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Apresentação dos resultados: percepções por dimensão

No documento Anais III Colóquio Festas e Socialidades (páginas 190-197)

Os resultados dos conjuntos de perguntas são expostos a seguir de forma resumida e com a visão geral dos atores, não separados por grupo a fim de valorizar os resultados gerais, mais importantes para o contexto do artigo.

Em relação à “Dimensão 1: Aspectos artísticos, estéticos e de inserção social”, foi possível perceber que, em termos estéticos, a beleza cênica do espetáculo é quase um consenso entre os grupos respondentes. Ainda assim, é comprometida por questões artísticas e de produção de serviços, que no conjunto afetam a harmonia, comprometendo questões de cunho operacional, desde a dificuldade de reger músicos pela posição em relação ao maestro, até questões de acessibilidade e conforto dos participantes.

O repertório incita uma das mais polêmicas sobre a Vesperata com opiniões diversas e críticas contundentes por parte de muitos dos grupos. Contudo, um dos pontos mais elucidativos a respeito da escolha e da diversificação do repertório é que esta ocorre de acordo até mesmo com as possibilidades físicas do local (pela dependência que os músicos têm do maestro por não poderem ouvir uns aos outros) e dos testes que são realizados com mudanças ocorrendo de acordo com a satisfação da plateia, fato que, por ser pouco divulgado, não é bem compreendido pelo senso comum.

Sobre a participação de menores na Banda Mirim, houve consenso sobre a importância da participação na banda e no próprio evento para a vida artística e para a formação pessoal dos músicos mirins. Quando se perguntou ao grupo de músicos sobre a importância da participação no evento os comentários vão ao encontro do suposto pelos outros grupos que a atuação na banda é importante inclusive para a formação pessoal do músico.

Na “Dimensão 2”, que tratou da “Comercialização”, os atores da iniciativa privada todos manifestaram ter clareza que a comercialização é feita diretamente com os meios de hospedagem e bares que possuem direito sobre as mesas, afirmando que estes as comercializam com agências de todo o Brasil ou diretamente com interessados. Já a SECtur diz não ter a dimensão exata do formato de comercialização e ressentir-se disso, já que deveria ser a responsável pelo controle, inclusive financeiro, do espetáculo.

Em termos mais específicos sobre a comercialização por meio de operadoras, as mais frequentemente citadas foram de Belo Horizonte, além de algumas outras que foram citadas por um grupo ou outro, mas com menos expressão. Segundo os respondentes, o contato das operadoras menores (que são maioria) é feito diretamente com os meios de hospedagem e bares que possuem direito à comercialização. Já uma das maiores operadoras, que figura entre as mais importantes do Brasil, atua independentemente. Ainda que haja mercados em ascensão, a capital do Estado ainda é a origem principal da demanda e a forma de divulgação que é consenso entre os grupos é o “boca a boca”, o que demonstra uma carência de profissionalização no que diz respeito à comunicação do produto.

Interessantemente, ainda que a Adeltur seja considerada responsável pela comercialização, quem o faz são seus associados diretamente, e ainda assim, não são todos. A Adeltur legitima o grupo que comercializa e, em situações em que lhe seja solicitado, como no caso de turistas que telefonem para a Associação em busca de mesas a serem comercializadas, indica associados que possuam mesas disponíveis.

Houve pouca discrepância em termos de opinião acerca dos impactos no que diz respeito à “Dimensão 3: Econômica”. Discute-se que o valor movimentado por fim de semana de Vesperata oscila entre R$180.000,00 e R$250.000,00, direta e indiretamente, incluindo valores gastos com hospedagem, alimentação, mesas e etc. Entende-se também que os impactos não se limitam aos pagantes por mesa e que mesmo os gastos desses

refletem no destino como um todo, e pôde ser percebido o potencial latente de investimentos.

Quando questionados sobre a participação da Vesperata no orçamento de seus negócios, os respondentes da iniciativa privada (os únicos para os quais a Vesperata tem impacto direto) tiveram uma amplitude grande de respostas. Os integrantes da Adeltur que possuem mesa para comercialização dizem que a faixa de contribuição da Vesperata oscila entre 50 e 70% na sua lucratividade. Para os “não associados”, sem mesa, essa representatividade mesmo sem a comercialização direta do produto chega a 33%. Os outros atores não percebem melhoras significativas em termos de ingresso decorrente da Vesperata, ao contrário, os receptivos dizem lucrar menos de 2%.

Na “Dimensão 4: Gestão e produção cultural”, percebeu-se que grande parte da responsabilidade é dividida, em termos executivos pelos membros da Adeltur com mesa, e artisticamente pelos músicos. A responsabilidade da Sectur acaba restringindo-se ao operacional e ligada à fiscalização. Os outros atores quando possuem alguma responsabilidade a relegam a um patamar inferior. De fato, a questão da gestão e da distribuição de responsabilidades foi das que suscitou mais reações adversas. Há uma sensação de desconhecimento e mesmo de descontentamento entre os grupos de atores que ficou muito clara.

Pôde-se perceber que a lucratividade do evento é reputada aos lucros agregados aos “pacotes” e não exatamente à comercialização das mesas e que essa relação é quase inevitável. A lucratividade indireta trazida pelo evento é que tem gerado o conflito de interesses sobre o direito à comercialização, já que em termos de custos pode ser considerado um produto barato, mas os aproximadamente R$ 8.000,00 de custo de cada apresentação se transformam em algo em torno de R$ 200.000,00 em benefícios indiretos, segundo estimativa dos próprios atores respondentes. Em relação ao preço final é quase consenso que o valor para quem adquire mesa na Vesperata é baixo, embora a reflexão sobre custo-benefício inspire discussões mais profundas sobre a qualidade do serviço prestado e sobre a necessidade de melhorias, incluindo, até mesmo, melhor remuneração aos prestadores de serviço a fim de poder aumentar o grau de exigência.

Buscou-se saber sobre o caráter eminentemente turístico do evento, em oposição a um evento comunitário e popular. Sobre a participação da comunidade no espetáculo, no entender dos respondentes, as mesas comercializadas pelos bares, cujo valor é igual aos das outras comercializadas pelas pousadas são as únicas destinadas ao público local,

quando não são requisitadas para serem comercializadas por outros associados ligados aos meios de hospedagem.

A inexistência de registros oficiais dos acordos originais gera insatisfação e até incredulidade as julgar pelo ruído na comunicação entre os atores. Há um questionamento frequente acerca do direito da Adeltur em gerir a Vesperata e da discrepância de número de mesas que pode ser comercializada por cada associado, ainda que segundo a associação exista uma ata da reunião realizada com a Prefeitura em que essa divisão foi acordada. A cópia dessa ata, entretanto, nunca foi disponibilizada a ninguém, nem mesmo aos membros da Adeltur. Houve também lacunas sobre o que se considera a gestão do evento e quais as responsabilidades inerentes a cada ator.

Sobre o acompanhamento formal, com pesquisa de demanda e de satisfação, houve em duas situações tentativas descontinuadas, mas, não houve retomada de nenhum processo seja por parte da Adeltur, da Sectur ou de quaisquer outros dos atores.

Encerrando essa dimensão, a questão sobre a existência de um grupo chamado “clube dos 13”, teve como resposta que eram, na época da pesquisa, na verdade 12 membros, depois do fechamento do Hotel Dália que era o 13º. Há o conhecimento generalizado de que são hotéis e pousadas que detêm tanto o direito de comercializar as mesas quanto o dever de arcar com os custos dessas mesas havendo ou não comercialização.

Na “Dimensão 5: Infraestrutura e técnica”, foi possível perceber uma clara preocupação com relação à segurança do evento, não em termos de violência originada por assaltos ou brigas; mas da integridade física em caso de acidente e que haja necessidade de evadir-se com urgência. Mesmo que não haja muito que se possa fazer em termos de calçamento, por exemplo, os bombeiros defendem a necessidade de corredores de escoamento além de rechaçarem a fita zebrada pela função de isolamento que esse tipo de material impõe, podendo caracterizar uma forma de discriminação. Os outros grupos mencionam a importância da fita para a segurança e conforto dos pagantes, mas a Sectur questiona o uso desse tipo de fita especificamente, em vez de algo que fosse menos agressivo.

Quanto à “Dimensão 6: Qualificação dos serviços ofertados no local”, ainda que não se acuse abertamente algum bar ou todos, é consenso que qualidade dos serviços está aquém do desejável, especialmente no atendimento. Algumas razões até foram apontadas para isso, mas é o fato mencionado é que muitos turistas reclamam do atendimento, da

discriminação por serem cobrados abusivamente, da variedade e qualidade dos pratos. Destacou-se que é perceptível o pouco interesse por parte dos bares no sentido de investir em estrutura física, como nos banheiros que lideram as reclamações, mas há também a falta da sofisticação que o evento sugere. Existem limitações relacionadas ao espaço físico urbano, mas ao que se pôde perceber esse não é o principal impedimento para investimentos na qualidade das instalações.

A “Dimensão 7: Legitimação de ocupação/uso do espaço público” teve dois grupos de resposta bem definidos. De um lado os que dizem ‘não saber’ se há regulamentação do uso, e os que ‘afirmam que não há’, como no caso da Promotoria. Esta é uma das questões que mais demonstra a singularidade da Vesperata, já que o principal evento comparado e inspirado nela, que acontece no Sul de Minas é gratuito e não “comercializa” espaço público; e a única outra comparação efetiva é com o próprio carnaval de Diamantina, que segundo o Ministério Público já é regulamentado.

Por fim, a “Dimensão 8: Acessibilidade/democratização de acesso e cidadania”, teve como conclusão que não há gratuidade especificamente voltada ao morador de Diamantina. Existem Vesperatas gratuitas que, quando acontecem, são divulgadas na rádio e há a cota de mesas dos bares que são comercializadas diretamente por esses, inclusive para moradores. Existem anualmente entre duas e quatro Vesperatas extras, que são gratuitas, mas não são voltadas à comunidade local, ainda que em muitas a comunidade possa participar. Contudo não há uma política exclusiva de inclusão.

Considerações finais

A pesquisa resultou em mais de seis horas de gravação entre os mais variados pontos de vista e grupos envolvidos. As informações obtidas deram origem a mais de 50 páginas de transcrição das entrevistas geraram um cabedal de informações que compreende uma visão plural sobre um objeto que é único, com múltiplas visões qualitativas extremamente enriquecedoras, apresentadas em forma de relatório ao Grupo de Trabalho, por intermédio da Sectur. Os resultados desta pesquisa são, portanto, de cunho acadêmico, fruto de parceria entre a UFVJM e a Prefeitura de Diamantina, e da boa vontade e dedicação dos atores envolvidos, sem caráter de consultoria ou assessoria.

Assim, o que foi possível perceber é que o produto em si é extremamente bem- sucedido em termos de longevidade, originalidade e satisfação em relação ao produto central (música e ambiente) e que mostra sinais de desgaste e até mesmo negligência em

termos de produtos secundários ou periféricos como serviços, alimentos e bebidas,

souvenirs, entre outros.

A gestão dessas mudanças deve ser alvo de discussões que promovam também mais diálogo e transparência entre os atores. Entretanto, sabe-se que recentemente tal processo foi iniciado por meio de edital de licitação do início de 2011 e algumas mudanças substanciais já podem ser verificadas. A comercialização está mais democrática, uma vez que a licitação deixou sob responsabilidade de uma empresa de turismo receptivo, esse serviço. Além disso, o preço das mesas aumentou se tornando mais condizente com a de apresentações musicais. A fita zebrada tão criticada por muitos envolvidos foi substituída por uma corda mais sutil e menos opressora. Personagens como Chica da Silva e Contratador João Fernandes são apresentados pela locutora do evento e caminham entrem os turistas e participantes, se colocando à disposição para fotografias, apenas para citar algumas das sutis mudanças geradas pelo trabalho e empenho do Grupo de Trabalho da Vesperata, que inclui os resultados desta pesquisa. Assim, o processo de pesquisa e todos os resultados aqui apresentados são voltados à compreensão da atividade, à geração de discussões relativas à renovação da Vesperata e à reafirmação das possibilidades que a parceria entre a academia e o mercado podem gerar.

Deve-se esclarecer que a pesquisa não é definitiva e, como toda pesquisa envolvendo relações humanas como é sempre o caso de eventos – especialmente os culturais - é muito subjetiva. Contudo, entende-se que o principal alcance foi o de tratar abertamente, e de forma isenta, temas que vinham se tornando tabus entre os envolvidos e que em vez de gerarem conhecimento histórico e cultural sobre um dos eventos permanentes mais bem-sucedidos que se tenha notícia nas cidades coloniais mineiras, estavam sendo omitidos ou mal comunicados. Dessa forma, acredita-se na integração entre a academia e a gestão pública como caminho viável na busca da evolução do turismo local.

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