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A conversão do conhecimento é um processo social entre indivíduos, e não confinada dentro do indivíduo. O modelo dinâmico pressupõe que o conhecimento humano é criado e se expande mediante interação social entre o conhecimento tácito e o conhecimento explícito, evoluindo ontologicamente desde o nível individual ao interorganizacional (NONAKA, 1994; NONAKA e TAKEUCHI, 1997; NONAKA e Von KROGH, 2009; NONAKA, Von KROGH e VOEPEL, 2006).

Nesse referencial bidimensional – ontológico versus epistemológico - ocorre a espiral da criação de conhecimento como diálogo contínuo entre o conhecimento tácito e o explícito que evolui dinamicamente desde o nível ontológico inferior – o do indivíduo – aos níveis mais altos – os interorganizacionais. A espiral (SECI) de criação de conhecimento, conforme pode ser vista na Figura 2, emerge de quatro modos de conversão do conhecimento: de conhecimento tácito em conhecimento tácito – a (S)ocialização; de conhecimento tácito em conhecimento explícito – a (E)xternalização; de conhecimento explícito em conhecimento explícito – a (C)ombinação; e por fim, de conhecimento explícito para conhecimento tácito – a (I)nternalização (NONAKA, 1994; NONAKA e TAKEUCHI, 1997; NONAKA e KONNO, 1998; NONAKA, Von KROGH e VOELPEL, 2006; NONAKA e TOYAMA, 2008).

A socialização é a fase em que o conhecimento tácito é compartilhado. Para Nonaka e Takeuchi (1997), a socialização é um processo eminentemente de compartilhamento de experiências, emergindo daí o conhecimento tácito na forma de modelos mentais ou

habilidades técnicas compartilhadas. Para esses autores, a experiência é o segredo para a aquisição do conhecimento tácito.

Segundo Nonaka e Takeuchi (1997, p. 97) o “conhecimento tácito mantido pelos indivíduos é a base da criação de conhecimento organizacional”. E o conhecimento tácito é especialmente importante para inovação tecnológica porque

Muito da acumulação tecnológica envolve conhecimento que é tácito: em outras palavras, não codificável e incorporada em pessoas (ou instituições). Isto porque lidar com a complexidade não pode ser reduzida a simplesmente derivada e facilmente aplicáveis “melhores práticas”, mas envolve “regras de ouro” que pode ser adquirida e melhorada somente com a experiência. (BELL e PAVITT, 1993, p. 166)

A experiência permite aquilo que Polanyi (2009) chama de “habitar” no outro. Ou seja, “os aprendizes trabalham com seus mestres e aprendem sua arte, não através da linguagem, mas sim através da observação, imitação e prática” (NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p. 69). Ainda para esses autores, a mera transferência de informações não permite transferir o conhecimento, por estar desligada das emoções associadas e do contexto específico propiciada pela experiência compartilhada. Portanto, historiadores econômicos, entre outros, enfatizaram a importância da movimentação de pessoas como principal mecanismo para transferência internacional de tecnologia (BELL e PAVITT, 1993).

Na socialização, o conhecimento tácito é trocado mediante experiências conjuntas, estar juntos, despender tempo convivendo no mesmo ambiente, em vez de repassar o

Fonte: Nonaka e Takeuchi (2008, p. 69)

conhecimento via linguagem escrita ou de instruções verbais (NONAKA e KONNO, 1998). Nesse processo, segundo Nonaka e Toyama (2008, p. 97), “o método fenomenológico de ver as coisas como elas são é eficaz”. Esses autores exemplificam esse método como o conhecimento tácito que se pode sentir e acumular sobre clientes, a partir de nossa própria experiência como clientes. Nisso, afirmam eles, as contradições são abraçadas em vez de serem confrontadas. Dessa forma os atores podem absorver o conhecimento em seu contexto, em seu ambiente social através da ação e da percepção.

Não há maneira simples de se comunicar ou transferir o conhecimento tácito, pois é adquirido essencialmente por experiências e não é de fácil articulação, ou verbalização. Por isso o compartilhamento do conhecimento tácito é a etapa mais crítica à criação de conhecimento organizacional. Nesse processo o compartilhamento deve ocorrer “entre vários indivíduos com diferentes históricos, perspectivas e motivações. [...] As emoções sentimentos e modelos mentais têm de ser compartilhados para permitir desenvolvimento de confiança mútua (grifo meu)” (NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p. 97). Segundo esses autores, para se conseguir esse compartilhamento é preciso um campo, um espaço, para que os indivíduos possam interagir mediante diálogos pessoais. Esse “campo” é o ba.

A externalização é o processo de articulação do conhecimento tácito. O método frequentemente usado para isso é a combinação de dedução e indução (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).

Como exemplo de dedução, Nonaka e Takeuchi (2008, p. 62) cita o desenvolvimento do conceito do carro RX-7 da Mazda: “um autêntico carro esportivo que permite dirigir com conforto e entusiasmo”, que derivou do slogan corporativo: “criar novos valores e apresentar o alegre prazer de dirigir”, combinado com o posicionamento do novo carro como: “um carro estratégico para o mercado americano e uma imagem de inovação”. Ao mesmo tempo, afirmam esses autores, a indução é a síntese de experiências (viagens conceituais) ao mercado que deseja atender, opiniões de clientes e de especialistas em carros. Complementam que, quando não se pode encontrar uma expressão adequada para uma imagem, mediante métodos analíticos de dedução e indução, o recurso é o método não-analítico – a metáfora, ou analogia, como reforça Nonaka (1994).

O modo de externalização é desencadeado por sucessivas rodadas de “diálogos” significativos. Nesse diálogo, o sofisticado uso de “metáforas” pode ser utilizado para habilitar membros da equipe a articular suas próprias perspectivas e, portanto, revelar conhecimento tácito oculto que, por outro lado, é de difícil comunicação. (NONAKA, 1994, p. 20)

A fase de combinação é o processo de reunir conhecimentos explícitos de diferentes fontes em um novo conhecimento sistematizado, como as especificações de um novo produto (NONAKA, REINMÖLLER e TOYAMA, 2001). Para Nonaka e Takeuchi (2008), a combinação nos nível altos da administração ocorre quando os conceitos intermediários (como de produtos) são combinados e integrados aos grandes conceitos, por exemplo, a visão corporativa.

E nesse modo de conversão de conhecimento envolve a combinação de diversos corpos de conhecimentos explícitos mediante documentos, reuniões, conversas telefônicas ou redes de comunicação com base em computadores – internet/intranet. O tratamento de informação existente pela separação, adição, combinação e classificação – como a que é feita com uso de banco de dados - pode levar a um novo conhecimento. O método de ensino formal e o treinamento em sala de aula geralmente assumem esse modo (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). Ainda segundo esses autores, o nível intermediário de administração desempenha papel crítico na criação de novos conceitos a partir da rede de informações codificadas e de conhecimentos.

A fase de internalização de conhecimento é o modo de conversão que é tipicamente efetuado pelo “aprender fazendo” (NONAKA e TAKEUCHI, 2008, p. 67) pelo qual o conhecimento explícito é convertido em tácito. É o aprendizado do fabrico de bolo seguindo uma receita que, com freqüência, sem a presença de um orientador, o número de tentativas e erros aumenta, até que se consiga chegar a um bom termo.

Quando a Hyundai, a partir de 1967, decidiu pela entrada na indústria automobilística, as equipes de produção buscaram adquirir o conhecimento tácito pelo “aprender fazendo”. As equipes “ensaiavam as operações, montando e desmontando por várias vezes dois automóveis para passageiros, um ônibus e um caminhão, a fim de tornar rotineiros os procedimentos, internalizando o conhecimento explícito transferido“ (KIM, 2005, p. 174).

O valor do conhecimento, segundo Nonaka e Takeuchi (2008) está nas experiências que, conjugando as quatro fases de conversão, são internalizadas e sedimentadas como conhecimento tácito do indivíduo, quer seja como modelos mentais compartilhados ou know- how técnico. Ou seja, a capacidade em definir uma situação ou problema é ampliada quando indivíduos interagem e compartilham conhecimento tácito e explícito (NONAKA, VON KROGH e VOELPEL, 2006).

Essas quatro fases de conversões dizem respeito tão somente à dimensão epistemológica do conhecimento. Pela própria definição a criação de conhecimento depende do contexto no qual se justifica. No processo de criação de conhecimento organizacional, cabe à organização promover o contexto adequado para facilitar as atividades do grupo, ou de equipes auto-organizadas (NONAKA, 1994; NONAKA e TAKEUCHI, 2008; NONAKA, VON KROGH e VOELPEL, 2006), assunto da próxima seção.