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CAPÍTULO 2 O COMPROMETIMENTO ORGANIZACIONAL

2.5. Variáveis Antecedentes do Comprometimento Organizacional

Pela tipologia de Mowday et al. (1982), pode considerar-se a existência de quatro grupos de variáveis antecedentes do comprometimento organizacional: características pessoais, características estruturais, características ou papéis funcionais e experiências individuais.

Já na perspectiva do Modelo das Três-Componentes do Comprometimento Organizacional, Meyer e Herscovitch (2001) propuseram antecedentes para cada uma das componentes do comprometimento. Assim, as determinantes da componente afectiva do comprometimento organizacional teriam a ver com o grau de identificação e de relevância que a organização tem para o indivíduo, traduzido, nomeadamente, pela partilha dos valores organizacionais, por um envolvimento activo do indivíduo nos processos e nas vivências

organizacional e, também, no apoio que o indivíduo sente que recebe da organização. Quanto à componente normativa, teria origem nas relações de reciprocidade entre os benefícios recebidos versus os investimentos realizados pelo indivíduo, bem como, através da internalização de normas organizacionais resultante de processos de socialização e de um contracto psicológico existente entre o indivíduo e a organização. Já a base da componente calculativa consiste nos investimentos realizados pelo indivíduo na organização e na ausência de alternativas à situação actual do indivíduo.

As práticas de gestão em geral e, em particular as de gestão de recursos humanos, são antecedentes causais distantes do comprometimento organizacional. Meyer e Allen (1997) consideraram que as políticas e práticas de gestão de recursos humanos vão originar no indivíduo uma percepção de auto-estima, de custos e de necessidade de reciprocidade. A percepção da auto-estima iria determinar o comprometimento afectivo, a de custos o calculativo e a de reciprocidade o normativo (Figura 2-3).

Figura 2-3: Práticas de Gestão de RH como antecedente do comprometimento organizacional (baseado em Meyer e Allen, 1997: 69)

Apesar de não haver muitos estudos que relacionem as práticas de gestão de recursos humanos com o comprometimento organizacional, há resultados que indiciam uma relação positiva entre uma percepção positiva das políticas e práticas de gestão de recursos humanos e

Políticas e Praticas de Gestão de RH Percepção da Auto-Estima Percepção dos custos das perdas Percepção da Necessidade de Reciprocidade Comprometimento Afectivo Comprometimento Calculativo Comprometimento Normativo

o comprometimento afectivo e normativo (Ashford e Saks, 1996; Bateman e Stressed, 1984; Mathieu e Zajac, 1990; Meyer e Allen, 1997; Mowday et al., 1982; Ogilvie, 1986). Esta tendência também se verificou em estudos realizados em Portugal (e.g., Botelho, 1996; Carochinho, 1998; Esteves, 2008; Ferreira, 2005).

Das diferentes práticas de gestão de recursos humanos, os processos de socialização têm sido uma das mais estudadas. Diversos estudos têm posto em destaque a influência antecipatória dos processos de socialização no desenvolvimento do comprometimento organizacional, especialmente no afectivo e normativo (Allen e Meyer, 1990b; Ashforth e Saks, 1996; Baker e Feldman, 1990; Bauer et al., 2007; Jones, 1986). Esta relação antecipatória positiva tem sido mais significativa com tácticas de investidura, do que com as de despojamento, na medida em que se inculta no novo colaborador um sentido de pertença e de apoio organizacional (Van Maanen e Schein, 1977). Refira-se ainda que, diversos estudos longitudinais sugerem que o comprometimento organizacional só esteja estabilizado após um período de socialização de cerca de um ano (Allen e Meyer, 1990b; Ashforth e Saks, 1996; Meyer e Allen, 1988; Meyer, Allen e Gellaty, 1990; Meyer, Bobocel e Allen, 1991; Meyer, Irving e Allen, 1998). Estes resultados são consistentes com os resultados obtidos nos estudos de Van Maanen e Schein (1977) e de Jones (1986).

Os resultados da relação de antecedência das características sócio-demográficas, tais como idade, antiguidade na empresa e na função, sexo, habilitações literárias, não têm sido nem significativos, nem consistentes (Allen e Meyer, 1996; Meyer e Allen, 1991 e 1997; Meyer et al., 2002). Apesar de se ter verificado uma relação positiva, embora fraca, com a idade e a antiguidade (quer na organização, quer na função) com qualquer uma das três componentes do comprometimento organizacional, não só a interpretação dos resultados não tem sido conclusiva como, por outro lado, alguns estudos têm verificado que essas relações diminuem e mesmo desaparecem ao controlarem-se outras variáveis, tais como a posição hierárquica, o estatuto, a percepção de alternativas, recompensas pelo trabalho e valores de trabalho. Tem-se também verificado que outras variáveis sócio-demográficas, tais como habilitações literárias, estado civil, sexo, apresentam fracas relações com o comprometimento organizacional, podendo-se concluir que este tipo de variáveis são pouco determinantes para o comprometimento organizacional, quer seja na sua componente afectiva, normativa ou

calculativa (Allen e Meyer, 1993; Meyer e Allen, 1997; Meyer et al., 2002; Mowday et al., 1982; Nascimento et al., 2008).

Estudos sugerem uma relação positiva quer entre os valores e a ética de trabalho, quer entre a necessidade de realização profissional e pessoal, com a componente afectiva e normativa (Finegan, 2000; Kidron, 1978; Meyer e Allen, 1997; Meyer et al., 1998; Wasti, 2003). Apesar de não ter sido objecto de muitos estudos, outra variável antecedente é a socialização inicial (“early socialization”), apresentando também uma relação positiva com o comprometimento afectivo e normativo (Bauer et al., 2007; Cohen, 2003; Mathieu e Zajac, 1990; Meyer e Allen, 1997; Mowday et al., 1982).

Apesar de também pouco estudada, os resultados de diversos estudos sugerem uma relação positiva entre a percepção de competências pessoais e a autoconfiança e o comprometimento afectivo (Johnson e Chang, 2006; Mathieu e Zajac, 1990). O mesmo ocorre com a percepção do indivíduo em relação ao apoio organizacional que recebe (Chen, Aryee e Lee, 2005; Rhoades e Eisenberger, 2002; Rhoades, Eisenberger e Armeli, 2001).

As experiências de trabalho consistem num conjunto de variáveis relacionadas, não só com experiências concretas do sujeito, mas também, com as características da função e do papel desempenhado pelo sujeito no exercício das suas tarefas. Estas variáveis têm sido objecto de um maior número de estudos, sendo os seus resultados mais consistentes do que os obtidos com as características pessoais. Sugerem que as experiências de trabalho têm uma influência positiva na formação do comprometimento organizacional, especialmente na sua componente afectiva. Refira-se ainda que a componente calculativa apresenta sistematicamente relações negativas com estas variáveis e, por isso, de sentido contrário às relações verificadas com as componentes afectiva e normativa (Allen e Meyer, 1996; Meyer e Allen, 1988, 1991 e 1997; Meyer et al., 1998; Meyer et al., 2002).

A amplitude funcional (“job scope”) consiste num conjunto de características funcionais, sendo as mais relevantes o desafio, o nível de autonomia, a variedade de requisitos exigidos para um bom desempenho, e que podem ser analisadas individualmente ou de forma agregada (Hackman e Oldham, 1975 e 1980). Verifica-se que a amplitude funcional, agregando várias medidas e características da função/trabalho, oferece uma predição mais consistente do comprometimento organizacional, especialmente da componente afectiva, do

que essas características consideradas isoladamente (Hackett, Bycio e Hausdorf, 1994; Mathieu e Zajac, 1990; Meyer et al., 2002).

Verifica-se também uma relação positiva entre a clareza com que os papéis organizacionais do sujeito estão definidos e as componentes afectiva e normativa, sendo que essa relação é negativa com a componente calculativa. Assim, quer a ambiguidade de papéis, quer o conflito entre papéis, relacionam-se negativamente com o comprometimento afectivo. Em contrapartida, o apoio e suporte recebido pela organização, bem como a forma correcta e justa com que as políticas e as decisões organizacionais são aplicadas, relacionam-se positivamente com as componentes afectivas e normativas e negativamente, mas em menor intensidade com a componente calculativa (Matiew e Zajac, 1990; Meyer e Allen, 1997; Meyer et al., 2002).

Estudos têm sugerido que as relações de liderança possam determinar o desenvolvimento do comprometimento organizacional. Há a evidência que uma liderança participativa e centrada nas pessoas, de cariz transformacional, se relaciona positivamente com o comprometimento afectivo (Bass e Riggio, 2006; Bycio, Hackett e Allen, 1995; DeCotiis e Summers, 1987; Meyer et al., 2002).

Os resultados apontam no sentido de que a justiça interaccional, a distributiva e a processual, apresentem uma relação positiva e significativa com as componentes afectiva e normativa, sendo negativa ou nula com a calculativa (Allen e Meyer, 1993; Meyer et al., 2002; Rego, 2002; Rego e Souto, 2004a; Rego et al., 2004).

Verifica-se também a existência de uma relação causal positiva entre a percepção do apoio organizacional e o comprometimento afectivo e normativo, e negativa com o calculativo (e.g., Rhoades e Eisenberger, 2002; Rhoades et al., 2001; Vandenberg, Bentein, Michon, Chebat, Tremblay e Fils, 2007). Estes resultados estão em linha com resultados obtidos em estudos realizados no contexto português, que sugeriram uma relação causal directa entre organizações positivas e o comprometimento afectivo e normativo (Cunha, Rego e Cunha, 2007; Rego e Souto, 2004b; Rego et al. 2007).

Apesar dos muitos estudos empíricos já efectuados, a identificação de constructos que determinam o comprometimento organizacional é ainda uma orientação dos autores para possíveis estudos futuros (Bcker et al., 2009; Wright e Kehoe, 2009).