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2 DESENVOLVIMENTO RURAL: PASSOS PARA SUSTENTABILIDADE

2.2. Agroecologia e Políticas Públicas para sua Implantação

2.2.1. A Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica

O principal marco legal da agricultura orgânica brasileira é a Lei n° 10.831, de 23 de dezembro de 20039, regulamentada através do Decreto 6.323 de 27 de dezembro de 200710. A partir desta legislação, que dispõe sobre a agricultura orgânica, ficou estabelecido que um sistema orgânico de produção agropecuária seria aquele que

[...] adota técnicas específicas, mediante a otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energia não-renovável, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenamento, distribuição e comercialização, e a proteção do meio ambiente. (BRASIL, Lei n° 10.831 de 23 de dezembro de 2003, art.1)

Esta lei trouxe novos critérios para o funcionamento de todo o sistema de produção orgânico, incluindo desde a produção, o armazenamento, a rotulagem, o transporte, a certificação, a comercialização e a fiscalização dos produtos.

Em 20 de agosto de 2012 foi instituída a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo), por meio do Decreto nº 7.794 em 20 de agosto de 2012. O objetivo desta política é de

[...] integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica e de base agroecológica, contribuindo para o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida da população, por meio do uso sustentável dos recursos naturais e da oferta e consumo de alimentos saudáveis (BRASIL, Lei nº 7.794, de 20 de agosto de

9 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/L10.831.htm acesso em 31/10/2013. 10 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6323.htm

2012, art.1°).

Ao induzir a transição agroecológica e a produção orgânica e agroecológica a Planapo não faz distinção dos conceitos de agroecologia e agricultura orgânica, considerando ambas como opositoras ao modelo tecnológico implantado durante o século XX. Para Abreu et

al. (2015, p. 174) “[...] sob o ponto de vista da prática agrícola, [...] as noções de agricultura

Orgânica e Agroecologia muitas vezes se confundem ”, entretanto, enquanto a Agricultura Orgânica tem suas raízes na ciência do solo, a Agroecologia tem as suas na ecologia.

A discussão sobre a relação entre Agricultura Agroecológica se situa no campo de disputas políticas e definem princípios, critérios de pertencimento e legitimidade científica. [...] de um lado, a Agroecologia parece avançar sobre o campo da Agricultura Orgânica; de outro, demarca mais claramente os princípios e as práticas desse estilo de agricultura. (ABREU et al., 2015, p.191)

Assim sendo, a Planapo vem em resposta ao movimento deflagrado por parte da sociedade brasileira no tocante a preservação ambiental e a obtenção de alimentos mais saudáveis, buscando trabalhar a sociobiodiversidade, o sistema orgânico de produção, a produção de base agroecológica e a transição agroecológica dentro de uma perspectiva sistêmica.

Alguns pontos são priorizados pela Pnapo tais como a promoção da soberania e da segurança alimentar e nutricional e do direito humano à alimentação adequada e saudável, a promoção do uso sustentável dos recursos naturais, a conservação dos ecossistemas naturais e recomposição dos ecossistemas modificados, a valorização da agrobiodiversidade e dos produtos da sociobiodiversidade além da ampliação da participação social e redução das desigualdades de gênero.

Dentre as suas diretrizes destaca-se

[...] valorização da agrobiodiversidade e dos produtos da sociobiodiversidade e estímulo às experiências locais de uso e conservação dos recursos genéticos vegetais e animais, especialmente àquelas que envolvam o manejo de raças e variedades locais, tradicionais ou crioulas (DECRETO Nº 7.794/2012, Art. 3º, inciso V)

Visando o cumprimento do preconizado no art.4° do decreto de constituição da Pnapo, forma previstos onze instrumentos de lei:

a) Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica - Planapo; b) Crédito rural e demais mecanismos de financiamento;

d) Preços agrícolas e extrativistas, incluídos mecanismos de regulação e compensação de preços nas aquisições ou subvenções;

e) Compras governamentais; f) Medidas fiscais e tributárias;

g) Pesquisa e inovação científica e tecnológica; h) Assistência técnica e extensão rural;

i) Formação profissional e educação;

j) Mecanismos de controle da transição agroecológica, da produção orgânica e de base agroecológica;

k) Sistemas de monitoramento e avaliação da produção orgânica e de base agroecológica.

Para alcançar o desenvolvimento da produção orgânica no Brasil a Pnapo busca a integração entre os agentes da rede de produção orgânica do setor público e do privado, e a participação da sociedade no planejamento e gestão democrática das políticas públicas. Esta integração entre diferentes atores efetiva-se graças a duas instancias de gestão da Pnapo previstas no Art.6, incisos I e II: a Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – Cnapo e a Câmara Interministerial de Agroecologia e Produção Orgânica (Ciapo).

São competências previstas para a Cnapo a promoção de participação social, através da constituição de pequenas comissões visando controle social e promoção do diálogo entre os diferentes atores.

I - promover a participação da sociedade na elaboração e no acompanhamento da PNAPO e do PLANAPO; II - constituir subcomissões temáticas que reunirão setores governamentais e da sociedade, para propor e subsidiar a tomada de decisão sobre temas específicos no âmbito da PNAPO; III - propor as diretrizes, objetivos, instrumentos e prioridades do PLANAPO ao Poder Executivo federal; IV - acompanhar e monitorar os programas e ações integrantes do PLANAPO, e propor alterações para aprimorar a realização dos seus objetivos; e V - promover o diálogo entre as instâncias governamentais e não governamentais relacionadas à agroecologia e produção orgânica, em âmbito nacional, estadual e distrital, para a implementação da PNAPO e do PLANAPO. (BRASIL, Lei nº 7.794, de 20 de agosto de 2012, art.7°).

Para exercício de sua competência a Cnapo conta com a ação da Subcomissão Temática de Produção Orgânica (STPOrg) e com as Comissões da Produção Orgânica (CPOrg) em cada Superintendência Federal de Agricultura. Juntamente com o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), STPOrgs e CPOrgs realizam ações necessárias ao desenvolvimento da produção orgânica, com base na integração entre os agentes da rede de produção orgânica do setor público e do privado, e na participação da sociedade no

planejamento e gestão democrática das políticas públicas.

As Comissões de Produção Orgânica – CPOrg são fóruns compostos por representantes de segmentos da rede de produção orgânica dos estados ou Distrito Federal, dividido igualmente por entidades governamentais e não governamentais. Para composição das CPOrgs o Decreto nº 7.794 define que

§ 4º - Os membros do setor público nas CPOrg-UF representarão, sempre que possível, diferentes segmentos, como assistência técnica, pesquisa, ensino, fomento e fiscalização. §5º Os membros do setor privado nas CPOrg-UF representarão, sempre que possível, diferentes segmentos, como produção, processamento, comercialização, assistência técnica, avaliação da conformidade, ensino, produção de insumos, mobilização social e defesa do consumidor” (BRASIL, Lei nº 7.794, de 20 de agosto de 2012, art.7°, incisos 4 e 5).

Assim sendo

As CPOrgs serão compostas paritariamente por, no mínimo, 4 (quatro) e, no máximo, 10 (dez) membros de organizações governamentais, titular e suplente, e igual número de membros de organizações não-governamentais e demais segmentos do setor privado, titular e suplente, que tenham reconhecida atuação no âmbito da produção orgânica. A CNPOrg será composta paritariamente por 5 (cinco) membros de organizações governamentais, titular e suplente, e 5 (cinco) membros de organizações não-governamentais e demais segmentos do setor privado, titular e suplente, que tenham reconhecida atuação junto à sociedade no âmbito da Produção Orgânica” (BRASIL, Instrução Normativa 54 de 22 de outubro de 2008, Art. 4 e 5)

A CPOrg se reúne regularmente e tem várias atribuições definidas na Instrução Normativa nº 54, de 22 de outubro de 2008, como, por exemplo, coordenar ações e projetos de fomento à produção orgânica, sugerir adequação das normas de produção e controle da qualidade orgânica, auxiliar na fiscalização, através do controle social, e propor políticas públicas para desenvolvimento da produção orgânica (Instrução Normativa 54, Art. 21, 2008). Como apontado anteriormente, o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo) é o principal instrumento de execução da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo). Seu escopo objetiva possibilitar à população a melhoria de qualidade de vida por meio da oferta e consumo de alimentos saudáveis e do uso sustentável dos recursos naturais, de monitoramento, avaliação e controle social das ações que visam ampliar e efetivar o desenvolvimento rural sustentável.

Em sua estrutura o Plano apresenta ações articuladas dos dez ministérios parceiros que formam um conjunto de 134 iniciativas, distribuídas em 14 metas e organizadas a partir dos eixos estratégicos “Produção”, “Uso e Conservação de Recursos Naturais”, “Conhecimento e

Comercialização” e “Consumo”.

O segundo Planapo a ser implantado entre 2016-2019 foi construído a partir de debates entre a sociedade e governo, pautado nas experiências obtidas durante a execução do primeiro Planapo (2012-2015). Este planoreúne 194 iniciativas que promovem, entre outras ações, a produção de alimentos saudáveis no Brasil, com medidas a serem implantadas até 2019. O segundo Planapo apresenta ações que estão divididas em seis grandes eixos: produção; uso e conservação dos recursos naturais; conhecimento; comercialização e consumo; terra e território, e sociobiodiversidade.

O primeiro Planapo (2012-2015) previu, em seu escopo, a ampliação de investimentos para infraestrutura e suporte técnico e operacional para a manutenção e funcionamento de bancos de sementes. De modo especial as estratégias, ações e atividades ligadas a sementes organizaram-se em torno de três enfoques que demandaram medidas específicas de apoio à estruturação e fomento as sementes crioulas, sementes varietais e sementes orgânicas (BRASIL, 2013).

[...] ampliar o investimento também de infraestrutura e de suporte técnico e operacional para a manutenção e funcionamento dos bancos de sementes [...] e o apoio dado pelo Ministério da Agricultura à implantação e manutenção de bancos comunitários de sementes em diversas unidades da federação, com prioridade para sementes utilizadas na adubação verde e conservação e uso de variedades de interesse para agroecologia e produção orgânica. (BRASIL, 2013, 32-33)

Os recursos investidos permitiram o apoio a aproximadamente 700 bancos comunitários de sementes, destacando-se o fato de alcançar mais de 12.000 agricultores (as) familiares inscritos no Cadastro Único (BRASIL, 2013).

O segundo Planapo (2016-2019) ratificou a importância dos bancos comunitários de sementes para a autonomia das unidades produtivas familiares, assegurando a continuidade de recursos para a ampliação desta estratégia.

O Planapo 2016-2019 trará desafios importantes nesses temas, com destaque para a consolidação do Programa Nacional de Sementes e Mudas, o financiamento de Unidades de Beneficiamento de Semente (UBS), a implantação e consolidação de bancos de sementes e a produção de sementes orgânicas certificadas. (PLANAPO, 2016, p.20)

Em sua “Meta 10” o Planapo 2016-2019 traz a iniciativa de apoiar a estruturação de 1000 unidades de bancos comunitários de sementes e Unidades de Beneficiamento de

Sementes (UBS) de interesse da agroecologia e da produção orgânica, em diversos territórios, estimulando a paridade de gênero na gestão dos bancos.