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CAPÍTULO 4 OS CAMINHOS DA PESQUISA: PERCURSO METODOLÓGICO

4.4 Elegendo as turmas no campo de investigação

5.1.4 Arte é uma fonte de renda

Quadro 8 - Arte é uma fonte de renda

Caio - Sei que arte é fazer peças barro, isso é uma coisa boa pra nossa gente, o barro é uma fonte de renda pra o Alto do Moura. (2º ano).

Pedro - Quando eu fui pra ilha de Itamaracá, na praia, lá eu vi a arte do Alto do Moura, eu vi lá as bonecas daqui de Caruaru. Eu vi um homem, ele veio do Sertão, ele não sabia fazer boneco não, aí agora ele tá fazendo, ele faz 100, 200, 300 pra vender. (2º ano). Mariana - A arte mudou a vida da minha mãe porque desde que minha mãe era pequena ela fazia bonecos de barro, então isso já mudou a vida dela porque hoje ela tem eu, tem uma família já pra sustentar e ela considera isso como um trabalho que ela faz e ela tá muito orgulhosa por isso. (2º ano).

Júnior - Arte é uma coisa muito boa e é bom pra gente aprender, a vender peças de barro pra quando a gente crescer ter uma arte, um futuro mais melhor. (2º ano).

Nos sentidos aqui colocados pelas crianças, a arte transcende a sua dimensão mais sensível, estética e do campo artístico e se insere no contexto de uma cultura mais material. Contudo, mesmo sendo uma fonte de renda para as famílias via venda dos produtos, a arte tende a contribuir para análise e clarificação do processo particular de estar no mundo e também produzir esse mundo por sua participação via expressão artística. Do mesmo modo, ela aparece como um caminho e possibilidade de emancipação social para a vida dos artesões que em certa medida possibilita uma experiência de percepção diferenciada do mundo.

Mariana - A arte mudou a vida da minha mãe porque desde que

minha mãe era pequena ela fazia bonecos de barro, então isso já mudou a vida dela porque hoje ela tem eu, tem uma família já pra sustentar e ela considera isso como um trabalho que ela faz e ela tá muito orgulhosa por isso.

O que Mariana revela em sua fala é uma questão inerente à comunidade do Alto do Moura. A grande maioria dos artesãos dessa localidade vive e sustenta suas famílias do dinheiro adquirido através da fabricação das peças de barro. Neste caso tomando contornos muito próprios, a fala das crianças ancorada mais no sentido da arte para o seu contexto e menos no conhecimento do campo artístico, sugere que elas não são meras receptoras desses conhecimentos evidenciando que não temos como pensar arte e seu ensino para as crianças sem atentar sobre quais crianças estamos pensando. Nesse contexto, seria fundamental discutir o fazer e o apreciar artesanato na escola.

Na mesma direção, a arte também é associada a um trabalho que garante a concretização da energia imaginativa.

Ana - Arte é um trabalho que as pessoas usam para ganhar dinheiro.

(2º ano).

Tal como coloca Ostrower (2013),

Nem na arte existiria criatividade se não pudéssemos encarar o fazer artístico como trabalho, como um fazer intencional produtivo e necessário que amplia em nós a capacidade de viver. Retirando à arte o caráter do trabalho, ela é reduzida a algo de supérfluo, enfeite talvez, porém, prescindível à existência humana (2013, p. 31).

O que Ostrower (2013) defende se consolida nas falas de Mariana e de Ana quando elas afirmam ser a arte um trabalho que garante o sustento das famílias. Mariana vai além,

quando diz que a arte mudou a vida da mãe dela, que sustenta a família com a arte e está orgulhosa com isso, ela nos remete a outra reflexão: que a arte lhe afirma como cidadã.

Na fala abaixo, Caio expressa sua compreensão acerca da arte como sendo algo que vai além do contexto da reprodutibilidade técnica e de fonte de renda:

Caio - Sei que arte é fazer peças barro, isso é uma coisa boa pra

nossa gente, o barro é uma fonte de renda pra o Alto do Moura. (2º ano).

Caio salienta mais uma vez o fazer com o barro como sendo arte, ou seja, na sua fala mantém-se o intuito de afirmar antes de qualquer coisa as peças artesanais feitas com barro como arte. A arte deixa de ser somente um conhecimento, o qual se desenvolve progressivamente por meio de um percurso de criação pessoal cultivado –por alguém que saiba criar, apreciar e contextualizar - e ganha significados outros, inclusive relativos à sua experiência pessoal, sem deixar de participar, por exemplo, de sistema artístico que tem suas bases na sociedade ocidental. Assim, o artesanato se constitui inicialmente nos dizeres das crianças como “A Arte do Barro”. Em seus dizeres, as crianças demonstram potencialidade em discorrer sobre o contexto cultural, social e econômico em que vivem. O que nos pareceu é que as crianças criam sentidos sobre arte e tais sentidos estão ancorados na sua constituição cultural, social e intersubjetiva.

Nessa perspectiva, Sarmento (2011) ressalta que as crianças têm capacidades de fazer interpretações das sociedades, dos outros e delas mesmas. Sendo assim, as crianças fazem isso de um modo que lhes é peculiar, diferente dos adultos. O que esse autor defende em seus estudos se reverbera nos dizeres das crianças, deixando claro que os padrões estéticos e de arte são variáveis, que vão de acordo com o tempo, o espaço e a cultura. O que as crianças disseram até agora sobre arte é o que melhor representa o tempo que elas vivem. Contudo, é importante destacar que mesmo que as crianças revelem essa autonomia na construção dos sentidos elaborados, este sistema é sempre compartilhado pelos adultos, em certa medida.