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A política colonial de Portugal

No documento HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA (páginas 100-103)

Em Portugal, a política colonial tomará outros rumos em 1930, ocasião em que António Salazar, conselheiro financeiro do regime militar que em 1926 derrubara a república liberal, se torna ministro dos assuntos coloniais. Uma das suas principais medidas visava criar uma ditadura civil semifascista − o Estado Novo − ela consistia em subordinar os interesses econômicos das colônias aos interesses da metrópole. Para enfrentar a grande crise econômica mundial e a interrupção do fluxo de remessas de fundos dos portugueses de além Atlântico, Portugal reduziria radicalmente os serviços da administração metropolitana e imporia com todo o rigor uma nova política cujo objetivo era extrair a riqueza da África. Nem o Estado e tampouco a iniciativa privada possuíam recursos destinados a investimentos na África. A exploração colonial estava portanto fundada sobre as mais simples práticas, entretanto as mais duras, relativas ao trabalho forçado, à taxação obrigatória da produção agrícola e à venda, para a África do Sul, de contratos de trabalhadores migrantes. Era Lisboa quem determinava a conduta global da política colonial. O sistema era semelhante ao sistema francês, contando com uma hierarquia administrativa comportando desde o governador -geral até os chefes de circunscrição, todos submetidos às leis e diretrizes decididas pelo governo de Lisboa e dotados de poderes similares àqueles dos seus colegas franceses. Autocrata e antidemocrata na metrópole, o “fascismo” português reforçava os métodos dirigistas em vigor nas colônias.

Mesmo antes da era fascista, Portugal geralmente praticara na África uma política de segregação, sobretudo após 1910. Esta política relegava o autóctone ao fundo da estrutura social. Os “indígenas” − tal como nas possessões fran- cesas − tinham poucos direitos e estavam submetidos ao trabalho obrigatório cujo caráter representava, por pouco que não, a continuação da escravatura. A ausência de inovação caracterizava singularmente as colônias portuguesas que também suportavam uma exploração mais intensa. Com exceção de capitais regionais como Bissau, Luanda e Lourenço Marques e subtraindo um pequeno número de outras cidades onde tal desenvolvimento industrial ocorrera, o inte- rior do país se mantinha como um reservatório onde se explorava o trabalho forçado, especialmente por intermédio dos mercadores brancos que compravam as colheitas dos camponeses.

A década de 1935 -1945 assim se configurou nas colônias portuguesas, marcada pela crise econômica, pelo endurecimento do regime fascista e pela Segunda Guerra Mundial.

No que diz respeito às ilhas de Cabo Verde, a grande crise econômica mun- dial traduziu -se pelo retorno de muitos milhares de trabalhadores imigrados, repatriados pelos Estados Unidos. Estes imigrantes haviam trazido ao país os fundos poupados no Novo Mundo. Entretanto, o arquipélago era muito pobre e grande número de cabo -verdianos foram obrigados a retomar o caminho do exílio, a sua preferência naturalmente recaiu sobre os países da América Latina, na espera pelo momento da sua instalação nos Estados Unidos. Pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial e posteriormente à grande seca que se abateu sobre as ilhas, uma corrente migratória dirigir -se -ia rumo a Dakar, onde os homens exerciam a profissão de sapateiros, sucateiros, cabeleireiros, ao passo que as mulheres tornavam -se domésticas. Uma nova grande seca, entre 1941 e 1942, produziu 20.000 mortos em uma população de 180.000 habitan- tes. Embora seu país não fosse considerado uma colônia regida pelo sistema de “indigenato”, nesse período os cabo -verdianos rapidamente tomaram consci- ência que, na realidade, eles não eram integralmente portugueses. No exército português, apesar dos regulamentos, eles sequer podiam aceder ao posto de furriel; este exército, estacionado nas ilhas durante a guerra com importantes reservas de alimentos, nada fez para socorrer os famintos cuja morte ocorreu em ausência de qualquer assistência. Irônico detalhe, a construção em Tarra- fal de um campo de concentração para inimigos do regime salazarista, após 1936, garantiu trabalho a numerosos habitantes. A sua condição de cidadãos portugueses e o seu nível de instrução relativamente elevado, lhes permitiram entretanto procurar emprego na Guiné portuguesa e em Angola, onde alguns

deles viriam desempenhar posteriormente um papel determinante na luta de libertação.

Cinderela das colônias portuguesas durante esta década, a Guiné conheceu

poucos progressos; a exportação do amendoim, cultura dos pequenos agriculto- res, não aumentava senão lentamente em razão da erosão contínua das terras, e os esforços empreendidos para introduzir o trabalho obrigatório seriam solapa- dos pela fuga de populações rumo ao Senegal ou à Guiné francesa. A influência do Cabo -Verde − sempre maior que aquela de Portugal − se manifestou pela imigração dos cabo -verdianos, não somente como auxiliares da administração mas, também, na qualidade de pequenos agricultores ou artesãos.

No sistema português, as ilhas de São Tomé e Príncipe representavam a colô- nia de plantação por excelência; uma trintena de companhias dividia entre si a maior parte das terras cultivadas enquanto a administração colonial era somente seu instrumento, preocupada principalmente em lhes prover a mão de obra necessária às suas atividades. Este problema agravou -se sob o regime fascista. Os autóctones repugnavam o trabalho nas plantações e foi preciso trazer mão de obra de Angola e de outras colônias, entretanto esta operação mostrava -se de mais em mais difícil: entre 1920 e 1940, o número de trabalhadores caíra de 40.000 para 30.000 indivíduos. No mesmo período, com a baixa da fertilidade natural das terras e em consequência deste quadro, aconteceu uma forte que- bra das exportações de cacau e as ilhas perderam a sua posição privilegiada no mercado mundial deste produto, constituindo assim uma nítida ilustração da ineficácia do regime português.

Situação semelhante aquela de Angola e Moçambique: a queda nos preços dos produtos coloniais era duramente sentida por todos, sobretudo, pelos peque- nos proprietários africanos mas também pelos grandes agricultores. O Portugal de Salazar não tinha os meios para desenvolver a economia: ele reservara a tarefa do investimento às grandes companhias de capital supranacional, espe- cialmente no tocante à exploração mineral. Em Moçambique, a maior parte da renda era extraída da mão de obra anualmente enviada rumo à África do Sul, às dezenas de milhares de homens, com vistas ao trabalho nas minas de ouro do Witwatersrand.

A situação de dominação colonial não oferecia aos africanos possibilidade alguma de escaparem ao duplo controle, da administração e dos colonos, os quais formavam uma frente contra os autóctones. Desde 1933, o ministro das colônias, Armando Monteiro, sublinhara a importância social das colônias, sugerindo a transferência massiva dos proletários brancos, desempregados na Europa, rumo à África, poupando assim as metrópoles da contestação operária e, pela mesma

ocasião, assegurando o “branqueamento” da África portuguesa. Tratava -se da filosofia fascista sob nova roupagem.

Entretanto, esta política de imigração foi entravada pela pobreza dos colonos, desprovidos de conhecimentos técnicos e de capitais. Eles não podiam sobrevi- ver senão explorando ao extremo a população autóctone, sendo levados a ocupar os mais modestos empregos, bloqueando o acesso dos africanos aos escritórios, à administração e até mesmo às usinas. A situação colonial criava assim, entre africanos e europeus, uma potente barreira social que reforçou e justificou a barreira da coloração da pele.

Para melhor assegurar a sua dominação, o regime de Salazar teve que encon- trar aliados. O acordo sobre as missões, assinado com a Santa -Sé em 1939, desdobrar -se -ia em uma concordata no ano seguinte: as missões católicas se tornaram o braço do Estado na educação da população africana. Isto não trouxe nenhum efeito maior ou mais grave a São Tomé e Príncipe e tampouco ao Cabo- -Verde mas, criou dificuldades constantes para a Guiné, onde a população, ape- gada às tradições e reforçada pela importante presença do islã, resistiu a tentativa de “catolicização” da colônia. As missões receberam alguns subsídios do Estado mas foram obrigadas a financiar a tarefa à qual elas se haviam proposto − um mínimo de escolarização − contando com os donativos obtidos junto aos crentes.

No documento HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA (páginas 100-103)