• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 4 – SATISFAÇÃO GLOBAL COM O TRABALHO

4.1. Conceito e definição de satisfação

Apesar do interesse que a satisfação no trabalho tem suscitado, não tem havido consenso quanto à sua definição, bem como quanto aos seus antecedentes e consequentes, havendo um relativo desconhecimento no que se refere a esta temática (Lawler III, 1994).

Destas divergências e disparidades de resultados, uma das mais paradigmáticas pelas suas implicações, é a relação de antecedência entre a satisfação e o desempenho ou resultados do trabalho (Lawler III, 1983; Meyer, Paunonen, Gellatly, Goffin e Jackson, 1989). Há evidência empírica, suportada por diversos estudos (bem como pelo senso comum), que permite estabelecer uma antecedência positiva entre a satisfação e o desempenho. Todavia, há outros estudos em que essa relação não é verificada. Destes, há a salientar a meta-análise de

30

Bowling (2007), em que verificou-se uma redução significativa da relação entre satisfação e desempenho, quando eram controladas as variáveis traços de personalidade, especificamente os “Big Five”. Mais ainda, quando era controlada a auto-estima com base organizacional (“organization-based self-esteem”) a relação causal entre a satisfação e o desempenho tornava-se nula (Bowling, 2007). Assim, pode-se por em causa o facto de colaboradores satisfeitos com o seu trabalho terem um desempenho profissional mais elevado, o que é uma das bases principais das teorias e modelos de motivação.

O mesmo se passa com os determinantes da satisfação. Lawler III (1994) chamou a atenção para o facto de haver teorias que salientam como origem da satisfação sentimentos relacionados com a auto-percepção do que a pessoa deveria receber, enquanto outras salientam a auto-percepção do que se espera receber.

Grande parte dos estudos existentes põe em evidência sistemas de relações entre diversas variáveis mas não perspectiva nem formula um enquadramento teórico da satisfação (Lawler III, 1994). Esta diversidade teórica e empírica leva mesmo a que Locke em 1968 questione, no título de um artigo de referência, “O que é a satisfação com o trabalho?”31 e Lawler chame a atenção para o facto de que “...teoria sem dados é fantasia; mas dados sem teoria é caos.” (Lawer III, 1985: 79). Esta posição é mesmo reforçada pelo facto dos estudos de Locke exclusivamente sobre a satisfação (Locke, 1968 e, especialmente, 1976), não terem tido continuação na linha de investigação futura deste autor 32.

Numa perspectiva de valorização das experiências afectivas, tem-se assistido a partir da década de 80 do século XX, ao aparecimento de estudos que incidem directamente na satisfação com o trabalho, visando especialmente a identificação dos seus determinantes e dos seus impactos na qualidade de vida dos indivíduos (Jayaratne, 1993; Lawler III, 1983, 1994 e 1995; Spector, 1997; Schneider, 1985). Refira-se, no entanto, que esses estudos têm tido como principal limitação uma ausência de um enquadramento teórico que dê sentido, coerência e integre os resultados obtidos.

31

Locke, E. A. (1969). What is job satisfaction? Organizational Behavior and Human Performance, 4, 309-336

32

Na realidade, Locke, em colaboração com Latham, vai desenvolver a Teoria da Definição de Objectivos (“Goal Setting Theory”) que, sendo uma teoria evolutiva, tem sido a linha de investigação destes autores ao longo dos anos (Locke e Latham, 2005).

A relação directa entre a satisfação e os comportamentos no local de trabalho, torna-a numa importante variável preditora de muitos comportamentos, tais como, absentismo, produtividade, “turnover” ou “intenção de turnover”, comportamentos de cidadania organizacional, o que realça a importância económica da satisfação em contexto organizacional e de gestão, (e.g., Jayaratne, 1993; Lawler III, 1983, 1994 e 1995; Locke, 1976; Orgon, 1995; Schneider, 1985; Spector, 1997). A satisfação continua a ser, por isso, um constructo de crucial importância para a compreensão do comportamento humano, em contexto organizacional ou não.

Para Locke “satisfação e insatisfação são (...) reacções emocionais complexas ao trabalho” (Locke, 1969: 314) ou “a Satisfação com o trabalho pode ser definida (até ao presente) como o prazer ou o estado emocional positivo resultante da avaliação de um trabalho ou de experiências de trabalho” (Locke, 1976: 1300). Já para Spector a “Satisfação com o trabalho é simplesmente como as pessoas sentem os seus trabalhos e diferentes aspectos dos seus trabalhos” (Spector, 1997: 2), considerando-a, até pela forma de como é medida, como uma atitude.

Na realidade, as diversas definições de satisfação com o trabalho podem ser agrupadas em duas categorias: uma que a considera como uma reacção afectiva a um conjunto de eventos e outra que a considera como uma atitude (Alcobia, 2001; Brief e Weiss, 2002; Jayaratne, 1993; Lawler III, 1983 e 1995; Lima et al., 1994; Locke, 1969 e 1975; Organ, 1995; Organ e Near, 1985; Spector, 1997). No entanto, quer seja considerada como emoção, quer como atitude, a satisfação é sempre “...um estado emocional positivo ou de uma atitude positiva face ao trabalho ou às experiências em contexto de trabalho” (Lima et al., 1994: 110). Nesta linha, a satisfação vai, por um lado, reflectir uma apreciação pessoal – emocional ou atitudinal – referente a diferentes aspectos do trabalho, que depende dos sentimentos e emoções experimentadas pela pessoa em causa em relação a esses mesmos aspectos (remuneração, benefícios, reconhecimento, liderança, etc.), bem como em relação ao trabalho enquanto constructo global. Por outro lado, a satiafação determina, em função dessa apreciação pessoal, respostas comportamentais específicas, tais como absentismo, produtividade, “turnover” ou “intenção de turnover”, comportamentos de cidadania organizacional.

A satisfação é a resultante de uma interacção entre o indivíduo e o contexto (ou contextos) onde actua ou em relação a um objecto específico (supervisor, colegas, tarefas, condições físicas, remuneração, etc.). Assim, enquanto atitude, a satisfação é determinada por três componentes: uma afectiva, outra cognitiva e uma terceira comportamental. A componente afectiva tem a ver com as emoções positivas (satisfação) ou negativas (insatisfação) que a pessoa tem em relação ao contexto ou objecto. Já a componente cognitiva está relacionada, quer com os processos organizacionais e de trabalho, quer com a capacidade que o indivíduo tem de avaliar o contexto ou o objecto. Passa também pela capacidade do indivíduo de alterar a sua percepção e avaliação, através de processos de aquisição de conhecimentos relevantes e das aprendizagens realizadas com base em experiências passadas. Por fim, a satisfação predispõe o sujeito a assumir uma linha comportamental específica em relação ao contexto ou objecto em causa. Nesta óptica a satisfação é mutável e dinâmica ao longo do tempo, dependendo das experiências tidas (Alcobia, 2001; Brief e Weiss, 2002; Jayaratne, 1993; Locke, 1969 e 1976; Lawler III, 1983, 1994 e 1995; Mowday, e Sutton, 1993; Organ e Near, 1985; Spector, 1997; Vroom, 1964).

Apesar de não haver um corpo teórico referente à satisfação, há diversas teorias motivacionais através das quais este constructo pode ser explicado, bem como a dinâmica processual que vai conduzir à satisfação.