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Nesse estado, o candidato ao Senado, João Goulart, nada menos que o presidente do Diretório Nacional do PlB , ex-ministro do Trabalho de

No documento Vargas e a crise dos anos 50 (páginas 129-134)

Vargas e seu herdeiro político, não conseguiu se eleger. Por sua vez, o

candidato ao governo do estado, Alberto Pasqualini, conhecido como o

maior ideólogo do trabalhismo e respeitado nome da política gaúcha, foi

derrotado por urna coligação partidária que reuniu o PSD e a UDN. Além

2 Esta questão foi levantada, mas pouco explorada, em Gomes, Angela de Castro e D' Amujo,

Maria Celina. Getulismo e trabalhismo. São Paulo, Ática, 19R9. capo t i .

3 Sobre o

PTB

como organização oligarquizada e como partido carismático, ver D'Araujo, Maria Celina. A ilusão trabalhista: o PTB de 1945 a 1965. Rio de Janeiro. luperj, 1989.

Trabalhismo e democracia _ 135

disso, em outro estado estratégico para o PTB

?

São Paulo, seu desempenho

eleitoral

(17,28%)

fora inferior ao alcançado

nas

eleições de

1945 (17, 63%)

e de

1950 (20,84%).'

Mesmo a reeleição do filho de Vargas para o Congres­

so, pelo Distrito Federal, não podia esconder o fato de que, do ponto de vista

eleitoral, o

PTB

não convertera o suicídio em votos e que precisaria trabalhar

intensamente para enfrentar a competição e capitalizar o carisma de seu

"\ider martirizado". Ou seja, o partido vivia, em

1954,

um momento difícil

e extraordinário em sua curta história, que potencializava problemas exis­ tentes desde sua criação ainda no Estado Novo.

O

P1B

nascera no bojo de articulações políticas cujo berço fora o

Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e toda a estrutura do movi­ mento sindical montada segoodo o modelo corporativista. Não possuía numerosas nem grandes lideranças políticas nacionais ou mesmo estaduais; não se con struíra a partir de núcleos dispersos em vários estados e municípios do

Brasil; e não se estruturara como forte máquina partidária.

A

debilidade de

suas

bases políticas e sindicais em certas regiões do país, como o Nordeste, aliada ao poder organizacional do Partido Social Democrático (PSD) e da UDN, expli­ cavam muito do perfil urbano e concentrado de seu elcitorado.�

É

bem verdade que o

P1B

tinha um recurso de poder nada desprezível.

Sua doutrina trabalhista tornava-o um partido cuja identidade, alicerçada no carisma de Getúlio -"o pai dos pobres" -, podia afinnar-se e expandir-se por meio de apelos ideológicos valiosos num Brasil que se urbanizava e

industrializava aceleradamente.

A

força do trabalhismo no PTB só era

comparável ao ""gelulismo" que, até então, por um lado, identificava-se com o trabalhismo c, por outro, transcendia ao próprio petebismo.

Tomar o

PTB

um partido eleitoralmente bem-sucedido exigiria uma série

de tarefas árduas, que poderiam analiticamente ser apresentadas como

integrando duas dimensões fundamentais.

A

primeira dimensão era a orga­

nizacional e exigia a rceslruturação c a expansão da máquina do partido, com destaque para sua penetração em vários estados da Federação, incluindo os

municípios rurais.

A

segunda dimensão era de caráter ideológico, traduzin­

do-se na necessidade de lutar pelo monopólio do carisma de Vargas, ao

4 Na verdade, o PTB em São Paulo nunca mais cOll.'ieguiria repetir os índices de preferência alcançadosantcs de 1954. sendo o suicídio de Vargas, sob esse aspecto, um evento decisivo na lrajetória eleitoral do partido. Ver sobre o assunto Lavareda, Antonio. A democracia nas umas: o processo panidário eleiwral brasileiro. Rio de Janeiro, lupctj/Rio Fundo, 199 L. capo 6. Os dados citados sào de votos de legenda e estão em Santos. Wanderley GuiLhcnne (coord.) et alii. Que Brasil é este? Manualde jlldicadorespolíticose sociais. RiodeJaneiro. IuperjfVértice, 1990, p. 222, 226 e 228.

5 Sobre as origens do PTB, ver Gomes, Angela de Castro. A invenção do trabalhismo. São Pauto, Vértice. 1988, capo 8; e O'Araujo, Maria Cetina. Op. clt., capo I.

136 •

Vargas

e a crise dos anos 50

mesmo tempo que distinguia entre trabalhismo de getulismo. Vale dizer, o

PTB

teria que disputar com outms partidos o controle do movimento sindical e do eleitorado popular, reinventando um trabalhismo sem Vargas e mais adequado

à

temática política dos anos

50.

É

claro que um esforço de reestruturação partidária implica lutas entre lideranças políticas pelo controle nacional elou estadual da organização, o que é particularmente difícil no caso de um partido carismático como o

PTB

.

Justamente por isso� essas lutas estão profundamente imbricadas com lutas simbólicas pelo controle das formas de representação do partido. No caso que se está examinando, tal esforço se traduz na n

ecess

idade de requalificar o trabalhismo, mantendo sua referência original� mas transfonnando-a.

A

idéia que orientou este texto é a de que, na década que vai de

1954

a

1964,

o

PTB

vive exatamente esse duplo esforço de afirmação e de renova­ ção enquanto partido político. Não é casual que este seja um período de proliferação e de competição entre lideranças que disputam a hegemonia dentro da máquina partidária. Não é casual também que essas lutas, muitas vezes anttopofágicas, apresentem-se como propostas de um "'novo" e "ver­ dadeiro" trabalhismo, opondo-se a um "velho" e "fisiológico" trabalhismo.' Entretanto, da ótica que está sendo considerada, não importa tanto que "substantivamente" a disputa seja mais organizacional do que ideológica.

O

que importa assinalar é que, politicamente, a luta partidária assuma a fonna de uma luta simbólica pelo controle, talvez, do mais importante recurso de poder desse partido.

Nesse sentido, é fundamental chamar a atenção para o lugar e o espaço que as representações ocupam na ação coletiva deste ator que é o

PTB. E

é exatamente por essa razão que a análise de sua trajetória neste texto será considerada através do crédito que o próprio partido atribui às representações que faz dele mesmo.

A

proposta é que o

PTB

trabalha com dois sentidos, aparentemente até contraditórios, da idéia de representação.

O

sentido de representação como "encarnação"', em que o partido está materializado em um representante, no caso um indivíduo, que simbolicamente está presente e vivo através de seu carismajlegado.

E

o sentido de representação como "formas de apresenta­ ção" de seu poder político, que pode se tornar "visível" elou "dizivel"' através de signos textuais ou não, como cerimônias, imagens e, naturalmente, o discurso (falado e impresso)! Como ideologia, o trabalhismo abarca os dois

6 Sobre

as

disputas por liderança no PTB, ver O'Araujo, Maria Celina. Op. cit., e Delgado, Lucilia de Almeida. PTB. Do getulismo ao reformismo. São Pauto, Marco Zero, 1989. 7 Para a questão da representação, ver Charter, Roger. A história hoje: dUvidas, desafios,

Trabalhismo e democracia _ 137

sentidos da representação e se expressa de fonnas múltiplas, dentre as quais o discurso asswne posição privilegiada, dermindo e sendo definido pela trajetória do próprio partido.

Adotando-se essa fonna de abordagem, não se pode trabalhar com dicotomias entre lideranças mais ideológicas e refonnistas, e lideranças mais pragmáticas e clientelísticas de fonna excludente ou conotando os lados "bom� e "mau" do partido. As práticas do PlB são entendidas aqui como orientadas por wna investida organizacional extremamente pragmática e

por

uma

preocupação doutrinária que investe em divulgação e propaganda, e que, sem abandonar o getulismo, aposta na renovação ideológica do trabalhismo.

Não é tão sim pIes quanto se poderia imaginar a fonnulação de wn diagnóstico preciso sobre o desempenho do

PlB

de

1954

a

1964.

Sem dúvida, ainda neste último ano, o partido continuava a conviver com proble­ mas clássicos de sua história. Durante toda a década, pennaneceu wn partido altamente oligarquizado, insistindo nos procedimentos de expulsão de dis­ sidentes e, nem por isso, sendo menos marcado pela existência de facções internas e de lideranças - algumas mais radicais do que nunca - que disputavam o controle de sua máquina.

Contudo, do ponto de vista eleitoral, é inequívoco que o partido avançou muito.

O

ano de

1955

talvez pudesse ser usado como ponto de referência útil. Este é o ano em que se adota, pela primeira vez no país, a cédula oficial e em que se começa a sentir seus efeitos. Um deles é o de permitir o aparecimento de votos para outras siglas partidárias em áreas tradicional­ mente controladas pelo PSD. Se de um lado esse fato abala os vínculos de identificação partidária que vinham sendo construídos, permite por outro um comportamento mais competitivo e agressivo enlre partidos, sobretudo considerando-se as

áreas

rurais do tenitório nacional, onde os pessedistas eram hegemônicos.

A partir dessas eleições, os ganhos eleitorais do

PIB

são bastante positi­ vos.

Em

inícios dos anos

60,

ele "já era a segunda maior força em tennos de eleições vice-presidenciais, de bancada no Senado

(26,6%)

e na

Câmara

Federal

(28,3 %),

onde, devido ao

crescimento

vertiginoso no Norte e no Nordeste em

1962,

praticamente empatara com o PSD. E aparecia em

terceiro

lugar entre os governadores, prefeitos, deputados estaduais e vereadores".'

Considerando wn outro indicador político muito valioso para os objetivos dessa reflexão - a taxa de identificação partidária antes do golpe de

1964

-, pode."e verificar que o desempenho do

PIB era

alentador. Em pesquisa

realizada pelo Ibope junto a amostras de eleitores das oito principais capitais do país, o

PlB

liderava com uma taxa de

29%,

contra

14%

da UDN,

7%

do

138 • Vargas e a crise dos anos 50

PSD e

5%

do PSP. Soma-se a isso o fato de o P1B ser ·o partido com o qual se identificava a maior fatia do eleitorado dos grandes centro..�", dos quais se excetuava apenas a cidade de São Paulo, o que se devia a problemas relativos

às

históricas disputas internas ocorridas nesse estado.9

Finalmente, vale assinalar que siglas trabalhistas que haviam surgido nesse período ainda não ofereciam potencial de concorrência para o

PTB

. 10

Nesse sentido, ele não só apresentava o crescimento eleitoral mais signifi­ cativo, especialmente quando comparado ao decréscimo do PSD, como possuía, de fato, o monopólio da representação do trabalhismo.

Para discutir alguns aspectos que iluminem a dinâmica política do

PlB

nessa década e formular possibilidades explicativas para seu desempenho organizacional e doutrinário, este texto irá

recorrer

a mna estratégia de análise. Acompanhar a aruação

de um

dos grandes nomes do partido, mas também

um

dos menos lembrados pela literarura especializada: San Tlago Dantas. San Tlago, desde

1955,

passa a integrar o

PTB

de forma militante, o que logo se traduz em cargo parlamentar e em funções na organização partidária. Envolvido de fonna intensa nos episódios dos anos

60

e nos governos parlamentarista e presidencialista de João Goulart, por coincidência dramá­ tica, vai desaparecer pouco após o golpe de

1964

e cerca de um ano antes da dissolução do

PTB.

Como toda estratégia de análise, a que se adota, ao privilegiar certos ângulos, deixa de contemplar outros. Assim, a própria atuação parlamentar de San Tlago e a da bancada petebista - que goza de grande autonomia ante a cúpula partidária - não serão examinadas.11 Do mesmo modo, não se acompanham as importantes questões que, no período, movimentam as relações do

PTB

com as organizações sindicais.12 Sem dúvida, as escolhas do texto tomam-se, em grande medida, as escolhas do próprio petcbista San

9 As capitais pesquisadas foram São Paulo. Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, CUritiba e Fortaleza. Id. ibid., p. 1 35-7; sobre o PTB em São Paulo, ver Benevides, Maria Vitôria. O PTB e o traballlismo: panido e sindicato em São Paulo (1945·1964). São Paulo, Brasiliense, 1989. O Partido Social Progressista (PSP), liderado por Adhemar de Barros, era praticamente um partido paulista.

10 Fntreeslas siglas estão o Partido Trabalhista Nacional (PTN): 1945-65; o Partido Orientador Trabalhista

(POT):

1945-51; o Partido Social Trabalhista (PST): 1947-65; o Partido Rural Trabalhista (PRT): 1958-65; e o Movimento Trabalhista Renovador (MTR): 196 1-65.

t i A atuação da bancada parlamentar do PTB está até hoje por ser examinada com o cuidado que merece. Nenhum dos estudos já produzidos sobre o partido, ainda pouco numerosos e recentes, assumiu o tema como preocupação central.

1 2 As relações do

PTB

com o movimento sindical têm mais espaço na literatura especiali7.ada, embora haja muito o que desvendar. O melhor trabalho existente é, sem duvida, o de Delgado, Lncilia de Almeida. Op. cit., especialmente os capo 1Il e IV.

Trabalhismo e democracia . 139

TIago. São seus diagnósticos, prognósticos e atuação que constituem a perspectiva que orienta esse olhar sobre o

PTB.

No documento Vargas e a crise dos anos 50 (páginas 129-134)

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