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Braga, França, Martino e Ferrara

No documento O CAMPO DA COMUNICAÇÃO (páginas 110-114)

No âmbito da COMPÓS, um desses frutíferos espaços de discussão foi cria-do em 2001: o GT de Epistemologia da Comunicação. Este foi configuracria-do ao longo dos anos, pelas pesquisadoras e pesquisadores participantes, como fórum

7 Neste contexto, o termo disciplina não se refere a programas de estudos previstos em grades curriculares, como as disciplinas de “Teorias da Comunicação” ou “Metodologia da Comunicação” existentes em cursos universitários na área. Trata-se do conceito epistemológico de disciplina, assim explicado, didaticamente, por Morin (2008, p. 105): “A disciplina é uma categoria organizadora dentro do conhecimento científico; ela institui a divisão e a especialização do trabalho e responde à diversidade das áreas que as ciências abrangem. Embora inserida em um conjunto mais amplo, uma disciplina tende naturalmente à autonomia pela delimitação das fronteiras, da linguagem em que ela se constitui, das técnicas que é levada a elaborar e a utilizar e, eventualmente, pelas teorias que lhe são próprias”.

8 O conceito de campo científico tem origem na teoria dos campos sociais, de Bourdieu (1983). Por campo científi-co, o autor compreende como um campo social específicientífi-co, que possui dinâmicas próprias de trocas e embates, a partir da acumulação de capitais (cuja valoração é principalmente simbólica).

privilegiado para compartilhamento e amadurecimento das inquietações episte-mológicas sobre a área, no país. Dos artigos apresentados neste GT, muitos foram aperfeiçoados e, então, publicados em periódicos científicos ou como capítulos de livro, sendo bastante utilizados no ensino de Teorias da Comunicação, na graduação e na pós-graduação.

Vale ressaltar que o GT reuniu autoras(es) que há muito já trabalhavam e pu-blicavam a respeito da epistemologia da Comunicação, como José Luiz Braga, que possui publicações a respeito do tema desde meados dos anos 1970; Vera França, desde o fim dos anos 1980 e início dos anos de 1990; Luiz Cláudio Martino, final dos anos de 1990; e Lucrécia Ferrara, cuja produção, já extensa, se focou mais especificamente sobre comunicação a partir do início dos anos 20009. Todas(os) essas(es) professoras(es) também possuem, juntamente com outras(os), papel fundamental na consolidação da Comunicação como área científica no Brasil.

Antes, contudo, de abordar textos originados nesse GT, para manter a organi-zação cronológica, devemos destacar um que o precede. Trata-se de Constituição do campo da comunicação, de José Luiz Braga, que primeiro foi apresentado em painel na Mesa de Abertura do 9º Encontro Anual da Compós, no ano 2000, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), em Porto Ale-gre, e reformulado para dez anos depois ser publicado na revista Verso e Reverso (BRAGA, 2011).

Nele, Braga trabalha com o termo campo da Comunicação e problematiza algumas perspectivas que apontam que ele se caracteriza por ser interdisciplinar, começando a esboçar seus argumentos em defesa de uma especificidade dos es-tudos comunicacionais e seu objeto de conhecimento. Propõe, ainda, que são as interações sociais e a midiatização que mostram a especificidade desses estudos comunicacionais, o que seria ainda aprofundado e consolidado em suas publi-cações futuras. Esse é um artigo inquietante, provocativo, e que embasa muitas das perspectivas de pesquisa atualmente em desenvolvimento no país. A partir

9 Informações levantadas a partir da produção bibliográfica específica sobre epistemologia da comunicação declara-da nos currículos Lattes declara-das(os) autoras(es).

de 2001 e da criação do GT, Braga passou a adotar tal espaço como instância fundamental para discussão de seus trabalhos, com vistas a posterior publicação em periódicos científicos ou capítulos de livro.

Outro artigo agregador a esse debate e igualmente emblemático, é Paradigmas da Comunicação: conhecer o quê? de Vera França, apresentado no primeiro ano de funcionamento do GT e publicado posteriormente, naquele mesmo ano, na revista Ciberlegenda (FRANÇA, 2001b).

A partir de sua experiência no ensino de Teorias da Comunicação, França apresenta algumas das questões mais pertinentes para a constituição epistemológica da área: a importância das teorias na formação de profissionais e pesquisadores, a definição de um objeto da comunicação, a questão da interdisciplinaridade, tendo como alternativa a transdisciplinaridade10, as principais correntes de es-tudo, paradigmas científicos norteadores, e o questionamento de qual é o lugar e o papel da Comunicação como área do conhecimento. Com uma linguagem de fácil compreensão, apesar de tratar de assuntos complexos, o texto de França se constitui como material frutífero para suscitar a reflexão epistemológica, espe-cialmente entre estudantes de graduação e pós-graduação.

Mais três textos que valem o destaque, por suas importantes contribuições, foram apresentados no GT em 2004. São eles: História e Identidade: Apontamentos Epistemológicos sobre a fundação e fundamentação do campo comunicacional, de Luiz Cláudio Martino, publicado posteriormente na revista E-Compós (MAR-TINO, 2004); Por uma Cultura Epistemológica da Comunicação, de Lucrécia Ferrara (2004), publicado no ano seguinte, como capítulo de livro; e Os estudos de interface como espaço de construção do Campo da Comunicação, de Braga, também publicado naquele mesmo ano na revista Contracampo (BRAGA, 2004).

No primeiro, Martino (2004) critica o pressuposto de diversidade conceitual como abonador de reflexões epistemológicas, defendendo que estas devem ir além

10 A transdisciplinaridade é o movimento de atravessamento de diversas disciplinas, contribuindo-lhes com a ge-ração de novas teorias e metodologias a partir desse atravessamento. É diferente da proposta da interdisciplinaridade (trocas, cooperações entre disciplinas) e da multidisciplinaridade (associação de disciplinas). Para melhor compreen-são, recomendamos a leitura de Morin (2008).

do olhar histórico sobre a área; o que dialoga com a proposta de Ferrara (2004), no segundo artigo, em que a autora lança um olhar sobre a produção científica e identifica as principais características epistemológicas da Comunicação, con-vocando a uma reflexão crítica sobre tais tendências. Por fim, temos o artigo de Braga (2004), que traz a perspectiva de que o campo da Comunicação pode não estar mais tão “disperso” como anteriormente percebido, propondo as interfaces entre outros campos como possibilidades de sua atuação, elaborando perguntas que só poderiam ser respondidas pelo viés comunicacional.

O que esses artigos trazem em comum é, principalmente, uma valorização da Comunicação como área do conhecimento, com questões e características particulares, o que ajudou a consolidar ainda mais as suas particularidades nos anos seguintes.

Acreditamos que vivemos, hoje, um momento feliz para os estudos de epis-temologia da Comunicação no Brasil, em que as(os) autoras(es) deste tópico já possuem grau suficiente de maturidade acadêmica para produzir obras que reúnem e consolidam suas construções e propostas conceituais.

Às obras que muito ajudaram (e ainda ajudam) a ensinar sobre comunica-ção nos cursos de graduacomunica-ção e pós-graduacomunica-ção no país, a exemplo de Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e teorias, organizado por Antonio Hohlfeldt, Luiz Cláudio Martino e Vera França (2001) e Teorias da Comunicação: muitas ou poucas?, de Luiz Cláudio Martino e colaboradores (2007), se somam produções como Curso básico de Teorias da Comunicação (FRANÇA; SIMÕES, 2016), Escritos sobre epistemologia da comunicação (MARTINO, 2017), Matrizes Interacionais:

a comunicação constrói a sociedade (BRAGA; CALAZANS et al, 2017), e O mo-delo praxiológico e os desafios da pesquisa em Comunicação (FRANÇA; SIMÕES, 2018), todos leituras essenciais e atualizadas, com contribuições aos estudos de epistemologia da Comunicação.

No documento O CAMPO DA COMUNICAÇÃO (páginas 110-114)