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5. A Solvência e a Equidade de um Esquema de Contas Nocionais de Contribuição Definida

5.1 Análise da Solvência

5.1.2 A Solvência de Longo Prazo

5.1.2.1 Stress Tests à Longevidade dos Pensionistas

Alguns dos riscos incidentes nos sistemas públicos de pensões são comuns aos assumidos pelas companhias de seguros, nomeadamente o de longevidade. Este facto permite-nos, com as devidas adaptações e quando necessário, aplicar um conjunto de metodologias utilizadas no setor segurador na sua gestão, no que concerne às pensões por velhice da Segurança Social. As especificações técnicas do exercício de stress tests36

à posição de solvência das seguradoras europeias, levado a cabo pela European Insurance and Occupational Pensions Authority (EIOPA), em março de 2011 (EIOPA,

2011), determinam, para efeitos de um choque ao risco de longevidade, uma diminuição de 23% na mortalidade esperada. Assim, esta será a magnitude que servirá de base aos choques dos três cenários de longevidade a ensaiar, designadamente:

- Cenário 1 – Diminuição instantânea e permanente de 23% da mortalidade esperada dos pensionistas, relativamente à situação inicial de equilíbrio. O objetivo é o de avaliar o efeito sobre o ABM de um choque instantâneo com a sua manutenção no longo prazo, não havendo reposição da situação original. Trata-se do cenário denominado em forma de L;

- Cenário 2 – Diminuição anual de 0,307% da mortalidade esperada dos pensionistas nos próximos 75 anos, ou seja no final deste período tem-se uma redução acumulada de 23% relativamente ao início.Pretende-se aferir o efeito de um choque continuado ao longo do tempo sobre o ABM. É o cenário por nós designado de em forma de ∖;

- Cenário 3 – Diminuição instantânea de 23% da mortalidade esperada dos pensionistas,durante os cinco primeiros anos da projeção, voltando, no sexto, a ter o valor original de equilíbrio. Neste cenário, o objetivo é o de analisar como o ABM reage a choques de curto prazo que

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Exercício de stress test feito às seguradoras sedeadas na União Europeia (UE), no âmbito da construção do novo regime de regulação e supervisão denominado de Solvência II, a vigorar a partir de 1 de janeiro de 2016 na UE. Constituído por três pilares, o primeiro determina que as seguradoras e resseguradoras detenham um capital amortecedor em conformidade com os riscos assumidos. O segundo pilar regula o processo de gestão de risco e de governação e o terceiro determina os critérios divulgação de informação e de reporting. Para informação mais aprofundada consultar Diretiva 2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009, relativa ao acesso à atividade de seguros e resseguros e ao seu exercício (Solvência II).

rapidamente voltem à situação original. Se o período de tempo considerado fosse outro, as conclusões obtidas seriam análogas porque se está inserido numa situação de equilíbrio, pelo que mais nenhum fator influencia o esquema, a não ser o choque em estudo. Trata-se do chamado cenário em forma de U.

O saldo acumulado, ou o valor do fundo de reserva, resulta da diferença acumulada entre as contribuições arrecadadas e as pensões pagas refletindo, assim, a posição de solvência em cada ano, por se ter partido de uma situação de equilíbrio, na qual o valor inicial é zero. Assim, sempre que ao longo do tempo o fundo de reserva for:

- Positivo: o sistema está solvente; - Negativo: o sistema está insolvente; - Nulo: o sistema está solvente.

Nos três cenários estabelecidos, o ativo resultou do produto das contribuições anuais pela expected

turnover duration, isto é, obtendo-se o contribution asset, ao qual acresce o saldo acumulado no fundo

de reserva. Os resultados ilustrados pelo Gráfico 2 pressupõem a ausência do ABM, enquanto que no Gráfico 3 admite-se a sua existência.

Pretendendo-se avaliar o comportamento do esquema NDC sueco, em termos teóricos, optou-se por, nos gráficos que se seguem, se expressar o saldo do fundo de reserva em percentagem do total do ativo do esquema e não em valores absolutos, pois não se está a trabalhar com dados populacionais reais. Para o objetivo prosseguido, parte-se então da situação de equilíbrio, definida no ponto 5.1.2, (número de contribuintes e pensionistas constante ao longo do tempo), diminuindo-se, por efeito dos choques, a mortalidade dos pensionistas e, em consequência, aumentando-se o número de pensionistas vivos. No Anexo I caracteriza-se a população37 em estudo e sua evolução ao longo do tempo. Da observação dos

gráficos38

, avalia-se a reação do sistema ao desequilíbrio provocado pelo cenário de stress em questão. No gráfico seguinte apresenta-se a evolução do saldo acumulado do fundo de reserva, expresso em percentagem do ativo do sistema, sem existência do ABM definido no ponto 4.1.3.3.

37

A população utilizada é a mencionada no ponto 5.1.2 e detalhada no Anexo I.

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Ao longo desta tese, sempre que possível, por uma questão de coerência e de modo a facilitar o estabelecimento de análises comparativas, manteremos as escalas dos gráficos (homólogos) relativamente às mesmas grandezas em estudo.

Gráfico 2: Fundo de reserva - população estacionária - sem ABM -

stress tests à longevidade

Fonte: cálculos do autor.

O próximo gráfico mostra o desempenho do saldo acumulado nofundo de reserva, em percentagem do valor do ativo do sistema, mas com a incorporação do ABM.

Gráfico 3: Fundo de reserva - população estacionária - com ABM -

stress tests à longevidade

Fonte: cálculos do autor.

O gráfico que se segue ilustra a evolução do índice de equilíbrio, definido no ponto 4.1.3.3, utilizado na indexação das contas nocionais e das pensões para os três cenários em estudo.

-2,0% -1,5% -1,0% -0,5% 0,0% 0,5% 1 5 9 13 17 21 25 29 33 37 41 45 49 53 57 61 65 69 73 Per ce n tagem d o ativ o d o si ste m a Ano de Projeção

Cenário 1 Cenário 2 Cenário 3

-0,8% -0,6% -0,4% -0,2% 0,0% 0,2% 0,4% 0,6% 1 5 9 13 17 21 25 29 33 37 41 45 49 53 57 61 65 69 73 Per ce n tagem d o ativ o d o si ste m a Ano de Projeção

Gráfico 4: Índice de equilíbrio - população estacionária - com ABM -

stress tests à longevidade

Fonte: cálculos do autor.

Da análise dos gráficos observam-se os seguintes comportamentos:

- No cenário 1, o Gráfico 2 evidencia que, sem a existência do ABM, o sistema, composto por contas nocionais e pensões em pagamento, inicia, desde o princípio, uma trajetória de saldos negativos que estabilizam 33 anos depois, em cerca de 1,72% do ativo. Observando o Gráfico 3, perante a insolvência ocorrida logo no primeiro ano, o mecanismo é ativado provocando um corte considerável nas pensões e nas contas nocionais de, aproximadamente, 4% (Gráfico 4), quase que recuperando novamente a solvência no quinto ano, momento a partir do qual se torna novamente deficitário, acumulando saldos negativos, até iniciar, no vigésimo sétimo ano, uma nova trajetória no sentido da situação de solvência, atingindo-a 71 anos depois (Gráfico 3). Os défices após o quinto ano acontecem devido às pensões pagas excederem as contribuições recebidas, porque os pensionistas mais antigos tiveram a sua pensão calculada de acordo com a esperança média de vida anterior, como tal inferior, levando a maiores valores atribuídos de pensão. Por outro lado, o aumento da esperança média de vida conduz ao incremento da

expected turnover duration e, consequentemente, ao do contribution asset, aumentando o valor do ativo, diminuindo assim o corte nas pensões causado pela ativação do ABM, razão pela qual o corte se revela insuficiente para compensar as pensões pagas a um maior número de pensionistas. A partir do momento em que, progressivamente, estes pensionistas mais antigos passam a ter um peso residual na população, o sistema volta a gerar excedentes e a caminhar para o equilíbrio dos saldos, mas sem a reposição do valor das pensões e das contas nocionais, conforme evidenciado pelo desempenho do índice de equilíbrio no Gráfico 4. Assim, esta

96% 97% 98% 99% 100% 101% 1 5 9 13 17 21 25 29 33 37 41 45 49 53 57 61 65 69 73 Ano de Projeção

recuperação parcial do nível das pensões e contas nocionais inicia-se no segundo ano, mas nunca é totalmente conseguida;

- No cenário 2, o Gráfico 2 evidencia que o sistema produz, continuadamente, saldos negativos até ao final do horizonte de projeção, com as receitas a revelarem-se inferiores às pensões pagas, nunca estabilizando ou recuperando desta situação. Conclui-se, assim, que uma arquitetura de financiamento de pensões assente num esquema NDC com um choque deste tipo, por si só, não assegura a solvência de longo prazo. Com a incorporação do ABM,ao ocorrer todos os anos um pequeno choque na mortalidade o mecanismo é contínua e ligeiramente ativado, agravando-se o seu impacto ao longo do tempo devido ao efeito cumulativo. Como a mortalidade não estabiliza, o sistema não consegue regressar à posição de solvência (Gráfico 3), não havendo uma reposição do valor original das pensões e das contas nocionais (Gráfico 4). Pelo contrário, assiste-se à sua continuada diminuição ao longo do tempo. A observação do Gráfico 3 demonstra, de um modo geral, que o sistema se encontra constantemente a gerar perdas, acumulando saldos negativos no fundo de reserva. Perante um choque desta natureza e magnitude, conclui-se que o esquema não é solvente, mesmo com o ABM embutido;

- No cenário 3, observa-se que com a redução temporária da mortalidade se registam saldos negativos durante dez anos (Gráfico 2). Nos primeiros cinco anos, tal é devido ao aumento da longevidade, pagando-se mais pensões durante esse período. Nos últimos cinco, este resultado é explicado pelo facto de as pensões pagas a um maior número de pensionistas vivos exceder a redução das pensões dos que se reformaram nos cinco anos após a verificação do choque, para os quais a pensão inicial é inferior devido à subida da esperança média de vida. Decorridos dez anos, a situação inverte-se, sendo as pensões pagas inferiores às contribuições recebidas, iniciando o fundo de reserva uma trajetória ascendente até chegar a um saldo próximo de zero aos trinta anos, altura em que os pensionistas com aposentações inferiores têm um peso residual, fazendo com que as pensões liquidadas sejam iguais às contribuições recebidas, infletindo-se o sentido daquela trajetória, mantendo-se constante até ao final da projeção. No que concerne aos Gráfico 3 e Gráfico 4, que refletem, respetivamente, a posição de solvência e a evolução do nível das responsabilidades, o desempenho do sistema é semelhante aos cinco primeiros anos do cenário 1, pelas mesmas razões e com a mesma atuação do ABM. A partir do quinto ano, como o choque da mortalidade volta de imediato ao ponto de partida, ou dito de outra forma, assiste-se a uma diminuição instantânea da longevidade reposicionando-se no seu valor inicial, o sistema começa logo a gerar excedentes, devido às menores pensões dos aposentados que entretanto se reformaram nos cinco anos anteriores, período em que a longevidade associada ao choque foi superior. Tendo atingido quase cerca de 0,4% do ativo (Gráfico 3), valor máximo, a partir do trigésimo quarto ano, o saldo do fundo de reserva começa a diminuir, à medida que aqueles

pensionistas vão falecendo. Esta evolução justifica-se porque, por um lado, se assiste a uma substituição de pensões mais baixas por outras mais elevadas, mas, por outro, o número de pensionistas vivos encontra-se a diminuir ao longo do tempo, ou seja, o número de sobrevivos dos cinco primeiros anos (detentor de pensões inferiores) vai diminuindo, caminhando, então, o saldo do fundo de reserva tendencialmente para zero, pois o efeito da existência de pensões mais elevadas sobrepõe-se ao associado à redução de pensionistas vivos, no entanto mantendo a posição de solvência. Perante um choque deste tipo o sistema continua solvente no longo prazo. Da comparação dos gráficos, conclui-se que, em todos os cenários, a existência do ABM melhora a solvência. No cenário 1, com incorporação do mecanismo, o sistema torna-se solvente, no longo prazo, registando-se, no final do horizonte de projeção, saldos acumulados positivos, pese embora os passivos não regressem ao montante original. No cenário 2, os défices acumulam-se continuadamente, porém com uma expressão inferior à da hipótese de ausência de mecanismo, nunca havendo lugar a uma reposição do valor inicial das pensões, das contas nocionais e da solvência. No cenário 3, com a inclusão do ABM, o sistema apresenta saldos excedentários para a generalidade dos períodos de projeção, sendo solvente nesses anos, permitindo ainda o repor dos passivos após o corte havido.