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4. A Gestão da Transição nos Países Pioneiros

4.1 A Gestão da Transição Sueca

4.1.3 A Arquitetura do Novo Sistema Sueco

4.1.3.3 O Mecanismo de Equilíbrio Automático

Os esquemas NDC comportam uma diminuição substancial da exposição aos riscos (macroeconómicos e demográficos) por parte do Estado, transferindo-os, parcialmente, para os indivíduos, mas não os eliminando completamente (Spivak, 2008; Palmer, 2012). Conforme explanado em Settergren (2001), o esquema sueco tem embutido um mecanismo de equilíbrio automático, visando garantir a sua solvência

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no longo prazo, seja ela ameaçada por razões demográficas, económicas ou financeiras. Neste último caso, pela diminuição dos fundos de reserva devido ao desempenho dos mercados financeiros. Neste âmbito, Cichon (2005) afirma que taxas baixas ou negativas de crescimento económico, eventualmente provocadas por uma contração da força laboral, constituem um problema central do sistema. Letzner & Tippelmann (2004) mencionam que, quando a força laboral diminui, o crescimento do salário médio pode exceder o da massa contributiva total, levando eventualmente a um crescimento mais acelerado das pensões e das contas nocionais do que o da base contributiva a partir da qual estas são suportadas. Nestas circunstâncias, a sustentabilidade financeira só pode ser atingida pelo recurso a fundos amortecedores ou pela ativação do ABM, reduzindo os elementos do passivo.

A avaliação da posição de solvência resulta do Rácio de Equilíbrio (Balance Ratio), definido como quociente entre os ativos e as responsabilidades do sistema. O primeiro membro do balanço é composto pela soma do valor atual das contribuições futuras acrescido dos fundos de reserva. O passivo é dado pelo montante das contas nocionais acrescido do valor atual das pensões em pagamento. Se o rácio for inferior a um, significa que o sistema não está solvente, pois o ativo é inferior ao passivo, tendo de se proceder a uma diminuição nas indexações ou mesmo a uma redução no valor nominal das contas e das pensões, como aconteceu em 2010 e 2011, anos em que foi ativado o Índice de Equilíbrio. Este índice é determinado pela seguinte relação:

Índice de Equilíbrio = Rácio de Equilíbrio x Índice de Rendimento.

As responsabilidades evoluirão de harmonia com o desempenho do índice de equilíbrio, até se obter novamente um rácio de equilíbrio superior à unidade. Nesta eventualidade, as pensões sofrerão um aumento superior ao crescimento do índice de rendimento, conforme resulta analiticamente da expressão anterior, reposicionando o seu valor no nível anterior ao da ativação do índice de equilíbrio, o designado “período de aceleração”. O gráfico seguinte ilustra este processo. Uma vez atingidos os valores anteriores à ativação do ABM, retoma-se a indexação ao índice de rendimento.

Gráfico 1: Indexação do sistema público de pensões sueco

Sempre que o rácio de equilíbrio é superior à unidade, produzem-se excedentes não distribuídos, permanecendo retidos no sistema. Quando o rácio for igual a um, o sistema encontra-se em equilíbrio financeiro, dando-se a revalorização ao índice de rendimento. O funcionamento, a descrição e as condições de ativação do ABM encontram-se regulamentados na Lei sueca, conferindo-lhe uma relativa imunidade à manipulação política.

Em conclusão, o ABM reduz o passivo do sistema, reposicionando-o no caminho da solvência de longo prazo. Atendendo ao modo de funcionamento, o método de valoração dos ativos e dos passivos é um elemento chave deste processo. No apuramento do rácio de equilíbrio, à exceção dos fundos de reserva avaliados a valores de mercado18

, a conceção sueca do balanço assenta em dados históricos, não havendo lugar a quaisquer tipos de projeções demográficas ou económicas. Considerando a natureza distinta do ativo e do passivo, pelas razões anteriormente explicadas no ponto 2.3.4, as respetivas taxas de rendimento podem ser diferentes. No entanto, apesar da cuidada reflexão concetual em redor do novo sistema, em Konberg et al. (2006) referem-se limitações suscetíveis de colocarem em perigo a sua sustentabilidade financeira, designadamente:

- A indexação ao crescimento do salário médio, ao invés de ao aumento da massa contributiva total, pelas razões acima apontadas;

- A utilização da esperança média de vida observada em dados do ano civil, mantendo-se inalterada a pensão após atribuição, não se recorrendo à esperança média de vida projetada, para cada geração;

- A necessidade do desempenho financeiro dos fundos de reserva ser, no mínimo, idêntica ao rendimento das contas nocionais;

- A sustentabilidade financeira depender das remunerações e do perfil dos pagamentos;

- A indexação assentar em dados históricos, possuindo um diferimento de dois anos, comparativamente a uma indexação instantânea.

Estes problemas consubstanciam ameaças, relativamente às quais pretendemos desenvolver melhorias ao longo desta tese, com a consequente aplicação à realidade portuguesa. No regime NDC sueco, a liquidação das pensões depende fortemente das contribuições anualmente arrecadadas, por assentar numa filosofia de repartição. Em nosso entender, uma gestão sã e prudente dos riscos assumidos recomenda a preparação da resposta a contextos de choques económicos, demográficos e financeiros, no sentido da preservação da sustentabilidade financeira, um dos objetivos da reforma de 1994. Neste âmbito, propomo-nos investigar o desenvolvimento de metodologias de análise, quantificação e de

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gestão dos riscos inerentes a estas eventualidades, aplicáveis a qualquer país e, em particular, a Portugal. Perante tais adversidades, apesar de no limite ser sempre possível incrementar-se a taxa de contribuição, como medida de gestão, tal não se configura como uma solução adequada, pois, a prazo, ela comporta um aumento das responsabilidades a liquidar (Konberg et al., 2006). Por outro lado, conforme defende Disney (1999), a alteração da taxa de contribuição concorre para a descredibilização dos esquemas NDC. Considerando estes argumentos, a existência de mecanismos de equilíbrio automáticos e de fundos de reserva são instrumentos essenciais à solvência dos sistemas. Em nossa opinião, a grande inovação do esquema sueco reside no ABM. Concebido com a finalidade de colmatar as insuficiências acima identificadas, conferindo sustentabilidade financeira no longo prazo, visava a manutenção da taxa de contribuição, pressuposto fundamental na conceção do sistema, atuando em compensação sobre a indexação. Conforme a própria denominação indica, o mecanismo é acionado automaticamente, não carecendo de decisão política, respondendo, assim, a um outro importante requisito da reforma: o de evitar o risco de decisões discricionárias e eleitoralistas. Segundo Andrews (2008), a análise das virtudes e dos problemas de um sistema de Segurança Social deve ser feita em duas dimensões: a da solvência e a da equidade, abordagem que desenvolveremos nesta tese, relativamente ao modelo sueco.