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PARTE 2 O TERRITÓRIO, O CAMPO E O PERCURSO DA PESQUISA

3.1 CARACTERISTICAS DEMOGRÁFICAS E GEOGRÁFICAS

O Complexo do Alemão se localiza na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, na Área de Planejamento42 – AP 3. Essa região abriga sete das dez maiores favelas da capital em números de habitantes. Nessa AP, 27% do total de moradores vivem em favelas. O número é maior do que a proporção da cidade como um todo, na qual 1.443.773 habitantes dos 6.320.446 totais vivem em favelas, o que corresponde a 23% da população (CAVALLIERI; VIAL, 2012).

42 A cidade do Rio de Janeiro é dividida, a partir da implementação do Plano Diretor da cidade em 1992, em cinco

Figura 10: Mapa da cidade do Rio de Janeiro, dividida por bairros, com marcação no Complexo do Alemão.

As AP são divididas em subáreas e em regiões administrativas (RA), divisão que considera, além da geografia próxima, características relacionadas, por exemplo, ao perfil de ocupação da região (SANTOS, 2012). O Complexo do Alemão é a XXIX região administrativa (RA) da cidade, que é dividida em 33 RAs. Dentre essas, o Complexo ocupa o 8º. lugar em relação à proporção de moradores do bairro que vivem em favelas. Entre os 1.143.773 moradores de favelas do Rio, 4,2% vivem no Complexo do Alemão, o que corresponde a 60.500 habitantes. Cabe ressaltar que, segundo os dados do Instituto Pereira Passos, nem todos os moradores da XXIX RA – Complexo do Alemão vivem em favelas, embora seja a maior proporção entre todas da cidade: a RA tem 69.143 habitantes e desses 87% vivem em favelas. Em número absolutos, o Complexo do Alemão é a 4ª. maior favela da cidade (a pesquisa considerou os complexos como uma favela apenas), ficando atrás apenas da Rocinha, do Complexo da Maré e do Complexo de Rio das Pedras (CAVALLIERI; VIAL, 2012).

Esse número, no entanto, não é um consenso, se perguntado aos próprios moradores da favela. Dados extraoficiais que circulam no território dizem que são 450 mil moradores, diante de informações de um levantamento do Ministério da Defesa, que apontou a existência de 150 mil moradias no território (MAIA, 2017). O Complexo do Alemão, enquanto bairro, tem taxas maiores de números de habitantes por domicílio e densidade demográfica do que a cidade do Rio de Janeiro em geral (INSTITUTO PEREIRA PASSOS, 2017), conforme podemos observar na tabela:

Tabela 1: Comparação entre o número de habitantes por domicílio e densidade demográfica entre o

bairro Complexo do Alemão e a cidade do Rio de Janeiro.

Dados Complexo do Alemão (bairro) Cidade do Rio de Janeiro Número de habitantes por

domicílio 3,32 2,94

Densidade demográfica

(habitantes/ha) 341,8 110,7

Fonte: elaboração da autora, baseada em dados de 2010 apresentados pelo Instituto Pereira Passos (2017)

Outro dado que mostra a discrepância entre o bairro e a cidade em geral é a renda per capita. Dados do censo demográfico de 2010 apresentam que, enquanto no município 34,1% da população vive com mais de dois salários mínimos, no Complexo do Alemão apenas 2,6% dos moradores têm esta renda. A maior parte dos moradores do Complexo vive com uma renda

per capita entre um quarto de salário mínimo e um salário mínimo (62,9%), número maior que o dobro se considerada a cidade como um todo (30,1%) (INSTITUTO PEREIRA PASSOS, 2017).

Com relação à faixa etária, tem-se que, em 2010, 29% da população do bairro tinha idade entre 15 e 29 anos. Em números absolutos, são 16.664 jovens, sendo 8.218 homens e 8.446 mulheres. Na cidade do Rio de Janeiro, como um todo, a porcentagem de jovens na população dessa idade é de 24% (INSTITUTO PEREIRA PASSOS, 2017), ou seja, há uma concentração maior de jovens naquela região, comparado com o perfil demográfico da cidade. Com relação às condições de vida, o Alemão tem um dos piores resultados do Índice de Desenvolvimento Social (IDS)43 da cidade do Rio de Janeiro, de acordo com dados do censo de 2000. Entre os 158 bairros, ocupa a 149ª posição, com o IDS de 0,47, considerado baixo. A título de comparação, a Lagoa, o primeiro lugar na lista, tem IDS de 0,854, e a maioria da população da cidade (53,95%) vive em áreas com IDS entre 0,5 e 0,7 (CAVALLIERI; LOPES, 2008). O que demonstra uma situação de vulnerabilidade social em patamares mais elevados do que o Rio de Janeiro, em geral.

Guimarães e Jannuzzi (2005), em uma reflexão a respeito do uso de indicadores sociais para a aplicação de políticas públicas, apresentam algumas críticas sobre suas limitações e inadequações existentes. Isso porque, apesar de legitimados política, técnica e cientificamente, muitas vezes existem “graves violações a princípios básicos das boas práticas da Pesquisa Social Empírica e do uso mal informado dessas medidas como critérios únicos e ‘neutros’” (p.88). O que os autores afirmam é que a utilização de índices numéricos não abrange os fenômenos multidimensionais existentes em diferentes territórios, ainda mais em um país como o Brasil, que tem dimensões continentais. Deve-se estar atento para que os índices não

43 O IDS é um índice baseado no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), calculado pela Organização das

Nações Unidas (ONU). Trata-se de número com intervalo de variação numa escala de 0 a 1 (0= menor valor; 1 = maior valor), que avaliou 10 variáveis de quatro dimensões no estudo em questão: (A) Dimensão Acesso a Saneamento Básico (1) Percentagem dos domicílios com serviço de abastecimento de água adequada - aqueles que têm canalização interna e estão ligados à rede geral; (2) Percentagem dos domicílios com serviço de esgoto adequado - aqueles que estão ligados à rede geral; (3) Percentagem dos domicílios com serviço adequado de coleta de lixo - aqueles que dispõem de coleta direta ou indireta de lixo; (B) Dimensão Qualidade Habitacional (4) Número médio de banheiros por pessoa; (C) Dimensão Grau de Escolaridade (5) Percentagem de analfabetismo em maiores de 15 anos; (6) Percentagem dos chefes de domicílio com menos de quatro anos de estudo; (7) Percentagem dos chefes de domicílio com 15 anos ou mais de estudo; (D) Dimensão Disponibilidade de Renda (8) Rendimento médio dos chefes de domicílio em salários mínimos; (9) Percentagem dos chefes de domicílio com renda até dois salários mínimos; (10) Percentagem dos chefes de domicílio com rendimento igual ou superior a 10 salários mínimos (CAVALLIERI; LOPES, 2008)

simplifiquem os diversos aspectos envolvidos na vulnerabilidade social e na pobreza. Apesar disso, são relevantes, pois informam a discrepante desigualdade social na cidade do Rio de Janeiro, demonstrando maior vulnerabilidade social em territórios como o Complexo do Alemão.

Cabe ressaltar que, dentro do Complexo, existem muitas disparidades entre as condições de vida dos moradores. Segundo Motta (2014), há uma grande desigualdade social naquele território, sendo que em alguns bairros encontramos desde casas com até três andares, azulejo, ar-condicionado nos cômodos, assim como as moradias advindas de intervenções governamentais (como os conjuntos habitacionais), até as casas de madeira no alto do morro. Quanto mais no alto, mais barata e sem estrutura são as casas, onde vivem os mais pobres. Para os jovens entrevistados por Pérez (2014), parte dessa desigualdade está também relacionada às obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)44, que atingiram de forma desigual a

favela. Enquanto algumas partes melhoraram porque ganharam muitos investimentos, outras continuaram da mesma forma ou até degradaram.