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CAPÍTULO 2 O COMPROMETIMENTO ORGANIZACIONAL

3.4. Determinantes do comprometimento com os objectivos

Locke et al. (1988) consideram determinantes do comprometimento com os objectivos aqueles factores que, de alguma forma, vão determinar a intensidade e o nível do comprometimento, e que “...direccionam o indivíduo a acreditar que a tentativa para atingir o objectivo é importante e fazem-no sem conflito entre o objectivo em questão e outros objectivos, ou fazem-no eliminando esse conflito” (Locke e Latham, 1990: 132-133). Assim, os determinantes podem ser considerados como variáveis antecedentes do comprometimento com os objectivos. Na origem do comprometimento com os objectivos está um processo cognitivo, que determina a emergência de uma relação entre o indivíduo e os objectivos com determinada intensidade, traduzido na determinação que é posta pelo indivíduo na consecução desses objectivos.

Hollenbeck e Klein (1987) propuseram um modelo explicativo do comprometimento com os objectivos, representado na Figura 3-2. Este modelo pretende integrar o comprometimento com os objectivos no processo de definição dos objectivos (Locke, 1968; Latham e Locke, 1978). Tem como base, por um lado, as expectativas do indivíduo, alinhando-se, assim, com a Teoria das Expectativas de Vroom (1964). Por outro lado, também vai basear-se, na formulação de comprometimento de Salancik (1995). O resultado, foi um modelo cujo objecto central era o comprometimento com os objectivos e não o processo de definição de objectivos.

Figura 3-2: Modelo dos antecedentes e consequentes do comprometimento com os objectivos (baseado em Hollenbeck e Klein, 1987: 215)

O modelo estipula que o comprometimento com os objectivos é uma variável moderadora da relação entre o nível de dificuldade dos objectivos e o desempenho do indivíduo. Por outro lado, propõe a existência de dois níveis de variáveis antecedentes. O primeiro nível é constituído pela atractividade do atingimento dos objectivos (“attractiveness of goal attainment”), enquanto a outra consiste na expectativa posta no atingimento do objectivo (“expectancy of goal attainment”). O segundo nível consiste nas variáveis que vão determinar a formação da atractividade e da expectativa. Quer a atractividade, quer a expectativa são determinadas por factores situacionais e pessoais. Os factores situacionais são contingenciais e dependem da situação em que o sujeito está inserido, enquanto os factores

Factores Situacionais Publicidade Volição Explicitação Estrutura de Recompensas Competição Factores Pessoais Necessidade de atingimento Resistência Personalidade Tipo A: Agressividade e Competitividade Comprometimento Organizacional Envolvimento no trabalho Factores Situacionais Influência Social: Objectivos, comprometimento e desempenho dos outros Complexidade do trabalho Constrangimentos ao desempenho Apoio da chefia Factores Pessoais Habilidade Sucessos passados Auto-estima Locus de controlo interno

Atractividade do Atingimento dos Objectivos Expectativa do Atingimento dos Objectivos

Comprometimento com os Objectivos

pessoais consistem num conjunto de características inerentes ao indivíduo (Hollenbeck e Klein, 1987).

Posteriormente, Locke et al. (1988) propuseram um modelo (Figura 3-3) que pretendia explicar a origem do comprometimento com os objectivos.

Figura 3-3: Modelo de Comprometimento para com os objectivos (adaptado de Locke et al., 1988: 28)

Este modelo, baseado na abordagem sócio-cognitiva de Bandura (1986), estabelece três grandes categorias determinantes do comprometimento com os objectivos: Factores Externos, Factores Interactivos e Factores Internos. O comprometimento com os objectivos é determinado por um processamento cognitivo (“cognitive processing”). Esse processamento tem por base as características e atributos específicos do indivíduo (factores internos), tais como expectativas, auto-eficácia, auto-estima e auto-reconhecimento, e vai integrar factores externos e interactivos ao indivíduo. Os factores externos são características organizacionais, tais como, a forma do exercício da autoridade, os modelos de influência relacional característicos da organização, as relações intra e inter grupais, as políticas e procedimentos,

Factores Externos  Autoridade  Influência do grupo de colegas  Recompensas e incentivos externos Factores Interactivos  Participação e competição (superior e/ou colegas e subordinados) Processamento cognitivo Factores Internos  Expectativas  Auto-eficácia  Recompensas internas Comprometimento com os objectivos Conteúdo dos Objectivos Desempenho

especialmente os de recompensa e reconhecimento. Quanto à categoria dos factores interactivos é constituída por variáveis inerente aos processos de relação interpessoal entre o sujeito e os outros, nomeadamente superiores, pares e subordinados, podendo ser de carácter participativo ou competitivo. Esta categoria vai determinar, a forma de participação do indivíduo no processo de definição de objectivos. O desempenho e os resultados são determinados quer pela intensidade do comprometimento organizacional, quer pelo nível de dificuldade dos objectivos (Locke et al., 1988).

A autoridade e a liderança, enquanto factores determinantes do comprometimento para com os objectivos, têm sido estudadas, especialmente, no âmbito dos objectivos definidos por atribuição (Locke e Latham, 1990 e 2002). Tal como Hollenbeck e Klein (1987) salientaram, estes constructos são factores situacionais quer da atractividade, pois é através da liderança que os objectivos são explicados e explicitados, quer da expectativa, pois é através do apoio do líder que as expectativas do indivíduo são determinadas. Verifica-se uma relação linear positiva entre reconhecimento da autoridade por parte dos indivíduos e o nível de comprometimento. O reconhecimento e a percepção da legitimação da autoridade conduzem o indivíduo a uma aceitação por submissão à autoridade dos objectivos definidos, o que já prefigura um comprometimento para com os objectivos. No entanto, para passar da simples aceitação a um estado de comprometimento é necessário que a chefia estabeleça uma relação de apoio e de suporte com os seus subordinados. Por outro lado, a compreensão desses objectivos, a sua explicação aos subordinados, o alinhamento com objectivos individuais, bem como organizacionais são também factores que vão potenciar a emergência de níveis elevados de comprometimento.

Outra dimensão importante na emergência do comprometimento com os objectivos é a confiança na autoridade. Os resultados existentes vão no sentido de estabelecer uma relação linear positiva entre a confiança na autoridade e o nível do investimento e do esforço posto pelo indivíduo na consecução dos objectivos (Hollenbeck e Klein, 1987; Likert, 1961/1971 e 1967; Locke e Latham, 1990, 2002 e 2005; Locke et al., 1988; Oldham 1975).

Este quadro teórico também se verifica a um nível macro-organizacional. Revendo as condições de sucesso de programas de Gestão por Objectivos, Ivancevich (1972 e 1974) sugere que o nível de comprometimento com os objectivos aumenta com um envolvimento

activo da gestão de topo, que passa nomeadamente por reuniões frequentes com os gestores envolvidos nos programas e por recompensar os bons desempenhos. Processos de comunicação baseados em feedback frequentes e precisos, ao invés de “...simples anúncios...” (Locke e Latham, 1990: 150), são também a base para o sucesso de qualquer programa de Gestão por Objectivos. Ao invés, uma excessiva pressão, nomeadamente em termos de prazos reduzidos para o atingimento dos objectivos, pode ser disfuncional, levando a uma diminuição do comprometimento com os objectivos e consequente diminuição do nível de desempenho.

Outro factor externo ao indivíduo que é determinante do comprometimento com os objectivos corresponde às influências sociais a que o indivíduo está sujeito. Estas são, nomeadamente, influências do grupo de pertença do indivíduo, traduzidas por pressões tendentes à conformidade, que podem ser positivas se ferem no sentido do reforço dos objectivos ou, no caso contrário, negativas se forem no sentido contrário ao atingimento dos objectivos. Este tipo de fenómenos de pressão social tem sido objecto de estudo desde a Teoria Científica do Trabalho, passando pelos Estudos de Hawthorne e, já na década de 60, pelos Estudos de Liderança de Michigan, conduzidos por Rensis Likert. Os resultados sugerem que, em grupos de elevada coesão, o comprometimento com os objectivos é maior, tendo este um papel uniformizador dos comportamentos e dos desempenhados individuais (Antoni, 2005; Earley e Kanfer, 1985; Hollenbeck e Klein, 1987; Locke e Latham, 1990; Klein e Mulvey, 1995). A Teoria Sócio-Cognitiva (Bandura; 1986) permite estabelecer que o nível de comprometimento seja maior se implicar, por um lado, compromissos com outras pessoas ou grupo e, por outro, a identificação com figuras tutelares ou “role model”. Nesta linha, pode-se estabelecer o pressuposto de que o comprometimento com os objectivos individuais poderá ser diferente do comprometimento com os objectivos de grupo. Refira-se, no entanto, que não foram encontrados estudos que permitisses sustentar este pressuposto.

Os diversos estudos, nomeadamente de ordem motivacional, sugerem também a existência de uma relação linear positiva entre o nível de expectativas, incentivos e recompensas e o nível de comprometimento com os objectivos. Não há, no entanto, um consenso quanto à influência das recompensas monetárias no comprometimento com os objectivos, pois foram encontrados resultados contraditórios entre os diversos estudos. Estudos empíricos parecem sugerir que os sistemas que privilegiam o pagamento directo do resultado obtido pelo trabalho (por exemplo comissões de vendas, prémios de produção ou

outros “prémios à peça”) são mais eficazes na determinação do comprometimento com os objectivos e do desempenho do que sistemas baseados em prémios atribuídos pelo atingimento dos objectivos definidos, especialmente quando os objectivos são difíceis de serem atingidos (Klein e Mulvey, 1995; Locke e Latham, 1990, 2002 e 2004; Locke et al., 1988; Terborg, 1976).

Os determinantes interactivos estão especialmente relacionados com o nível de participação dos sujeitos na definição dos objectivos. Note-se, no entanto, que os resultados não são conclusivos. Por um lado, há estudos que sugerem que a participação não vai determinar o comprometimento com os objectivos e, por outro lado, também há estudos que sugerem uma relação linear e positiva entre o nível de participação e o comprometimento com os objectivos. Refira-se, no entanto, que os estudos têm focado mais na participação enquanto determinante da definição dos objectivos, do que como determinante do comprometimento para com os objectivos (Latham et al., 1988; Locke e Latham, 1990, 2002 e 2004).

Dos determinantes internos realça-se a auto-eficácia. Os estudos sugerem a existência de uma relação linear positiva entre a auto-eficácia do sujeito e o comprometimento com os objectivos, o que está em linha com a Teoria Sócio-Cognitiva de Bandura (1986 e 1999). Outros dois determinantes internos são as expectativas e as recompensas internas ou intrínsecas do sujeito. Também aqui verifica-se a existência de uma relação linear positiva entre estas variáveis e o nível de comprometimento. O mesmo ocorre com a auto-estima (Bandura e Locke, 2003; Hollenbeck e Klein, 1987; Locke e Latham, 1990, 2002 e 2004; Locke et al., 1988).

Não foram encontrados estudos que relacionem directamente o comprometimento com os objectivos e o comprometimento organizacional, nem foram referidos estudos nesse sentido nas diversas meta-análises realizadas (e.g., Klein et al., 2001; Locke e Latham, 1988, 1990 e 2002; Meyer et al., 2002). Nas várias formulações do “Ciclo de Elevado Desempenho” o comprometimento com os objectivos é considerado como uma variável causal do comprometimento organizacional. No entanto, este pressuposto carece ainda de verificação empírica.

Em oposição, já Hollenbeck e Klein (1987) consideram o comprometimento organizacional, bem como o envolvimento no trabalho, variáveis antecedentes do

comprometimento com os objectivos, sendo a sua influência mediada pela atractividade. Refira-se ainda que, Meyer et al. (2004) consideraram, na sua proposta de Modelo Integrado do Comprometimento e Motivação dos Empregados, que o comprometimento organizacional, por ser um constructo mais geral, seja um antecedente do comprometimento com os objectivos.

3.5. Implicações para a presente investigação

As diversas linhas de investigação têm-se centrado ao nível da construção e desenvolvimento da Teoria da Definição dos Objectivos, mais do que ao nível do comprometimento com os objectivos. Como referido anteriormente, os autores têm continuamente expressado a preocupação em “manter as Teorias Abertas-Fechadas”29 (Locke e Latham, 2005: 146), perspectivando que os resultados de diversos estudos realizados ao longo do tempo na realidade “...não contradizem os resultados iniciais; eles acrescentam conhecimento” (Locke e Latham, 2005: 147). Assim, os autores têm vindo a defender a formulação e o estudo de “macroteorias” (Locke e Latham, 2004: 392) que integrem constructos de diferentes teorias e modelos.

Apesar de o quadro teórico apontar para que o comprometimento organizacional exerça uma relação de moderação entre objectivos e resultados, há estudos que indiciam que essas relações sejam de mediação, sugerindo uma maior complexidade neste tipo de relações, especialmente se forem incluídas outras variáveis mediadoras, tais como a justiça organizacional (e.g., Li e Butler, 2004; Sue-Chan e Ong, 2002). Há também estudos que sugerem uma possível relação de antecedência entre o comprometimento com os objectivos e o comprometimento organizacional (e.g., Locke e Latham, 1990, 2002 e 2004; Miner, 2005), bem como estudos que verificaram que a direcção dessa relação seria inversa (e.g., Hollenbeck e Klein, 1987; Meyer et al., 2004).

29

Para o presente estudo foi utilizado o modelo de comprometimento com os objectivos de Hollenbeck e Klein (1987). Assim, este constructo foi perspectivado como sendo unidimensional. De igual forma, o comprometimento organizacional foi considerado como sendo um constructo determinante do comprometimento com os objectivos, sendo um dos factores pessoais que intervêm na formação da atractividade pelo atingir dos objectivos.

Perspectivaram-se também os objectivos de trabalho numa óptica individual. Como diversos autores já salientaram, há influências sociais, nomeadamente do grupo de referência do indivíduo que perspectivam um comprometimento com os objectivos de grupo (Antoni, 2005; Hollenbeck & Klein, 1987; Locke & Latham, 1988, 1990 e 2002; Klein & Mulvey, 1995). Assim, pretende-se também verificar se os participantes do presente estudo faziam uma distinção clara entre o comprometimento com objectivos individuais e o comprometimento com os objectivos de grupo.

Por outro lado, o presente estudo considera que o comprometimento com os objectivos seja um constructo mediador entre o comprometimento organizacional e as estratégias comportamentais. Esta decisão deve-se ao facto de estar estabelecida a relação entre o comprometimento com os objectivos e o desempenho e resultados obtidos. Sendo o desempenho e os resultados produtos de comportamentos de trabalho – por exemplo a realização de determinadas tarefas – pode-se extrapolar que o comprometimento com os objectivos vai determinar as estratégias comportamentais, assumindo um papel mediador na relação entre o comprometimento organizacional e os comportamentos dos indivíduos em contexto organizacional. Refira-se ainda que os resultados obtidos por Sue-Chan e Ong (2002) suportam esta posição conceptual, por sugerirem uma maior influência da relação de mediação do que da relação de moderação.

Na linha de diversos estudos (e.g., Hollenbeck e Klein, 1987; Latham e Locke, 1978 Locke e Latham, 1990; Sue-Chan e Ong, 2002), foi perspectivado o comprometimento com os objectivos como sendo um determinante da satisfação global com o trabalho.

O presente estudo situa-se na perspectiva preconizada por Locke e Latham (2005), na mediada em que o modelo proposto integra a perspectiva o comprometimento organizacional de Meyer e Allen (1991) com o comprometimento com os objectivos de Hollenbeck e Klein (1987) e ainda as estratégias comportamentais representadas pelo modelo EVLN (Farrell,

1983; Rusbult et al., 1982). Resulta assim da confluência de três modelos distintos sendo que, até ao momento, não foram encontrados estudos que os relacionassem.

Concluindo, o comprometimento com os objectivos, é um constructo com diversas implicações que, pela sua abrangência, pode ser perspectivado não só no âmbito da Teoria da Definição de Objectivos, mas também num quadro mais global dos processos organizacionais, nomeadamente quanto ao comprometimento organizacional, satisfação global com o trabalho e estratégias comportamentais.