• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 1 A ARTE E SEU ENSINO: MAPEANDO OS SENTIDOS

1.3 Escola Nova: da arte como expressão

O movimento Modernista é oficialmente “inaugurado” aqui no Brasil no ano de 1922, com a Semana de Arte Moderna. No entanto, somente a partir de meados de 1927 a 1935 é que os princípios modernistas começaram a repercutir na Educação Artística através de artigos, cursos e atividades pedagógicas dirigidas por artistas e educadores como Mário de Andrade, Anita Malfatti e Nereu Sampaio (BARBOSA, 2011). Ainda de acordo com essa autora, neste mesmo período, o movimento conhecido como Escola Nova deflagrou reformas educacionais em todo o Brasil, com o objetivo de democratização da sociedade, para a superação do sistema oligárquico, e houve um despertar das preocupações com a necessidade de se adaptar modelos estrangeiros às condições nacionais.

Portanto, a Pedagogia Nova ou Escola Nova surge com o propósito de questionar e suplantar o modelo educacional tradicional. Ambas as correntes, apesar de partirem de conceitos e de metodologias distintas, têm, de acordo com Gadotti (2008), um traço em comum: o de conceber a educação como um processo de desenvolvimento pessoal e individual. A Escola Nova defende a educação como sendo um forte aliado no processo de construção de uma sociedade democrática mais humana e mais igualitária, que leve em consideração a diversidade e a individualidade dos sujeitos, abordando a educação como um fator de equalização social (SAVIANI, 2008; GADOTTI, 2008).

Nesta mesma perspectiva, o escolanovismo, ao contrário da escola tradicional, coloca em foco o aluno, tirando o professor da posição de transmissor dos conhecimentos, e considerando-o como um facilitador da aprendizagem. Como eixo central dessa perspectiva escolanovista, os aspectos afetivos e psicológicos dos alunos passam a ser considerados, dando ênfase à sua expressividade e espontaneidade, ressaltando a importância da autoavaliação:

Compreende-se, então, que essa maneira de entender a educação por referência à pedagogia tradicional, tenha deslocado o eixo da questão pedagógica do intelecto para o sentimento; do aspecto lógico para o psicológico; dos conteúdos cognitivos para os métodos ou processos pedagógicos do professor para o aluno; do esforço para o interesse; da disciplina para a espontaneidade; do diretivismo para o não-diretivismo; da

quantidade para qualidade; de uma pedagogia de inspiração filosófica centrada na ciência da lógica para a pedagogia de inspiração experimental baseada principalmente nas contribuições da biologia e da psicologia. (SAVIANI, 2008, p. 8).

Esse modelo educacional visava uma proposta de escola diferenciada, onde o aluno pudesse ser pensado como sujeito de seu próprio saber. Nessa expectativa, entra em cena o ensino da arte como “expressão”, marcado pela livre expressão da criança, onde a mesma deveria se expressar sem nenhum tipo de intervenção por parte do professor:

A ideia da livre-expressão, originada no expressionismo, levou à ideia de que a Arte na educação tem como finalidade principal permitir que a criança expresse seu sentimento e à ideia de que a Arte não é ensinada, mas expressada. Esses novos conceitos, mais do que aos educadores, entusiasmaram artistas e psicólogos, que foram os grandes divulgadores dessas correntes e, talvez por isso, promover experiências terapêuticas passou a ser considerada a maior missão da Arte na Educação (BARBOSA, 1975, p. 45).

Essa concepção psicopedagógica estava calcada em especial no desenho da criança que foi tomado como uma representação de um processo mental (BARBOSA, 2011; SILVA, 2005). Assim, o ensino de arte como expressão sofreu influência do pensamento defendido pela corrente livre-expressionista, que surgiu no Brasil em 1930, durante o movimento modernista, em que artistas como Malfatti e Mário de Andrade desenvolviam um trabalho de ensino de práticas pedagógicas em arte, tendo como aliado principal o estudo de técnica em artes plásticas, visando a potencializar a expressividade das crianças (VASCONCELOS, 2010).

Esta concepção de arte com ênfase na livre expressão e espontaneidade da criança é uma prática que reflete o pensamento da Pedagogia Nova, que concebia a natureza da criança como uma inocência original, em que a pureza da criança deveria ser preservada:

Essa concepção, no ensino das artes, traduz-se na ideia do fazer artístico como meio de liberar as emoções. E também na ideia de que a espontaneidade de criação da criança deve ser preservada a todo custo. Por isso, o professor não deve interferir, ensinar, mas manter-se apenas como expectador do trabalho da criança (ALMEIDA, 2004, p. 36).

Esta abordagem do ensino de arte tem suas bases conceituais e metodológicas ligadas ao Movimento de Escolinhas de Arte no Brasil (MEA), o qual tinha como principal premissa

que “arte não se ensina, se expressa”, com base teórica no pensamento de Herbert Read e Viktor Lowenfeld (SILVA, 2005; AZEVEDO, 2010; VIDAL, 2011).

Para Azevedo (2010), a ideia de livre expressão foi posteriormente deformada no âmbito da escola pública, sendo pautada como um “deixar fazer” desprovida de fundamentação teórica, traduzindo-se em um “espontaneísmo proposital”, implantado pelo pensamento educacional vigente.

Desse modo, as aulas de arte passaram a ser desenvolvidas a partir de produções descontextualizadas dos elementos da história da arte e de seus fundamentos. Os alunos expressavam-se livremente, tendo como suporte o argumento modernista de que era necessário educar visando ao desenvolvimento emocional e afetivo dos alunos:

Aqueles que defendem a Arte na escola meramente para liberar a emoção devem lembrar que podemos aprender muito pouco sobre nossas emoções se não formos capazes de refletir sobre elas. Na educação, o subjetivo, a vida interior e a vida emocional devem progredir, mas não ao acaso. Se a arte não é tratada como um conhecimento, mas somente como um “grito da alma”, não estaremos oferecendo uma educação nem no sentido cognitivo, nem no sentido emocional. Por ambas a escola deve se responsabilizar (BARBOSA, 2003, p. 21).

Essa lacuna existente entre a emoção e a reflexão destacada por Barbosa, Ana Mae (2003) nos convida a refletirmos sobre a forma como se aprende e se ensina arte, tendo nosso olhar voltado para a dimensão do saber sensível que é dado pelo corpo, agregado ao conhecimento inteligível, representado pelos signos da mente (DUARTE JÚNIOR, 2000, 2011). Essa interação entre o sensível e o reflexivo permite que o aluno possa pensar sobre as próprias emoções, e nessa relação se insere a educação estética, que se concretiza no processo de formação cultural do aluno.

Esta formação considera o contexto cultural no qual o aluno está inserido, respeitando suas diferenças e suas singularidades. Nesse sentido, o ensino da arte torna-se um elemento significativo para que os alunos possam se expressar através das diversas linguagens artísticas, proporcionando com isso que os mesmos tenham contato com experiências estéticas, artísticas e culturais.

Para isso, é necessário também que não percamos de vista a arte como uma área do conhecimento, que pensa o ensino de arte com seus conteúdos, com suas especificidades e autonomia. Essa linha de pensamento amplia as reflexões e discussões e traz uma série de questionamentos em torno do ensino em questão e vai além da tendência tradicional de arte como técnica, da tendência modernista de arte como expressão, como já exposto, e de arte

como meras atividades sem nenhum compromisso com o conhecimento inerente a cada linguagem artística.