído, porém que não apenas acumule conhecimentos a perder de vista, para se um dia..., a depender de sua orientação, servir-se deles na vida cotidiana.

Para ele, não é a assimilação intensiva de vários saberes que levará os jovens a compreenderem melhor o mundo em que vivem, pois muitas vezes eles acumulam saberes, passam nos exames, porém não conseguem mobilizar o que aprenderam em situações reais,

dentro e fora do trabalho, como por exemplo na família, cidade, lazer. A função da escola deveria ser de formar competências nos alunos, entendendo-as como a capacidade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, capacidades, informações) a fim de solucionar, com pertinência e eficácia, uma série de situações (PERRENOUD, 2000a).

O autor levanta vários questionamentos feitos à Pedagogia das Competências, entre eles, a objeção clássica de alguns céticos: o desenvolvimento de competências não ocorre em detrimento dos saberes? Estas não levam à desistência de transmitir conhecimentos? A esta crítica Perrenoud (2000b) responde que a oposição entre saberes e competências tem fundamento, mas ao mesmo tempo é injustificada. Seu fundamento está na necessidade que tem a Pedagogia das Competências de reduzir o tempo destinado à pura assimilação de saberes ou mesmo de questionar a organização fechada das disciplinas curriculares, porém sua injustiça está no não reconhecimento de que para desenvolver competências é preciso mobilizar saberes. O autor ainda afirma a existência de conhecimentos de níveis diferenciados, mesmo que, em quase a totalidade das ações humanas, exija-se algum conhecimento.

Outra crítica é a de que desenvolver competências remete a práticas do cotidiano, que mobilizam apenas o conhecimento da experiência ou do senso comum, prejudicando a vocação da escola em favorecer a aquisição dos conteúdos das disciplinas. Perrenoud (2000b) defende-se, inicialmente, afirmando que as competências requeridas na vida cotidiana não são desprezíveis, pois que adianta um indivíduo culto, sem a capacidade de aplicar sua cultura à resolução de problemas concretos? Segundo o autor, estas competências elementares exigem a mobilização dos saberes disciplinares tratados nos programas escolares.

Uma última crítica feita à Pedagogia das Competências, destacada pelo próprio Perrenoud (1999), é a associação do uso da noção de competência feita pelas práticas e discursos escolares à política econômica. Ele discorda dessa espécie de contágio ou modismo, os quais a escola estaria tendo, apropriando-se do conceito de competências advindo do mundo do trabalho. Segundo o autor, existe uma moda simultânea no uso da palavra, mas que se tem interesses diferentes.

Diante dos aspectos apresentados sobre a Pedagogia das Competências e do nosso objeto de análise, vejamos alguns elementos acerca de como pensa Philippe Perrenoud sobre a organização do currículo escolar.

A Pedagogia das Competências traz de volta um dilema no que concerne à visão de currículo. Perrenoud (1999) destaca duas visões que vêm se apresentando como posições ritualmente antagônicas, diante das quais montamos o seguinte quadro59:

Quadro 8: Concepções de Currículo

Aspectos/categorias Concepção de Currículo Clássico Concepção de Currículo Tecnocrático Relação com o

conhecimento Percorre o campo mais amplo de conhecimentos Aceita limitar, drasticamente, a quantidade de conhecimentos Aplicabilidade do

conhecimento abordado/aprendido

Confia na formação profissional ou no dia-a-dia da vida para garantir a articulação entre saberes e solução de problemas

Exercita, no âmbito escolar, de maneira intensiva a mobilização de saberes em situação complexa

Tipo de cultura Procura trabalhar uma cultura geral Procura trabalhar uma cultura prática Fundamentos Possui fundamentos numa perspectiva

humanista Possui fundamentos numa perspectiva científica Objetivo na

formação

Almeja uma formação erudita Almeja uma formação pragmática Caricatura do

produto educacional Conhecimentos inúteis para a ação Utilitarismo estreito limitado ao saber-fazer elementar

Para Perrenoud (1999) a escola, desde seu nascimento, vive uma tensão entre essas duas visões, porém sua opção é compatibilizar as duas perspectivas, de forma que o aluno tanto se aproprie de conhecimentos profundos, como adquira perícia na sua implementação; de forma que a cultura geral possa prepará-lo para enfrentar os problemas da existência.

A Pedagogia das Competências, segundo Perrenoud (1999), reconhece a convivência de competências disciplinares, transversais e interdisciplinares. O currículo não pode se caracterizar nem como o “tudo disciplinar”, nem como o “tudo transversal”. As competências estão em grande parte articuladas com os conhecimentos disciplinares, o que não as exime de interrogações sobre seus limites ou mesmo a intersecções entre diferentes disciplinas.

Segundo Perrenoud (2000b), a tendência das competências é atenuar as divisões disciplinares, é diminuir os programas de ensino, trabalhando um número mais limitado de noções disciplinares, com a intenção de ampliar o tempo para o exercício da transferência60 e, conseqüentemente, da mobilização de saberes. Esta postura diminuiria o nível de especialidade, o que para alguns seria algo prejudicial àqueles que podem fazer estudos mais

59 Perrenoud (1999) não faz esta categorização e muito menos classifica as duas visões de currículo apresentadas. As duas visões são classificadas tomando como referência discussões e argumentações realizadas por Tomas Tadeu da Silva (1999, p. 21-27), para este último autor estas duas visões se enquadram nas teorias tradicionais de currículo.

60 Transferência de conhecimentos para Perrenoud (2000b) significa a capacidade de transpor e combinar saberes, inventando uma estratégia original para resolver problemas em situações complexas. A transferência não é algo automático, adquiri-se por meio do exercício e de uma prática reflexiva.

aprofundados nos domínios correspondentes, mas, em contrapartida, daria melhores chances a todos os outros.

Para Perrenoud (idem), a prioridade deve ser dada àqueles que não conseguem aprender sozinhos, àqueles que saem da escola desprovidos de competências indispensáveis para a atualidade, pois ler, escrever e contar não estão mais à altura das exigências de nossa época.

Os currículos, na Pedagogia das Competências (PERRENOUD, 2000a), devem trabalhar por problematizações ou por projetos, deve-se parar de pensar em dar o curso e sim conceber, encaixar e regular situações de aprendizagem, seguindo princípios pedagógicos ativos e construtivistas.