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CAPÍTULO III – POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DOCENTE NO BRASIL: AVANÇOS,

3.2. AS DIRETRIZES CURRICULARES E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO

A carreira de professor deve ser pensada como uma profissão que exige um processo de aprendizagem contínuo e não apenas formação inicial, como a OCDE (2005) defende. Louzano et al. (2010) afirmam que os países com melhores desempenhos no PISA preocupam-se em oferecer além da formação inicial de qualidade, também oportunidades e incentivos para o desenvolvimento da profissão ao longo da carreira. No entanto, a formação inicial de professores é de extrema importância para a carreira docente.

Louzano et al. (2010) ainda chamam a atenção para o fato de que alguns sistemas de ensino no mundo, como os da Finlândia e Cingapura, fazem o recrutamento de seus professores antes mesmos deles ingressarem em cursos de formação de professores, concentrando recursos para formar apenas os interessados em ocupar postos de trabalho. Já no Brasil, a legislação educacional prevê que só depois de cursarem programas de formação docente é que os futuros professores buscam uma colocação no mercado de trabalho. Porém, sabe-se que antes mesmo de terem concluído os cursos de formação de professores alguns estudantes conseguem vagas para atuar na educação básica, cobrindo férias e licenças médicas dos professores efetivos.

No entanto, mesmo a legislação prevendo formação superior e aprovação em concurso público para os professores da educação básica, o Brasil é um país extenso e apresenta práticas diferenciadas (SCHEIBE, 2010), sem falar que a Lei 12.014/2009 (BRASIL, 2009) e a Lei 12.796/2013 (BRASIL, 2013) alteraram o dispositivo legal presente na LDB 9394/96 (BRASIL, 1996) nos seus artigos 61 e 62, que exigia formação em nível superior para os professores que atuam na educação básica, a partir desse momento apenas a formação em nível médio é suficiente para os profissionais que irão atuar nos anos iniciais da educação básica. Segundo Araújo (2013) a lei nº 12.796 (BRASIL, 2013) não trouxe grandes alterações e “[...] na área em que traria os dispositivos foram vetados”.

Araújo (2013) afirma que na lei havia dois dispositivos que foram vetados pela presidente Dilma Rousseff, o primeiro era o parágrafo 7º do artigo 62 da LDB 9394/96 (BRASIL, 1996):

“§ 7º Os docentes com formação em nível médio na modalidade normal terão prazo de 6 (seis) anos, contando da posse em cargo docente da rede pública de ensino, para a conclusão de curso de licenciatura de graduação plena”.

E conforme Araújo (2013) o segundo dispositivo estava relacionado à criação do artigo 87-A, que apresentava o seguinte texto;

“Art. 87-A. O dispositivo no § 7º do art. 62 não se aplica aos docentes com formação em nível médio na modalidade normal que se encontrarem em exercício na educação infantil ou nos anos iniciais do ensino fundamental, em rede pública, na data da publicação desta Lei”.

Segundo Araújo (2013) foi por meio de uma mensagem presidencial que foram expostas as razões dos vetos, que são o fato de o texto não prevê as consequências em relação ao não cumprimento da regra, ou seja, não fica claro o destino do profissional que não concluir os estudos no prazo determinado e devido à expansão do número de vagas oferecidas na educação infantil, essa exigência afetaria de forma direta as redes municipais de ensino. A respeito do não cumprimento do prazo de seis anos para docentes com ensino médio concluírem o nível superior, o veto parece coerente, já que o artigo 62 da LDB 9394/96 (BRASIL, 1996) permite o exercício do magistério com nível médio para os professores que fizeram concurso protegido por esse artigo. Como afirma Araújo (2013) o restante da argumentação a respeito dos vetos parece ser incoerente, pois ela parece ter um peso financeiro, ao permitir ainda o ingresso de professores sem curso superior invertem-se os valores: menor qualidade na educação e menos gasto público com a formação dos docentes, urge uma discussão em torno de quanto custará essa formação e de onde serão provenientes os recursos para ela.

Segundo Oliveira (2013) a Lei 12.014/2009 (BRASIL, 2009) e a Lei 12.796/2013 (BRASIL, 2013) que alteraram o dispositivo legal presente na LDB 9394/96 (BRASIL, 1996) nos seus artigos 61 e 62, que exigia formação em nível superior para os professores que atuam na educação básica expressam uma tendência que marca o debate que tem existido em torno da formação necessária para a atuação na educação básica no País, e tais mudanças,

[...] na norma legal refletem posições políticas que têm defendido interesses diversos no debate sobre a formação docente. Por um lado, observa-se que a defesa da formação inicial em nível superior tem sido há décadas defendida como um princípio para os que lutam pela profissionalização docente. Compreendendo a formação como determinante da profissão, as entidades acadêmicas têm defendido por meio de suas representações a formação em nível superior, em cursos presenciais e preferencialmente em universidades públicas. (OLIVEIRA, 2013, p. 60-61)

Ainda segundo Oliveira (2013, p. 61) com as mudanças provocadas pelas referidas leis, passou a se admitir “[...] como norma uma condição que antes era exceção”, ou seja, apenas a formação em nível médio é suficiente para os profissionais que irão atuar nos anos iniciais da educação básica, uma das fases mais importantes da educação continuará recebendo profissionais com formação com menor nível de exigência de qualificação, o que acaba reforçando a ideia de formação normalista para atuação na educação infantil e contribuindo para o enfraquecimento dessa etapa como espaço da profissão docente.

Já o projeto do Plano Nacional de Educação (PL 8035/2010) que encontra-se ainda em discussão no Congresso Nacional, apresentam-se metas de valorização e formação de professores, como elaboração de planos de carreira por todos os sistemas de ensino e a graduação de todos os docentes da educação básica, porém superar apenas as dificuldades estruturais da carreira não é suficiente como afirma Chaves (2014, p. 32), é necessário investir na qualificação dos docentes, oferecendo qualidade na formação inicial e continuada, pensando também na “[...] reconfiguração da atuação do professor em razão das mudanças na dinâmica de aprendizado”.

Scheibe (2010) baseada em dados do Inep (2009) afirma que até 2009 o Brasil contava com 1.882.961 professores atuando na educação básica, sendo que 1.288.688 com nível superior completo, destes 10% não possuem curso de licenciatura e um número expressivo de professores mesmo tendo cursando licenciatura ministram disciplinas não compatíveis com as suas formações.

Segundo Oliveira (2010) o fato de não existir um Sistema Nacional de Educação no Brasil, pode ser uma das justificativas para atualmente a profissão docente se apresentar diferenciada e fragmentada, já que os Estados e municípios são considerados entes autônomos pela Constituição Federal de 1998, correspondendo cada um a um sistema de ensino, tem-se professores federais, estaduais e municipais, professores concursados e não concursados, professores que atuam no meio urbano e rural, professores que atuam na rede pública e particular e professores titulados e sem titulação, portanto esse contexto faz originar diversos

planos de carreiras ou até mesmo ausência de planos, diferenças salariais, ampla jornada de trabalho: estadual/municipal; pública/privada; educação básica/educação superior.

Em relação à formação de professores no Brasil o INEP (2009) apresenta dados que apontam que o setor privado é responsável por cerca de 74% das matrículas em cursos de graduação presenciais, a maior parte representada por instituições não universitárias e em cursos noturnos. E segundo Scheibe (2010) essas instituições apresentam precárias condições de oferta de curso e as licenciaturas por demandarem menor custo de oferta, são historicamente oferecidas e privilegiadas por essas instituições.

Segundo dados do Censo da Educação Superior 2011 (INEP, 2013) no ano de 2011, 238.107 estudantes dos cursos de licenciatura concluíram seus cursos no Brasil, representando 23,4% do total de concluintes de graduação no país, como pode ser observado na Tabela 5. Porém, nem todos vão se tornar professores, já que é comum estudantes de licenciaturas cursarem também o bacharelado e seguirem a carreira de pesquisadores ou atuarem em instituições privadas que oferecem melhores salários e condições de trabalho, bem como reconhecimento social.

Tabela 5. Número e percentual de matrículas, ingressos (todas as formas e por processos seletivos) e concluintes de graduação (presencial e a distância), segundo o grau acadêmico – Brasil – 2010-2011.

Ano Organização Acadêmica Matrículas

Ingressos

Concluintes Total Por Processo Seletivo Formas Outras

Total % Total % Total % Total % Total %

Total 6.379.299 100,0 2.182.229 100,0 1.922.240 100,0 259.989 100,0 973.839 100,0 Bacharelado 4.226.717 66,3 1.340.003 61,4 1.163.237 60,5 176.766 68,0 577.891 59,3 2010 Licenciatura 1.354.989 21,2 452.527 20,7 393.776 20,5 58.751 22,6 233.306 24,0 Tecnológico 781.609 12,3 381.885 17,5 357.670 18,6 24.215 9,3 162.642 16,7 Não se Aplica1 15.984 0,3 7.814 0,4 7.557 0,4 257 0,1 .. .. Total 6.739.689 100,0 2.346.695 100,0 2.093.368 100,0 253.327 100,0 1.016.713 100,0 Bacharelado 4.495.831 66,7 1.438.981 61,3 1.259.913 60,2 179.068 70,7 607.971 59,8 2011 Licenciatura 1.356.329 20,1 454.712 19,4 409.029 19,5 45.683 18,0 238.107 23,4 Tecnológico 870.534 12,9 443.253 18,9 415.113 19,8 28.140 11,1 170.635 16,8 Não se Aplica1 16.995 0,3 9.749 0,4 9.313 0,4 436 0,2 .. .. Total 5,6 7,5 8,9 -2,6 4,4 ∆% Bacharelado 6,4 7,4 8,3 1,3 5,2 (2010-2011) Licenciatura 0,1 0,5 3,9 -22,2 2,1 Tecnológico 1,4 16,1 16,1 16,2 4,9 Fonte: MEC/INEP (2013).

Dados do Censo da Educação Superior 2011 (INEP, 2013), apontam que tem ocorrido uma pequena redução no número de matrículas nos cursos de licenciatura presenciais, como pode ser observado no gráfico abaixo. O Gráfico 1 também compara a distribuição das matrículas de graduação, por grau acadêmico do curso, segundo a modalidade de ensino. A modalidade presencial totaliza 4.196.423 matrículas de bacharelado, 926.780 matrículas de licenciatura e 606.564 matrículas de grau tecnológico. A modalidade a distância soma 429.549 matrículas de licenciatura, 299.408 matrículas de bacharelado e 263.970 matrículas de grau tecnológico.

Gráfico 1. Distribuição do Número de Matrículas de Graduação por Modalidade de Ensino, segundo o Grau Acadêmico – Brasil – 2011

Fonte: MEC/INEP (2013).

Nota: “Não se Aplica” corresponde à área básica de ingresso, na qual não está definido o grau acadêmico.

Em relação a 2010, a elevação de matrículas presenciais em 2011 corresponde 11,1% para o grau tecnológico (de 545.844, em 2010, para 606.564, em 2011) e 6,0% para o bacharelado (de 3.958.544 para 4.196.423). Na licenciatura, verifica-se decréscimo de 0,2% de matrículas presenciais (de 928.748 para 926.780). No caso das matrículas a distância, o crescimento observado equivale a 12,0% para o grau tecnológico (de 235.765 para 263.970), 11,6% para o bacharelado (de 268.173 para 299.408) e 0,8% para a licenciatura (de 426.241 para 429.549), como aponta o INEP (2013).

Observa-se um pequeno aumento no número de matrículas para os cursos de licenciatura na modalidade a distância, porém é a menor taxa de crescimento registrada entre todas as graduações, o que só evidencia o quanto a carreira docente tem sido pouco atraente

aos jovens que buscam um curso superior, já os cursos de bacharelado são mais procurados, por oferecerem melhores oportunidades de trabalho e salários do que a docência.

Segundo dados do relatório produzido pela Comissão Especial do Conselho Nacional de Educação (CNE), de 2007, composta pelos pesquisadores Ruiz, Ramos, Hingel (2007) e intitulado Escassez de Professores no Ensino Médio: soluções estruturais e emergenciais, as disciplinas que mais carecem de professores são as de física e química, seguidas das de matemática e biologia e de acordo com Chaves (2014, p. 28) atualmente “[...] faltam 170 mil professores de exatas na educação básica”. Logo, é necessária a efetivação de novos projetos e políticas voltadas à atração da carreira docente, pois apenas o discurso político e clichê da valorização da profissão docente não mudará o quadro de precarização que se encontra o magistério.

A partir de 1997, surgem discussões sobre como reorganizar a formação de professores da educação básica e como destacam Louzano et al. (2010) somente em 2005, por meio do Parecer CNE/CP nº 5, de 13 de dezembro de 2005 (BRASIL, 2005) é que se estabeleceu uma nova norma nacional, assim o currículo nacional comum foi substituído por diretrizes nacionais, isso para o curso de Pedagogia. De acordo com essas orientações, a Pedagogia ficou responsável pela formação de professores para a educação infantil e para o primeiro ciclo do ensino fundamental, sendo que a formação deveria se dá entre 2.800 a 3.600 horas o que equivale a 3 ou 4 anos, já as licenciaturas ficaram responsáveis pela formação dos professores que irão atuar no segundo ciclo do ensino fundamental e ensino médio.

As demais diretrizes para as licenciaturas foram sendo aprovadas e estabelecidas em anos diferentes, por exemplo, as Diretrizes Curriculares para o curso de Ciências Biológicas foram estabelecidas pela Resolução CNE/CES 7, de 11 de março de 2002 (BRASIL, 2002), já a Resolução CNE/CES 18, de 13 de março de 2002 (BRASIL, 2002) estabeleceu as Diretrizes Curriculares para o curso de Letras, ambas as diretrizes definem que a formação se dará entre 2.800 a 3.600 horas divididas em: a) Créditos: sendo privilegiadas teorias relacionadas ao processo de ensino-aprendizagem, prática pedagógica, planejamento pedagógico, avaliação escolar e políticas públicas educacionais, sendo este conteúdo dividido entre 2.500/3.000 horas; b) Estágio ou prática: destinado à observação, planejamento e avaliação de atividades educativas, para todas essas atividades são destinadas entre 300/600 horas; c) Iniciação Científica e Extensão: atividades não obrigatórias.

Já as Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia foram estabelecidas pela Resolução CNE/CP n. 1, de 15 de maio de 2006. Destaca-se que as Diretrizes Curriculares Nacionais de cada curso têm suas origens na LDB 9394/96 (BRASIL, 1996).

Gatti e Barretto (2009) demonstram alguns aspectos importantes relativos aos currículos e ementas curriculares dos cursos de formação inicial de professores de Ciências Biológicas e Letras. Segundo as autoras o curso de Letras destina 51,4% de sua carga horária a disciplinas relativas aos conhecimentos disciplinares da área, predominando o estudo da Linguística, e apenas 11% das horas-disciplinas são destinadas à formação para docência. Já o curso de Ciências Biológicas destina 10% da carga horária para a formação para docência e 65,3% para a formação específica na área.

As autoras fazem outras importantes observações em relação ao currículo das licenciaturas citadas, por exemplo, na pesquisa realizada elas observaram que poucas instituições especificam em que consistem os estágios e como eles são realizados; as práticas exigidas pelas diretrizes curriculares nesses cursos mostram-se problemáticas, pois muitas vezes elas são introduzidas em diversas disciplinas sem especificação clara; foram encontrados problemas com nomes de disciplinas e ementas pouco específicas; pouco estudo voltado aos saberes tecnológicos; e abordagem de conteúdo que poderia ser destinada às especializações ou pós-graduação, já que são conteúdos que visam claramente a formação de outro profissional que não o professor.

Todos esses aspectos relacionados à formação docente contribuem para a ausência de um eixo formativo claro, o que acaba promovendo uma frágil preparação para o ofício da docência na educação básica. Segundo Arroyo (2011, p. 13) “[...] o currículo é o núcleo e o espaço central mais estruturante da função da escola”, o autor afirma ainda que por esse motivo o currículo é também o espaço mais normatizado, politizado e ressignificado, prova disso é a grande quantidade de diretrizes curriculares para a educação básica.

Segundo Arroyo (2011) o território do currículo é também um espaço de inventar resistências, novas fronteiras por novos direitos ao neoconservadorismo político e gestor. Portanto, é necessário pensar na construção de um currículo que privilegie uma formação docente sólida, que ajude a garantir o direito dos docentes e dos educandos à riqueza de conhecimentos e de culturas produzidos, promovendo assim, uma plena formação.

3.3 AS LICENCIATURAS E O PERFIL DOS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO