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As áreas de floresta densa de terra firme apresentam variações de acordo com o relevo, que se manifestam na condição de floresta densa de baixos platôs e de floresta densa sub- montana. Nessas áreas, segundo Brasil (2008), além da castanha do Brasil (Bertholletia excelsa), ocorrem várias espécies produtoras de madeira de lei como: acapu (Vouacapoua americana), maçaranduba (Manilkara huberi), jarana (Holopyxidium sp.), piquiá (Caryocar villosum), angelim rajado (Pithecolobium racemosum), sucupira (Bowdichia sp.), jutaí (Hymenaea courbaril), cupiúba (Goupia glabra), louro vermelho (Ocotea rubra), amapá doce (Parahancornia amapa), ipê (Tabebuia sp.), mandioqueira (Qualea sp.) e cumaru (Dipteryx sp.).

Na floresta densa de planície aluvial, conhecida, localmente, como “floresta de várzea”, encontram-se grandes concentrações de palmeiras, em que predominam o buriti (Mauritia flexuosa) e o açaí (Euterpe oleracea). Nas várzeas altas, são encontradas grandes árvores, como: seringueira (Hevea brasiliensis), andiroba (Carapa guianesis), ucuuba (Virola surinamensis), jacareúba (Calophyllum brasiliensis), matamatá (Eschweilera sp.), pracuúba (Mora paraensis), açacu (Hura crepitans), pau-mulato (Calycophyllum spruceanum), muiratinga (Maquira sp.) e samaúma (Ceiba pentandra), além de diferentes espécies de palmáceas: urucuri (Manicaria saccifera), murumuru (Astrocaryum murumuru), bacabeira (Oenocarpus bacaba) e açaí (Euterpe oleracea) (BRASIL, 2008).

No que concerne à fauna, apresenta-se bastante diversificada, dependendo das características de cada ecossistema. As condições fitofisiográficas mostram-se determinantes na distribuição das espécies no território, tanto em decorrência de seus hábitos alimentares, como de suas necessidades de territorialidade.

Segundo Brasil (2008), a Unidade possui uma rica fauna de pequenos mamíferos, incluindo espécies raras, como a cuíca d’água (Chironectes minimus) e o rato da árvore (Isothrix sp.). Nos castanhais é frequente a presença da cotia (Dasyprocta leporina), da cutiara (Myoprocta agouti) e podem ser registrados, também, o caitetu (Tayassu tajacu) e a anta (Tapirus terrestris). Na região do baixo Cajari, registram-se a capivara (Hydrochoeris hydrochaeris), a lontra (Lontra longicaudis) e a ariranha (Pteronura brasiliensis). Inclui-se nessa região a presença de duas espécies de cetáceos: o tucuxi (Sotalia fluviatilis) e o boto vermelho (Inia geoffrensis). As áreas de cerrado são pouco estudadas, mas em suas manchas de floresta é frequente a presença do guariba (Alouatta macconnelli), do macaco-prego (Cebus

apella), do mico-de-cheiro (Saimiri sciureus), tatu (Dasypus novemcinctus), paca (Agouti paca).

Na avifauna destacam-se o biguá (Graculus brasiliensis), carará (Anhinga anhinga), arara (Ara sp.), papagaio (Amazona sp.), periquito (Farpus sp.), tucano (Rhamphastos sp.), mutum (Crax sp. e Mitu sp.), marreco (Dendrocygna automnalis) e pato selvagem (Cairina moschata). O número de ofídios peçonhentos é pequeno, se comparado às localidades vizinhas. Dentre outras, ocorre a surucucu pico-de-jaca (Lachesis muta), várias espécies de jararaca (Bothrops sp) e cascavel (Crotalus durissus). Registram-se, também, ofídios não-peçonhentos, como: jibóia (Boa constrictor), sucuri (Eunectes murinus) e caninana (Spilotes pullatus).

Quanto aos répteis, há várias espécies de lagartos, tais como jacuruxi (Dracaena guianensis), iguana (Iguana iguana) e, com maior frequência, o jacuraru (Tupinambis teguixin). Ocorrem, ainda, o jacaré açu (Melanosuchus niger) e o jacaré tinga (Caiman crocodilus). Dentre os quelônios, pode-se encontrar: perema (Rhinoclemmys punctularia), muçuã (Kinosternon scorpioides), cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus), tracajá (Podocnemis unifilis), cujos habitats são os campos alagados e rios. Embora raro, encontra-se, também, o mata-matá (Chelus fimbriatus), que tem como habitat os igapós (BRASIL, 2008).

Muitas são as espécies de peixes relatadas pelos moradores, com destaque para as mais pescadas e consumidas pela população: traíra (Hoplias sp), surubim (Pseudoplatystoma fasciatum), pacu-açu (Rubripinnis rhomboidalis), piranha (Serrasalmus sp), tamuatá (Hosplosternum littorale), jejú (Hoplerythrinus unitaeniatus), aracú (Laemolyta sp), tucunaré (Cichla sp) e diferentes espécies de acarás. Na área de influência direta do rio Amazonas pesca- se o camarão (Macrobrachium amazonicum).

Ainda que a flora e fauna da área não tenham sido muito estudadas, registra-se a presença de várias espécies florísticas e faunísticas. Na medida em que novas pesquisas forem realizadas, essas listas devem aumentar. Por outro lado, as pressões sobre esses recursos podem comprometer a diversidade de algumas espécies.

A rica biodiversidade do território da RESEX é diretamente afetada pela ação de diferentes agentes, entre os quais: caçadores, pescadores, madeireiros, agricultores, estrada e os próprios agroextrativistas. Os impactos das atividades dos mesmos apresentam repercussões diretas na qualidade e quantidade dos estoques dos recursos.

Os recursos da diversidade biológica na RESEX têm grande importância para a vida dos agroextrativistas, que podem ser usados em diversos fins: na construção de casas, barcos e outros equipamentos, como na alimentação ou fonte de renda.

Segundo a pesquisa socioeconômica realizada em 1993 (FILOCREÃO, 1993, p. 85), 65% das famílias caçaram cotias; 62% caçaram paca e 42% abateram veados; enquanto que 40% das unidades familiares conseguiam caçar macacos e guaribas. Os peixes capturados com mais freqüência nas unidades familiares foram a traíra, por 72%, seguido do aracu, por 65% das famílias; as piranhas, por 64% e os acarás, por 60% das famílias.

Os dados dessa pesquisa indicam a abundância de caça e pesca na UC e a importância da fauna para a sobrevivência das famílias, ao passo que evidencia também a pressão exercida sobre esses recursos. A experiência tem demonstrado que as atividades de caça e pesca, realizadas por populações tradicionais, quando feitas basicamente para sua sobrevivência, tem mantido a sustentabilidade desses recursos.

Por outro lado, quando são incorporadas práticas predatórias e/ou é associada a outros agentes, seus efeitos podem ser desastrosos. As repercussões da atividade antrópica sobre a biodiversidade, bem como seu impacto de caráter socioambiental, serão tratadas em maiores detalhes na seção “3.5. Ameaças e conflitos socioambientais na RESEX do rio Cajari’’, deste trabalho.

Em seu conjunto a área da reserva é, extremamente, diversificada, constituindo uma unidade territorial integrada como um grande complexo de ecossistemas, interligados e interdependentes entre si. Por outro lado, a ação humana define espacializações que resultam em marcas na configuração natural.

3.1.1 Espacialização socioambiental da RESEX do Rio Cajari

Quando criada, a RESEX se sobrepôs em partes dos municípios de Mazagão e Laranjal do Jari que, em 1994, foi desmembrado para instalação do município de Vitória do Jari. Com isso, a UC ocupa porções de três municípios amapaenses. Por outro lado, a Unidade divide-se em três grandes setores, que se caracterizam como espaços diferenciados: alto Cajari, médio-baixo Cajari e Amazonas-Ajuruxi, que são usados para definir o campo de atuação das representações comunitárias (ver seção ‘3.2.1 Organização político-institucional no Cajari’).

O setor Alto Cajari constitui-se de uma área de terra firme em que predomina floresta densa e uma faixa de savana/cerrado. Nesse setor, concentra-se a maior parte dos castanhais da reserva, cuja exploração foi fundamental na organização da ocupação desse espaço.

O setor é cortado pela rodovia BR-156 (no trecho Macapá - Laranjal do Jari), principal via de acesso, que serve ao escoamento da produção, facilitando o acesso ao mercado consumidor e às cidades. A abertura da estrada, a partir de 1991, influenciou na reorganização da distribuição espacial das famílias, através da formação de vilarejos ao longo de seu eixo.

Aqui se encontra certa infraestrutura urbana, principalmente, em Água Branca do Cajari, a maior e mais estruturada comunidade, que cresceu em torno de um antigo barracão. Entre os serviços públicos estão: escola de ensino fundamental e médio, Unidade Básica de Saúde, sistema de tratamento de água, telefone público, escritório do Instituto de Desenvolvimento Rural do Amapá – RURAP, mercearias e igrejas.

O setor Médio-baixo Cajari, notadamente relacionado ao curso do rio, compõe-se de faixas de várzeas, de veredas e de campos alagados, pontuados por maciços de terra firme florestados, as “ilhas” ou “tesos”, como são conhecidos. Nessas ilhas o agroextrativista faz sua roça e cria pequenos animais, como porcos e galinhas. Nos campos alagados, ricos em pastagens naturais, são criados búfalos e bovinos.

A abundância de açaizais nas várzeas das cabeceiras dos igarapés motivou a execução de um projeto comunitário de manejo florestal para produção de palmito. Foi então implantada uma unidade de beneficiamento de palmito, em Conceição do Muriacá, com o apoio do Fundo Mundial para a Natureza – WWF e Governo Estadual (Esse tema será retomado na seção 3.2.1 Organização político-institucional no Cajari).

Além da extração do açaí (Euterpe oleracea Mart) para fruto e palmito, da exploração de pequena quantidade de castanha, esse setor tem grande potencial para a exploração de seringais nativos, atualmente, desativados. Fomentada pelo transporte para a Feira do Produtor, a agricultura é cada vez mais importante na economia dessa área, sendo desenvolvida nas “ilhas” (tesos), bordas de terra firme e nas faixas de restinga. Predomina o acesso fluvial.

Nesse setor, o aproveitamento de pastagens para a pecuária tem sido origem de conflitos. Antes da criação da reserva, os conflitos ocorriam entre as empresas do Projeto Jari e

famílias agroextrativistas (PICANÇO, 2005). Atualmente, os mesmos ocorrem entre criadores remanescentes e novos criadores com os agroextrativistas não criadores, por conta de invasões de roças e pelo acesso a recursos da biodiversidade.

O setor Amazonas-Ajuruxi é formado por uma faixa inundável ao longo do Amazonas, que inclui vários rios e igarapés, com destaque para rio Ajuruxi. Nesse espaço formam-se numerosas áreas alagadas em depressões, que constituem campos alagáveis, várzeas e igapós. No setor predominam as florestas de várzeas, em que o principal produto é o açaí, para fruto e palmito, além da extração de madeira e a pesca, sendo que às margens do Amazonas, pesca-se o camarão. Em toda essa área o transporte é exclusivamente fluvial.

As terras permanecem encharcadas em boa parte do ano, o que limita a produção agrícola, pois só se trabalha a terra nos meses de verão ou tem-se de percorrer longas distâncias até a terra firme, onde são implantadas as roças de mandioca. No verão, as várzeas são cultivadas em pequenas roças de milho, melancia, banana, cana-de-açúcar e jerimum, basicamente, para o autosustento. Durante o inverno, explora-se a madeira e o açaí.

As comunidades localizadas nesse setor estão mais isoladas em relação ao conjunto da reserva. Isso parece ter influenciado decisivamente sua participação nas atividades e no acesso aos benefícios advindos do fato de pertencerem a essa UC (PICANÇO, 2005), que só passaram a receber nos últimos anos, juntamente com mais informações sobre a Unidade.

Em seu conjunto, a RESEX-CA é um complexo edafoclimático e botânico, que influencia diretamente a distribuição social no espaço, bem como as atividades praticadas pelas famílias agroextrativistas. Com base nisso, as expectativas e estratégias de sobrevivência individual e coletiva da população, apresentam especificidades socioculturais e de intervenção antrópica sobre a biodiversidade de cada ecossistema.

Nesse sentido, cada setor ou zona apresenta sua especificidade ambiental que influencia no tipo de relação homem/natureza, estabelecendo diferenças socioculturais e de uso dos recursos para o provimento das necessidades materiais de subsistência dos moradores locais. Essa setorização acabou sendo adotada para orientar a gestão da UC, pelo entendimento de que se constitui por espaços natural ou culturalmente heterogêneos.

Partindo desse entendimento e procurando evitar qualquer determinismo ambiental, far- se-á uma abordagem das dinâmicas social, econômica e ambiental que ocorrem na UC. Busca- se analisar em que medida as mesmas estão relacionadas com os pressupostos que orientaram a

criação da reserva.

3.2 DINÂMICA SOCIAL

A análise da dinâmica social está centrada em aspectos fundamentais de avaliação das condições de vida de determinada sociedade. Nesse sentido, será considerada a evolução do acesso aos serviços sociais básicos por parte da população, com destaque para a organização político-institucional, habitação-moradia, educação, saúde, ocupação e renda, transporte e comunicação.

3.2.1 Organização político-institucional no Cajari

As primeiras organizações dos agroextrativistas do sul do Amapá têm sua origem ligada ao movimento sindical de luta pela terra, influenciadas pelos ventos de redemocratização do país no início dos anos de 1980. Para Filocreão (2007), o isolamento da região e a situação de Território Federal condicionaram duas frentes de influências, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Amapá (SINTRA) e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Almeirim (STR-Almeirim).

A criação do município de Laranjal do Jarí (1987), a transformação do Amapá em Estado (1988) e depois a emancipação do município de Vitória do Jarí47, impõem mudanças político-administrativas e reorientam os vínculos socioculturais e políticos na região. Com isso, os governos estadual e municipal passam a trabalhar pela integração econômico-regional, através do planejamento e intervenção estatais.

No Cajari, a organização política dos moradores tem início em 1984, com denúncias de conflitos fundiários, que ocorriam na região. Recebem apoio do SINTRA e criam a Associação Agrícola e Extrativista dos Trabalhadores Rurais do Cajari, com atuação no Alto Cajari. Entre 1985 e 1989 essa associação atuou no escoamento da produção em barco cedido

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O Muncípio de Laranjal do Jari foi criado através da Lei nº 7.639 de 17 de dezembro de 1987, desmembrado do município de Mazagão. Vitória do Jari foi emancipado como Município através da Lei nº 0171, de 8 de setembro de 1994, desmembrado de Laranjal do Jari.

pela Secretaria de Estado da Agricultura - SEAG (FILOCREÃO apud SILLS, 1991). Depois disso, encerrou sua atuação.

Em 1986foi criada a Cooperativa Mista Extrativista Vegetal dos Agricultores do Laranjal do Jari – COMAJA48, no auge da luta pela destinação de áreas para exploração pelos agroextrativistas do sul do Amapá. Juntos, a cooperativa e o SINTRA, apresentaram demanda formal para a criação dessas áreas. No desenrolar desse processo foram criados o PAE Maracá e a RESEX Cajari, como abordado anteriormente.

Com a criação da RESEX do Cajari, em 1990, a COMAJA ficou com sua ação restrita ao beneficiamento de uma parte da castanha-do-brasil produzida na reserva. Suas lideranças e área de maior atuação acabaram não sendo incluídos no espaço territorial da UC, o que levou ao seu afastamento e isolamento em relação ao movimento.

Um dos pressupostos para a implementação de Reservas Extrativistas é a efetiva participação de instituições representativas das comunidades na co-gestão da UC. Parte-se da premissa que isso possa garantir a transparência e a eficiência das tomadas de decisão. A legislação que criou a Unidade exige uma entidade representativa das comunidades junto ao IBAMA, para receber a Concessão Real de Uso. Isso acabou por impor uma nova lógica à população, no sentido de buscar a institucionalização, para cumprir a burocracia. É com esse sentido que os moradores irão organizar-se para viabilizar as demandas, decorrentes da co- gestão do território.

Com essa perspectiva inicial, o SINTRA e a regional Amapá do Conselho Nacional dos Seringueiros – CNS/AP, criada em 1990, trabalharão no fortalecimento da organização política dos moradores. O trabalho foi assessorado pelo Instituto de Estudos Amazônicos – IEA e apoiado, financeiramente, pelo WWF – World Wildlife Fund e Konrad Adenauer Stifttung – KAS. Foi então promovida uma série de discussões com os moradores, resultando na criação da Associação dos Trabalhadores Extrativistas do Rio Cajari – ASTEX/CA.

Criada em setembro de 1991, com 235 sócios, a ASTEX-CA tem a finalidade de garantir a auto-sustentabilidade dos recursos naturais, aliada a exploração racional de seu

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A COMAJA surgiu como Associação dos Agricultores de Laranjal do Jarí – AMAJA, em 1984. Dois anos mais tarde seus membros decidiram criar uma Cooperativa, congregando castanheiros e pequenos agricultores. O ano de 1990 marca o início do trabalho com o beneficiamento da castanha, em sua primeira fábrica localizada na comunidade de Jarilândia (PICANÇO, 1999).

potencial. Antes de sua criação, todas as ações em torno da Reserva, eram comandadas pelo Conselho Nacional dos Seringueiros – Regional Amapá (CNS-AP).

A partir de então, a ação do CNS-AP vai se concentrando mais no campo da mobilização política, na articulação com o poder público e com os segmentos do movimento nacional e com agentes externos. Por outro lado, ainda mantém o poder de ingerência em situações de maior crise interna. A associação assume a gestão e coordenação das atividades políticas e de produção coletiva no interior da Reserva.

Inicialmente, a ASTEX-CA respondia pela gestão de toda a Reserva, sendo respaldada pela aprovação do Plano de Utilização, em 1995, que legitima o poder da associação. Com base nesse instrumento, a mesma decide sobre temas importantes na vida da população local, embora deva contar com aprovação do CNPT/IBAMA.

Em tese, as decisões da associação deveriam ser, também, respaldadas por seus núcleos de base e pelo conjunto dos moradores, “na qualidade de co-autores e co-gestores na administração da Reserva” (BRASIL, 1996, p. 20). Na prática essa competência é assumida, quase exclusivamente, por uma pequena parcela da diretoria da Associação, senão por seus presidentes.

Esse processo resultou em distorções que reproduzem práticas clientelistas comuns no meio político e do poder público. Nesse quadro, foram geradas diferenças de acesso aos recursos, com repercussões sócio-econômicas entre os agroextrativistas (BENJAMIN, 2004), que comprometeram a gestão centralizada em uma única entidade comunitária.

A experiência do Projeto RESEX49 mostrou-se sintomática nesse sentido. Ao final de sua primeira fase, entre 1995 a 1999, chegou-se a conclusão que a gestão da reserva por uma única associação, era muito difícil, em função da grande extensão da área e de conflito de interesses.

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. Segundo Relatório Final (1999), o Projeto RESEX foi financiado conjuntamente por doações do Fundo fiducitário das Florestas Tropicais (Rain Forest Trust Fund) do G-7 e pela União Européia. Sob administração do Banco Mundial foi firmado acordo de cooperação com o Governo brasileiro través do Ministério do Meio Ambiente – MMA. O projeto tem por objetivo testar nas quatro primeiras Reservas Extrativistas da Amazônia brasileira, modelos apropriados de gerenciamento econômico, social e ambiental, aperfeiçoando os métodos e procedimentos utilizados pelas populações tradicionais na administração dos recursos naturais renováveis das florestas tropicais, por intermédio da co-gestão entre Governo e Sociedade. A primeira fase ocorreu de 1995 a 1999. A Fase II foi realizada entre 2002 e 2006.

Esse Projeto foi inicialmente administrado pelo IBAMA/CNPT e ASTEX-CA. No conjunto, parece consolidar-se um entendimento de que os benefícios do mesmo ficaram restritos, em sua maioria, à área de influência direta da diretoria, no caso o Alto Cajari. Isso foi decisivo para que outras lideranças pressionassem pela gestão da área dividida entre outras associações.

O processo foi apoiado pelo CNPT e CNS-AP e avançou no sentido de estabelecer três áreas administrativas, sob responsabilidade de três associações co-gestoras. Foram criadas a Associação dos Moradores Agroextrativistas do Cajari – AMAEX-CA, fundada em 01/08/1999, que assumiu a gestão do setor Amazonas-Ajuruxi e a Associação dos Produtores Agroextrativistas do Médio e Baixo Rio Cajari – ASSCAJARI50, legalizada em 2003, para gerir o médio e baixo curso do rio. A ASTEX-CA ficou responsável pelo Alto Cajari.

A divisão atendeu aos anseios de parcela dos moradores e obedece à correlação de forças entre as lideranças dos diferentes setores que compõem a Unidade. Definida a área de atuação de cada associação, as mesmas passaram a fazer gestão dos recursos provenientes do Projeto RESEX/PPG751. A AMAEX-CA executou os recursos, também, na área de atuação da ASSCAJARI, devido a demora em sua regularização.

Como já foi dito, inicialmente todas as ações eram conduzidas pela ASTEX-CA, inclusive as de caráter produtivo. O aumento das demandas no âmbito de produção e comercialização, bem como as limitações legais para as associações conduzirem a bom termo o processo, levou o CNS/AP e ASTEX-CA a buscar apoio para criar cooperativas. Por outro lado, as associações firmaram sua atuação na organização social e política.

Foi então criada a Cooperativa dos Produtores Agroextrativistas da Reserva do Rio Cajari – COOPERCA, em dezembro de 1996, e a Cooperativa Mista Agroextrativistas dos Trabalhadores do Alto Cajari – COOPERALCA, em janeiro de 2001. A primeira atuando nos

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A ASSCAJARI ocupou o lugar da Associação Mista dos Trabalhadores Extrativistas dos Rios Muriaca e Cajari – AMAERC, fundada em janeiro de 1999, mas que não chegou a ser legalizada.

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O Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG7) Trata-se de uma iniciativa dos países do G-7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Inglaterra, Itália e Japão) para a implantação de uma política de ações voltadas para a defesa da Floresta Amazônica. Este programa foi instituído pelo governo brasileiro em 1992, com uma dotação inicial de US$ 250 milhões, como objetivo implantar um modelo de desenvolvimento sustentável nas florestas tropicais brasileiras. (NELSON E FUJIWARA, 2002).

Médio e Baixo rio Cajari, com o objetivo de produzir e comercializar palmito de açaí. A segunda, para viabilizar a produção/beneficiamento e comercialização da castanha no Alto Cajari.

A COOPERCA teve sua criação motivada pela busca de alternativa econômica para os moradores do médio e baixo rio Cajari, recebendo apoio inicial da WWF para a instalação de uma fábrica de palmito. Em junho de 1997, a fábrica era inaugurada na comunidade de Conceição do Muriacá, objetivando aproveitar os vastos açaizais existentes, através de manejo florestal comunitário.

A cooperativa produziu e comercializou palmito, inclusive estabelecendo parceria com empresa de Santa Catarina para gerir sua unidade, mas está com sua produção paralizada atualmente. Segundo Irmael Pinto Frazão52, presidente atual, a cooperativa tem 41 cooperados e sua fábrica não está funcionando pela falta de autorização legal por parte do IBAMA.

A COOPERALCA recebeu apoio do Projeto RESEX/PPG7, para construção de unidade de beneficiamento de castanha na comunidade de Santa Clara, no alto Cajari. Segundo seu presidente, Natanael Gonçalves Vicente53, a cooperativa tem um quadro social de 86 cooperados inscritos, mas ninguém colocou suas cotas partes assumidas em Assembléia. Para ele, o quadro social, tanto da cooperativa, quanto das associações não cumprem suas obrigações, comprometendo o desenvolvimento das ações planejadas.