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Aspetos Técnicos de um Esquema de Contas Nocionais de Contribuição Definida Genérico

2. Os Esquemas de Contas Nocionais de Contribuição Definida

2.3 Aspetos Técnicos de um Esquema de Contas Nocionais de Contribuição Definida Genérico

Seguidamente, analisa-se no plano técnico o modelo genérico de esquema NDC, o qual sofreu alterações diversas nos países onde foi implementado, em conformidade com as políticas sociais a atingir ou privilegiar.

2.3.1 O Capital Nocional

Para Palmer (2012), o Capital Nocional de um indivíduo i no final do instante T, 𝐾𝑖,𝑇, resulta da

acumulação e revalorização das contribuições anuais, que resultam, por sua vez, da incidência da taxa de contribuição, c, igual para todos os indivíduos, sobre o seu salário no período t, mais concretamente todos os rendimentos coletáveis para o efeito, 𝑤𝑖,𝑡. O valor, 𝐾𝑖,𝑇, é então dado por:

𝐾𝑖,𝑇 = ∑ 𝑐𝑤𝑖,𝑡𝐼𝑡

𝑇 𝑡=1

, (2.1)

sendo It um índice de revalorização obtido a partir da taxa interna de rendimento do sistema, αt, da

seguinte forma: 𝐼𝑡= ∏(1 + 𝛼𝑡) 𝑇−1 𝑡=1 (2.2) com 𝐼𝑇 = 1 .

O salário (todos os rendimentos coletáveis para o efeito), sobre o qual incide a taxa de contribuição, poderá estar sujeito a um plafonamento previamente estabelecido, delimitando a responsabilidade do Estado. Em qualquer momento, o valor atual do benefício ou, equivalentemente, da pensão do indivíduo, é igual ao capital nocional, correspondendo ao saldo da sua conta. A anuidade de onde se obtém a pensão por velhice depende genericamente de dois fatores que iremos de imediato analisar: da taxa de desconto da anuidade e da esperança média de vida da respetiva geração (coorte) de nascimento, naquela data.

2.3.2 A Taxa de Desconto da Anuidade

A fixação da taxa de desconto da anuidade não é um assunto pacífico por questões de sustentabilidade e pela sua influência no valor da pensão inicialmente atribuída ao reformado. Na abordagem tradicional, com capitalização real, este valor baseia-se na taxa de rendimento dos ativos a caucionarem as

responsabilidades. Estando-se a falar de um esquema NDC, não existe fundeamento financeiro. Em consequência, não é possível seguir-se aquela metodologia. No entanto, a taxa de desconto da anuidade deve igualar a taxa interna de rendimento do sistema, definindo-se como a taxa que iguala o valor atual dos ativos ao dos passivos (ver ponto 2.3.4), a qual tem como principal componente influenciadora o crescimento da massa contributiva futura, pelo que o seu valor exato só é efetivamente conhecido uma vez concluídos todos os pagamentos. Todavia, no momento da reforma, coloca-se uma questão prática na determinação da pensão, ao ser necessário fixar uma taxa de desconto na anuidade. Caso se opte por ter uma taxa de desconto nula, as pensões deverão ser indexadas à taxa interna de rendimento do sistema, de forma a não se gerarem desequilíbrios financeiros. Porém, se considerarmos as preferências intertemporais individuais em relação ao consumo, que tendem a privilegiar o consumo presente em relação ao do futuro, é desejável assumir uma taxa de desconto diferente de zero, dado que, quanto mais elevada esta for, maiores serão as pensões iniciais. Assim, de modo a manter-se o equilíbrio do esquema, a taxa de desconto a fixar deverá situar-se próxima da de rendimento interna do sistema, que se estima obter no futuro, dando posteriormente lugar a reajustes em caso de desvios (à semelhança do que acontece na Suécia), sempre que se verifiquem diferenças entre a taxa de desconto da anuidade e a taxa interna de rendimento, observada a posteriori. Se esta última for inferior à prevista no desconto dos fluxos da anuidade, dever-se-á proceder a uma correção negativa e, ao invés, a um reajustamento positivo.

2.3.3 A Esperança Média de Vida

Relativamente ao apuramento da esperança média de vida a usar na anuidade, Palmer (2006a) refere três abordagens técnicas possíveis:

- Usar projeções sobre a evolução futura da mortalidade geracional com revisões, desejavelmente, anuais. Se a informação e os valores de partida forem fiáveis, os reajustamentos anuais serão marginais e (recomenda o autor) apenas aplicáveis a gerações a aposentarem-se no futuro, sendo tendencialmente maiores quanto mais estas se distanciarem da idade de reforma;

- Usar estimativas da esperança média de vida assentes em informação passada disponível no ano civil. Este procedimento reveste-se de menor subjetividade que o anterior, mas apresenta o risco de existir um certo desfasamento entre os valores apurados e a realidade, determinando pensões superiores às devidas para os trabalhadores mais antigos e transferindo custos para as gerações futuras, isto admitindo, acrescentamos nós, um aumento continuado da longevidade no tempo. Apesar desta pressão sobre o sistema poder ser retificada com um mecanismo de equilíbrio inserido na arquitetura, o efeito distributivo permanece. De outro modo, esta opção é suscetível de gerar défices no sistema;

- Uma terceira hipótese é usar-se informação passada disponível no ano civil, como na segunda hipótese e, periodicamente, reajustar todas as pensões de acordo com a evolução observada da esperança média de vida. Apesar de ser a abordagem mais rigorosa, quando comparada com as alternativas de se tentar obter a projeção certa desde o início (primeira hipótese) ou de endogeneização dos desvios através do mecanismo de equilíbrio (segunda hipótese), esta é também a menos apelativa para os decisores políticos, por implicar uma maior volatilidade no valor das pensões em pagamento. Inclusivamente, para alguns pensionistas com grande longevidade, este processo de redução das pensões pode perdurar por várias décadas, apresentando-se, eventualmente, demasiado gravoso.

2.3.4 A Taxa Interna de Rentabilidade

A taxa interna de rentabilidade é a taxa de rendimento necessária para manter o esquema NDC financeiramente sustentável. Em Palmer (2006a), o equilíbrio financeiro é definido como o estado no qual o valor atual (v. a.) dos ativos do sistema iguala o dos passivos, isto é:

𝑣. 𝑎. (At)=𝑣. 𝑎. (Lt) , (2.3)

sendo At e Lt, respetivamente, o ativo e o passivo do sistema no momento t.

O passivo compreende o somatório das contas nocionais dos m trabalhadores acrescido do valor atual das 𝑙 pensões em pagamento, ou seja:

𝑣. 𝑎. (𝐿𝑡) = ∑ 𝐾𝑖,𝑡 𝑚 𝑖=1 + ∑ 𝑣. 𝑎. (𝑃𝑗,𝑡) 𝑙 𝑗=1 , (2.4)

sendo 𝑃𝑗,𝑡 a pensão do j-ésimo pensionista, no momento t.

O ativo corresponde ao valor atual das contribuições futuras, relativas ao período m, acrescido dos fundos de reserva eventualmente existentes. No caso específico do regime sueco, arquétipo que iremos seguir, o cálculo daquele valor atual, denominado de Contribution Asset, é feito por recurso ao conceito de Turnover Duration, TD, acrescendo o valor do fundo de reserva no momento t, F𝑅𝑡, sendo o ativo dado pela expressão:

𝑣. 𝑎.(At)=TD∑ cwi, t n

i=1

+F𝑅𝑡 . (2.5)

Sem prejuízo de adiante, no ponto 4.1.3.4, aprofundarmos o conceito de turnover duration, podemos antecipar tratar-se de uma métrica introduzida aquando da reforma sueca e utilizada naquele regime,

quantificadora do tempo médio de permanência de uma unidade monetária no esquema, desde que é descontada pelo contribuinte até ser liquidada ao pensionista.13

Num esquema NDC genérico, as contas durante a fase de acumulação e as pensões ao longo do período de pagamento são revalorizadas à mesma taxa, significando idêntico tratamento entre trabalhadores e pensionistas, ou seja, entre ativo e passivo.

Em Samuelson (1958), demonstra-se que a taxa de rendimento de um regime financiado em repartição é a do crescimento da sua massa contributiva total. Efetivamente, num estado estacionário (steady state), definido por ter uma distribuição fixa dos salários e das idades que constituem a força laboral e por uma taxa de mortalidade constante, uma taxa de rendimento do sistema baseada na taxa (instantânea) de crescimento da massa contributiva total é suficiente para manter a sustentabilidade financeira. A taxa de rendimento é assim determinada pela taxa de crescimento da produtividade, g, acrescida da taxa de crescimento da força laboral, λ. Mais tarde, Valdés-Prieto (2000) defende que a taxa de rendimento g+λ não é suficiente para assegurar a sustentabilidade financeira. Em linha com este último raciocínio, Settergren & Mikula (2005) chamam a atenção para o facto de o argumento de que a taxa de rendimento de um regime financiado em repartição é igual ao crescimento da massa contributiva total só é válido num modelo de gerações sobrepostas (OLG, overlapping generations) a duas gerações ou numa economia irrealista em estado estacionário. Com efeito, autores como Settergren & Mikula (2005), Arthur & McNicoll (1978) e Willis (1988) provaram que, num modelo OLG com mais que duas gerações, variações no diferencial etário entre as idades, às quais o rendimento médio é obtido e consumido, constituem um fator crítico na determinação da taxa de juro de equilíbrio do sistema. Keyfitz (1985, 1988), Lee (1980, 1988, 1994a, 1994b) e Lee & Lapkoff (1988) provaram que o montante consumido, em determinadas ou em todas as idades, é afetado por alterações neste diferencial etário. Deste modo, em Settergren & Mikula (2005) demonstra-se que a turnover duration é dada pela diferença entre a idade média dos aposentados e a idade média dos contribuintes, constituindo uma medida da duração da responsabilidade com pensões. Afirmam ainda que, à exceção do estado estacionário, não existem valores definitivos para a turnover duration, dependendo o seu valor em cada momento das condições económicas correntes e do padrão demográfico registado, denominando-se esta métrica de expected turnover duration. Como esta afeta o contribution asset (o valor atual das contribuições futuras), o qual poderá posteriormente diferenciar-se do observado, devem atualizar-se as suas estimativas, à medida que os padrões económicos e demográficos se alteram, obtendo-se um novo

contribution asset.

Conforme anteriormente mencionado, num estado estacionário a taxa de crescimento da massa contributiva total, g+λ, corresponde à taxa interna de rendimento de um regime financiado em

13

Para uma descrição mais detalhada da metodologia de cálculo da turnover duration recomenda-se a leitura do relatório anual Orange Report publicado pela Swedish Pension Agency.

repartição. Variações no balanço do sistema, provocadas pela dinâmica das populações (não estacionaridade), afetam a sua taxa interna de rentabilidade. Do lado do ativo, as variações traduzem-se em mudanças na expected turnover duration e no valor das contribuições recebidas. Do lado do passivo, advêm de variações na mortalidade e nas contas nocionais. Esta variação do balanço, 𝜌𝑡, pode traduzir-

se pela expressão seguinte:

𝜌𝑡 =

𝑣. 𝑎. (𝐴𝑡)

𝑣. 𝑎. (𝐿𝑡)− 1 . (2.6)

Se adicionarmos esta última componente à taxa interna de rentabilidade, correspondente à situação estacionária, g+λ, a expressão da taxa de rendimento passa a ser dada por:

𝛼 = 𝑔 + 𝜆 + 𝜌 , (2.7)

conforme referido em Settergren & Mikula (2005). Se a taxa de rendimento atribuída numa certa arquitetura for inferior a α, então, comparativamente ao sistema genérico, ocorrerá um excedente que, a não ser imputado às contas nocionais, representará um imposto.

Quando o esquema NDC genérico possua acoplado um fundo de reserva, a taxa interna de rendimento será ainda influenciada pela taxa de rendimento dos ativos do fundo.

Assim, tal como concluem os autores referidos, a taxa interna de rendimento de um sistema em repartição não é apenas função do crescimento da massa contributiva total, mas também da variação nos padrões das receitas e da mortalidade e ainda da tendência de crescimento da população, dado que alterações nestas variáveis influenciam a Expected Turnover Duration. Acresce que, se houver um fundo de reserva, o seu rendimento também influenciará a taxa interna de rendimento do esquema.