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FENÔMENO E A CIENTIFICIDADE

No documento O CAMPO DA COMUNICAÇÃO (páginas 38-41)

1 Jornalista e professora do PPGCOM-UFPI. Doutora em Processos Comunicacionais pela Umesp (2010), com estágio de Pós-Doutorado em Comunicação e Cultura pela ECO-UFRJ (2020). Presidenta da Federação Brasileira das Associações Científicas e Acadêmicas da Comunicação (SOCICOM) no biênio 2018-2020. E-mail: anareginarego@

gmail.com

Ana Regina Rêgo1

P

ensar o campo da comunicação implica abrir-se para infinitas possibilida-des perceptivas acerca do fenômeno comunicacional, visto que enquanto condição essencial de construção de sociabilidades, a comunicação e seus processos, em torno dos quais orbitam laços interacionais, estruturas de poder e redes mercadológicas, possuem desde as primeiras comunidades humanas, uma centralidade na vida em sociedade.

O século XX potencializou o uso da comunicação pelas estruturas de poder.

As tecnologias da comunicação possibilitaram a maximização dos usos dos pro-cessos comunicacionais em corporações comerciais atreladas ao paradigma da modernidade, e que procuraram se moldar e assim moldar as sociedades em torno de políticas de verdade (FOUCAULT, 2009), cujo objetivo era legitimar tanto o poder midiático, quanto seus aliados nos campos político e econômico. Como nos diz Castells (2019), o controle das mentes, invariavelmente, tem passado por estratégias comunicativas vinculadas a aparelhos de poder. Essa interveniência da comunicação na mente dos indivíduos, se faz tanto a partir da ação do mer-cado, enquanto lugar de construção e projeção da sociedade moderna, em que

valores foram forjados através da publicidade e do marketing e em que produtos inexistentes há poucos anos, passaram a ser indispensáveis aos indivíduos; como também a partir de ações do campo político, que por sua vez, trabalha o perfil ideológico, moral e os valores e as crenças pessoais e coletivas. Neste ínterim, os caminhos do marketing e da comunicação se interconectam, para obtenção de objetivos e, para tanto, se utilizam de estratégias, cada vez mais precisas.

Pensar a cientificidade da comunicação, portanto, não se faz dispensável, ao contrário, diante da crise dos lugares de verdade do regime de historicidade da modernidade (HARTOG, 2015), faz-se mister pensar a ciência da comunicação, ainda que represente grandes desafios, como vencer a própria fetichização do método (SODRÉ, 2014) sem cair na flexibilidade analítica total, como também, perceber a potência da essência interdisciplinar do fenômeno que dialoga com outros fenômenos, mas que mantém suas especificidades.

De um lado, as práticas por onde se estruturam as sociabilidades, se mani-festam os afetos e transcorrem os modos de dominação, de outro as pesquisas, os intercâmbios inter e transdisciplinares e os complexos contextos que movem os pesquisadores do campo da comunicação e de outros campos, que, potencial-mente, a partir do final do século XIX e começo do século XX, se debruçaram sobre a comunicação, inicialmente, dita de massa.

Foi diante de um fenômeno mutante observado nas contextualidades comple-xas do século XX que cientistas e pesquisadores formularam paradigmas, teorias e levantaram hipóteses. Logo, a tradição do que se projeta como componentes teóricos-metodológicos do campo científico da comunicação possui uma cons-trução inicial e para muitos incipiente, vinculada tanto a áreas como sociologia e psicologia, como aos meios de comunicação de massa, que terminaram por modificar o status da comunicação na sociedade, se deslocando de uma centra-lidade para uma ubiquidade crescente.

Para Sodré

Falar de paradigma é pôr em cena o problema do estatuto do conhe-cimento implicado na comunicação – primeiro, perguntar sobre a sua realidade como prática social e, depois, como se pode conhecê-la, se doutrina, se campo científico. Aqui se imbricam os pontos cruciais da ontologia e da epistemologia. No primeiro se examina filosofi-camente o grau ou a medida de realidade implicada, enquanto no segundo se esclarece o modo de conhecer essa realidade, portanto, o posicionamento da filosofia sobre o discurso científico. Ao modo da ciência, caberia conhecer o real de maneira ordenadamente sis-temática e, na medida do possível, objetiva. (SODRÉ, 2014, p. 25).

Nesse sentido, este texto se estrutura em torno de provocações situadas em dois polos de observação, de um lado, nos centramos no fenômeno, nos proces-sos e nas práticas da comunicação, com ênfase no espaço midiático e na força do capital que o impulsiona, assim como, nos aparatos políticos que lhes proporcio-nam poder social. Destacamos que neste momento, o foco será na comunicação midiatizada visto que necessariamente precisamos fazer aqui um recorte, tendo em vista o espaço disponível para este capítulo. Posteriormente, tratamos das inquietações que circundam a ciência, a comunicação e sua cientificidade, foca-lizados nos trajetos, desafios e possíveis caminhos. No último ponto mencionado, trazemos visões de pensadores da comunicação que procuram construir novas teorias em território nacional, situando o fenômeno para além das características midiáticas adquiridas no último século, ou seja, tratam-o como elo interacional e característica inerente à humanidade.

Ponderamos que este é um ensaio construído a partir de caminhos e escolhas que procuram situar posições dentro de um pequeno espaço destinado a cada capítulo pela organização do livro e que, portanto, não tem como congregar um número maior de posições, conceituações teóricas e autores, nem tem a pretensão de se colocar como o lugar da verdade, mas tão somente trazer à luz, inquietações que rondam a comunicação enquanto fenômeno, campo, estudo cientificamente orientado e por fim, ciência.

No documento O CAMPO DA COMUNICAÇÃO (páginas 38-41)