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Um grupo de investidores deseja aplicar capital de giro em determinada atividade e, para tanto, elegem um administrador de absoluta confiança e habilidade irrepreensível no trato dos negócios, para que providencie os investimentos. Diversas hipóteses poderiam ser pensadas para a consecução do objetivo colimado. Todavia, se a atividade-fim não é momentânea e tende a se tornar habitual, a joint venture, ou contrato de parceria150 – como traduzido em nosso país – não seria a melhor opção. De outra parte, a sociedade limitada também não seria a mais indicada, uma vez que não preservaria de modo eficiente a qualidade de investidores dos sócios partícipes. Por seu lado, a sociedade em comandita não traria consigo as vantagens do sigilo. A adequação do figurino societário ficaria, assim, com a conta de participação.

Todavia, porque essa espécie de sociedade não tem, normalmente, divulgação pela mídia, sendo, por natureza, oculta aos olhos das pessoas, acredita-se equivocadamente ser um tipo societário em extinção, ou mesmo extinto. Mas isso não corresponde à efetiva realidade. O que parece correto afirmar é que a adoção da sociedade em conta de participação é muito mais freqüente do que se imagina, e, para alguns, os reais números só não vêm à tona em virtude, precisamente, do caráter oculto dessa sociedade.

Para Waldirio Bulgarelli, “são inumeráveis as utilizações de que a sociedade em conta de participação pode revestir-se na prática”151. Como lembra Bernardo Lopes Portugal, “diante de uma oportunidade de negócios e a simplicidade da formatação de uma sociedade em conta de participação, este tipo de sociedade constitui-se como um instrumento jurídico capaz de viabilizar a participação de investidores, seja de pequeno ou grande porte, ainda mais numa economia cada vez mais globalizada e competitiva, principalmente no dinâmico

150 PIRES, Antonio Cecílio Moreira; WIEGERINCK, João Antonio, O direito societário e as alterações

introduzidas pelo novo Código Civil, cit., p. 24.

mercado de capitais. É, pois, um tipo societário cuja utilização vem crescendo, o que vai demandar um maior interesse no estudo de seus aspectos jurídicos”.152

Com freqüência, ela é invocada para cobrir o vazio jurídico da regulamentação de novos negócios que as transformações da vida econômica impõem, até que a legislação, consciente de sua importância, os venha a subordinar a uma disciplina própria. Assim, se o que se quer é participar em um negócio à conta de outrem, sem necessidade de presença e atuação no negócio; se se intenta uma especialização patrimonial de contribuição dos sócios gerida por alguém em seu próprio nome, mas garantida aos sócios ocultos a prestação de contas e o direito de regresso; se o que se busca é a limitação da responsabilidade patrimonial do sócio oculto, nos termos das disposições clausulares do contrato, então o caminho mais indicado é o da contratação de uma sociedade em conta de participação.

Não é incomum, por isso, nos dias de hoje, que pessoas interessadas em fazer investimentos contratem com determinada sociedade, especialista na intermediação e gestão de capital, a configuração de uma sociedade em conta de participação, em que caiba aos primeiros (investidores ou sócios participantes) aportar recursos, conforme determinadas disposições clausulares de contrato, enquanto à segunda (sócio ostensivo) incumba gerir e aplicar tais recursos em empresa cuidadosamente escolhida.

Para Rubens Requião, dadas as condições econômicas reinantes nos dias de hoje, sociedades dessa natureza estão revivendo. “Capitalistas emprestam seus capitais a empresários para aplicação em determinadas operações, repartindo-se o lucro a final. É comum nos negócios momentâneos de importação, ou quaisquer outros negócios que envolvam aplicação imediata de expressivos capitais”.153

Oscar Barreto Filho entende não haver melhor forma associativa, nos quadros do direito vigente, para a atividade desenvolvida pelos investments trusts do tipo aberto. Waldemar Ferreira já preconizava a possibilidade de emprego da sociedade em conta de participação para o chamado contrato de royalty, pelo qual se regulamenta, por exemplo, uma

152 PORTUGAL, Bernardo Lopes. A sociedade em conta de participação no novo Código Civil e seus aspectos

tributários. In: RODRIGUES, Frederico Viana (Org.). Direito de empresa no novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 160.

hipótese em que comerciantes ou industriais, detentores de fórmulas ou processos industriais, de patentes de invenção, ajustam com firmas brasileiras a fabricação de seus produtos aqui em nosso país, mediante porcentagem sobre o montante dos negócios ou dos lucros líquidos154. Pontes de Miranda aludia a uma série de atividades negociais que tinham seu melhor figurino nessa forma de sociedade. E ela pode ser o filão rico que a imaginação e a engenhosidade dos juristas podem explorar para resolver e disciplinar muitos negócios jurídicos novos, revelados pela criatividade dos empresários, no afã de acompanhar a revolução econômica dos tempos modernos. Além disso, a história da sociedade em conta de participação, longa e de inegáveis virtudes, evidencia que, não raro, ela é chamada para preencher o vazio jurídico decorrente de situações que surgem como lógica conseqüência da contínua evolução das sociedades mercantis155. Oculta que é, desprovida de personalidade jurídica, serve e tem servido a muitos e variados propósitos, que não se ajustam à rigidez e ao formalismo de outros tipos de sociedades.

Nos dias de hoje, um exemplo bastante comum de sociedade em conta de participação é o que se dá com a exploração de flats adquiridos por diversas pessoas ou entidades, desenvolvida nos empreendimentos administrados sob o regime de pool hoteleiro. Nele, a empresa hoteleira é a sócia ostensiva, enquanto os proprietários das unidades imobiliárias integrantes do pool são os sócios participantes.

Outro exemplo de sociedade em conta de participação são as empresas (sócios participantes) que, apostando em futuros lucros de uma atividade ainda pouco explorada – por exemplo, a Biotecnologia, associam-se a outra empresa (sócio ostensivo), para que esta exerça atividades de pesquisa para obtenção de novos medicamentos. Como, em regra, somente o sócio ostensivo assume obrigações perante terceiros, a sociedade em conta de participação significará para os sócios participantes considerável isenção em relação aos riscos do negócio e possibilidade de participação nos lucros, caso venham a existir.

Para Bernardo Lopes Portugal, a sociedade em conta de participação tem aplicação “nos mais diversos ramos da atividade econômica atual, como na administração de imóveis, execução de obras públicas ou exploração de concessões de serviços públicos, organização de

154 Cf. FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1961. v. 3, n. 592, p. 544-545. 155 MÉLEGA, Luiz. As sociedades em conta de participação e o imposto sobre a renda. Suplemento Tributário

fundos de investimento, sindicatos financeiros, sindicatos acionários, acordos industriais e comerciais, e até mesmo para a aquisição de bilhetes de loteria”.156

Não se esqueça, ademais, a possibilidade de viabilização negocial, em determinadas circunstâncias especiais, por via da sociedade em conta de participação, como se dá com “as empresas de importação ou exportação, em determinados momentos cíclicos de uma economia, quando há demanda crescente por capital e não há tempo hábil para a burocracia de criação de empresas, registro, habilitação, etc.157