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Quando dois ou mais agentes distintos decidem unir-se para explorar conjuntamente determinada atividade econômica, sem que tenham que estabelecer elevado grau de vinculação e comprometimento, a solução mais indicada é uma das várias formas de parceria existentes nos diversos ordenamentos jurídicos. Nesse leque de opções, duas modalidades de associação se destacam: a joint venture e a sociedade em conta de participação.

Originária do direito anglo-saxônico, a joint venture242 nasceu de uma forma de

associação despersonalizada e cresceu para o uso nos negócios internacionais. Nascida na

common law, com base essencialmente jurisprudencial, acabou também ganhando espaço nos sistemas de civil law. Abrange ela, em resumo, todas as formas de associação de empresas com objetivo de realização de atividades econômicas com escopo de lucro, não importando, assim, a conformação jurídica que venha a adotar.

Para os fins deste estudo, a joint venture é “um acordo de cooperação (sem forma própria) entre duas ou mais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que podem exercer a administração conjunta, e que têm o dever de busca do objetivo comum, atuante na expectativa de ganho ou benefício (não necessariamente imediato)”.243

Quanto à forma sob a qual possa organizar-se, a joint venture pode constituir-se como pessoa jurídica autônoma, geralmente uma sociedade por ações (ou limitada), na qual participam, mediante aporte de capitais, as partes contratantes. É o que se denomina

incorporated joint venture ou joint venture corporation. Para alguns autores, nesse caso, a

joint venture corporation designaria apenas o contrato de sociedade empresária, cuja constituição decorre do encontro de vontades das partes, formalizado por meio de um “acordo básico”; para outros, seria o próprio “acordo básico”, instrumento jurídico preliminar ao contrato de sociedade propriamente dito. O que, todavia, parece mais acertado é não circunscrever a joint venture corporation a dois fenômenos isolados, mas entendê-la como um

242 O vocábulo joint significa “conjunto”, e venture tem relação com “aventura”. Tradicionalmente, a joint

venture tinha a conotação de uma aventura conjunta, vinculada a um contrato de direito de navegação, que buscava auferir lucros com negócios ultramarinos de exportação e importação.

243 GALIZZI, Gustavo Oliva. A sociedade em conta de participação como subespécie do gênero “joint venture”.

Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo, Malheiros, v. 135, p. 207, jul./set. 2004.

real contrato de cooperação, que abarque não apenas o contrato preliminar, mas também o próprio surgimento de uma sociedade empresária.244

Pode dar-se, porém, que os interesses envolvidos levem ao compartilhamento dos riscos, não, porém, sob a forma de pessoa jurídica, de modo que não se constitua, assim, uma sociedade conjunta com personalidade separada, em que os sócios detenham ações de capital proporcional ao investimento. Em tal caso, tem-se a unincorporated joint venture, ou non

corporated joint venture, ou, ainda, mining partnership. Pelo fato de não haver personalidade jurídica, os integrantes se obrigam nos termos acordados, respondendo cada um por suas obrigações, sem presunção de solidariedade. As regras norteadoras das decisões que darão curso ao empreendimento e aos aspectos gerais da parceria constituem matéria de livre estipulação dos contratantes, os quais, respeitadas as disposições do ordenamento jurídico, determinarão a seu talante os procedimentos formais e as cláusulas que melhor possam atender aos interesses comuns.

Quanto à relação entre a sociedade em conta de participação e a joint venture, o que se pode dizer é que aquela é uma subespécie desta, que constitui gênero. A conta de participação pode configurar modalidade de joint venture, em sociedade não personificada, tipificada pelo ordenamento civil pátrio, em que os sócios conservam suas individualidades e personalidades jurídicas. Já a joint venture poderá ser ou não uma nova pessoa jurídica, conforme se organize como incorporated joint venture (uma nova pessoa jurídica) ou como

non corporated joint venture (em que não há o surgimento de nova pessoa jurídica). Quando for dessa última modalidade, a joint venture pode encaixar-se nos contornos elementares da sociedade em conta de participação. Em outros dizeres: é possível o enquadramento da sociedade em conta de participação no gênero joint venture, mas não como incorporated joint

venture, e sim na qualidade de subespécie típica e sui generis, a saber, como uma non

corporated joint venture.245

De modo mais específico, pode-se dizer a respeito da sociedade em conta de participação nessa correlação: a) é uma unincorporated joint venture (lato sensu), pois não dá

244 Cf. GALIZZI, Gustavo Oliva, A sociedade em conta de participação como subespécie do gênero “joint

venture”, cit., p. 209.

origem a uma nova pessoa jurídica; b) é típica, já que regulada pelos artigos 991 a 996 do Código Civil de 2002; c) é dominante, pois, na consonância com as regras do direito civil, a gestão pertence exclusivamente a uma das partes contratantes (sócio ostensivo); d) é sui

generis, por diferir em três aspectos das demais modalidades de joint ventures: (i) existência de um sócio oculto, que, por via de regra, não aparece para a mídia (CC, art. 991, parágrafo único); (ii) responsabilidade exclusiva do sócio ostensivo perante terceiros; (iii) por via de regra, transferência da propriedade dos investimentos dos demais sócios ao sócio ostensivo, que os administra no interesse comum, observada a circunstância de que a especialização patrimonial somente produz efeitos em relação aos sócios (CC, art. 994, § 1º); e) por fim, para que a conta de participação possa ser classificada como subespécie do gênero joint venture, deve ser necessariamente contratada por prazo determinado, característica que é da essência desta.

Além disso, no que tange às diferenças entre a sociedade em conta de participação e a joint venture, pode-se dizer, por primeiro, que, naquela, a gestão dos negócios sociais fica inteiramente a cargo do sócio ostensivo; nesta é faculdade das partes integrantes contratar uma administração compartilhada (mutual agency) ou individualizada. Ao depois, a propriedade dos aportes dos sócios, na conta de participação, normalmente passa ao sócio ostensivo, em cujo poder estão, e ele os há de controlar e utilizar no interesse comum; na

unincorporated joint venture, ocorre fenômeno similar, mas não idêntico, já que os recursos investidos pelas partes contratantes integram uma “conta comum”, administrada pelo operador, mas de propriedade de todos, e cada integrante contabiliza, em seus registros próprios, os resultados positivos e negativos decorrentes do projeto.