• Nenhum resultado encontrado

Assim como comer, dormir, se vestir ou se locomover, entre outras tantas coisas, a comunicação faz parte da rotina dos seres humanos. Seja pela fala, pelos gestos, pelos sons, por imagens ou pela escrita, o fato é que as pessoas se comunicam em boa parte do tempo. As redes sociais digitais transformaram este processo, pois elas expandem a comunicação, por meio de códigos e sinais característicos. Assim, os conteúdos a partir delas podem resultar em engajamento de maneiras diferentes.

O uso da tecnologia no dia a dia causa um impacto sobre a sociabilidade dos indivíduos, uma vez que ela auxilia no desenvolvimento de vínculos umas com as outras. Além disso, elas passam a disponibilizar e/ou acessar informações e opiniões, além de aproximar os indivíduos e grupos por nichos de interesses. Todas essas questões compõem o capital social, termo que, de acordo com Matos (2009):

[...] parece ter sido empregado pela primeira vez por Hanifan (1916), definindo como ―um conjunto de relações sociais marcadas pela boa vontade, camaradagem e simpatia, atributos muito próximos do goodwill utilizado para definir as relações públicas na sua origem‖. (MATOS, 2009, p. 34-35).

Muito antes da popularização da tecnologia e das redes sociais digitais, Pierre Bourdieu, no artigo ―Le capital social: notes provisoires‖ (1980) já indicava que o capital social seria o fato de pertencer a um grupo baseado em trocas permanentes. Para o autor, essas conexões são irredutíveis às relações objetivas de proximidade no espaço físico ou ao espaço econômico e social, porque são fundamentadas em trocas inseparavelmente materiais e simbólicas cujo estabelecimento e perpetuação pressupõem conhecimento desta proximidade.

Também citando o mesmo artigo de Bourdieu, Matos (2009, p. 35) complementa dizendo que para o autor: ―[...] o capital social descreve circunstâncias nas quais os indivíduos podem se valer de sua participação em grupos e redes para atingir metas e benefícios‖. Ou seja, segundo Bourdieu, o capital social não está nas pessoas, mas sim nas relações sociais construídas por elas.

O acesso ao capital social é uma das grandes vantagens que um indivíduo obtém ao fazer parte de uma rede social digital. Para Araújo (2003), tem a ver com a capacidade de cooperar e de confiar para a produção do bem público. A autora explica:

Capital social expressa, basicamente, a capacidade de uma sociedade de estabelecer laços de confiança interpessoal e redes de cooperação com vistas à produção de bens coletivos. [...] refere-se às instituições, relações e normas sociais que dão qualidade às relações interpessoais em uma dada sociedade. (ARAUJO, 2003, p.10).

Por outro lado, conforme Matos, o capital social na perspectiva das redes é abrangente, pois: ―[...] mescla características do capital social com laços fortes (intracomunitários) e fracos (intercomunitários), horizontais e verticais, abertos e fechados‖ (MATOS, 2009, p.40). A pesquisadora complementa a explicação dizendo que os laços verticais definem o capital social como algo que une os integrantes de um grupo, enquanto os laços horizontais promovem o surgimento de pontes entre grupos. E conclui afirmando:

Essa visão postula que o capital social seria uma lâmina de dois fios: por um lado, pode oferecer aos membros de uma comunidade uma variedade de serviços – desde o cuidado com as crianças até recomendações para a obtenção de trabalho e ajuda em casos de emergência; mas, por outro lado, esses mesmos laços podem gerar obrigações e compromissos marcados pela fidelidade cega aos líderes, resultado em envolvimentos ilegais e concentração de informações que normalmente são negadas aos membros menos fieis. (MATOS, 2009, p.40-41).

Sobre os laços sociais, denominados fortes e fracos, a pesquisadora explica que os primeiros são caracterizados pela proximidade, intimidade e, sobretudo, pela intenção de construir e manter vínculos. Já os outros são ocasionais e, quer sejam formais quer informais, não são baseados em intimidade. Estreitando mais as denominações, com um olhar do todo das relações off-line e on-line, Putnam (2000), refere-se o capital social principalmente às conexões e tem como elementos a reciprocidade e a confiança.

Recuero (2005), posteriormente, observa os vínculos sociais: ―Trata-se do conteúdo embutido nas interações que constituem os laços sociais, que pode ser acumulado, aprofundando um determinado laço e aumentando o sentimento de grupo‖ (RECUERO, 2005, p. 90). Assim, a autora afirma que o capital social tem dupla faceta: coletivo e individual. Ela explica:

Diz respeito ao indivíduo, a partir do momento que este é que pode alocar esses recursos e utilizá-los. É coletivo, porque faz parte das relações de um determinado grupo ou rede social e somente existe com ele. O capital social, portanto, apenas existe enquanto recurso coletivo, mas por ter capacidade de ser alocado e utilizado individualmente, tem este caráter duplo. (RECUERO, 2005, p. 90).

A partir destes conceitos, é possível inferir que o capital social é desenvolvido a partir do momento em que ocorre uma relação de cooperação frequente com outras pessoas. Independente de ser presencial ou virtual.

Portanto, qualquer indivíduo desenvolve esse conceito no seu dia a dia com quem são estabelecidas relações, seja com a família, vizinhos, amigos e colegas de faculdade, do trabalho ou de algum grupo que participa. E essas relações também são vivenciadas de forma virtual, por meio das redes sociais digitais. As pessoas veem os seus perfis como formas relevantes para estreitar relações com outros indivíduos e investem tempo postando o seu contexto ou assuntos do seu interesse para fortalecer os laços de convivência.

Se voltarmos os conceitos acima para as relações on-line, entre os influenciadores digitais e os seus seguidores, ou seja, pessoas que acompanham os seus conteúdos nas redes sociais digitais, é possível perceber que a base de um bom desempenho nas redes, convertido também para trabalho, ocorre através da confiança e coerência reconhecidas pelo público nos seus discursos e práticas. E essa característica é uma das bases do capital social on-line.

A confiança, por exemplo, num sujeito que tem uma postura profissional e ética, que recomenda um produto ou um serviço, se de fato utiliza e gosta é a base para outras características cada vez mais visadas por influenciadores digitais: autenticidade, reciprocidade e o engajamento das pessoas. Consequentemente a identificação de um seguidor por uma recomendação de um criador de conteúdo que tem as características acima, possivelmente vai levá-lo a conhecer e adquirir os produtos e serviços indicados, fechando o ciclo pelo qual um influenciador é contratado por uma marca.

Por trás do sucesso que um youtuber conquista com o seu canal existe a persistência de um trabalho constante e contínuo, bem como o foco em um nicho, ou seja, ser referência num determinado assunto, produzindo conteúdos a respeito e interagindo com quem acompanha o seu trabalho. Esse retorno para quem comenta e acompanha o trabalho é fundamental nessa relação de proximidade entre as partes e é o que também difere uma campanha feita com um famoso, das que são endossadas por um influenciador.

Em geral, as pessoas estão mais à vontade de dialogar e questionar um influenciador do que um famoso, pois se sentem mais próximas a ele. E de fato elas interagem mais, questionam, cobram coerência, elogiam alguém que expõe ser o que de fato é com características positivas, mas demonstra também as suas imperfeições.

Na edição de setembro de 2018 da revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios18, a matéria ―O valor da sua influência‖ aborda os sete mandamentos do influenciador: encontrar a sua identidade, manter o diálogo, abrace os trolls19, use as ferramentas, escolha bem o tema, cultive a autenticidade e aposte em collabs20 (CARVALHO, 2018). Essas recomendações nada mais são do que dicas para o fortalecimento do capital social nas redes sociais digitais.

18

A autora entende que esta fonte não é canônica, mas é interessante, pois mostra como um magazine dedicado ao empreendedorismo e relevante no seu nicho reconhece os profissionais do YouTube como forças de destaque no cenário do desenvolvimento de negócios no país.

19

De acordo com a reportagem, seria uma indicação para os influenciadores saberem lidar com as críticas e com as brincadeiras feitas pelos seguidores. Nem sempre é possível agradar a todos, mas é importante saber receber os comentários de quem discorda de alguma opinião e levar com bom humor com aqueles que interagem de forma descontraída a alguma postagem. (CARVALHO. Set. 2018. p. 62).

20

De acordo com a reportagem, quando dois ou mais influenciadores se reúnem para realizar em conjunto uma postagem, seja ela com texto, foto e/ou vídeo. Essas práticas fazem com que a audiência de ambos cresça. Mas é importante que ações como essa sejam feitas com pessoas que tenham pontos em comum entre as partes para que não haja ruídos entre os seguidores.

Para Araújo (2003, p. 26): ―grupos ricos em capital social podem promover melhor o desenvolvimento das pessoas, ou seja, promover o capital humano‖. Isto é observado junto à publicidade nos últimos anos, com o engajamento de pessoas comuns em redes sociais digitais que valorizam o compartilhamento de informações e até com uma nova geração de famosos que advém de nichos focados por interesses.

É cada vez mais forte na sociedade contemporânea a ideia da cocriação, da colaboração e as pessoas, cada vez mais, têm buscado se sentir úteis e pertencentes a algo. Sabendo disso, é muito comum que as marcas procurem em conjunto com os seus consumidores ideias para inovação de produtos, serviços, embalagens, sistema de entrega, promoções, entre outras tantas ações. Mas o importante para a identificação do capital social, seja de uma pessoa ou de uma organização é estar aberto para que possam prosperar e dar oportunidade de participação a outros indivíduos, fazendo-se presente, interagindo e dialogando constantemente.